A (IN)VIABILIDADE DE AMPLIAÇÃO DA PRIVATIZAÇÃO DOS PRESÍDIOS ANTE O CRESCIMENTO DA POPULAÇÃO CARCERÁRIA NO ESTADO DE SANTA CATARINA


Bruno Alves de Morais[1]
Edson Paulo Pacheco Dutra Júnior[2]
 
RESUMO

O presente trabalho tem por foco o estudo da privatização dos presídios brasileiros. O artigo apresenta a evolução histórica da pena e os direitos do preso, além de trazer modelos de administração prisional existentes no mundo e exemplos de privatização no Brasil. Por fim, discute sua aplicabilidade no Estado Democrático de Direito, uma vez que atualmente a Administração Pública, na gestão dos estabelecimentos carcerários, não tem atendido aos anseios sociais na garantia dos direitos fundamentais dos presos, tampouco apresenta um modelo de administração estatal que signifique economia para o erário.

1 INTRODUÇÃO

Este trabalho tem por objeto verificar as vantagens de ampliação da privatização da administração dos presídios no estado de Santa Catarina, sob o enfoque do Estado Democrático de Direito. Sabe-se que a situação dos presídios brasileiros é bastante preocupante, apresentando celas abarrotadas de delinquentes e rebeliões em massa, além de não possibilitarem vários dos direitos do preso previstos em legislação própria. Essa situação é retratada diariamente nos noticiários nacionais e internacionais: detentos desamparados e sem perspectiva de retorno à sociedade.

A pena aplicada chega a ser executada, contudo em condições degradantes e contrárias à dignidade humana, fundamento principal de um Estado Democrático de Direito. No intuito de alterar o atual cenário, será estudado o sistema penitenciário atual brasileiro para, ao final, concluir se a privatização pode atender aos anseios da Administração Pública, dos detentos e da sociedade.

Dessa forma, o trabalho busca identificar os direitos do preso à luz do Estado Democrático de Direito e a evolução histórica da pena; na sequência se propõe a descrever os modelos de administração prisional no mundo e alguns exemplos de administração prisional privada no Brasil; por fim, buscará analisar efetivamente a viabilidade de ampliação do presente modelo no Estado de Santa Catarina.

O método aplicado será o dedutivo, pois parte da compreensão da privatização de presídios no geral, para então compreender a sua aplicabilidade no Brasil. Considerando esse contexto, a metodologia utilizada no estudo envolve uma pesquisa bibliográfica, qualitativa e descritiva, traduzida em livros, legislações e levantamentos estatísticos.

2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA PENA E OS direitos do apenado à luz do estado democrático de direito

A pena e sua respectiva aplicação têm sido motivo de discussão nas sociedades ao longo dos séculos. Por tudo que representam, as penas privativas de liberdade afetam o ser humano em um dos bem jurídicos mais valiosos, vale dizer, a liberdade. 

Em uma sociedade contemporânea, esse instituto deve ser observado à luz dos Direitos Humanos, enquanto requisito de validade do próprio sistema. Nesse sentido, este tópico visa analisar a evolução histórica deste importante instituto jurídico, bem como elencar os direitos dos presos no contexto de um Estado democrático de Direito.

2.1  EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA PENA

            Várias são as divisões teóricas no estudo da pena. Em que pese a complexidade de ideias firmadas ao longo dos anos, a maioria dos estudiosos divide essa evolução da forma que será apresentada neste tópico.

O estudo da pena no Direito Penal pode ser dividido em etapas ou fases, variando de acordo com a espécie de aplicação da pena. Assim, o estudo da pena divide-se em três fases, quais sejam, a fase primitiva, a fase humanitária, e a fase científica contemporânea. (ARAGÃO, 1972)

As características da fase primitiva foram esclarecidas pelo estudo de Joseane de Queiroz Vieira e Francisca Edineusa Pamplona Damacena:

A fase primitiva caracterizava-se pela vingança privada, pública ou divina, ou seja, o culpado era punido pela própria vítima e/ou pela família dela, a sociedade muitas vezes também se unia na depreciação do acusado através da representação do Soberano (Príncipe, Rei, Monarca) e ainda acreditava-se que de alguma forma o criminoso atingia, através de seu delito, um ser Superior ou Divino, por isso à Igreja cumpria a função de punir. Um exemplo dessa fase é o Código de Hamurabi (2000 a.C.), considerado uma das legislações mais antigas do mundo, onde já é possível identificar a regulamentação da punição, esta de caráter vingativo, que até os dias atuais ainda é conhecida pelo senso comum através do tão famoso slogan “olho por olho, dente por dente”. A Lei de Talião (do latim Lex Talionis; Lex: lei e talis: tal, parelho), consagrada pelo código, pregava a rigorosa reciprocidade do crime, qual seja, a punição de maneira igual ao dano causado, logo, matou então morrerá, estuprou será estuprado. (2008, p. 2)

            O sistema humanista surgiu a partir do final do século XVIII, sob influências do Iluminismo que, com seus ideais de liberdade e igualdade, pregava o respeito à dignidade da pessoa humana. O grande idealizador da fase humanista foi o Marquês de Beccaria, que criticava duramente as arbitrariedades que os infratores sofriam. Beccaria salientava a necessidade de se garantir o princípio da legalidade na aplicação da pena, ou seja, as penas e suas formas de cumprimento deveriam ser apresentadas por leis cominadas pelo poder legislativo. BECCARIA (2005, p. 41-43)

            No período científico ou criminológico, o estudo das penas e do homem delinqüente toma novos rumos, que buscam a explicação causal do delito. Aparecendo a figura de Lombroso, que considera o crime como sendo uma manifestação da personalidade humana e produto de várias causas. A pena não possui mais um fim retributivo, mas, sobretudo, de defesa social e recuperação do criminoso, necessitando, então, ser individualizado, o que evidentemente supõe o conhecimento da personalidade daquele a quem será aplicada. O ponto central do estudo de LOMBROSO é a consideração do delito como fenômeno biológico e o uso de método experimental para estudá-lo. Esse autor também foi criador da antropologia criminal, surgindo do seu lado FERRI, com a Sociologia Criminal, e GAROFALLO, no campo jurídico, sendo que os três são considerados como os fundadores da Escola Positiva. (SALA, 2000)

            Mostrou-se importante o estudo dessas fases de análise da pena, com vistas a entender a evolução da pena sob o ponto de vista da sociedade, que vislumbrava o criminoso somo um inimigo do Estado, fenômeno atenuado na realidade atual, com a promulgação da Constituição Federal de 1988.

2.2 DOS DIREITOS DOS PRESOS         

A proteção dos direitos dos presos tem ganhado importância como o passar dos anos, principalmente após a promulgação da Constituição Federal de 1988 e com a atuação de instituições defensoras dos Direitos Humanos. A Lei de Execuções Penais garante uma série de direitos ao preso, que cabe ao Estado preservar:

Art. 41 - Constituem direitos do preso:

I - alimentação suficiente e vestuário; II - atribuição de trabalho e sua remuneração; III - Previdência Social; IV - constituição de pecúlio; V - proporcionalidade na distribuição do tempo para o trabalho, o descanso e a recreação; VI - exercício das atividades profissionais, intelectuais, artísticas e desportivas anteriores, desde que compatíveis com a execução da pena; VII - assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa; VIII - proteção contra qualquer forma de sensacionalismo; IX - entrevista pessoal e reservada com o advogado; X - visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias determinados; XI - chamamento nominal; XII - igualdade de tratamento salvo quanto às exigências da individualização da pena; XIII - audiência especial com o diretor do estabelecimento; XIV - representação e petição a qualquer autoridade, em defesa de direito; XV - contato com o mundo exterior por meio de correspondência escrita, da leitura e de outros meios de informação que não comprometam a moral e os bons costumes. XVI – atestado de pena a cumprir, emitido anualmente, sob pena da responsabilidade da autoridade judiciária competente. 

            Conforme visto, o preso mantem uma série de direitos legais, diferente de outras épocas, em que os presos perdiam a totalidade de seus direitos. Sobre o tema, disserta Antonio José Miguel Feu Rosa:

Em outros tempos a mera condição de preso importava na perda de todos os direitos. O preso perdia todos os seus bens, sua família, toda e qualquer proteção da lei, e, como condenado, passava a não ter direito algum. Hoje o preso deixou de ser objeto do Direito Penal para ser pessoa do Direito, num sentido amplo. (ROSA. 1995, p. 83)

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