1 INTRODUÇÃO

 

O presente trabalho tem como objetivo analisar a Lei da Palmada frente à intervenção do Estado, no poder familiar, analisando os princípios constitucionais, que norteiam a garantia das crianças e dos adolescentes, assim como o Estatuto da Criança e do Adolescente, Código Civil e Constituição Federal.

Com isso, parte-se da análise do Código Civil, Estatuto da Criança e do Adolescente e Constituição Federal frente ao tratamento jurídico que é dado às crianças e adolescentes, demonstrando os princípios, presentes no ordenamento jurídico brasileiro, que visam preservar os direitos destes indivíduos.

A Constituição da República de 1988 é um marco na história social e jurídica do Brasil. No que tange ao Direito da Criança e do Adolescente, representa, de forma decisiva, os anseios sociais, implementa o Estado Democrático de Direito e eleva crianças e adolescentes à condição de sujeitos de direitos e deveres, consolidando o sistema da proteção integral, fundamental à compreensão do atual paradigma a que estão sujeitos estes indivíduos.

O surgimento desse sistema de proteção integral, que culminou com o Estatuto da Criança e do Adolescente, decorre, como será visto, da influencia da Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança da Organização das Nações Unidas (1989).

A nova Doutrina da Proteção Integral implementou outro modelo democrático cujas entidades – familiar, social e estatal – tornam-se conjuntamente responsáveis em manter um sistema mais justo e de garantias fundamentais a todas as crianças e adolescentes, sem distinção.

Assim, a criança e o adolescente passaram a serem vistos como sujeitos de direitos, tendo em vista que a Constituição Federal de 1988 e o Estatuto da Criança e do Adolescente conceituaram os princípios basilares dessa nova situação, na qual o papel da família, da sociedade e o do Estado são primordiais para o melhor desenvolvimento físico, social e moral das crianças e dos adolescentes.

Atualmente a Constituição Federal e Estatuto da Criança e do Adolescente prevêem normas que visam resguardar os deveres dos pais na criação de seus filhos. Ademais, estas normas protetivas garantem que as crianças e os adolescentes sejam respeitados pelos pais, uma vez que violadas, o Estado tem autorização para intervir nas relações familiares em prol destes indivíduos.

O Estado, pautado no Princípio da prioridade absoluta, tem o dever de garantir que as crianças e os adolescentes serão criados e educados, na sociedade, como prioridades das autoridades públicas.

Os pais, na atual Constituição de 1988, e nos termos do Princípio da isonomia, tem o poder familiar, para conduzir sua família, entretanto, a autoridade parental, se sujeita à fiscalização e ao controle do Estado, nos termos da lei. Sempre que ocorrer algum fato incompatível ao exercício do poder por seus titulares existe a possibilidade de suspensão ou de sua destituição.

A Lei da Palmada foi criada com o objetivo de estabelecer como direito da criança e do adolescente não serem submetidos a qualquer forma de punição corporal, mediante a adoção de castigos moderados ou imoderados, sob a alegação de quaisquer propósitos, ainda que pedagógicos.

Por tal razão, a pesquisa mais apropriada e, portanto, adotada foi a dogmática jurídica. Utilizando- se de ampla revisão bibliográfica, fez-se o estudo da norma e das doutrinas pertinentes, à luz de instrumentos teóricos e conceituais, com o intuito de verificar a efetividade da aplicação da Lei da Palmada frente ao ordenamento jurídico brasileiro. Para isso, a técnica de pesquisa utilizada foi a bibliográfica, da espécie teórica e do tipo explicativo.

O primeiro capítulo irá analisar os princípios constitucionais na defesa da criança e do adolescente, sendo que a Constituição da Republica de 1988 foi primordial para nortear a fundamentação e intervenção desses princípios, que ganham conteúdo e preocupações coletivas, em atendimento ao processo de constitucionalização que o Direito Civil enfrenta, como conseqüência do paradigma do Estado Democrático de Direito.

No capítulo seguinte, será analisado a proteção da personalidade e integridade física da Criança e do Adolescente frente à Constituição Federal, ECA e Código Civil. As crianças e adolescentes, na condição de pessoas, são titulares de direitos de personalidade intransmissíveis e irrenunciáveis.

Todavia, considerando que estes indivíduos, são frágeis, dado a condição infantil, a capacidade de exercício dos direitos de personalidade serão exercidos por outrem, seus responsáveis.

Entretanto, está limitação para o exercício dos direitos de personalidade não implica a não titularidade desses direitos por parte das crianças e dos adolescentes.

A integridade física, a integridade psíquica e a integridade moral compõem os aspectos fundamentais da pessoa humana, que são tutelados pelo direito da personalidade, tratados pelo ordenamento jurídico de maneira especial em relação às crianças e aos adolescentes, uma vez que eles são beneficiários da proteção absoluta.

Na sequência, será apontado o estudo acerca do poder familiar, relacionando à relação afetiva entre os pais e filhos e a intervenção do Estado nessa relação, assim como, as medidas que garantam o afastamento da autoridade paterna do convívio com a criança e o adolescente, no caso de abuso desta autoridade.

No último capítulo será analisada a Lei da Palmada, sob o enfoque da Constituição Federal, Código Civil e Estatuto da Criança e do Adolescente. Este capítulo tem o objetivo de mostrar que esta Lei em nada inovou o ordenamento jurídico brasileiro, diante da existência de outras normas que já garantem a proteção das crianças.

Ademais, este capítulo visa mostrar que as crianças e os adolescentes possuem personalidades próprias, assim, nem todos são capazes de serem educados, para o convívio em sociedade, apenas pelo dialogo, necessitando os pais da famosa “palmada pedagógica”.

Na conclusão do trabalho é demonstrado que a Lei da Palmada não inovou em nada, sendo que legislação brasileira, como o Estatuto da Criança e do Adolescente, Código Civil, Constituição Federal e Código Penal, já tratavam das disposições contidas nesta Lei.

 

 

 

 

2PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS NA DEFESA DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

 

A Constituição Federal de 1988, Código Civil e Estatuto da Criança e do Adolescente, no tocante à aplicação dos princípios, foram primordiais para nortear a fundamentação e interpretação destes princípios, que ganharam conteúdo e preocupações coletivas, em atendimentos ao processo de constitucionalização que o Direito Civil enfrenta, em consequência do Estado Democrático de Direito.

Os princípios do Direito Civil devem ser interpretados segundo a Constituição Federal e, como normas que são, devem servir como esquema interpretativo para as relações civis, pois é esse o sentido da constitucionalização do Direito Civil.

Neste sentido, bem fundamento por Anderson Schreiber:

O fenômeno da constitucionalização do direito civil refletiu-se, portanto, também na responsabilidade civil, e de forma notável. Um novo universo de interesses merecedores de tutela veio dar margem, diante da sua violação, a danos que até então sequer era considerados juridicamente como tais, tendo, de forma direta ou indireta, negada a sua ressarcibilidade. (SCHEREIBER, 2007, p. 85-86).

 

Nas lições de Maria Berenice dias (2010, p. 448) a Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente acolheram a doutrina da proteção integral, assim, as crianças e adolescentes foram colocadas a salvo de toda forma de negligência. Transformaram-se em sujeitos de direito e foram contemplados com enorme número de garantias e prerrogativas.

Embora a Constituição Federal não seja um diploma especifico para regulamentar os direitos das crianças e dos adolescentes, foi responsável por romper com a doutrina da situação irregular e trazer a doutrina da proteção integral.

Como explica Tânia da Silva Pereira:

Adotada a doutrina jurídica da Proteção Integral, a população infanto-juvenil, em qualquer situação deve ser protegida e seus direitos, garantidos, além de terem sido reconhecidas prerrogativas idênticas às dos adultos. A proteção, como prioridade absoluta, não é mais obrigação exclusiva da família e do Estado: é um dever social. As crianças e os adolescentes devem ser resguardados e defendidos por serem pessoas em com condição peculiar de desenvolvimento. (PEREIRA, 2008, p. 759-760).

Assim, feita esta breve introdução acerca da proteção absoluta da criança e do adolescente, passa-se a analisar os princípios, presentes na Constituição Federal e Estatuto da Criança e do adolescente, que garantem esta proteção.

 

2.1Princípio da Dignidade da Pessoa Humana e o Princípio da Proteção Integral à criança e ao adolescente

 

O Princípio da dignidade da pessoa humana, conforme entende Dias (2009, p. 61), é um dos princípios, mais importantes do Estado Democrático de Direito, considerado como um macro princípio do qual se desencadeiam os demais.

Na lição de Ingo Wolfgan Sarlet:

Não restam dúvidas de que todos os órgãos, funções e atividades estatais encontram-se vinculados ao princípio da dignidade da pessoa humana, impondo-lhes um dever de respeito e proteção, que se exprime tanto na obrigação por parte do Estado de abster-se de ingerências na esfera individual que sejam contrárias a dignidade pessoal, quanto no dever de protegê-la (a dignidade pessoal de todos os indivíduos) contra agressões oriundas de terceiros, seja qual for à procedência, vale dizer, inclusive contra agressões oriundas de outros particulares, especialmente – mas não exclusivamente – dos assim denominados poderes sociais (ou poderes privados). (SARLET, 2009, p. 121)

 

Assim, o autor ao afirmar que é dever do Estado à proteção da dignidade da pessoa humana, também está incluindo nesse rol de proteção à criança e ao adolescente, pois se encontram num estado incompleto de desenvolvimento, sendo necessário um especial respeito à sua condição de pessoa humana.

É dever da família, sociedade e, inclusive, do Estado, resguardar o menor de qualquer ofensa ou ato atentatório contra sua dignidade, respaldando tal preceito no artigo 227 da Constituição Federal, in verbis:

É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (BRASIL, 1988).

 

Desta forma, pode-se dizer que o Estado, sociedade e família possuem obrigação solidária, perante a criança e ao adolescente, nos termos dos dispositivos da Carta Maior, sendo de responsabilidades daqueles os danos causados, ainda que por omissão ou negligência, uma vez que a criança e o adolescente estão em fase de desenvolvimento físico e psíquico. Entretanto, apesar de haver a obrigação solidária, o legislador impôs, primeiramente, aos pais o dever de proteger estes indivíduos, desempenhando assim o poder familiar.

Como adverte Ana Maria Viola de Souza (2004) o Estado se atribui a responsabilidade de defesa dos direitos e garantias fundamentais do cidadão; contudo, por absoluta carência de recursos materiais necessários à política de assistência, não está logrando êxito na sua função como cidadão produtivo e útil.

Paulo Luiz Netto Lobo afirma que:

(...) a mudança verificada com relação à infância e à juventude frente ao artigo 227 da CF/88, que estabeleceu seus direitos humanos, fundamentais, individuais e sociais, oponíveis contra o Estado, sociedade e a comunidade em geral, como também os pais e seus substitutos, e ainda todos os familiares, “Não é um direito oponível apenas ao Estado, à sociedade ou a estranhos, mas a cada membro da própria família. (LOBO, p. 243).

 

Com o advento da Constituição Federal de 1988, o Estado passou a se preocupar com a defesa de seus indivíduos, usando a família, como um instrumento de proteção à dignidade da pessoa humana.

Assim, bem fundamentou Eduardo Silva (2002, p. 464), quando disse que a família é composta por pessoas, e todas elas merecem a atenção da ordem jurídica. O Direito de Família tem a sua estrutura de base no princípio absoluto da dignidade da pessoa humana e deste modo promove a sua ligação com todas as outras normas ainda em vigorosa conexão com o direito familista, pois configurando um único sistema e um único propósito, que está em assegurar a comunhão plena da vida, e não só dos cônjuges, dos unidos estavelmente, mas de cada integrante da sociedade familiar.

 

 

 

O doutrinador Ingo Wolfgan Sarlet, afirma que:

O que se pretende sustentar de modo mais enfático é que a dignidade da pessoa humana na condição de valor (e princípio normativo) fundamental que ‘atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais’, exige e pressupõe o reconhecimento e proteção dos direitos fundamentais de todas as dimensões (ou gerações, se assim preferirmos). Assim, sem que reconheçam à pessoa humana os direitos fundamentais que lhe são inerentes, em verdade, estar-se-á negando-lhe a própria dignidade. (SARLET, 2009, p. 94).

Conforme afirma Paulo Luiz Netto Lobo, o princípio não é uma recomendação ética, mas diretriz determinante nas relações da criança e do adolescente com seus pais, com sua família, com a sociedade e com o Estado.

A maior vulnerabilidade e fragilidade destes indivíduos em desenvolvimento os fazem destinatários de um tratamento especial. Assim, diante deste cenário, consagra-se o principio da prioridade absoluta, no qual exige do poder público a garantia dos direitos fundamentais às crianças e aos adolescentes.

A Convenção sobre os Direitos da Criança da ONU, a Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente listam diversos direitos que devem ser alvo de proteção prioritariamente pelo Estado, pela família e pela sociedade a fim de garantir uma existência digna e o desenvolvimento pleno da criança e adolescente.

Dessa forma, é que a criança e o adolescente, além dos direitos fundamentais inerentes a qualquer ser humano, têm alguns direitos que lhe são especiais pela sua própria condição de pessoa em desenvolvimento.

O Estatuto da Criança e do Adolescente rompe com a doutrina da situação irregular do Código de Menores que tratava a criança e o adolescente como objetos, passando a tratá-los como sujeitos de direitos. O Estatuto, visando garantir a efetivação desses direitos, dispõe que qualquer atentado, por omissão ou ação, aos direitos fundamentais das crianças e adolescentes são punidos conforme determina a lei.

Assim, prevê o Estatuto da criança e do adolescente no art. 3°, que todos devem adotar medidas que atendam ao melhor interesse da criança e do adolescente:

 

 

A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade (BRASIL, 1990).

 

O princípio da prioridade absoluta está previsto no art. 227 da CF e também no art. 4°, da Lei 8.069/90, Estatuto da Criança e do Adolescente:

É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e a convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (BRASIL, 1988)

No art. 4º da Lei 8.069/90:

É dever da família, comunidade, da sociedade em geral e do Poder Público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende: a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias: b) precedência do atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública: c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas: d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude. (BRASIL, 1990).

Em consonância à nova Constituição Federal de 1988, o Estatuto da Criança e do adolescente deixa claro, seu objetivo fundamental, que é a proteção integral de crianças e adolescentes, assim, todos os seus dispositivos legais devem ser interpretados de modo a priorizar os direitos destes indivíduos.

Assim, pode-se dizer que o art. 4º da Lei 8.069/90, prevê ser de responsabilidade, não só do Estado, mas também, da sociedade e da família, garantir a proteção integral da criança e do adolescente, e que está proteção seja absoluta, ou seja, acima de qualquer outra.

Conforme lições de Murillo José Digiácomo e Ildeara de Amorim Digiácomo (2013, p. 5/6), o art. 4º da Lei 8.069/90 estabelece um verdadeiro comando normativo dirigido em especial ao administrador público, que em suas metas e ações não tem alternativa outra além de priorizar - e de forma absoluta - a área infanto-juvenil, como vem sendo reconhecido de forma reiterada por nossos Tribunais.

A Declaração dos Direitos da Criança, do ano 1959, trouxe no princípio 8°1, a seguinte redação: a criança deve - em todas as circunstâncias - figurar entre os primeiros a receber proteção e auxílio. Assim, caso ocorra um acidente, epidemia ou catástrofe, as crianças e os adolescentes, serão os primeiros a serem socorridos e receberem proteção e auxílio, pois deve se a circunstancia de serem considerados indivíduos indefesos pela legislação brasileira.

Está norma, ainda é reforçada pelos dispositivos previstos no Estatuto da Criança e Adolescente, nos arts. 5º e 18°, que impõem a todos o dever de colocar crianças e adolescentes a salvo de qualquer perigo. Vejamos:

Art. 5º. Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais. (BRASIL, 1990),

Art. 18°. É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor. (BRASIL, 1990).

 

O art. 259, § único, do ECA2, assegura que o poder público deverá assegurar e adaptar o acesso das crianças e dos adolescentes aos seus órgãos e serviços.

Posto isso, conclui se que são inúmeros os dispositivos legais que priorizam a proteção integral destes menores perante a sociedade, de modo que o Estado deve sempre se ater na prioridade absoluta deles, com o intuito de garantir proteção e condição de existência a estes indivíduos, além do respeito, a inviolabilidade de sua integridade física, psíquica e moral.

 

2.2 Princípio da Paternidade Responsável



Reza o art. 226, §7° da Constituição Federal que:

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do estado: (...)

§7º. Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas. (BRASIL, 1988).

 

Assim, o legislador considerou que o planejamento familiar e a educação, no lar, são responsabilidades dos pais, com o objetivo de incentivar a convivência familiar.

Deste modo, a “paternidade responsável”, implica num planejamento familiar, para garantir à criança e ao adolescente o direito à alimentação, educação, dignidade, dentre outros.

 

2.3 Princípio da Liberdade

 

O princípio da liberdade foi um dos primeiros princípios a ser reconhecido como direito fundamental, integrando a primeira geração de direitos a garantir o respeito à dignidade da pessoa humana.

A constituição federal, art. 2273, na parte que se trata dos direitos da criança e do adolescente, assegura o direito à liberdade. Assenta-se neste direito tanto a necessidade de o adolescente, desde os 12 (doze) anos de idade, concordar com a adoção, conforme também preceitua o art. 45, §2°, do ECA4, como a possibilidade do filho de impugnar o reconhecimento levado a efeito enquanto era menor de idade, nos termos do art. 1.614 do CC5.

Igualmente o Estatuto da Criança e do Adolescente consagra como direito fundamental a liberdade de opinião e de expressão, art, 16, II6, e a liberdade de participar da vida familiar e comunitária sem discriminação, art. 16 V7.

Segundo Rolf Madaleno (2009, p. 62), o princípio da liberdade se faz presente no âmbito familiar, pela liberdade de escolha na constituição de uma unidade familiar, entre o casamento e a união estável, vetada a intervenção de pessoa pública ou privada.

Assim, o legislador brasileiro, no art. 1513, do Código Civil estabeleceu que: é defeso a qualquer pessoa, de direito público ou privado, interferir na comunhão de vida instituída pela família. (BRASIL, 2002).

O princípio da liberdade, também está presente na livre decisão acerca do planejamento familiar, só intervindo o Estado para proporcionar recursos educacionais e informações cientificas, conforme preceitua o art. 1565, §2° do CC:

Art. 1.565. Pelo casamento, homem e mulher assumem mutuamente a condição de consortes, companheiros e responsáveis pelos encargos da família.

§ 2o O planejamento familiar é de livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e financeiros para o exercício desse direito, vedado qualquer tipo de coerção por parte de instituições privadas ou públicas. (BRASIL, 2002).

 

Contudo, visto tratar-se de princípios, a exposição realizada em tais artigos não pode ser entendida de forma a esgotar o significado de tais direitos. Em outras palavras, o legislador não buscou restringir ou limitar tais direitos às previsões contidas nas normas supracitadas, mas apenas apontar diretrizes ao seu correto entendimento.

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3 PROTEÇÃO DOS DIREITOS DE PERSONALIDADE E INTEGRIDADE FÍSICA DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE A LUZ DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE1988, CÓDIGO CIVIL DE 2003 E ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE.

 

 

Com o advento da Constituição Federal a criança e o adolescente foram reconhecidos na condição de sujeitos de direitos e não mais como meros objetos de intervenção do Estado e de seus pais.

As crianças e os adolescentes, na condição de pessoas, são titulares de direitos de personalidade intransmissíveis e irrenunciáveis.

Lado outro, considerando que estes indivíduos, são frágeis, dado a condição infantil, a capacidade de exercício dos direitos de personalidade são exercidos, por outrem, seus responsáveis.

Entretanto, está limitação para o exercício dos direitos de personalidade não implica a não titularidade desses direitos por parte das crianças e dos adolescentes.

Assim, o nosso ordenamento jurídico, com o intuito de proteger a titularidade destes direitos, conta com os dispositivos do Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu art. 3°:

 

A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade. (BRASIL, 1990).

 

Com o objetivo de concretizar a dignidade da pessoa humana a Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente estabeleceram o compromisso com a doutrina da proteção integral, que assegura às crianças e aos adolescentes a condição de sujeitos de direitos, de pessoas em desenvolvimento e de prioridade absoluta.

O princípio da proteção integral das crianças e adolescentes está consagrado no art. 2278 da Constituição Federal de 1988 e nos artigos 3°9 e 4°10 do Estatuto da Criança e do Adolescente e tendo em vista que estes indivíduos estão em condição de desenvolvimento, seus direitos estão pautados na prioridade absoluta.

Anotando a lição de Liberati (2003, p. 20), a Convenção Internacional sobre os direitos da Criança de 1989 representou, dentro do panorama legal internacional, o resumo e a conclusão de toda a legislação garantista de proteção à infância.

A Convenção definiu a base da Doutrina da Proteção Integral ao proclamar um conjunto de direitos de natureza individual, difusa, coletiva, econômica, social e cultural, reconhecendo que criança e adolescente são sujeitos de direitos e, considerando sua vulnerabilidade, necessitam de cuidados e proteção especiais. Exige a Convenção, com força de lei internacional, que os países signatários adaptem as legislações às suas disposições e os compromete a não violarem seus preceitos, instituindo, para isto, mecanismos de controle e fiscalização. (VERONESE, 2008).

Antes da Constituição de 1988, o nosso ordenamento jurídico privilegiava o interesse do adulto e as questões patrimoniais. Após a promulgação da Constituição de 1988, o legislador brasileiro se ateve ao principio da prioridade absoluta ao melhor interesse da criança e do adolescente, de modo a objetivar o crescimento saudável destes indivíduos. Colocando-os a salvo de qualquer tipo de violência.

De acordo com os ensinamentos de Garcia (2007) em estreita ligação com o princípio da dignidade humana, os direitos de personalidade atuam como barreira de proteção em favor da pessoa, tutelando-a naquelas manifestações da sua existência quem lhe são mais caras.

Reza o artigo 17 da Lei n. 8.069/90 que: O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, idéias e crenças, dos espaços e objetos pessoais. (BRASIL, 1990).

A integridade física, a integridade psíquica e a integridade moral compõem os aspectos fundamentais da pessoa humana, que são tutelados pelo direito da personalidade, tratados naquele preceito de maneira especial em relação às crianças e aos adolescentes, beneficiários da proteção legal pelo Estatuto.

Atualmente muito tem se discutido acerca do direito da criança de ter na sua certidão de nascimento o nome de seu pai, quanto este é desconhecido.

Assim, remonto-me a uma decisão do E. Tribunal de Justiça de Minas Gerais, no qual ficou decidido que a genitora que se recusar em dizer o nome do suposto pai da criança, pode se consubstanciar em alienação parental, conforme art. 2º, parágrafo único, inciso III, da Lei nº 12.318/10:

Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este. 

Parágrafo único. São formas exemplificativas de alienação parental, além dos atos assim declarados pelo juiz ou constatados por perícia, praticados diretamente ou com auxílio de terceiros: 
(...) III - dificultar contato de criança ou adolescente com genitor. (BRASIL, 2010).

 

Nesse passo, na ponderação havida entre a preservação da intimidade da genitora e o direito inalienável do menor em saber quem é seu pai biológico, deve prevalecer este último, inclusive porque atende ao princípio do melhor interesse da criança, conforme decidiu o E. Tribunal de Justiça de Minas Gerais: 


APELAÇÃO CÍVEL. PROCEDIMENTO DE AVERIGUAÇÃO DE PATERNIDADE. REGISTRO CIVIL DE NASCIMENTO DE CRIANÇA. RECUSA DA GENITORA EM INFORMAR AO REGISTRADOR O NOME DO POSSÍVEL PAI. RISCO DE ALIENAÇÃO PARENTAL. NECESSIDADE DA OITIVA DA MÃE PELO MAGISTRADO. MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA. RECURSO PROVIDO. 
1. O filho tem o direito de saber quem é seu pai biológico, não sendo a genitora casada. 2. O direito da genitora à intimidade não pode prevalecer sobre o direito de personalidade do filho, principalmente quando há risco de alienação parental. 3. Assim, tendo havido recusa da genitora, no ato do registro do filho, em informar o nome do possível genitor, deve o magistrado ouvi-la e adverti-la sobre as consequências da sua omissão. Estará preservando o melhor interesse da criança. 4. Apelação cível conhecida e provida para cassar a sentença e determinar diligência. 
V. V. - O procedimento de averiguação oficiosa de paternidade visa ao reconhecimento voluntário do pai para fins de averbação do registro de nascimento perante o Cartório de Registro Civil, evitando-se uma futura ação de investigação de paternidade. 
- Não obstante a paternidade seja um direito do menor, a ausência de informação do nome do suposto genitor impossibilita a averiguação, devendo ser mantida a sentença que determinou o arquivamento do procedimento.  (TJMG -  Apelação Cível  1.0188.12.008409-3/001, Relator(a): Des.(a) Alyrio Ramos , 8ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 03/07/2014, publicação da súmula em 16/07/2014). (MINAS GERAIS, 2014).

 

 

O Tribunal de Justiça de Minas Gerais decidiu, recentemente, que a falta de relação paterno filial acarreta na violação de direitos da personalidade humana, conforme ementa descrita abaixo:


AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - PATERNIDADE RECONHECIDA - OMITIDA PERANTE A SOCIEDADE EM INFORMATIVO LOCAL - CIDADE DE PEQUENO PORTE - REPERCUSSÃO GERAL - DANOS MORAIS CONFIGURADOS - VIOLAÇÃO AOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE - SENTENÇA MANTIDA. 
- A falta da relação paterno-filial, acarreta a violação de direitos próprios da personalidade humana, maculando o princípio da dignidade da pessoa humana. 
- Conforme entendimento jurisprudencial consolidado pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça, possível a indenização por danos morais decorrentes da violação dos direitos da criança - Inteligência do art. 227 da Constituição Federal.  (TJMG -  Apelação Cível  1.0144.11.001951-6/001, Relator(a): Des.(a) Wanderley Paiva , 11ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 27/02/2013, publicação da súmula em 01/03/2013) (MINAS GERAIS, 2013).

 

Portanto no tocante a preservação dos direitos de personalidade da criança (integridade física e psíquica), concluímos que todo e qualquer ato lesivo a direito de personalidade, causador de dano (físico ou psíquico), deverá ser severamente punido, uma vez que interfere diretamente no processo de formação do indivíduo acarretando-lhe sequelas para toda a vida.

 

 

 

 

 

 

 

 



























 





 

4 PODER FAMILIAR

 

4.1 O Poder Familiar na legislação: ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente, Código Civil de 2003 e Constituição Federal de 1988

 

Ao longo da vida, principalmente em seu inicio, o homem necessita de apoio para a sua criação e educação, apoio este, que será fundamental no seu desenvolvimento até chegar a vida adulta.

A constituição de 1988 inovou ao trazer a expressão poder familiar, uma vez que a partir dela este instituto passou a ser exercido tanto pela mãe, quanto pelo pai, em consonância ao princípio da isonomia, conforme se verifica no art. 226, §5°, da Carta Magna e art. 21 do Estatuto da Criança e do Adolescente, respectivamente:

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

§ 5º - Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher. (BRASIL, 1988).

Art. 21. O pátrio poder poder familiar será exercido, em igualdade de condições, pelo pai e pela mãe, na forma do que dispuser a legislação civil, assegurado a qualquer deles o direito de, em caso de discordância, recorrer à autoridade judiciária competente para a solução da divergência. (BRASIL, 1990).

 

O Código Civil de 2003, também, em consonância com o Princípio da Isonomia, adotou a nomenclatura poder familiar, em desfavor da expressão pátrio poder, conforme se verifica no art. 1630:Os filhos estão sujeitos ao poder familiar, enquanto menores. (BRASIL, 2002).

Silvio Venosa (2012, p. 302) afirma que ambos os pais devem exercer o poder familiar, em um ambiente de compreensão e entendimento. O conflito gerado entre os pais, nas tomadas de decisões, para o doutrinador, poderá, em ultima análise, ser decidido perante os Tribunais.

É importante notar que o poder familiar decorre da paternidade e filiação e não do casamento, assim, em caso de separação dos pais, o pátrio poder continuará sendo exercido por ambos os pais.

Tiago Marques do Nascimento (2014) afirma que o poder familiar deve ser analisado paralelamente sob duas perspectivas: a primeira diz respeito à relação afetiva entre os pais e filhos e a segunda a intervenção do Estado nessa relação. O Estado, pautado no Princípio Constitucional da Prioridade Absoluta, assume o papel de garantidor dos direitos da criança e do adolescente, principalmente quando os pais não cumprem suas obrigações perante seus filhos.

Segundo a autora Maria Berenice Dias (2010), a autonomia da família não é absoluta, sendo cabível a intervenção subsidiaria do Estado. O grande desafio é encontrar o ponto de equilíbrio entre essas duas situações opostas: a supremacia do Estado nos domínios da família e a onipotência daqueles que assumem o poder de direção da família.

O poder familiar tem uma natureza de relação de autoridade, por haver um vinculo de subordinação entre pais e filhos, pois os genitores tem o poder de mando, e os filhos o dever de obediência, conforme reza o art. 1.634, VII, CC:

Art. 1.634. Compete aos pais, quanto à pessoa dos filhos menores:

VII - exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição. (BRASIL, 2002).

 

Destaca-se que a autoridade do pai é em benefício do desenvolvimento do filho e o poder de mando deve ser exercido dentro dos limites da lei, sem haver abusos.

De acordo com Maria Helena Diniz o poder familiar:

Compreende o conjunto de faculdades encomendadas aos pais, como instituição protetora da menoridade, como fim de lograr o pleno desenvolvimento e a formação integral dos filhos, seja físico, mental, moral, espiritual ou socialmente. A autoridade paternal é o veículo instrumentalizador de direitos fundamentais dos filhos, de modo a conduzi-lo à autonomia responsável. (DIAS, 2011, p. 424).

 

O poder familiar é irrenunciável, intransmissível, inalienável e imprescritível, sendo as obrigações que dele fluem personalíssima.

Para Silvio de Salvo Venosa (2012), o caráter indisponível decorre da paternidade natural ou legal, não podendo ser transferida por iniciativa dos titulares, para terceiros.

A família tem profunda importância no desenvolvimento das crianças e adolescentes, pois é através dela que estes indivíduos receberão educação, apreenderão a conviver em sociedade, respeitando os limites da liberdade e os direitos das outras pessoas.

Desta forma a família é a base de toda sociedade, sendo as relações desenvolvidas no seu interior, exteriorizadas para a sociedade, conforme citou Donald W. Winnicott:

A base de todas as teorias sobre o desenvolvimento da personalidade humana é a continuidade, a linha da vida, que provavelmente tem início antes do nascimento concreto do bebê; continuidade em que está implícita a idéia de que nada daquilo que fez parte da experiência de um indivíduo se perde ou pode jamais vir a perder-se para este indivíduo, mesmo que, por força de causas complexas e variadas, viesse a tornar-se (como de fato se torna) inalcançável à consciência. (Winnicott, 1999, p. 80).

Os pais, ou responsáveis, exercem o poder familiar em face da criança, como uma forma de proteção, pois estes indivíduos transmitem um sentimento de fragilidade, necessitando, assim, de cuidados especiais.

O Principio da Proteção Integral da Criança e do Adolescente, também, trouxe consigo a atuação do Estado no poder familiar, sendo que antes da Constituição Federal de 1988 a criança e o adolescente só eram amparados pelo Estado quando cometiam algum delito ou quando eram abandonadas.

O Estado é o maior responsável pela proteção integral da criança e do adolescente, de maneira que cabe principalmente a ele promover, constantemente, a execução de políticas públicas eficazes, capazes de propiciar o pleno desenvolvimento dessa parcela vulnerável da população.

Assim, de acordo com os ensinamentos de Maria Berenice Dias (2011), os deveres atribuídos aos pais, não são exclusivos a estes. Com relação à saúde, por exemplo, no caso dos pais não terem condições de prestar lhes a devida assistência, surge a obrigação do Estado.

Lado outro, deixando o poder público de obedecer ao comando constitucional de promover programas de assistência integral de prevenção e de atendimento especializado aos adolescentes, por exemplo, vitimas da dependência química, se torna possível a busca, através da via judicial, para compelir o Estado no adimplemento de seus deveres.

Neste sentido, decidiu o E. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA. TRATAMENTO CONTRA DEPENDÊNCIA QUÍMICA. PESSOA MAIOR. OBRIGAÇÃO E SOLIDARIEDADE DOS ENTES PÚBLICOS. O Estado, em todas as suas esferas de poder, deve assegurar o direito à vida e à saúde, fornecendo gratuitamente o tratamento médico cuja família não tem condições de custear. Responsabilidade solidária, estabelecida nos artigos 196 e 227 da Constituição Federal, podendo o autor da ação exigir, em conjunto ou separadamente, o cumprimento da obrigação por qualquer dos entes públicos, independentemente da regionalização e...(TJ-RS - AI: 70046647210 RS , Relator: Jorge Luís Dall'Agnol, Data de Julgamento: 20/12/2011, Sétima Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 18/01/2012). (RIO GRANDE DO SUL, 2011).

 

 

4.2 A perda, suspensão e destituição da autoridade parental

 

O Código Civil e o Estatuto da Criança e do Adolescente estabeleceram medidas para coibir o regular exercício da autoridade parental.

Ambas as causas de cessão da autoridade parental, que irá proporcionar o afastamento da criança e do adolescente do convívio de seus pais ou responsáveis, se dará por decisão judicial, e pressupõe o ajuizamento de ação própria, com a observância dos princípios do contraditório e ampla defesa, podendo ser interposta pelo Ministério Público ou quem tenha legitimo interesse, art. 155 do ECA. (BRASIL, 1990).

A aplicação das medidas que passarei a descrever está condicionada a existência de conduta grave, imputando aos pais ou responsáveis, como por exemplo, o descumprimento injustificado dos deveres e obrigações a que alude o art. 22 do ECA:

Art. 22. Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais. (BRASIL, 1990).

É preciso ter em mente que a falta ou carência de recursos materiais não constitui motivo suficiente para a aplicação das medidas em estudo, conforme prevê o art. 23 do ECA:

 

Art. 23. A falta ou a carência de recursos materiais não constitui motivo suficiente para a perda ou a suspensão do pátrio poder familiar.

Parágrafo único. Não existindo outro motivo que por si só autorize a decretação da medida, a criança ou o adolescente será mantido em sua família de origem, a qual deverá obrigatoriamente ser incluída em programas oficiais de auxílio.

§ 1° Não existindo outro motivo que por si só autorize a decretação da medida, a criança ou o adolescente será mantido em sua família de origem, a qual deverá obrigatoriamente ser incluída em programas oficiais de auxílio.

§ 2° A condenação criminal do pai ou da mãe não implicará a destituição do poder familiar, exceto na hipótese de condenação por crime doloso, sujeito à pena de reclusão, contra o próprio filho ou filha. (BRASIL, 1990).

 

Segundo afirma Paulo Lobo (2010), a suspensão e a destituição do poder familiar constituem sanções aplicadas aos genitores pela infração dos deveres que lhes são inerentes, ainda que não sirvam como pena ao pai faltoso.

Enquanto que a doutrinadora Maria Berenice Dias (2011) sustenta que estas sanções tem o objetivo de preservar a situação dos interesses das crianças e adolescentes, afastando-os de influências nocivas. Em face das seqüelas que a perda do poder familiar trás, deve somente ser decretada quando sua mantença resultar em perigo a segurança ou a dignidade destes menores.

A suspensão do poder familiar está prevista no art. 1637 do Código Civil:

 

Art. 1.637. Se o pai, ou a mãe, abusar de sua autoridade, faltando aos deveres a eles inerentes ou arruinando os bens dos filhos, cabe ao juiz, requerendo algum parente, ou o Ministério Público, adotar a medida que lhe pareça reclamada pela segurança do menor e seus haveres, até suspendendo o poder familiar, quando convenha.

Parágrafo único. Suspende-se igualmente o exercício do poder familiar ao pai ou à mãe condenados por sentença irrecorrível, em virtude de crime cuja pena exceda a dois anos de prisão. (BRASIL, 2002).

 

 

Conforme ensinamentos de Caio Mario da Silva Pereira (2011, p. 464), o parágrafo único, da norma citada acima, refere-se à suspensão do poder familiar, se o pai ou a mãe for condenado por sentença irrecorrível em crime cuja pena exceda a dois anos de prisão. Tal não se justifica, salvo se a condenação se referir a crimes relativos à violência entre os mesmos ou relativos à assistência familiar. A condenação em pena criminal excedente a dois anos, por sentença irrecorrível, importa em suspensão automática da autoridade paterna, que se restaura uma vez haja-se cumprido o convicto.

A suspensão impede temporariamente o exercício da autoridade parental, podendo ser revista quando superados os fatos que a provocaram, sempre em atendimento ao melhor interesse da criança e do adolescente.

Ademais, a suspensão é facultativa, cabendo ao Juiz aplicá-la ou não de acordo com a conveniência do caso, observando o que é melhor para a criança e o adolescente, sendo que a sentença que decretar está suspensão, deverá ser averbada à margem do registro de nascimento da criança ou adolescente.

De acordo com as lições de Silvio de Salvo Venosa (2012), uma vez suspenso o poder familiar, perde o genitor todos os direitos em relação ao filho, inclusive o usufruto lega.

Em síntese, a suspensão do poder familiar é medida menos gravosa do que as outras sanções impostas, porque cessados os motivos, ou seja, extinta a causa que a gerou, pode ser restabelecido o poder paternal.

A perda poder familiar, conforme preceitua o art. 1638 do Código Civil, decorre do relaxamento dos pais, para com os deveres de seus filhos, por ato judicial nos casos de castigo imoderado ou abandono do filho, prática de atos contrários à moral e aos bons costumes e ao abandono de seus filhos.

Art. 1.638. Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que:- castigar imoderadamente o filho;II - deixar o filho em abandono;III - praticar atos contrários à moral e aos bons costumes;IV - incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no artigo antecedente. (BRASIL, 2002).

Reza o doutrinador Sílvio de Salvo Venosa que:

Em sede de suspensão ou perda do poder familiar, cabe ao Juiz, avaliando a urgência e a necessidade que a situação requer, sempre em prol do que melhor for para o menor, usar de seu poder geral de cautela, determinando medidas provisórias, deferindo e determinando a busca e apreensão e a guarda provisória dos menores a terceiros ou a estabelecimentos idôneos, enquanto a matéria é discutida no curso do processo. Lembre-se de que a suspensão do poder familiar suprime alguns direitos do genitor, mas não o exonera de prestar alimentos. (Venosa, 2012, p. 323).

A extinção do poder familiar está prevista no art. 1635 do Código Civil e consiste na perda definitiva:

Art. 1.635. Extingue-se o poder familiar: I - pela morte dos pais ou do filho;II - pela emancipação, nos termos do art. 5o, parágrafo único;III - pela maioridade;IV - pela adoção; V - por decisão judicial, na forma do artigo 1.638. (BRASIL, 2002).

O primeiro inciso do artigo citado acima diz respeito à extinção do poder familiar no caso da morte dos pais ou do filho, assim, conforme preceitua Rof Madaleno (2009), está extinção se dá por um fator natural, uma vez que todo ser humano é dotado de personalidade na qual termina com a morte, fazendo cessar as relações jurídicas das quais o sujeito era titular.

A segunda causa de extinção é pela emancipação do filho, que deverá ser realizada por um instrumento público pelos pais ou pelo tutor, mediante requerimento e homologação judicial. A emancipação é irrevogável, e deve ser outorgada por ambos os pais, em decorrência da completa paridade dos sexos, só sendo reduzida à pessoa de um dos genitores quando o outro já é falecido, foi destituído do poder familiar, ou quando inexistente o registro de um dos ascendentes.

Com a maioridade, também será cessado o poder familiar, ficando, desde já, a pessoa habilitada permitida a praticar todos os atos da vida civil.

Nos termos do art. 169 do ECA, os pedidos de adoção tem que se dar à luz do Princípio do Contraditório, ainda que haja anuência expressa dos genitores da criança e do adolescente

Art. 169. Nas hipóteses em que a destituição da tutela, a perda ou a suspensão do poder familiar constituir pressuposto lógico da medida principal de colocação em família substituta, será observado o procedimento contraditório previsto nas Seções II e III deste Capítulo. (BRASIL, 1990).

 

Entretanto, o Código Civil ao prevê expressamente que em casos de pedidos de adoção, os pais biológicos perdem o poder familiar, sem mencionar a necessidade do contraditório, leva alguns Juristas a dispensarem a anuência destes, no processo de adoção.

A perda do poder familiar, por decisão judicial, nos moldes do art. 1638 do Código Civil, depende dos seguintes fatores:I - castigar imoderadamente o filho; II - deixar o filho em abandono; III - praticar atos contrários à moral e aos bons costumes; IV - incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no artigo antecedente. (BRASIL, 2002).

Devido a sua gravidade a perda do poder familiar só ocorrerá quando o fato que a ensejar for tão grave que coloque em perigo permanente a segurança e a dignidade da criança.

Deste modo, o poder familiar é de suma importância no ordenamento jurídico, pois tem o condão de atribuir aos pais, ou responsáveis, obrigações e direitos aos filhos, devendo os mesmos serem respeitados, sob pena das sanções impostas pelo legislador, como a suspensão, perda ou extinção. Além disso, o legislador, também, atribuiu ao Estado, como órgão responsável, tendo em vista que na falta ou ausência dos pais, este irá atuar em favor das crianças e dos adolescentes.

 

 

 

 

 

5 LEI DA PALMADA N° 13.010 DE 26 DE JUNHO DE 2014



A lei da palmada n° 13.010/14 foi promulgada no dia 26 de junho deste ano, e trouxe 04 (quatro) artigos, dos quais prevêem alterações no Estatuto da Criança e do Adolescente e na lei n°9.394/96, na qual estabelece as diretrizes e bases da educação nacional.

As alterações trazidas pela Lei da Palmada tem como objetivo definir o castigo físico e tratamento cruel, medidas a serem tomadas pelo Conselho Tutelar e Poder Público em caso de constatação de maus tratos e adoção de políticas públicas e medidas que promovam e permitam a educação  preventiva à violência infantil.

Assim, a lei da palmada dispõe que:

Art. 1o - A Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), passa a vigorar acrescida dos seguintes arts. 18-A, 18-B e 70-A:

Art. 18-A.- A criança e o adolescente têm o direito de ser educados e cuidados sem o uso de castigo físico ou de tratamento cruel ou degradante, como formas de correção, disciplina, educação ou qualquer outro pretexto, pelos pais, pelos integrantes da família ampliada, pelos responsáveis, pelos agentes públicos executores de medidas socioeducativas ou por qualquer pessoa encarregada de cuidar deles, tratá-los, educá-los ou protegê-los.Parágrafo único.  Para os fins desta Lei, considera-se:I - castigo físico: ação de natureza disciplinar ou punitiva aplicada com o uso da força física sobre a criança ou o adolescente que resulte em:a) sofrimento físico; ou b) lesão;II - tratamento cruel ou degradante: conduta ou forma cruel de tratamento em relação à criança ou ao adolescente que:a) humilhe; ou b) ameace gravemente; ou c) ridicularize.”“Art. 18-B. Os pais, os integrantes da família ampliada, os responsáveis, os agentes públicos executores de medidas socioeducativas ou qualquer pessoa encarregada de cuidar de crianças e de adolescentes, tratá-los, educá-los ou protegê-los que utilizarem castigo físico ou tratamento cruel ou degradante como formas de correção, disciplina, educação ou qualquer outro pretexto estarão sujeitos, sem prejuízo de outras sanções cabíveis, às seguintes medidas, que serão aplicadas de acordo com a gravidade do caso:I - encaminhamento a programa oficial ou comunitário de proteção à família;II - encaminhamento a tratamento psicológico ou psiquiátrico;III - encaminhamento a cursos ou programas de orientação;IV - obrigação de encaminhar a criança a tratamento especializado;V - advertência.Parágrafo único.  As medidas previstas neste artigo serão aplicadas pelo Conselho Tutelar, sem prejuízo de outras providências legais.”

Art. 70-A.- A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios deverão atuar de forma articulada na elaboração de políticas públicas e na execução de ações destinadas a coibir o uso de castigo físico ou de tratamento cruel ou degradante e difundir formas não violentas de educação de crianças e de adolescentes, tendo como principais ações:I - a promoção de campanhas educativas permanentes para a divulgação do direito da criança e do adolescente de serem educados e cuidados sem o uso de castigo físico ou de tratamento cruel ou degradante e dos instrumentos de proteção aos direitos humanos;II - a integração com os órgãos do Poder Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública, com o Conselho Tutelar, com os Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente e com as entidades não governamentais que atuam na promoção, proteção e defesa dos direitos da criança e do adolescente;III - a formação continuada e a capacitação dos profissionais de saúde, educação e assistência social e dos demais agentes que atuam na promoção, proteção e defesa dos direitos da criança e do adolescente para o desenvolvimento das competências necessárias à prevenção, à identificação de evidências, ao diagnóstico e ao enfrentamento de todas as formas de violência contra a criança e o adolescente;IV - o apoio e o incentivo às práticas de resolução pacífica de conflitos que envolvam violência contra a criança e o adolescente;V - a inclusão, nas políticas públicas, de ações que visem a garantir os direitos da criança e do adolescente, desde a atenção pré-natal, e de atividades junto aos pais e responsáveis com o objetivo de promover a informação, a reflexão, o debate e a orientação sobre alternativas ao uso de castigo físico ou de tratamento cruel ou degradante no processo educativo;VI - a promoção de espaços intersetoriais locais para a articulação de ações e a elaboração de planos de atuação conjunta focados nas famílias em situação de violência, com participação de profissionais de saúde, de assistência social e de educação e de órgãos de promoção, proteção e defesa dos direitos da criança e do adolescente.Parágrafo único.  As famílias com crianças e adolescentes com deficiência terão prioridade de atendimento nas ações e políticas públicas de prevenção e proteção.”

Art. 2o Os arts. 13 e 245 da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, passam a vigorar com as seguintes alterações:“Art. 13. Os casos de suspeita ou confirmação de castigo físico, de tratamento cruel ou degradante e de maus-tratos contra criança ou adolescente serão obrigatoriamente comunicados ao Conselho Tutelar da respectiva localidade, sem prejuízo de outras providências legais.“Art. 245. (VETADO)”.

Art. 3o O art. 26 da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), passa a vigorar acrescido do seguinte § 9o: “§ 9o Conteúdos relativos aos direitos humanos e à prevenção de todas as formas de violência contra a criança e o adolescente serão incluídos, como temas transversais, nos currículos escolares de que trata o caput deste artigo, tendo como diretriz a Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), observada a produção e distribuição de material didático adequado.”

Art. 4o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. (BRASIL, 2014).

 

 

5.1 Inovações?

 

Do ponto de vista estritamente jurídico, a Lei da Palmada não inova, no sentido de que o ordenamento jurídico, como pode ser observado pela Constituição Federal, Estatuto da Criança e do Adolescente e Código Penal, já coíbem a violência contra a criança e adolescente.

Alguns doutrinadores alegam que o código civil, em seu art. 1634, VII, por apenas proibir o castigo imoderado, cria uma permissão legal para o castigo moderado.

A autora Fabíola Santos Albuquerque coleciona que:

Grave também é o fato de o CC/2002 ter conservado a idéia do castigo imoderado ao filho. Afinal qual é o parâmetro objetivamente adotado para dizer se aquele castigo é ou não imoderado? E se aquele castigo não está tipificado entre as proibições decorrentes do princípio do melhor interesse? São questões que a legislação civil não respondeu, portanto insurge colidindo frontalmente com os ditames constitucionais do art. 227, com os do ECA e com as diretrizes estrangeira. (Albuquerque, 2004, p. 175).

Assim, por conta da subjetividade, trazida por um conceito tão aberto como “imoderado”, é que o legislador conceituou “castigo” na Lei da Palmada.

Entretanto, filio-me a corrente de que apesar do Código Civil não prevê de forma expressa a coibição do castigo moderado, não é certo dizer que o mesmo o permitia, pois, sob o ponto estritamente constitucional, não há fundamento jurídico para o castigo, seja ele físico ou psíquico, ainda que “moderado”, uma vez que o mesmo consiste em violência à integridade e personalidade da criança e do adolescente, violando o Princípio da Dignidade Humana, abordado no Capítulo 1.

Ademais, a Constituição Federal dispõe expressamente que a criança e o adolescente estão a salvo de toda forma de negligência, exploração, violação, crueldade e opressão, nos termos do art. 227:

É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (BRASIL, 1988).



Outrossim, o Estatuto da Criança e do Adolescente já previa no art. 129, as medidas aplicadas pela Lei da Palmada, no art. 18-B, quanto os pais que praticarem a violência familiar:

Art. 129. São medidas aplicáveis aos pais ou responsável:I - encaminhamento a programa oficial ou comunitário de proteção à família;II - inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos;III - encaminhamento a tratamento psicológico ou psiquiátrico;IV - encaminhamento a cursos ou programas de orientação;V - obrigação de matricular o filho ou pupilo e acompanhar sua freqüência e aproveitamento escolar;VI - obrigação de encaminhar a criança ou adolescente a tratamento especializado;VII - advertência;VIII - perda da guarda;IX - destituição da tutela;X - suspensão ou destituição do pátrio poder poder familiar. (Expressão substituída pela Lei nº 12.010, de 2009) VigênciaParágrafo único. Na aplicação das medidas previstas nos incisos IX e X deste artigo, observar-se-á o disposto nos arts. 23 e 24. (BRASIL, 1990).

A vedação à violência física e à crueldade contra menores nas formas de correção, disciplina e educação encontra-se em nosso ordenamento jurídico, conforme elencado no art. 227, caput e §4°:

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

§ 4º - A lei punirá severamente o abuso, a violência e a exploração sexual da criança e do adolescente. (BRASIL, 1988).



O ordenamento jurídico brasileiro já tipificou que os pais ou responsáveis pela criança e o adolescente que abusarem desta situação de autoridade, extrapolando os limites normais da criação e educação, conforme preceitua o art. 136 do Código Penal, serão punidos:

Art. 136 - Expor a perigo a vida ou a saúde de pessoa sob sua autoridade, guarda ou vigilância, para fim de educação, ensino, tratamento ou custódia, quer privando-a de alimentação ou cuidados indispensáveis, quer sujeitando-a a trabalho excessivo ou inadequado, quer abusando de meios de correção ou disciplina:Pena - detenção, de dois meses a um ano, ou multa.Pena - detenção, de dois meses a um ano, ou multa.§ 1º - Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave:Pena - reclusão, de um a quatro anos.§ 2º - Se resulta a morte:Pena - reclusão, de quatro a doze anos.Pena - reclusão, de quatro a doze anos.§ 3º - Aumenta-se a pena de um terço, se o crime é praticado contra pessoa menor de 14 (catorze) anos. (BRASIL, 1942).

Parte superior do formulário

Parte inferior do formulário

 

Para o professor Lopes Cavalcante, a Lei nova não trouxe qualquer modificação relevante. Ao responder ao seguinte questionamento: "O que muda, na prática, com a Lei n.° 13.010/2014?" anota que:

Praticamente nada. Os castigos físicos e o tratamento cruel ou degradante já eram punidos por outras normas existentes, como o Código Civil, o Código Penal e o próprio ECA. A Lei n.° 13.010/2014, que não cominou sanções severas aos eventuais infratores, assumiu um caráter mais pedagógico e programático, lançando as bases para a reflexão e o debate sobre o tema. (CAVALCANTE, 2014 )

 

Isso posto, conclui-se que a Lei da Palmada não inovou o ordenamento jurídico, pois a legislação já tratava clara e suficientemente dos assuntos regulamentados nesta Lei.

 

5.2 Intervenção do Estado na autonomia dos pais

 

Atualmente o Estado cada vez mais intervém na autonomia familiar, dado a adoção do Princípio da Proteção Integral da criança e do adolescente. A Constituição Federal, conforme analisado neste trabalho, trouxe no art. 22711 a questão da responsabilidade do Estado, sociedade, família e dos pais, perante as crianças e aos adolescentes.

Entretanto, apesar da Constituição assegurar que o Estado tem responsabilidade em face da criança, o mesmo não deve se achar no direito de intervir na base socio-educativa da família.

A Declaração Universal de Direitos Humanos trouxe em seu artigo 26, item 3, que competi aos pais a prioridade de escolher o gênero de educação a dar aos filhos, assim como o art. 226, §7°, da Constituição Federal, que dispõe:

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

§ 7º - Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas. (BRASIL, 1988).



Desta feita, verifica-se que nossa própria Lei Maior garante aos pais livre gerência da sociedade conjugal, certamente abarcando a opção de educar os filhos. Cabe ao Estado, apenas, fornecer meios para que essa escolha possa ser efetivada.

O Supremo Tribunal Federal, com base no art. 227 da CF/88, decidiu em diversos recursos, dentre os quais cito o recurso extraordinário 48611, no qual o Município de Florianópolis seria o responsável pela implementação de direitos às crianças e adolescentes vitimas de violência:

Trata-se de recurso extraordinário (art. 102, III, a da Constituição) interposto pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina, de acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, cuja possui o seguinte teor:Ação Civil Pública. Atendimento de crianças e adolescentes pelo Projeto Sentinela/Acorde. Necessidade de contratação de pessoal especializado. Ingerência na Administração Municipal e Violação do Princípio da Separação dos Poderes caracterizada.Obrigação do Poder Público que deve ser cumprida na medida de suas condições. Impossibilidade jurídica do pedido reconhecida. Remessa e recurso providos.O recorrente sustenta a ofensa ao art. 227 da Constituição Federal.É o relatório.Decido.Assiste razão ao recorrente.Em casos análogos ao presente, esta Corte vem reconhecendo, excepcionalmente, a possibilidade de determinação judicial para que sejam implementados os direitos de crianças e adolescentes, vítimas de exploração ou violência física, sexual e/ou psicológica, ao atendimento em projetos sociais desenvolvidos pelo Município de Florianópolis-SC em parceria com o Governo Federal (Programa Sentinela – Projeto Acorde).Nesse sentido, por exemplo, as seguintes decisões monocráticas: RE 604.884, AI 583.264, AI 583.476, AI 583.553, RE 482.611 e AI 583.596, todos de relatoria do Min. Celso de Mello; RE 503.658 e RE 482.741, ambos de relatoria do Min. Eros Grau; RE 482.751 e RE 513.465, ambos de relatoria da Min. Ellen Gracie; RE 572.717, RE 572.717, RE 573.690 e RE 574.506, todos de relatoria do min. Carlos Britto; AI 583.594 e AI 583.516, ambos de relatoria da min. CármenLúcia.Do exposto, com fundamento no art. 557, § 1º do Código de Processo Civil, dou provimento ao recurso, para restabelecer a sentença.Publique-se.Brasília, 27 de agosto de 2010.Ministro JOAQUIM BARBOSA Relator (STF - RE: 613730 SC , Relator: Min. JOAQUIM BARBOSA, Data de Julgamento: 27/08/2010, Data de Publicação: DJe-172 DIVULG 15/09/2010 PUBLIC 16/09/2010). (SANTA CATARINA, 2010)


O Código Civil de 2002, em seu artigo 1.513, disciplina que ―é defeso a qualquer pessoa de direito público ou privado interferir na comunhão da vida instituída pela família.

Assim, a família deve observar as garantias constitucionais de proteção às crianças e aos adolescentes no momento da educação, sendo o método utilizado direito exclusivo dos pais, não cabendo ao Estado ponderar o que é adequado ou não. A família tem o direito de ter seus próprios valores e os meios de dar eficácia a educação dos seus filhos.

Dessa forma, percebe-se que cabe aos pais o controle perante a família e a decisão acerca de sua função e ao Estado, em parceria com a sociedade, a responsabilidade de agir frente aos atos praticados em discrepância da lei.

Assevera Silvo de Salvo Venosa que:

Não pode também o Estado deixar de cumprir sua permanente função social de proteção à família, como sua célula master, sob pena de o próprio Estado desaparecer, cedendo lugar ao caos. Daí por que a intervenção do Estado na família é fundamental, embora deva preservar os direitos básicos de autonomia. Essa intervenção deve ser sempre protetora, nunca invasiva da vida privada. (VENOSA, 2005.)

O professor Eudes Quintino de Oliveira Júnior afirma que:



Referida questão ganha extrema importância quando se traz à baila dois artigos fundamentais sobre o assunto: o primeiro é o artigo 26, item 3, da Declaração Universal de Direitos Humanos – o Brasil é signatário –  no sentido de que Aos pais pertence a prioridade do direito de escolher o gênero de educação a dar aos filhos. O segundo, dando continuidade à regra anterior, é o artigo 226, §7º, da Constituição Federal, dispondo que: Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas. Desta feita, verifica-se que nossa própria Lei Maior garante aos pais livre gerência da sociedade conjugal, certamente abarcando a opção de educar os filhos. Cabe ao Estado, apenas, fornecer meios para que essa escolha possa ser efetivada. Contudo, eventual ingerência na liberdade já garantida, parece se tornar abusiva. Evidentemente, qualquer tipo de abuso dos pais ou responsáveis deve ser tutelado por nosso ordenamento. Ocorre que já existem tutelas que podem se demonstrar eficazes, desde que aplicadas de maneira coesa com o sistema e com nossa sociedade. (OLIVEIRA, 2013).

 

Posto isso, o Estado, pautado no Princípio da Intervenção Mínima no Direito de Família, deve criar mecanismos que coíbam a violência no âmbito da família, com respeito ao direito do livre arbitro dos pais. No entanto, em no caso de falha dos pais, durante o exercício do poder familiar, caberá ao Estado agir, subsidiariamente.

No artigo, publicado por Luciana Maria Reis Moreira e Giovanna Bianca Trevizani, cujo o tema foi “Lei da Palmada: Educai as crianças para que não seja necessário punir os adultos”, retratou uma entrevista concedida ao Jornal Hoje Em Dia à juíza Luziene Barbosa Lima, da 6ª Vara Criminal de Belo Horizonte, em que considerou inócua a proposta da lei. Para ela, a nova lei invade a liberdade de um pai corrigir seus filhos dentro dos princípios constitucionais. “Não vejo mal algum em aplicar palmadinhas e, sobretudo o diálogo para impor limites. O que é inadmissível são agressões físicas extremas”, disse, considerando que é comum no Brasil formular leis sem analisar o aspecto cultural da educação da família.

O Estado não tem que se meter nessa área. Se os pais não corrigirem seus filhos e imporem limites, as consequências serão bem piores. Mais tarde é o próprio Estado que vai assumir essa incumbência”, afirma.

Observa que, segundo a magistrada, o Estado costuma implementar novas leis mas não implementa políticas educacionais para que elas sejam devidamente respeitadas. “No caso da ‘lei da palmada’, não há programas sociais que garantam as penalidades.

O Pedagogo Antônio Carlos Gomes, no artigo “Remando Contra a Correnteza e a Favor do ECA”, defende que as melhores formas de estabelecer limites às crianças e aos adolescentes são através do exemplo, do diálogo e da repressão cordial, mas que se nada disso der certo, uma postura mais severa e dura deve ser adotada, inclusive com contenção física em casos mais graves. Segundo ele, não agir assim é uma forma de negligencia da educação para o convívio social.

Os pais ou os responsáveis pela criança e adolescente são adultos e tem responsabilidades para com estes indivíduos. Partindo do pressuposto que cada criança tem personalidade própria, os pais devem usar de meios, ainda que “palmadas”, para corrigi-las, impondo limites, para determinar o que é certo e errado.

Assim, a autoridade dos pais no exercício da educação de seus filhos é muito importante para o seu desenvolvimento, contribuindo para a sua formação como o adulto de amanhã. A criança que cresce sem limites, com a percepção de que aquilo que ela realmente acredita ser o certo, será no futuro, ou até mesmo durante o seu desenvolvimento, um individuo propicio a pratica de delitos, contribuindo para a criminalização da sociedade.

1 Princípio 8° da Declaração dos Direitos da Criança em 1959 dispõe que a criança figurará, em quaisquer circunstâncias, entre os primeiros a receber proteção e socorro.

2O art. 259 do Estatuto da Criança e do Adolescente dispõe que: a União, no prazo de noventa dias contados da publicação deste Estatuto, elaborará projeto de lei dispondo sobre a criação ou adaptação de seus órgãos às diretrizes da política de atendimento fixadas no art. 88 e ao que estabelece o Título V do Livro II.

Parágrafo único. Compete aos estados e municípios promoverem a adaptação de seus órgãos e programas às diretrizes e princípios estabelecidos nesta Lei. (BRASIL, 1990).

 

3A Constituição Federal consagra no art. 227 que: é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (BRASIL, 1988).

 

 

 

 

4O Estatuto da Criança e do Adolescente prevê no art. 45. A adoção depende do consentimento dos pais ou do representante legal do adotando.§ 2º. Em se tratando de adotando maior de doze anos de idade, será também necessário o seu consentimento (BRASIL, 1990).

 

5O Código Civil estabelece no art. 1.614 que: O filho maior não pode ser reconhecido sem o seu consentimento, e o menor pode impugnar o reconhecimento, nos quatro anos que se seguirem à maioridade, ou à emancipação. (BRASIL, 2002).

 

6O Estatuto da Criança e do Adolescente dispõe no art. 16. O direito à liberdade compreende os seguintes aspectos; II - opinião e expressão. (BRASIL, 1990).

 

7 O Estatuto da Criança e do Adolescente dispõe no art. 16. O direito à liberdade compreende os seguintes aspectos; V- participar da vida familiar e comunitária, sem discriminação. (BRASIL,1990).

8 A Constituição Federal consagra no art. 227 que: é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (BRASIL, 1988).

9Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade. (BRASIL, 1990)

10Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. (BRASIL, 1990).

11 A Constituição Federal consagra no art. 227 que: é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (BRASIL, 1988).