A INOVAÇÃO DA REPERCUSSÃO GERAL COMO REQUISITO DE ADMSSIBILIDADE NO RE: A (IM)POSSIBILIDADE DO EXAME DE MÉRITO[1]

 

 Frederico Nepomuceno Léda[2]

Ronald de Assis Soares[3]

Christian Barros Pinto[4]

 

SUMÁRIO: 1 Introdução; 2 Dos recursos excepcionais: recurso extraordinário; 3 A inserção da repercussão geral como requisito de admissibilidade do RE; 4 O exame da repercussão geral em seus sentidos: material e formal; 4.1 Procedimento; 4.2 As possibilidades apresentadas pela doutrina para contrapor o julgamento indevido da repercussão geral; 5 Considerações Finais; Referências.

RESUMO

O presente trabalho visa destacar as inovações trazidas no âmbito recursal no processo civil brasileiro, mais especificamente com relação ao recurso extraordinário no domínio do Supremo Tribunal Federal. Para tanto de forma preliminar trabalhar-se-á com o recurso extraordinário desde suas origens, analisando as características que permeiam essa espécie de recurso excepcional. Posterior a esse momento, é mister destacar a eclosão da repercussão geral através da Emenda Constitucional 45/2004 como requisito de admissibilidade do recurso extraordinário, um pensamento constitucional de valorizar a figura da Suprema Corte, que se via abarrotada de processos. Como ponto findo do estudo em exposição, surge em uma análise recente do instituto em voga a demarcação de duas perspectivas: formal e material, para melhor delimitar o exame de admissibilidade. Diante da problemática de análise indevida da repercussão geral, vislumbram-se alguns instrumentos para contrapor a decisão do presidente (vice-presidente) do tribunal.

Palavra-chave: Recurso Extraordinário. Repercussão Geral. Perspectiva: formal e material. Exame de admissibilidade e mérito.

1 INTRODUÇÃO

Há cerca de uma década o processo civil brasileiro passava por um período de reformas, devido principalmente as inovações legislativas surgidas como a EC 45/2004 e consequentemente a Lei 11.418/2006. A seara recursal sofreu glorioso avanço, no que toca a inserção da repercussão geral como novo requisito de admissibilidade do recurso extraordinário, na busca de tentar solver mais uma crise do sistema judiciário, haja vista que o Supremo Tribunal Federal perdera sua real função com o abarrotamento de processos alocados em sua instância.

Diante essa novidade, houve o aperfeiçoamento do texto constitucional (art. 102 da CF) e também da legislação infraconstitucional (arts. 543-A e segs. do CPC) para delimitar os parâmetros procedimentais acerca da repercussão geral. Contudo uma nova problemática foi gerada diante o exame bipartido de admissibilidade desse instituto, pois contêm uma análise preliminar, em seu sentido formal, realizada pelo presidente (vice-presidente) do tribunal a quo, e outra análise definitiva, em seu sentido material, de competência do STF.

Nesse sentido, a doutrina se posiciona sobre essa possível atuação indevida do presidente do tribunal, que pode por ultrapassar o âmbito de sua competência e descumprir preceito constitucional. Assim sendo, vislumbra-se quais os mecanismos admissíveis para contrapor o julgamento indevido da repercussão geral.

2 DOS RECURSOS EXCEPCIONAIS: RECURSO EXTRAORDINÁRIO

O recuso extraordinário é instituto de origem norte-americana. A Constituição deu à Corte Suprema competência originária e competência recursal no tocante a certas causas; mas, em matéria de recursos, só se referiu aos interpostos contra decisões judiciais dos órgãos judiciários inferiores da União. (ASSIS, 2012)

Remédio instituído pelo Judiciary Act de 1789 que permitiu a revisão pela Corte Suprema de decisões finais dos mais altos tribunais dos Estados, mediante writ of error, em diversas hipóteses relacionadas com a constitucionalidade de leis e com a legitimidade de normas estaduais, bem como títulos, direitos e privilégios à luz da Constituição, dos tratados e das leis da União. (ASSIS, 2012)

Posteriormente a legislação orientou-se no sentido de conferir à Corte Suprema, de modo explícito em termos de crescente amplitude, o poder de reexaminar decisões dos Estados, quer por meio do appeal (denominação dada ao writ of error pelo novo Judiciary Act de 1925), quer do writ of certiorari. Inicialmente era obrigatório para a Corte o conhecimento do appeal (recurso), quando cabível. Assim firmou-se a necessidade, em regra, dos quatro votos Justices, no mínimo, para o deferimento da petição no sentido de conhecer-se da matéria. (MOREIRA, 2009)

Havia superposições na fixação dos pressupostos de cabimento do appeal e do certiorari, de modo que, em algumas dessas hipóteses, tanto se podia tentar o acesso à Corte por uma via, quanto por outra. O mais aconselhável era o appeal, cujo conhecimento escapava ao juízo de discricionário da Corte, e a sua escolha errônea não prejudicava necessariamente a parte. Em 1988 essa situação modificou-se por força da Supreme Court Csde Selections Act, que restringiu drasticamente o uso do appeal como meio de revisão. Remanesce apenas a via do certiorari à pela discrição da Suprema Corte (MOREIRA, 2009).

No Brasil surgiu somente com a República. A denominação recurso extraordinário, se aplicou somente ao primeiro Regime Interno do Supremo Tribunal Federal. Com a reforma de constitucional de 1926, ampliaram-se as hipóteses de cabimento, uma das inovações que perdurou por muitos anos foi a concessão do recurso com fundamento na divergência de interpretação da mesma lei federal por dois ou mais tribunais locais, caso em que ele poderia ser também interposto por qualquer dos tribunais referidos ou pelo Procurador-Geral da República. Tinha-se, inicialmente, um recurso extraordinário ex officio, com caráter facultativo (MOREIRA, 2009).

A evolução do recurso extraordinário culminou na Constituição Federal de 1988. Em que o recurso ficou limitado às questões constitucionais. Sendo o remédio que se situa no ápice do controle difuso de constitucionalidade, desempenhando uma importante função constitucional. E para julgar as questões federais, desafogando dessa forma o STF, a Constituição Federal de 1988 criou o STJ, e o recurso especial. (ASSIS, 2012)

Os recursos excepcionais encaminhados aos tribunais superiores (STJ e STF) possuem características mais peculiares que os recursos ordinários, de certo modo exige-se maior complexidade em sua matéria. Como consequência disso, suscita-se aqui tanto no recurso especial quanto no recurso extraordinário, a presença de um requisito específico de admissibilidade, denominado prequestionamento (CÂMARA, 2013).

Tais recursos são de fundamentação vinculada, ou seja, estão sujeitos apenas à discussão de questões de direito. É relevante destacar que para interposição desses recursos é necessário o esgotamento das instâncias ordinárias, sendo cabíveis contra decisões que tenham julgado a causa em última ou única instância (DIDIER JR.; CUNHA, 2009).

De acordo com Andrés Tavares (2003, p. 296), “a elevada estrutura do extraordinário avulta na impossibilidade da supressão, ou do simples condicionamento do remédio, pela via legislativa”. Controla a densa atividade desenvolvida pelos demais órgãos judiciários nessa área específica, como instrumento privilegiado. Só será admitido o recurso extraordinário se a decisão recorrida for de última ou única instância, ocorrer o prequestionamento art. 102, III, caput, da CF) e ter repercussão geral (art. 102, §3º, da CF)  (NEVES, 2013).  

3 A INSERÇÃO DA REPERCUSSÃO GERAL COMO REQUISITO DE ADMISSIBILIDADE DO RE

O cabimento do recurso extraordinário se encontra fixado no art. 102, III, letras a, b, c, e d, da Constituição Federal, cujo texto, na redação da EC 45 de 08.12.2004, atribui competência ao Supremo Tribunal Federal para:

Art. 102, III - julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas, em única ou última instância, por outros Tribunais, quando a decisão recorrida: a) contrariar dispositivo desta Constituição ou negar vigência a tratado ou lei federal; b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal; c) julgar válida lei ou ato do Governo local, contestado em face da Constituição ou de lei federal; d) dar à lei federal interpretação divergente da que lhe haja dado outro Tribunal ou o próprio Supremo Tribunal Federal.

A previsão de cabimento está toda elencada no próprio texto da constituição, nem lei ordinária, nem disposição regimental pode fazer-lhe acréscimos ou supressões. Essa Emenda Constitucional nº 45/2004 acrescentou um requisito específico de admissibilidade do recurso extraordinário, que é a repercussão geral das questões constitucionais no recurso ou caso. O requisito da repercussão geral é objeto do art. 102, § 3º do CF. Esse parágrafo representa a tentativa de solucionar a presente crise do STF (ASSIS, 2012).

Isso porque percebeu que o Supremo Tribunal Federal tinha se desvirtuado da função para a qual foi projetado, atuando em demandas de menor significância, e sendo exorbitante o número de recursos extraordinários que chegam àquele tribunal, via direta ou por meio do agravo previsto no art. 544 do CPC. O legislador resolveu criar um pressuposto de admissibilidade para resolver a “crise” do tribunal e passasse a julgar somente causas de extrema relevância ou de significativa transcendência (NEVES, 2013).

Esse acréscimo feito pela EC 45/2004 prescreve um ônus do recorrente de demonstrar a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso, a fim de que o tribunal examine a admissão do recurso, somente podendo recusá-lo pela manifestação de dois terços de seus membros. Dessa forma, embora seja de competência das turmas do STF o julgamento extraordinário, a análise dessa questão preliminar deve ser feita pelo Pleno, a quem devem ser remitidos os autos. Logo o recorrente, além de ter de fundamentar o seu recurso em uma das hipóteses do art. 102, III, da CF/98, terá também, de demonstrar o preenchimento do novo requisito (DIDIER JR.; CUNHA, 2009).

A novidade trazida por essa Emenda Constitucional 45/2004 não teve aplicação imediata, havendo um entendimento pacífico que seria necessário uma lei infraconstitucional para regulamentar o novo pressuposto intrínseco de admissibilidade do recurso extraordinário. Essa exigência foi cumprida por meio da Lei 11.418/2006, que criou os arts. 543-A e 543-B do CPC. Segundo o artigo 543-A, §2º, do CPC prescreve “o recorrente deverá demonstrar, em preliminar do recurso, para apreciação exclusiva do Supremo Tribunal Federal, a existência da repercussão geral” (DIDIER JR.; CUNHA, 2009).

O recorrente demonstrará a relevância dessa questão do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico, ou ainda a circunstância de essas questões ultrapassarem interesses subjetivos da causa, elementos alternativos para configurar a repercussão geral, conforme previsão do art. 543-A, §1º, do CPC. Ainda que a repercussão geral seja prevista por meio de um conceito jurídico indeterminado, cabendo ao STF traçar seus contornos, a doutrina entende que a transcendência pode ser qualificativa, referindo-se à importância para a sistematização e desenvolvimento do Direito, ou quantitativa, referindo-se ao número de pessoas atingidas pela decisão (NEVES, 2013).

Como o art. 543-A do CPC trata de conceitos jurídicos indeterminados, o preenchimento da hipótese de incidência não prescinde do exame de peculiaridades da situação concreta. Não sendo possível assim estabelecer uma noção a priori, abstrata, do que seja questão de repercussão geral, pois essa cláusula depende, sempre, das circunstâncias do caso concreto. Contudo, há uma hipótese de presunção absoluta de repercussão geral: sempre que o recurso impugnar decisão contrária à súmula ou jurisprudência dominante do Tribunal (art. 543-A, §3º, CPC, acrescido pela Lei Federal n. 11.418/2006) (ARENHART; MARINONI, 2011).

Segundo Fredie Didier (2009, p.334), “a presunção é plenamente justificável, pois reforça a força vinculativa das decisões do STF, não somente daquelas incluídas em enunciado de súmula vinculante, mas também dos enunciados de súmula não vinculante e à jurisprudência dominante não-sumulada”.

Na previsão do art. 102, §3º da CF, a inadmissibilidade do recurso extraordinário só será admitida pela manifestação de dois terços dos membros do Supremo Tribunal Federal no sentido de que não há no caso concreto a repercussão geral. Isso significa que oito ministros deverão entender pela inadmissibilidade, o que permite a dispensa da remessa do recurso extraordinário ao Plenário nas hipóteses de quatro membros da Turma decidirem pela existência da repercussão geral, pois nesse caso o número máximo de votos possíveis pela inadmissão do recurso será sete, insuficiente para barrar o julgamento do recurso extraordinário. Assim, havendo menos de quatro votos na Turma considerando a existência de repercussão geral, o recurso deverá ser encaminhado ao Plenário decidir a respeito de sua admissibilidade (THEODORO JR., 2013).

Com o intuito de evitar que todos os recursos extraordinários nos quais não se consigam quatro votos, entendendo existir repercussão geral, sigam para o Plenário, o que poderia congestionar de maneira significativa a pauta desse órgão, o art. 543-A, §5º, do CPC determina que, sendo negada a existência de repercussão geral, a decisão valerá a todos os recursos sobre matéria idêntica, que serão indeferidos liminarmente pelo relator, salvo na hipótese da revisão da tese. Também se admite que a negativa de conhecimento nesses casos seja realizada em decisão colegiada pela Turma, o que permite a conclusão de que, uma vez proferida decisão monocrática pelo relator, será cabível o recurso de agravo interno para o órgão colegiado no prazo de 5 dias (NEVES, 2013).

4 O EXAME DA REPERCUSSÃO GERAL EM SEUS SENTIDOS: MATERIAL E FORMAL

     Como preconiza o art. 541 do CPC, o recurso extraordinário deve ser interposto perante o presidente ou vice-presidente, e no recurso deverá conter: a exposição do fato e do direito; a demonstração do cabimento do recurso interposto; as razões do pedido de reforma da decisão recorrida. Deste modo, o presidente do tribunal irá fazer uma análise preliminar do recurso, podendo inadmiti-lo por falta de requisito necessário de admissibilidade. Ressalta-se que não poderá ele julgar o requisito da repercussão geral, pois é de competência exclusiva do STF. Todavia muito se discute com relação à dita análise preliminar diante o requisito da repercussão geral, que por vezes pode ser indevidamente julgada (AURELLI, 2007).

Para melhor entendimento da questão analítica de admissibilidade pelo presidente do tribunal e pelo STF, explana-se aqui o que parte da doutrina intitulou como repercussão geral nos sentidos: formal e material.  A perspectiva formal trata estritamente da existência de um requisito de regularidade formal, ou seja, se no recurso interposto há um tópico destinado à apresentação da repercussão geral, conectando-se assim, ao papel designado ao presidente do tribunal. Já consoante ao outro sentido, o foco é conduzido para a matéria trazida no tópico da repercussão geral, cabendo ao STF (exclusivamente) verificar se realmente atende o exigido no art. 543-A, §1°, do CPC (ANDRADE, 2008).

De maneira geral não se observa facilmente a utilização de tais nomenclaturas, principalmente pelo fato dos doutrinadores mais renomados ainda se utilizarem de classificações como preliminar formal, e existência ou não de repercussão geral para delinear os momentos de exame do pressuposto exigido. Porém, o próprio STF já mostra-se declinado a aderir esse entendimento que classifica e caracteriza a repercussão geral (formal e material), até mesmo com relação ao âmbito de atuação das autoridades competentes, sendo uma forma mais pratica de estabelecer parâmetros de avaliação (PARISENTI, 2012).

Nos dizeres do CPC (art. 543-A, §2°), bem como no texto constitucional (art. 102, §3°) é evidente o destaque da função interpretativa diante a repercussão geral direcionada exclusivamente ao STF, visto que o julgamento preliminar do presidente do tribunal será para avaliar o cabimento do recurso, verificando se ele atende a todos os pressupostos exigidos pela lei. Sendo irrecorrível a decisão emanada do STF (de no mínimo 2/3 de seus membros), que nega a presença de repercussão geral no RE (THEODORO JR., 2013).

Acontece que há uma certa confusão diante os limites demarcados ao presidente do tribunal sobre seu prévio exame de admissibilidade, a ponto ainda de se entender que ele pode negar seguimento ao recurso, aplicando considerações acerca da repercussão geral já decididas pelo tribunal superior. De tal modo, verifica-se uma dicotomia entre a legislação posta e a prática jurídica (ARENHART; MARINONI, 2011).

 

4.1 PROCEDIMENTO

O recurso extraordinário deve ser interposto no prazo de 15 dias perante o presidente ou vice-presidente do tribunal recorrido, contudo será protocolado na secretaria e ficará após a intimação do recorrido ali exposto na espera das possíveis contrarrazões (também dentro do prazo de 15 dias). Com o oferecimento ou não das contrarrazões oportunizadas ao recorrido, depois do prazo findo, o presidente (ou vice-presidente) irá realizar o primeiro crivo de admissibilidade do recurso, podendo admiti-lo ou não, se valendo sempre da fundamentação motivadora da decisão (art. 542 do CPC).

Cumpre ressaltar que nessa avaliação de pressupostos e cabimento do recurso extraordinário pelo presidente do tribunal, cabe recurso de agravo do art. 544 do CPC (no prazo de 10 dias contados da publicação do pronunciamento) em casos de inadmissão, lembrando que o exame prévio do presidente do tribunal não vincula o tribunal superior, no entanto a decisão que admite o recurso extraordinário é irrecorrível. Coaduna com essa ideia, a possibilidade do próprio STF não conhecer do recurso por constatar algum vício de admissibilidade (MOREIRA, 2012).

O agravo contra decisão de indeferimento do recurso extraordinário será primeiramente dirigida à presidência do tribunal de origem, tendo o agravado após a intimação 10 dias para contrarrazoar, em seguida os autos serão distribuídos a um relator no STF. A partir de então o julgador deverá observar o Regimento Interno do tribunal, mas o CPC dispõe as possíveis opções do relator em seu art. 544, §4°, em situações de não conhecer (ou inadmissão) do agravo por parte do relator cabe recurso no prazo de 5 dias (agravo interno). Caso admitido, o recurso extraordinário que se encontra nos mesmos autos do agravo subirá ao Supremo Tribunal Federal (ARENHART; MARINONI, 2011).

Quando recebido pelo tribunal superior, qualquer Turma é competente para julgar nos ditames do Regimento Interno do STF, ou se o recurso tiver subido devido ao agravo interposto, a Turma responsável pelo conhecimento do agravo estará preventa para julgar. A Turma então irá realizar novamente um exame de admissibilidade, concernente agora a repercussão geral material, podendo pelo número mínimo de quatro votos reconhecer o pressuposto sem a necessidade de remetê-lo ao Plenário. Destaca-se aqui também a possibilidade de interferência de terceiro, o amicus curiae, por meio de procurador habilitado para manifestar a favor do reconhecimento da repercussão geral (MOREIRA, 2012).

No Supremo Tribunal Federal, quando não for caso de inadmissibilidade do recurso por outra razão, o relator submeterá, por meio eletrônico, aos demais ministros, copia de sua manifestação sobre a existência, ou não, de repercussão geral (art. 323, caput, do RISTF). Uma vez recebida a manifestação do relator, os demais Ministros encaminhar-lhe-ão, também por meio eletrônico, no prazo comum de vinte dias, manifestação sobre a questão da repercussão geral (art. 324, caput, do RISTF). O relator juntara copia das manifestações aos autos, quando não se tratar de processo Informatizado, e, uma vez definida a existência de repercussão geral, julgara o recurso ou pedira dia para seu julgamento, apos vista ao Procurador-Geral, se necessária. Negada a existência de repercussão geral, formalizara e subscrevera decisão de recusa do recurso (art. 325, caput, do RISTF). (ARENHART; MARINONI, 2011, p.576)

Ademais, negada a existência de repercussão geral pelo Pleno, a decisão vinculará para todos os recursos sobre matéria idêntica que estão na espera de apreciação, exceto aqueles tomados por revisão de tese. Agora quando conhecido o recurso, será julgado o recurso extraordinário, trazendo assim uma nova decisão emanada do STF (um acórdão), mesmo que venha confirmar o entendimento trazido na decisão do órgão a quo, assim deverá ela ser publicada no Diário Oficial como disposto nos ditames do RISTF (THEODORO JR., 2013).

4.2 AS POSSIBILIDADES APRESENTADAS PELA DOUTRINA PARA CONTRAPOR O JULGAMENTO INDEVIDO DA REPERCUSSÃO GERAL

O papel da repercussão geral em tornar mais expressiva a questão debatida e realçar a relevância das Cortes Supremas, acabou por tumultuar um pouco o procedimento de avaliação de admissibilidade e mérito na realidade forense. Na tentativa de fazer cumprir o papel de filtrar e impedir o abarrotamento de processos na instância máxima, o presidente do tribunal termina por extrapolar em certos momentos o âmbito de sua competência (ASSIS, 2012).

Diante da decisão particular do presidente ou vice-presidente do tribunal em inadmitir o recurso extraordinário, logo se suscitaria a possibilidade de interposição do agravo interno, no prazo de 5 dias, contudo, por força do art. 544 do CPC nos casos de inadmissibilidade do recurso extraordinário/especial positivou-se o cabimento do agravo encartado nos mesmos autos do recurso excepcional e encaminhado para os tribunais superiores. Como disposto, antes da apreciação pelos órgãos supremos será oportunizada a possibilidade das contrarrazões, para então possibilitar a avaliação do agravo, e possivelmente do recurso primário. De certo que esta é uma alternativa para buscar reaver a decisão denegatória do presidente do tribunal, porém é necessário focar no fato da incorreta procedibilidade perante o exame da repercussão geral (CÂMARA, 2013).

O tema em pauta vislumbra uma problemática bem mais abrangente do que uma mera questão de admissibilidade recursal, adentrando em um mérito de competência e até mesmo afronta à Constituição vigente. A partir do momento em que o presidente do tribunal ultrapassa a barreira da análise da repercussão geral em sentido formal e alcança o sentido material, ele está usurpando a competência do STF. E diante dessa constatação, remete-se a utilização da reclamação constitucional como meio de impugnar o ato indevido tomado por ele (AURELLI, 2007).

A procedência da reclamação contra ato judicial importa negação do poder do órgão inferior para realizá-lo – poder que ele não tem porque a competência é de um tribunal de nível superior ao do órgão prolator, ou porque a matéria fora superiormente decidida pelo tribunal competente. Daí a confirmação de que as reclamações previstas constitucionalmente, sendo embora um energético remédio processual à disposição do sujeito interessado, recurso não é. (DINAMARCO, 2003, p.198)

    O escopo da reclamação é proteger a competência ou garantir o cumprimento das decisões oriundas do STF e STJ, então quando constatados atos que remetam a qualquer uma dessas hipóteses a parte interessada ou o Ministério Público podem tomar mão da reclamação (sem qualquer prejuízo de outros mecanismos, tais como os recursos). Deverá o legitimado através de petição escrita encaminhar ao presidente do STF, no caso de recurso extraordinário, devendo ser exposta com prova documental de forma eletrônica (art. 156 do RISTF).

Assim trata o Regimento Interno do STF, que compete ao plenário do supremo tribunal a reclamação destinada à preservação da sua própria competência originária, de tal modo, que o relator requisitará informações do reclamado (autoridade ou agente a quem se imputou o ato em discussão), no prazo de 10 dias para assim poder se praticar o exercício de seu direito de defesa. Com isso o relator irá avaliar a necessidade de suspensão do processo ou do ato impugnado, para após o parecer do Ministério Público poder julgar a reclamação. De acordo com os arts. 161 e 162 do RISTF poderá se adotar três medidas diante a procedência da reclamação, ensejando o cumprimento imediato da decisão ordenada pelo presidente da Suprema Corte ou pela própria Turma julgadora (BUENO, 2011).

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O recurso extraordinário restringe-se ao de vetor do controle difuso de constitucionalidade, inserindo-se na alteração da competência do STF, convertido em corte constitucional, sem embargo de outras atribuições de menor significância, é em suma uma estrutura político-administrativa da República. O recurso extraordinário exige peculiaridades específicas de atuação, sendo admitido apenas se a decisão recorrida for de última ou única instância, e contiver os requisitos de prequestionamento e repercussão geral.

 Sobre a repercussão geral, previsto no art. 102, §3º da CF, prescreve o ônus do recorrente de demonstrar a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso, a fim de submetê-la a exame do tribunal. Presume-se que há repercussão geral quando suscitado o item no recurso em questão, somente cabendo ao STF (por 2/3 de seus membros) deixar de conhecer o recurso extraordinário por falta de repercussão geral. Logo, somente o STF poderá dizer que não há repercussão geral, não podendo o presidente ou vice-presidente do tribunal local fazer essa análise.

Por fim, novos estudos aprimoraram o entendimento sobre o tema, trazendo as perspectivas: formal e material, com o objetivo de estabelecer melhores critérios de identificação e atuação acerca da repercussão geral. E para contrapor o excesso cometido pelo presidente do tribunal, constatou-se além da indicação do agravo do art. 544 do CPC, a utilização de reclamação constitucional para conter a usurpação de competência evidenciada.

REFERÊNCIAS

ANDRADE, Milso Nunes Veloso de. A “Repercussão Geral” como Pressuposto de Apreciação de Recurso Extraordinário: Algumas Considerações. vol. 1. No 22:  2008. Disponível em: < http://www.direitopublico.idp.edu.br/index.php/direitopublico/article/viewArticle/535 >. Acesso em: 28 out. 2014.

ARENHART, MARINONI, Sérgio Cruz, Luiz Guilherme. Curso de Processo Civil.  v. 2. 9°. ed. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2011.

ASSIS, Araken de. Manual dos recursos. 4ª ed. rev., atual e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012.

AURELLI, Arlete Inês. Repercussão geral como requisito de admissibilidade do recurso extraordinário / Revista de Processo – vol. 151 – São Paulo: Revista dos Tribunais Online, 2007.

BUENO, Cássio Scarpinella. Curso sistematizado de processo civil, 5: recursos, processos e incidentes nos tribunais, sucendâneos recursais: técnicas de controle das decisões jurisdicionais. 3. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2011.

CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. v. 2. São Paulo: Atlas, 2013.

DIDIER JR, Fredie; CUNHA, Leonardo José Carneiro. Curso de direito processual civil: meios de impugnação às decisões judiciais e processo nos tribunais. Vol. 3. 7ª ed. Salvador: Editora JusPodivm, 2009.

DINAMARCO, Cândido Rangel. Nova era do processo civil. São Paulo: Malheiros, 2003.

MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil. Vol. 5. Rio de Janeiro: Forense, 2009.

_____. O novo processo civil brasileiro: exposição sistemática do procedimento. 29°. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2012.

NEVES, Daniel Amorim Assumpcao. Manual de direito processual civil. 5. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: METODO, 2013.

PARISENTI, Amanda Sessim. O recurso extraordinário e o instituto da repercussão geral: uma análise crítica. Trabalho de Conclusão de Curso (Monografia) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre: 2012. Disponível: < https://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/67356/000872059.pdf?sequence=1 >. Acesso em: 28 out 2014.

TAVARES, André Ramos. Curso de direito constitucional. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003.

THEODORO JR., Humberto. Curso de Direito Processual Civil: Teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. vol. 1. Rio de Janeiro: Forense, 2013.

VadeMecum Saraiva / obra coletiva de autoria da editora Saraiva com a colaboração de Luiz Roberto Curia, Livia Céspedes e Juliana Nicoletti. 17. ed. atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2014.

___________________________________

[1] Paper apresentado à disciplina de Recursos no Processo Civil lecionada pelo professor Christian Barros Pinto.

[2] Aluno do sexto período do curso de Direito vespertino da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco; Email:[email protected].

[3] Aluno do sexto período do curso de Direito vespertino da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco; Email: [email protected].

[4] Professor, orientador.