A (IN)CONSTITUCIONALIDADE JUSFILOSOFICA DAS PRISÕES CAUTELARES.

 

Taiana Levinne 

Juliana Coelho

Lais Spinola

Madson Mota

Mileide Cordeiro

Stephani Galo

Thaluana Fontes

RESUMO

 O Presente artigo tem por finalidade analisar as prisões cautelares frente aos princípios constitucionais relacionados a liberdade do ser humano, questionando se as mesmas são constitucionais ou inconstitucionais, objetiva ainda analisar do ponto de vista jusfilosófico tal temática. Findada a presente escrita analisa-se que mesmo que tais prisões afrontem em muito na liberdade do individuo, bem como na sua postura perante a sociedade, as prisões cautelares devem ser entendidas como constitucionais levando-se sempre em consideração os princípios de liberdade constitucional e a devida proporção e fundamentação de cerceamento de liberdade ao caso concreto.

Palavras-chave: prisões cautelares; princípios constitucionais; jusfilosofia.

 

INTRODUÇÃO

As medidas cautelares previstas no Código de Processo Penal tem como consequência a restrição de liberdade do individuo, no entanto tais medidas são de suma importância para a devida eficácia dos atos processuais. Ocorre que retirar a liberdade de alguém que ainda não foi sentenciado como culpado vai de encontro a mesma liberdade que a ele é dada através da Constituição Federal. Diante de tal dissenso tal instituto torna-se tema de constante questionamento entre operadores do Direito.

Conforme o código de processo penal as medidas cautelares processuais penais são: prisão em flagrante, prisão preventiva, prisão resultante de pronúncia, prisão temporária e prisão decorrente de sentença penal condenatória recorrível. Todas elas têm como característica comum a restrição de liberdade do individuo, e mesmo que revogadas, a condição de preso ficará socialmente e psicologicamente de forma eterna na vida daquele que sofreu a presente sanção.

Sabe-se que deve se buscar a ressocialização do preso, bem como daquele que já esteve com sua liberdade cerceada, no entanto, ao voltar o olhar para a realidade, sabe-se que aquele que já sofreu alguma penalidade na seara penal será sempre visto perante a sociedade com certo preconceito, tornando assim as medidas cautelares ainda mais complicadas no mundo atual.

Diante do exposto pretende-se discutir se as medidas cautelares do processo penal são ou não constitucionais, abordando o tema atrelado ao que dispõe a Constituição Federal no que se refere a dignidade da pessoa humana, onde a mesma estabelece que todos devem receber tratamento digno e compatível com sua condição de sujeito de direitos, não privando assim o individuo de sua liberdade de ir e vir quando o mesmo ainda se quer foi julgado.

  1. As medidas cautelares no Código de Processo Penal

1.1 Dos tipos de medidas cautelares

Quando se fala em processo penal, muitos são os casos em que manter o possível autor do crime em liberdade acarreta perigo a efetiva solução da demanda processual. As presentes medidas, no entanto, devem ser utilizadas apenas nos casos previstos em lei, a mesma se encontra no artigo 282 do código de processo penal.

Dentre as medidas cautelares de natureza pessoal, as prisões provisórias são as que atingem diretamente a liberdade do indivíduo, e se apresentam sob várias modalidades, como por exemplo a prisão em flagrante, a prisão preventiva, a prisão resultante de pronúncia, a prisão temporária e a prisão decorrente de sentença penal condenatória recorrível.

 

1.1.1 Da prisão em flagrante

É caracterizado em flagrante delito o sujeito que é encontrado no instante da prática do ilícito penal, seja no seu exato momento, seja nas hipóteses prevista no art. 302, incisos I a IV do código processo penal.

A prisão em flagrante, disciplinada no arts. 301 a 310 do CPP e também no inciso LXI do art. 5º da Constituição Federal é uma das espécies de prisão cautelar de natureza processual e, portanto, sujeita aos critérios daquelas medidas. E a sua utilização apenas é cabível frente à necessidade e certificação de evidências sobre autoria e o fato típico.

1.1.2 Da prisão preventiva

Prisão de natureza cautelar, a mesma, em sentido amplo, alcança toda e qualquer prisão que seja proferida antes de uma sentença penal condenatória transitada em julgado.

De acordo com David Alves Moreira, prisão preventiva:

“é aquela medida restritiva da liberdade determinada pelo Juiz, em qualquer fase do inquérito ou da instrução criminal, seja como medida de segurança de natureza processual , seja para garantir eventual execução da pena, seja para preservar a ordem pública, seja por conveniência da instrução criminal”.

Como qualquer providência excepcional, sua aplicação deverá ser sempre cautelosa, pois o resultado nem sempre poderá coincidir ao que se é esperado, ou seja, a manutenção de um acusado numa prisão será relacionada, por exemplo, que a chamada “ordem pública” esteja segura atribuindo a prisão, ao mesmo tempo em que se verificará um enorme prejuízo com a medida se ao final houver a declaração de inocência do acusado através de uma sentença absolutória.

1.1.3 Da prisão resultante de pronúncia

A pronúncia é um instituto processual de aplicação própria nos crimes da competência do Tribunal do Júri e, portanto, nos casos de crimes dolos os contra a vida e os conexos a este.

A pronúncia, dependente que é da existência material do crime e indícios de sua autoria, constitui verdadeira sentença, em que o juiz, ao analisar as provas constantes nos autos, remete o acusado para o julgamento definitivo pelo Tribunal do Júri.

As interferências dessa decisão segundo a nossa organização processual, seria a de lançamento do nome do réu no rol dos culpados, a sua prisão, salvo exceções, e o seu julgamento pelo conselho de sentença, do que se dessume ser, a pronúncia, origem de mais uma modalidade de prisão cautelar.

1.1.4 Da Prisão temporária

Inserida pela Lei nº 7.960, de 21.12.89, a prisão temporária vem se unir às diversos tipos de prisão cautelar e, como medida extrema que é, também fica reservada aos casos de maior gravidade.

Representando a verdadeira prisão para averiguações, sempre presente na rotina das delegacias, a prisão temporária apoia-se na necessidade e conveniência de sua utilização para a realização de investigações na fase do inquérito policial e, quando indemonstrada essa necessidade, a medida fica prejudicada.

1.1.5 Prisão decorrente de sentença penal condenatória recorrível

A sentença penal condenatória recorrível, segundo o art. 393 do Código de Processo Penal, ocasiona sobretudo dois efeitos essenciais: o recolhimento do réu à prisão, salvo algumas exceções, e o lançamento do nome do réu no rol dos culpados.

Com a chegada da atual carta magna, o segundo efeito, o do lançamento do nome do réu no rol dos culpados, praticamente foi revogado, pois contraria o princípio constitucional da presunção da inocência.

A questão principal, portanto, limita-se ao primeiro efeito da sentença condenatória recorrível, origem de mais uma modalidade de prisão que, em razão da possibilidade recursal, ainda figura entre as medidas cautelares.

1.2 Dos fundamentos para a concessão de medidas cautelares

As medidas cautelares de natureza processual também são chamadas de prisões provisórias, e como afirma Thiago Naves apud MANZINI (1952), “a prisão provisória consiste em uma limitação mais ou menos intensa da liberdade física de uma pessoa, para uma finalidade processual penal”.

Por meio do instituto da prisão provisória, se limita a liberdade da pessoa, visando a tutela do processo. As medidas cautelares são formas de assegurar a defesa de determinados direitos, até que se confirme a tutela definitiva, isto é, a guarda e a defesa da sociedade mediante o direito. A prisão cautelar é primordial para que a lei penal reine, quando fundamental.

São dois os requisitos essenciais para a aplicação da medida cautelar de natureza processual. O primeiro deles é o do periculum in mora. Se existe urgência em afastar-se o perigo de prejuízo ao processo, resultante do decurso do tempo, a medida cautelar torna-se necessária. Por outro lado, é também importante o requisito do fumus boni iuris. A aplicação da medida cautelar torna-se justa havendo possibilidade, para uma das partes, de solução favorável no processo principal. Deve-se fazer um juízo de probabilidade, que indique a necessidade de intervenção do processo cautelar.

  1. Dos princípios constitucionais

2.1 Princípio da liberdade individual

A Liberdade Individual, mais do que circunstância de promoção da abundância econômica e da paz civil é o princípio definidor do Homem enquanto ser moral. O acordo com a Liberdade Individual presume a firmeza de que só uma ordem social na qual caiba aos indivíduos a condução da sua vida consentirá o pleno desenvolvimento da dignidade do ser humano.

E, segundo Marco Aurélio Alves Adão:

A busca por liberdade se reduz, muitas vezes, a mera liberdade individual: não estar submetidos senão às leis, não ser detido, preso, morto, nem maltratado arbitrariamente, dizer a opinião sem consequências, escolher a profissão, ir e vir, não dar conta à ninguém dos próprios passos, reunir-se sem empecilhos, etc.

Certamente, o individualismo se sobrepõe ao pensamento mítico sobre a democracia, pois o imaginário popular foi construído pela cultura e pela promessa de felicidade do “meu” e do “fazer”. Transforma-se tudo em posse, inclusive as pessoas (minha esposa, meu filho, meu amigo, meu trabalho, meu cargo) e tudo sob a ótica de uma prática fabril (fazemos amor, fazemos amizades).

Como assevera Marco Aurélio Alves Adão:

“O direito individual surge como forma de libertar o homem das amarras do estado absolutista. A esfera individual não mais pode ser restringida pelo Estado de forma deliberada e absoluta. O problema é como estabelecer equilíbrio entre a “liberdade individual” e a “autoridade estatal”. Isto porque o conceito de liberdade não é absoluto, não implica em ausência de coação. Liberdade consiste na ausência de coação anormal, ilegítima e imoral. Daí concluir-se que somente a lei geral estatal pode restringi-la, e assim mesmo devendo aquela ser elaborada segundo regras preestabelecidas e aceitas pela coletividade que busca regular. A lei limitadora do conteúdo da liberdade individual precisa ser normal, moral e legítima, no sentido de ser consentida por aqueles que a liberdade restringe.”

A liberdade só poderá ser limitada pela norma. Desta forma de considerar-se a legalidade frente à liberdade é fundada em um conteúdo negativo, sendo a liberdade o conceito geral e a restrição da lei a exceção. Não há uma relação no sentido de poder-se fazer tudo o que a lei permite, mas de poder-se fazer tudo, exceto o que a lei expressamente proíbe.

O conteúdo das normas é também fonte de considerações éticas. Pode uma lei ser formalmente válida e emanada de poder legítimo, e mesmo assim ser moralmente considerada inválida, enquanto limitadora do conteúdo das liberdades. Daí concluir-se que a legitimidade do poder não é suficiente para que a legalidade seja legítima, é necessário também que o conteúdo das leis seja expressão da soberania popular.

Para Marco Aurélio Alves Adão:

As leis podem ser moralmente questionáveis quanto à sua esfera interna. O comando legal que limita a liberdade individual pode trazer regra que moralmente não traduza o interesse coletivo, a despeito de ser emanado de poder legítimo e elaborada de forma correta, segundo regras preestabelecidas.

Se há uma limitação ao exercício de uma liberdade, por parte de uma lei, é necessário que os conceitos de que a lei se vale sejam eticamente aceitos, para que a eficácia seja assegurada.

2.2 A dignidade da pessoa humana

O princípio da dignidade da pessoa humana é um dos pilares do sistema jurídico em vigor. É um verdadeiro compromisso com o respeito à identidade e à integridade de todo ser humano. De modo geral, é a dignidade humana um atributo da pessoa, não podendo ser medida por um único fator, pois nela intervém a combinação de aspectos morais, econômicos, sociais e políticos, entre outros funcionando como uma garantia que milita em favor dos cidadãos, funcionando como um limitador às ações do Estado. Como princípio fundamental do Estado Democrático do país, a dignidade da pessoa humana, juntamente com o direito à vida e à liberdade, são garantias individuais asseguradas e consagradas pela Constituição Federal de 1988.

  1. A Constitucionalidade das medidas cautelares frente a possibilidade de reversão

Segundo decisão do Superior Tribunal de Justiça, não existe inconstitucionalidade nas prisões provisórias, ao sumular sobre o assunto, em 06/09/1990: “a exigência da prisão provisória, para apelar, não ofende a garantia constitucional da presunção de inocência”.

Desta forma, o princípio da presunção de inocência, não inviabiliza a decretação das prisões provisórias, porém os requisitos e pressupostos legais atinentes a espécies devem estar presentes: a) prova da materialidade, sequenciados por garantia da ordem pública, conveniência da instrução criminal e para garantia da aplicação da lei penal; b) indícios suficientes da autoria.

As medidas cautelares são exceções e de utilização restrita, desta forma, ao atingir a liberdade, o indivíduo, em tese inocente, poderá vir a ser prejudicado patrimonial, ou moralmente, ensejando a responsabilidade civil do Estado pelos danos causados aos acusados com essas medidas.

Nota-se que há uma tentativa do Estado em contrabalançar o dano à ofensa, como maneira de fazer uma compensação pelo ato praticado pelo Estado na tentativa de uma aplicação correta da lei e restauração da ordem pública.

Sabe-se que, todos têm direito a viver uma vida com dignidade e a receber do Estado todas as condições para a realização desta condição. Convém lembrar que as medidas cautelares foram originadas como uma ferramenta do Estado para que os procedimentos envolvendo a aplicação da lei penal sejam eficientes, devendo resguardar, entretanto, os direitos fundamentais de cada individuo.

CONCLUSÃO

É sabido que desenvolvimento normal do processo necessita, na maioria das vezes, de um tempo superior ao esperado pelos litigantes, dando margem a para que algumas situações apresentadas inicialmente sofram alterações em detrimento de uma das partes.

Por isso, podemos constatar a necessidade do uso de medidas que possam garantir a originalidade dos fatos apresentados no início da demanda, evitando, dessa forma, eventuais prejuízos viabilizados pela demora da prestação jurisdicional.

No Processo Penal, tais medidas, além de estarem sempre apoiadas nas regras gerais a que estão submetidas, são tomadas de excepcionais cuidados quando da sua utilização, e isto porque o objeto da pretensão provisória é a privação da liberdade do indivíduo como medida necessária, por exemplo, nos casos de investigação criminal, ou para a garantia da ordem pública, dentre outros.

Não obstante a tudo, é importante ressaltar que, como afetam a liberdade dos indivíduos, as prisões cautelares, quando sem fundamentos, dão ensejo a responsabilidade civil do Estado, como meio de reparar o dano sofrido, reforçando o aspecto de revogabilidade dos seus efeitos.

Destarte, nota-se que, embora as prisões cautelares atentem contra o principio da presunção da inocência, seu caráter revogável, sua natureza e sua função as tornam compatível com o sistema constitucional em vigor no país, havendo ainda uma alternativa de possível indenização estatal como forma de compensar os danos sofridos pelo indivíduo em questão.

Por tudo isso, é importante sublinhar que cabe ao intérprete uma criteriosa análise do caso concreto ao deparar-se diante de uma situação que necessite a aplicação das medidas cautelares existentes, pois seus efeitos afetam diretamente a liberdade e a dignidade do indivíduo.

 

 

REFERENCIAS

ADÃO, Marco Aurélio. Ética, liberdade, legalidade e legitimidade. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19/etica-liberdade-legalidade-e-legitimidade Acesso em: 04 março 2017.

BRASIL, DECRETO-LEI Nº 3.689, DE 3 DE OUTUBRO DE 1941. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del3689Compilado.htm. Acesso em: 06 março de 2017

MOREIRA, Davi. Prisão Provisória: as medidas cautelares de natureza pessoal no processo penal: de sua indevida aplicação, conseqüências e fundamentos à sua reparação. 1.ed. Brasília/DF: Livraria e Editora Brasília Jurídica, 1996

NERY, Leidiane. A (in)constitucionalidade das Prisões Cautelares no Ordenamento Jurídico Brasileiro. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/49687/inconstitucionalidade-da-prisao-preventiva-para-garantia-da-ordem-publica-e-da-ordem-economica. Acesso em: 06 março de 2017

TEIXEIRA, Guilherme. A (in)constitucionalidade das medidas cautelares previstas no Direito Processual Penal. Disponível em: http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/5285/A-in-constitucionalidade-das-medidas-cautelares-previstas-no-Direito-Processual-Penal Acesso em: 04 março de 2017