A IMPORTÂNCIA DA CRIMINALIZAÇÃO DA CONCORRÊNCIA DESLEAL PARA A PROTEÇÃO DA ORDEM ECONÔMICA BRASILEIRA.

 

Marcos Henrique Sacramento Brito e Mozaniel Vaz da Silva²

RESUMO

Este paper pretente descrever as caracteristicas essênciais do crime de concorrência desleal e verificar como dialogam as diversas fontes do Direito presente neste crime. Além do mais, pretende-se ressaltar o dever de responsabilidade da pessoa jurídica perante á ordem ecnomica e relacionar de que modo isto se reflete no cotidiano do consumidor que é parte vulnerável das relações consumeristas. Por fim, destaca-se a importância da tutela penal á ordem economica, verificando a importância da intervênção do Direito Penal em contraste ao Princípio da Fragmentariedade.

 

INTRODUÇÃO

A política legislativa penal sempre foi bem clara ao tipificar como crime apenas as condutas cujo bem jurídico afetado fosse suficientemente importante não apenas para o âmbito jurídico, mas em igual medida, para a sociedade de forma geral, em obediência ao que se denomina por ultima ratio do direito penal. Nesse sentido a análise da lei nº 8137/90 que introduziu o rol dos crimes contra a economia e as relações de consumo, especificamente em seu artigo 4º expõem uma preocupação do legislador penal em relação a esse fenômeno cuja abrangência demanda uma interdisciplinaridade irremediável na tutela dos direitos subjetivos individuais, coletivos ou difusos. De fato, tal tutela ainda permanece em constante atualização como se percebe pelas recentes modificações ocorridas nesse artigo pela lei nº 12529/2011 (Lei de Defesa da Concorrência). Assim, o estudo aqui desenvolvido vem a demonstrar sua relevância ao analisar a interação entre direito penal e consumerista e comercial em torno de um mesmo fenômeno, ou seja, em torno da concorrência desleal, qual sejam as práticas ilícitas que visam propiciar uma vantagem concorrencial desigual, criando por sua vez verdadeiros monopólios.

Por fim cabe ressaltar que a interação a ser analisada ganha relevo ao se levar em conta a forma como o direito penal vem a prestar contribuições ao modelo atual de direito do consumidor, modelo este que apresenta uma humanização das partes nas relações comerciais (tanto consumidores quanto fornecedores), inovando ao apresentar a presunção de vulnerabilidade (técnica, informacional etc.) da parte adquirente de mercadorias e serviços, ressaltando de tal forma a Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica nos crimes contra a ordem econômica.

1 BREVE DESCRIÇÃO SOBRE OS CRIMES DE CONCORRÊNCIA DESLEAL 

A Lei nº 12.529 de 2011 nasceu no intuito de especificar e especializa tutela da Lei 8.078 de 1990 assim como do próprio Código de Processo Penal no que se refere à uma prática reprovável que vem gradualmente tornando-se cada vez mais comum na sociedade economicamente globalizada atual: a concorrência desleal, mais especificamente os crimes e infrações praticados com esse fim específico.

De fato, Analisando seu contexto histórico. A concorrência desleal obviamente, é fruto e consequência de um processo de concorrência comercial, que por sua vez, só fora possível por conta da abertura econômica que permitiu aflorar as diversas atividades e estabelecimentos comerciais, sobre os mais variados ramos. Nesse sentido, segundo Luciano Ricardo Nascimento (2012, p. 3), as origens de tal afloramento comercial remontam ao período da Revolução Francesa que, ao pôr fim ao filtro do estado monárquico às relações comerciais possibilitou uma verdadeira revolução industrial que encontrou nas práticas liberais de comércio um terreno fértil para a implantação de várias atividades comercias (que muitas das vezes abrangiam uma mesma atividade, uma vez guiados pela tendência do lucro). Desde o século XVIII até o XXI tal visão liberal da ordem econômica ainda se perpetua e, com ela, o fenômeno da concorrência como manifestação benéfica se efetivada de forma proba e ética “não admitindo embaraços artificiais à entrada de novas empresas no mercado ou ao desenvolvimento da atividade empresarial.” (FONSECA apud, NASCIMENTO, 2012, p. 4). Desta forma, mesmo com a atual proteção estatal, tendências neoliberalistas ainda persistem e com elas as práticas concorrenciais e uma vez que o cenário globalizado torna mais acirrada a competição empresarial, e por consequência as práticas desonestas de concorrência (ou melhor, de verdadeira supressão desta), torna-se necessário um maior aprimoramento na legislação afim de proteger a saudável concorrência cujo interesse é de conveniência tanto para os grandes empresários quanto para o Estado assim como para a própria sociedade quanto consumidora que se vê beneficiada com produtos e preços cada vez mais adequados aos seus interesses graças às disputas por público-alvo, travadas na seara empresarial.

A partir desse contexto é que legislação nacional em um lúcido movimento de evolução promulgou em 30 de Dezembro de 2011 a Lei nº 12.529 que:

Estrutura o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência; dispõe sobre a prevenção e repressão às infrações contra a ordem econômica; altera a Lei no 8.137, de 27 de dezembro de 1990, o Decreto-Lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal, e a Lei no 7.347, de 24 de julho de 1985; revoga dispositivos da Lei no 8.884, de 11 de junho de 1994, e a Lei no 9.781, de 19 de janeiro de 1999; e dá outras providências. (Brasil, 2011)

Desta forma, essa nova lei visa além, de modernizar a tutela dos interesses públicos e privados concernentes às práticas concorrenciais e organizar sistematicamente o sistema brasileiro de defesa da concorrência com estipulação de órgãos e suas respectivas competências também elenca um rol taxativo, a partir do título V, das infrações à ordem pública, concernentes a prática de concorrência desleal (assim como as sansões legais cabíveis) o que revela uma verdadeira integração entre Direito Penal, Empresarial e Consumerista em prol da tutela de interesses dentro deste contexto Específico. E cerca de tais infrações é que se tem os aspectos penais específicos relacionados à tutela da livre concorrência, e nesse sentido é que aqui será exposta uma breve análise sobre o ponto de vista penal de tais infrações de forma geral.

Como assevera Luis Ricardo Nascimento, no geral o rol de infrações apresentadas possui características comuns: São crimes próprios; O sujeito ativo é geralmente pessoa física responsável por uma certa atividade econômica e, embora haja discussões sobre a responsabilidade penal da pessoa jurídica, entende-se que esta também pode se apresentar como sujeito ativo. O sujeito passivo na maioria dos casos se configura como uma pessoa jurídica lesada em sua atividade, embora pessoas físicas também possam figurar em tais posições (NASCIMENTO, 2012, p. 4). O bem jurídico tutelado é “Comum em todos os tipos que compõem os crimes de concorrência desleal: a liberdade de competição”. (PIRANGELI,2003, p. 275).

  • Sobre o dialogo das fontes: o direito penal, comercial e do consumidor presentes neste tipo penal.

Como já afirmado anteriormente, visando a defesa da concorrência justa e leal, um conjunto de âmbitos jurídicos se agrupa e complementa-se na tutela de um mesmo interesse que pode se apresentar de formas diversas em casos concretos a depender dos afetados, da extensão da lesão entre outros fatores. Desta forma é que se observa-se na mesma Lei nº 12.529/2011 características e competências que remetem ao Direito Civil, Consumerista, Processual civil, Empresarial, Processual Penal e especialmente, ao próprio âmbito do Direito Penal. Estes setores apresentam suas contribuições através de fontes principiológicas e normativas que, ao contrário de se manifestarem de forma contraditória, dialogam e complementam-se. Entretanto, uma questão que sempre levanta desconfiança é se, por exemplo os princípios que regem o Direito comercial e/ou do Consumidor e que inevitavelmente influenciam em maior ou menor grau a Lei aqui estudada não acabariam por ser antagônicas aos princípios diametralmente inversos advindos de outras fontes a exemplo dá inversão do ônus da prova por vezes relativizado na seara do Direito do Consumidor porém expressamente refutado no Processo Penal.

A resposta à esta indagação só pode ser negativa uma vez que, além de prévia proibição de caráter constitucional, à luz de princípios como o da fragmentariedade (que será estudado mais à frente) e o da intervenção mínima a ultima ratio do Direito Penal acaba por legitimar sua predominância sobre o regramento de outros âmbitos jurídicos, o que não desnatura o diálogo entre as fontes, pelo contrário as organiza de forma que não haja antinomias internas. 

  • DO DEVER DE RESPONSABILIDADE DA PESSOA JURÍDICA PERANTE Á ORDEM ECONÔMICA NO CRIME DE CONCORRÊNCIA DESLEAL

Os direitos e interesses difusos e coletivos foram postos em foco pela Constituição Federal de 1988, ultrapassando os direitos individuais como se pode observar na proteção da proteção da ordem econômica. Logo, a atual Constituição trouxe expressamente a responsabilidade penal da Pessoa Jurídica em crimes contra o meio ambiente, conforme dispõe o Art. 225. § 5º “As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.” (BRASIL, 1988). Outro exemplo expresso na Constituição Federal é a proteção á ordem econômica, senão vejamos no art. 173, § 5º, da Constituição:

A lei, sem prejuízo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa jurídica, estabelecerá a responsabilidade desta, sujeitando-a às punições compatíveis com a sua natureza nos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular.(BRASIL, 1988)

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