Autor: Gustavo Mourão de Sá

 

Sobre a questão da legalidade e da anterioridade da lei penal, temos que está é muito relevante dentro da seara penal. Assim, a legalidade pode ser analisada em três modalidades diferentes, sendo a primeira delas no aspecto político, no qual vem a garantir as pessoas contra eventuais abusos praticados pelo Estado.

Já em relação ao seu aspecto jurídico, temos dois significados distintos dentro dessa modalidade, onde em seu sentido amplo está traduzido no sentido de que ninguém estará obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa se não for em virtude da própria lei, conforme expressamente previsto no art. 5, II, da Constituição Federal.

No sentido mais estrito, ainda dentro do aspecto jurídico da legalidade, podemos afirmar ser esta a confirmação de que não ocorre crime sem uma lei que o defina como tal, nem pode ser aplicado pena sem a cominação da própria lei.

Nesses termos, podemos demonstrar os preciosos ensinamentos estabelecidos por Guilherme de Souza Nucci (2014, p. 79), ao dispor sobre o princípio da reserva legal, e ainda está de maneira qualificada, ao afirmar da seguinte forma:

Nesse último enfoque é também conhecido como princípio da reserva legal, ou seja, os tipos penais incriminadores somente podem ser criados por lei em sentido estrito, emanada do Poder Legislativo, de acordo com o processo previsto na Constituição Federal. Há, ainda, a denominada reserva legal qualificada, que é a reserva da lei, dependendo das especificações feitas pela Constituição Federal.

Dessa maneira, não bastaria a simples criação de uma lei, para que assim fosse possível disciplinar sobre um determinado assunto, sendo fundamental para isso, o respeito ao expressamente previsto pela própria constituinte.

A legalidade pode ser evidenciada em dois aspectos diferentes, como é o caso da mera legalidade e da estrita legalidade. Assim, quando abordamos sobre a primeira, estamos nos referindo a aquela norma dirigida para os juízes, prescrevendo como são aplicadas as leis, de acordo com a sua formulação. Já em relação ao aspecto da estrita legalidade, podemos evidenciar a reserva absoluta da lei, sendo uma norma dirigida ao próprio legislador, como forma de taxatividade.

Atualmente não é considerada a mera legalidade, tendo em vista que, nem todas as normas penais são capazes de obedecer ao princípio da taxatividade. Dessa maneira, o ideal se funda na sustentação da estrita legalidade, devendo o crime está descrito na própria lei, de forma detalhada, não provocando nenhuma espécie de dúvidas ou de questionamentos ao seu respeito.

Ainda sobre a questão da legalidade, podemos demonstrar que poderá ser tanto a legalidade formal, como também material. Assim, a primeira é traduzida na impossibilidade de caracterizar como sendo crime uma conduta que não é considerada lesiva a um interesse que se encontra juridicamente protegido.

Já no caso da legalidade material, é determinada como sendo a impossibilidade de ser considerada uma conduta criminosa, se esta não for lesiva a um interesse juridicamente tutelada, e ainda merecedora de aplicação de pena, conforme a visão estabelecida pela sociedade, independentemente da existência de lei.

Sobre a anterioridade, podemos definir como a obrigação da prévia existência de uma norma penal incriminadora, para que somente assim, possa alguém ser condenado por aquele fato. Isso faz com que o princípio da legalidade possua o mínimo possível de eficácia, pois não seria possível a regra de que não ocorre crime sem lei, se está não for devidamente editada antes do fato.

Dessa forma, não seria possível que as leis penais incriminadores depois de editadas, retroagirem para serem aplicadas aos fatos ocorridos anteriores a sua edição. Isso acabaria por esvazias o próprio princípio da legalidade.

É importante salientar que apesar do princípio da legalidade e anterioridade abordar apenas na palavra crime, estes são também aplicados extensivamente às contravenções penais.

A aplicação desses princípios na questão da pena e das medidas de segurança também é perfeitamente válida, tendo em vista que ambas são espécies de sanção penal. Principalmente nos casos das medidas de segurança que são destinadas aos inimputáveis e semi-imputáveis, que praticam atos considerados como típicos e ilícitos.

Nesses termos, podemos evidenciar os ensinamentos de Guilherme de Souza Nucci (2014, p. 80), ao citar uma passagem de outros doutrinadores a respeito da aplicação dos princípios da legalidade e da anterioridade, da seguinte maneira:

Quando se tratar de privar a liberdade de alguém, é preciso respeitar o princípio da legalidade. Torna se importante, nesse contexto mencionar a lição de Pierangeli e Zaffaroni: “(...) salvo o caso dos inimputáveis sempre que se tira a liberdade por um fato por ele praticado, o que existe é uma pena, porque toda privação da liberdade tem um conteúdo penoso para quem sofre (...)”.

O tipo penal é considerado como sendo um modelo de conduta, assim, é justamente isso que vai interessar para o princípio da legalidade, pois não pode haver crime sem uma lei que estabeleça nesse sentido. Dessa maneira, a definição legal da própria infração deverá ser realizada de forma clara, para que não gere tipos penais incriminadores abertos, causando um esvaziamento do princípio da legalidade.

Quando abordamos sobre o tipo penal incriminador aberto, estamos nos referindo a aquele onde vai precisar da interpretação do juiz para que possa ser totalmente compreendido e aplicado ao caso concreto. Além desse fator, se torna fundamental na questão do princípio da legalidade a previsão normativa anterior à data do fato, bem como que este tipo penal seja claramente especifico, se enquadrando de acordo com o comportamento do agente.

Assim, podemos salientar que a preceituação da norma penal incriminadora de maneira genérica fere o princípio da legalidade, pois como visto anteriormente, é de fundamental relevância que esta ocorra de maneira específica.

Nesse sentido, salienta Guilherme de Souza Nucci (2014, p. 82) ao dispor sobre a questão das normas penais incriminadoras utilizadas para cobrir o máximo possível de lacunas existentes no Código Penal, ao dispor da seguinte maneira:

Essa providência, que dá margem aos tipos exageradamente abertos, ofende a legalidade. Aliás, mesmo no direito anglo-americano, baseado no sistema do direito consuetudinário, portanto, não vinculado perfeitamente ao princípio da legalidade, já existem vários precedentes judiciais declarando inconstitucionais as regras de Direito Penal que permitem a elaboração de normas penais genéricas e imprecisas. O direito brasileiro não deixa de ter os seus exemplos.

Nesse contexto, podemos afirmar com absoluta propriedade que as normas penais incriminadoras do tipo abertas podem ser consideradas como sendo mais perigosas do que a aplicação da própria analogia, tendo em vista que pelo menos está possui um parâmetro de semelhança com uma conduta correta.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

JESUS, Damásio de. Direito penal: parte geral. 35ª. Ed. São Paulo: Saraiva, 2014.

MASSON, Cleber. Direito penal esquematizado: parte geral. 8ª. Ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2014.

NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal. 10ª ed., rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2014.