A intolerância chegou por aqui


Paulo é o nome fictício de um garoto que conheci numa loja de artigos para jardinagens Ele estava repleto de cicatrizes no rosto, braços etc. Ele tem pouco mais de 18 anos, é simpático e muito educado. A curiosidade me fez perguntar o que havia acontecido e ele sem maior constrangimento respondeu que foi atacado por um grupo de skinheads na Avenida Paulista em um domingo. Ele não é homossexual, mas é negro, ou melhor, mestiço, com a pele bem escura, cabelos, lisos e traços de branco. E essa foi a razão do ataque que sofreu na cidade de São Paulo, onde os negros e mestiços representam mais do que cinqüenta por cento dos habitantes.
Paulo, todo machucado depois do ataque foi levado a um hospital onde foi atendido e posteriormente encaminhado a uma delegacia de polícia para registrar a ocorrência. Infelizmente o delegado de plantão deu pouca importância ao fato, alegando que não poderia fazer nada, pois os agressores não estavam mais no local e não havia meios de localizá-los.
Não vi menção na imprensa sobre o ocorrido, pois nem sempre há um jornalista ou um policial de plantão interessado na violência cotidiana da maior cidade do país e da América do Sul. Esse grupo de fascistóides deve ter feito outras vítimas no mesmo dia, antes ou depois do ataque ao Paulo. É mais fácil classificar esses eventos como brigas de rua e não como um problema social da mais séria importância.
Esse fato pode representar o recrudescimento do racismo que historicamente sempre foi "envergonhado" para um racismo ativista e violento. No Brasil, como afirmou o nosso ex-presidente sociólogo, os negros são tolerados desde que não confrontem a imagem construída pela sociedade branca sobre eles. Traduzindo, eles podem ser empregadas domésticas, motoristas, operários, copeiras etc. Entretanto, quando a mobilidade social começa a proporcionar condições para que ascendam para outras categorias sociais, "privativas" dos brancos ou dos que se consideram como tal, começam os problemas.
Os ataques recentes contra gays ocorridos na capital, que felizmente, foram registrados por câmeras e presenciados por testemunhas que não se omitiram, podem ser um sinal de que nossa sociedade está perdendo o senso de tolerância em relação ao outro, seja ele negro, pobre, mendigo, índio ou homossexual.
A pouca atenção dada a estes fatos, pode ser o prenúncio de que estamos entrando em uma rota extremamente perigosa, desconstruindo a velha imagem de uma sociedade tolerante e pacífica, que Gilberto Freyre chamou de "Democracia Racial".