A Imbecilidade do Fanatismo Religioso
Por Leôncio de Aguiar Vasconcellos Filho | 04/08/2025 | HistóriaA disputa em torno da primazia de uma crença, com relação às demais, é algo tão antigo quanto a própria humanidade. E, também, bem danosa, mesmo se comparada aos mais persecutórios delírios. Nós, brasileiros, não precisamos viajar para observar os vieses de “superioridade”, já que os mesmos têm ocorrido no nosso próprio território, com seguidos ataques num país que, mais que todos, deveria prezar pela liberdade religiosa de facto.
A primeira religião monoteísta, surgida há milhares de anos, foi o Judaísmo. Por muitos séculos, os judeus foram um povo ocupante da costa leste do Mar Mediterrâneo, professando sua fé em Javé. Seus cinco livros religiosos (Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio) formam o Pentateuco, ou Thorá, que equivale ao Velho Testamento Cristão. Para eles, não há nada além da Thorá, reverenciadora do citado deus Javé, havendo até hoje a espera pelo Messias, que os conduzirá a um mundo sem tribulações (o Novo Testamento não está inserido na Thorá, por isso os judeus não reconhecem Cristo como o Messias). Certamente, os judeus não acrescentaram o Novo Testamento à Thorá porque viam em Cristo um homem comum, especialmente durante e depois do julgamento em que uma multidão (minoria, diga-se), aproveitando-se da tradição de Páscoa em que poderia, dentre dois condenados, perdoar um e condenar o outro, preferiu a Crucifixão de Cristo por não participar da facção guerrilheira Zelote, que combatia a ocupação romana com violência. Ao contrário de Barrabás, o assassino libertado por Pilatos em seu detrimento.
Daí, os constantes atritos que, nos séculos seguintes, permearam as relações entre cristãos e judeus, sendo estes expulsos de cerca de cento e dez sociedades, antigas, medievais, modernas e contemporâneas, nos quase últimos dois mil anos. Nos recentes séculos, os "pogroms" foram ainda mais violentos, tendo os judeus que pressionar à criação de um Estado Próprio, numa Diáspora inversa, a fim de que não fossem mais perseguidos. Tudo por causa da não acrescência, à Thorá, do Novo Testamento, que, somados, formariam um livro sagrado único para todos, com Cristo como Salvador.
O que quero dizer é que os livros sagrados e as religiões, com seus dogmas, sacramentos, doutrinas e tradições, em Estados Teocráticos como os das Idades Antiga e Média, são controlados pelas cúpulas sacerdotais, que detêm o Poder. Vejam, por exemplo, os seguidos concílios, na Alta Idade Média, com os corpos clericais a discutir as convenientes interpretações, posteriormente impostas ao povo convertido do Império Romano, e, depois, que se encontrava sob o domínio dos senhores feudais (os romanos, inclusive, acrescentavam, ao Novo Testamento, livros escritos séculos após a Crucifixão, e não detentores, em tese, de qualquer valor teológico).
Em 1054, houve o Grande Cisma do Oriente, em que, da Igreja Católica Romana, surgiu a Igreja Ortodoxa Grega, com sede em Bizâncio, antigo território grego (atual Istambul, na Turquia). Os motivos foram divergências doutrinárias, em especial sobre o dogma da infalibilidade papal, passando os ortodoxos a ter como guia o Patriarca Ecumênico de Constantinopla (um detalhe a não passar despercebido é o de que, na Bíblia Ortodoxa Grega, foram acrescentados mais quatro ou cinco livros, em relação à Bíblia Católica Romana).
Então, meus caros, parem de beligerar por “carne pouca”. A maior parte dos dirigentes das Igrejas (Católica Romana, Ortodoxa Grega, Ortodoxa Russa, Luterana, Anglicana, Calvinista e outras, todas com Escrituras adicionadas, subtraídas ou alteradas) precisa que você leia, numa seleção por eles realizada, o que homens comuns escreveram. Seu objetivo é vos impor uma interpretação conveniente, que venha a lhes beneficiar com os vossos bens, eis que Deus não escreve nada, servindo apenas de pretexto para lhes drenarem, mesmo que vocês ganhem um salário miserável e nem comam para pagar a contribuição. Isso não se restringe ao Cristianismo, também ocorrendo em diferentes ramos de outras religiões.
Esta é a razão que explica o fato de haver uma concorrência tão ampla, sendo o Brasil o recordista mundial de criação de Igrejas a cada ano. Então, parem de atacar a liberdade religiosa dos outros, seja por acreditarem em santos, por não acreditarem, por adorarem imagens ou não adorarem. Seja pelo que for. Deixem os integrantes dos cultos afro-brasileiros, os budistas, os judeus e os seguidores de demais religiões em paz. Também não atormentem os cristãos, os muçulmanos, os sikhs, os hinduístas ou quem quer que seja. Enquanto os fanáticos se digladiam por seus guias terrenos, “a caravana deles passa” e estão cada vez mais ricos, como pessoas físicas ou Instituições. Como não há, nem mesmo, consenso sobre se Cristo foi o Messias, não creio que arriscar vossas vidas, vossas famílias e vossa honra por algo que sequer sabemos se é verdade seja o melhor caminho.
É a minha opinião sobre os mercadores de almas, mas cada um faz o que desejar de sua própria vida. E tenham nas vossas mentes que o melhor é celebrar nossa laicidade, com ou sem religiões, num dos poucos presentes decentes que o Estado Brasileiro nos deu.