Ao encarar uma imagem, o que ela diz para seu espectador? Uma foto é capaz de contar quem é o personagem nela presente, em que local o fato se desdobra e quando? Na busca por respostas para estas perguntas e para a suposição de que as pessoas não têm memória visual dos acontecimentos, este artigo apresenta os elementos básicos que constituem uma fotografia e analisa, principalmente sob o ponto de vista do espectador, a capacidade da imagem de transmitir informações e de constituir um registro histórico do fato. Considerando toda a história da fotografia e o espaço que ela ocupa na modernidade, permeando diversos veículos impressos e ganhando as páginas e sites da internet, questionamos o impacto da imagem jornalística na cobertura de fatos importantes divulgados pela grande mídia, no caso a revista Veja, nos últimos três anos, para estudantes do curso de Comunicação Social – Jornalismo, do Centro Universitário do Triângulo - UNITRI. Por meio da aplicação de questionários para este público, constatamos, de forma prática, afirmações de grandes especialistas do campo como Roland Barthes, Philippe Dubois e Walter Benjamin, e trazemos à luz o papel da imagem jornalística.

INTRODUÇÃO

Breve Histórico da Fotografia e do Fotojornalismo

Desde os primórdios da comunicação, o ser humano se expressa por meio de imagens. Um dos primeiros registros da comunicação advém das pinturas feitas pelo homem nas paredes de cavernas (pinturas rupestres), demonstrando cenas de caçadas e do dia-a-dia. Naquele tempo, acreditava-se que os desenhos tinham "poder" sobre os animais. Por meio desses desenhos, o homem era capaz de dominá-los, de captar e aprisionar sua essência. A fixação do homem por capturar imagens foi evoluindo e ganhando novas técnicas ao longo da história.

A história da fotografia enquanto texto visual é bastante recente, uma vez que, até fins do século XIX, cabia à pintura esta função, tanto que os primeiros fotógrafos conhecidos da história, Joseph Nicephore Nièpce, Louis Jacques Mande Daguérre e Wiliiam Henry Fox Talbot, eram todos pintores.

Muitos elementos da história da fotografia, enquanto arte, e do fotojornalismo se cruzam. Desde Daguerre, com suas imagens iodadas e chapas de prata impressionadas na câmara escura até as câmeras digitais de hoje em dia, muito se modificou na forma de testemunhar através da fotografia.

O que se nota é que a história do fotojornalismo se conta numa sucessiva quebra de paradigmas e reformulações, inclusive na leitura da imagem de imprensa enquanto texto subjetivo.[1] Em fins do século XIX e início do século XX, a fotografia em plena ascensão se firma como forma de representação do real. A produção e reprodução de imagens estáticas chama a atenção da imprensa e ocorrem grandes inovações no setor de publicações.

Por volta de 1842, principiam os processos de reprodução da imagem, o marco inicial do que seria o fotojornalismo.Este processo também é responsável pelo que Walter Benjamin chama de perda da "aura" da obra de arte, em seu livro A Obra de Arte na Era de sua Reprodutibilidade Técnica.

Os mais importantes acontecimentos da história mundial foram sendo registrados pela fotografia e o fotojornalismo. Os anos de 1846 e 1848 são marcados como o primeiro registro de guerra durante o conflito Americano-mexicano. Foi a primeira vez que os jornais enviaram correspondentes para a cobertura de acontecimentos que poderiam render páginas de jornal. Paulatinamente, a guerra ia se revelando um grande tema para o fotojornalismo que começava a se desenvolver como instrumento de imprensa.

Na segunda metade do século XIX é que evoluções significativas no campo da fotografia começam a se sobressair. Surgem novas técnicas e novos equipamentos, que antes eram pesados e de difícil transporte. Diminui-se o tempo de exposição, descobre-se a possibilidade de reprodução de uma mesma imagem a partir de um único original (técnica de colódio úmido), surgem os estúdios com iluminação artificial e as exposições se espalham.

Em 1870, o aperfeiçoamento do obturador (aumento da velocidade e novas técnicas de captura de imagens), contribui para ascensão do fotojornalismo. A evolução dos processos gráficos e o reconhecimento da profissão fotojornalista por volta de 1920, influenciam na difusão da fotografia.

Mas será que uma imagem é realmente capaz de revelar algo sem um texto? Até que ponto a fotografia pode ser precisa ligando a memória ao que aconteceu? Por que certas imagens ficam tão fixas na memória, enquanto outras simplesmente não deixam rastros?

Com base em todo esse histórico, pretendemos com este artigo, questionar o papel do fotojornalismo na transmissão de informações e na constituição de uma memória histórica, avaliando as impressões deixadas por imagens expostas pela grande mídia.

O Fotojornalismo na atualidade

Atualmente vivemos na chamada "era da informação". Somos bombardeados diariamente por fotos e textos relacionados aos mais variados assuntos de todo o globo. Novos recursos tecnológicos e novas possibilidades permeiam todas as áreas do conhecimento e a comunicação ganha outros conceitos e outros alcances.

É notável o papel da imagem no processo comunicacional. Do surgimento dos primeiros tipos móveis e a adaptação da arte de retratar pessoas e paisagens da pintura para a fotografia, até o uso atual da imagem como texto visual, muitos séculos transcorreram. Hoje é quase impossível pensar a comunicação na mídia sem o auxílio de uma fotografia; isso quando não é ela própria o elemento principal de uma notícia.

Quando falamos em texto visual, recordamos também da imagem em movimento. Vídeo e animações permeiam programas televisivos e sites da Internet. Contudo, para desenvolvimento deste artigo vamos considerar apenas a imagem estática, visto que toda imagem em movimento, basicamente, é formada de quadros de imagens estáticas passadas em seqüência a uma velocidade maior que o olho consegue acompanhar.

O amplo uso e exploração da imagem na comunicação dá lugar a uma gama de artigos e trabalhos que buscam, por meio de análises ora profundas ora superficiais, desvendar os mitos que encobrem esta ciência/arte. Alguns trabalhos tratam das impressões do mundo frente aos primeiros retratos fotográficos que se mostravam mais perfeitos do que os das pinturas; outros mencionam a aura mística das fotografias; outros ainda tratam da evolução do processo de retratar a realidade (ou realidades) e várias são as discussões a cerca de constituir a fotografia uma arte ou ciência. Muito se fala atualmente da manipulação de imagens na mídia, da perda do caráter de "testemunho" da fotografia.

Arte ou ciência, manipulada ou não, o que percebemos é que a fotografia, no decorrer da história, sempre veio acompanhada de um efeito impactante e seu uso nos meios de comunicação, como fonte de informação, é crescente. É sobre este efeito que tratamos neste artigo, buscando entender o que numa foto consegue atingir quem a visualiza. O efeito de uma foto sai dela ou é o espectador que o vê? Quão fundo uma foto pode chegar na emoção e na memória de uma pessoa? Ela é capaz de transmitir fatos com precisão? A foto serve como um registro histórico duradouro?

Pretendemos oferecer as respostas para todas essas questões e outras, que com certeza irão surgir no desenvolvimento deste artigo. Respostas que sabemos que não serão definitivas, mas atestarão pequenas revelações que, acreditamos, poderão servir de base para outros estudos sobre esta importante ferramenta.

DESENVOLVIMENTO

Para a realização deste artigo, partimos de uma experiência feita por um professor dentro de sala de aula, com os alunos do curso de Jornalismo do 4º período do Centro Universitário do Triângulo – UNITRI, campus Uberlândia. Nesta experiência, fotos de grandes acontecimentos cobertos pela mídia foram selecionadas de importantes revistas brasileiras e recortadas, sem as legendas. O professor identificou algumas retrancas no quadro e pediu que cada aluno pegasse uma foto e colasse sob a retranca que achasse pertinente ao acontecimento.As fotos foram coladas e, ao final, percebeu-se que a maioria dos alunos não sabia a que fatos as fotos se referiam, portanto, não sabiam ao certo associa-las sob a retranca correta. A experiência reforçou a afirmação já de domínio público e ratificada por Rosa Gauditano, fotógrafa de revistas diversas e reconhecida pelo seu trabalho de documentário fotográfico com tribos indígenas no norte e centro oeste, que acredita que o Brasil é um país de memória curta. "Costumamos dizer que o brasileiro não tem memória, como se isso fosse uma frase feita; mas é a verdade".[2]

Inspirados por essa experiência, decidimos estudar mais a fundo se a conclusão retirada do exercício em sala era realmente fundamentada e a que se devia a afirmação da falta de memória do brasileiro. Pode a foto, uma vez que visualizada, remeter a um acontecimento com precisão? Ou ela está fadada a apenas flashes de memória, ora chocando, ora impressionando, ora inspirando o belo, ou a esperança, ou a raiva, ou a reflexão, mas nunca sendo retidas de forma a constituir um testemunho histórico?

Com base nestes questionamentos, definimos uma questão principal: A foto jornalística, da forma como é utilizada hoje, consegue causar um impacto (memória) a longo prazo nas pessoas?

A questão vai ao encontro do objetivo principal deste artigo, questionar o impacto da foto jornalística na formação de uma memória histórica, ou seja, até que ponto e com qual precisão a fotografia é capaz de transmitir informações, e do objetivo secundário, analisar quais elementos da imagem chamam a atenção, resultando em melhor memorização, e por quê.

Optamos por elaborar uma pesquisa, a fim de descobrir até que ponto a afirmação do senso comum, citada anteriormente, é verdadeira. Para tanto, elaboramos um questionário como instrumento de pesquisa. Considerando os recursos e a disponibilidade dos componentes do grupo, delimitamos a aplicação deste questionário aos estudantes do curso de Jornalismo noturno do Centro Universitário do Triângulo – Unitri. Fizemos a escolha deste público como amostragem, uma vez que, na impossibilidade de fazer uma pesquisa nacional, os estudantes de jornalismo supostamente representam uma camada da sociedade mais atualizada, próxima dos meios de comunicação, acostumada ao trato com os acontecimentos e notícias.

Neste instrumento de pesquisa, foram elaboradas sete questões contendo perguntas relativas a fotos e fatos divulgadas pela grande mídia nos últimos 3 anos, especificamente da revista Veja, que comprovam ou não as hipóteses previamente definidas pelos objetivos. Foram escolhidas três fotos: caso da modelo Bia Furtado (Maria Beatriz Furtado), que teve queimaduras em mais de 30% do corpo causadas pelo incêndio do ônibus da Viação Itapemirim, no Rio de Janeiro, em dezembro de 2006; caso da árbitra Lia Mara Lourenço, que teve o pé esquerdo perfurado durante o aquecimento do lançamento de um dardo no Troféu Brasil de Atletismo, em São Paulo, em setembro de 2006; caso da missionária americana Dorothy Stang, 73 anos, assassinada com três tiros no Travessão do Santana, município de Anapu, Pará, em 2005, por defender os direitos de trabalhadores rurais contra os interesses de fazendeiros e grileiros da região. Optamos por essas fotos por se tratar de assuntos recentes (últimos três anos), que tiveram ampla divulgação na mídia e provocaram certa indignação e choque nas pessoas.

Em uma segunda etapa do questionário, dispusemos quatro fotos, também de fatos amplamente divulgados na mídia impressa e na televisiva, desta vez com as legendas, buscando comprovar se estas auxiliam ou não na correta remissão entre imagem e fato. A primeira foto diz respeito à queda do Boeing 1907, no norte do estado de Mato Grosso, que resultou na morte de 154 pessoas, em 29 de setembro de 2006. A segunda mostra o corpo do brasileiro Jean Charles de Menezes, assassinado com oito tiros no metrô de Londres por ter sido confundido com um homem-bomba, em 22 de julho de 2005. A terceira foto refere-se à rainha da bateria da Mocidade Alegre, Nani Moreira, que sofreu um acidente durante o desfile de 2006, em que um acessório que levava na cabeça pegou fogo e a feriu. A quarta foto retrata o funeral do ex-presidente chileno Augusto Pinochet, em Santiago. Pinochet foi morto no dia 10 de dezembro de 2006.

Contudo lembramos que, como nosso objetivo é a Fotografia, aqui com letra maiúscula para distinguir de qualquer fotografia, e não uma fotografia, portanto poderiam ter sido escolhidas quaisquer outras imagens. As hipóteses que decidimos trabalhar foram:

1. A imagem jornalística induz a memória não para o fato em si, mas para os acontecimentos mais recentes ligados à imagem;

2. A foto jornalística delimita tempo/espaço, mas não personagens;

3. A imagem, somente quando subordinada a um texto, consegue remeter a um registro histórico.

O questionário foi aplicado de forma estratificada, sendo respondido individualmente por alunos do 1º e 2º, 3º e 4º, e 5º e 6º períodos do curso de jornalismo da Unitri. Optamos por esta classificação buscando medir se o estágio em que o aluno se encontra no curso (inicial, intermediário ou final) é determinante de uma diferença visível na capacidade de reconhecimento das fotos e fatos. No total, 74 alunos responderam à pesquisa.

Antes da análise dos questionários, achamos pertinente entender um pouco mais dos elementos que constituem a Fotografia. Retomaremos a obra de Roland Barthes, A câmara clara: nota sobre a fotografia, em que o autor estabelece a distinção entre o "studium" e o "punctum" da fotografia, ou seja, o "óbvio", como objeto de estudo, como terreno de um saber e de uma cultura que pode ser compreendida e desvendada, e o "obtuso", ligado ao afeto, simbólico. Desfazendo os aspectos da fotografia, teremos como avaliar o que nela é marcante e esclarecemos os critérios que usaremos para avaliação das respostas.

Em foco: os elementos da Fotografia

Independentemente da forma como uma Fotografia é usada em um veículo, a foto, em si, possui alguns elementos que podem ser identificados: o fotógrafo, o espectador e o objeto. A esses termos, Roland Barthes nomeia "Operator", "Spectator" e lança o conceito do objeto como "Spectrum"[3] , mantendo ao mesmo tempo a relação com o "espetáculo" e com o fato já decorrido e, nesse sentido, já morto.

Diante deste aspecto da Fotografia, como registro de uma realidade, de uma existência que já foi e não pode repetir-se, Barthes ainda menciona uma fatalidade[4]: que uma vez que a fotografia retrata uma coisa ou objeto do mundo, ela está da mesma forma sujeita a desordem com que eles se encontram neste mundo.

Então, a ordem que o espectador vê em uma Fotografia não é dada pela realidade, mas acaba sendo a representação de algo escolhido pelo fotógrafo, e nunca a foto em si. Para o nosso trabalho, nenhuma afirmação seria fundamentada se nosso estudo se baseasse em "uma" foto e não na Fotografia. Não é possível entender a Fotografia se ela pode ser tantos objetos, tantas representações. Resta-nos, como a Barthes, conceituar "de movimentos pessoais, o traço fundamental, o universal sem o qual não haveria Fotografia."[5]

Para tanto, Barthes passa da observação do objeto, "Spectrum", para a do "Spectator", chegando então ao foco que nos importa neste artigo: o ponto de vista do espectador. Ele descreve, já em 1980, o bombardeio de imagens de todo o tipo a que o espectador está sujeito. "Vejo fotos por toda parte, como todo mundo hoje em dia; elas vêm do mundo para mim, sem que eu peça; não passam de "imagens", seu modo de aparição é o tudo-o-que-vier (ou tudo-o-que-for)."[6]

Entre as fotos publicadas, ou seja, que passaram pelo filtro da cultura, Barthes constatava que algumas provocavam nele pequenos júbilos. O autor, dessa forma, colocou-se na posição de espectador, analisando nele mesmo o efeito que as imagens lhe proporcionavam.

Como se estas remetessem a um centro silenciado, um bem erótico ou dilacerante, enterrado em mim mesmo (por mais bem comportado que aparentemente fosse o tema); e que outras (imagens), ao contrário, me eram de tal modo indiferentes, que a força de vê-las se multiplicarem, como erva daninha, eu sentia em relação a elas uma espécie de aversão, de irritação mesmo.[7]

Dificilmente lhe atraiam várias fotos de um mesmo autor, donde ele concluiu que o "júbilo" ou a "indiferença" não eram questão de estilo ou de uma subjetividade. Tratava-se antes, de uma individualidade, ou seja, de um foto dotada de elementos que alcançassem o efeito universal.

Surge então um conceito de "estalo" para nomear esta atração que algumas fotos desencadeiam, conceito este substituído pelo termo "animação": "é assim que devo nomear a atração que a faz existir: uma animação. A própria foto não é em nada animada (não acredito nas fotos "vivas") mas ela me anima: é o que toda aventura produz".[8]

A foto encontra na sua dificuldade para existir, a sua banalidade, visto que ela não tem essência própria. O que confere essência à Fotografia é o sentimento que ela consegue despertar.

Como resultado dessa linha de pensamento de Barthes, aparecem dois conceitos de fundamental importância para nosso trabalho na medida que fornecem uma base teórica para a elucidação de o que na foto chama a atenção e por quê. Estes conceitos vão além das análises mais comuns de como a imagem é utilizada nos meios de comunicação. Eles mostram uma outra visão na qual parte (ao menos) do efeito (impacto) de uma foto pode não se dever a como ela foi publicada, mas, de fato, aos seus elementos constitutivos. Enfim, a estes elementos Barthes chama "studium" e "punctum":

o primeiro, visivelmente, é uma vastidão, ela tem a extensão de um campo, que percebo com bastante familiaridade em função do meu saber, da minha cultura; esses campo pode ser mais ou menos bem-sucedido, segundo a arte ou oportunidade do fotógrafo, mas remete sempre a uma informação clássica.[9]

Milhares de fotos são feitas desse campo, direcionadas ao interesse geral: "às vezes emocionado, mas cuja emoção passa pelo revezamento judicioso de uma cultura moral e política".[10]

No entendimento do grupo, é nesta title="" href="http://www.webartigosos.com/admin/de/editor.php?name=wysiwyg&refresh=417981491#_ftn11" name="_ftnref11">[11]

Em contraposição, o segundo elemento, o "punctum", faz um processo inverso, partindo da cena como uma flecha e transpassando o espectador. O "punctum" designa essa ferida, essa picada, a marca feita por um instrumento pontudo. A palavra remete também à idéia de pontuação. As fotos são pontuadas, mosqueadas com pontos sensíveis. "O punctum de uma foto é esse acaso que, nela, me punge (mas também me mortifica, me fere)".[12]

Assim, a foto é constituída de elementos universais e intencionais e de elementos que fogem à intencionalidade do fotógrafo e, às vezes, atingem mais diretamente o sentimento do espectador, imprimindo-a na sua memória por mais tempo. Interessa, neste artigo, saber como a foto pode ser mais surpreendente e, dessa forma, mais chamativa e animada.

surpresas obedecem a um princípio de desafio (aquilo por que elas são estranhas): o fotógrafo [...] deve [...] em última instância desafiar as (leis) do interessante: a foto se torna "surpreendente" a partir do momento em que não se sabe por que ela foi tirada. Em um primeiro tempo, a Fotografia, para surpreender, fotografa o notável; mas logo, por uma inversão conhecida, ela decreta notável aquilo que fotografa.[13]

O fotógrafo não tem todo o controle dos elementos da Fotografia. Como no caso do "punctum", muitas vezes, o que prende a atenção do espectador é ora um detalhe, ora o que não ficou claro e que o desafia a descobrir o motivo pela qual a foto foi tirada.

As fotos de reportagem são, com muita freqüência, "unárias", isto é, homogêneas, com todos os elementos dispostos de forma clara, objetiva e precisa. Nem por isso são pacíficas, como é o caso, por exemplo, de fotos title="" href="http://www.webartigosos.com/admin/de/editor.php?name=wysiwyg&refresh=417981491#_ftn14" name="_ftnref14">[14]

Este conceito das fotos de reportagem como "unárias" fornece uma explicação chave para a falta de memória histórica e visual, já citada neste artigo. Não basta que as fotos sejam chocantes, dotadas de elementos sensacionalistas, para que elas sejam capazes de marcar o "Spectator", de pungi-lo. Se elas não transpassam, não podem possivelmente deixar registro. Para que isso aconteça, é necessário que exista um detalhe: o "punctum", pelo qual a foto deixa de ser qualquer. Ela ganha uma imobilidade viva, ligada a um detonador, que desencadeia uma explosão de sentimentos. Não é possível estabelecer uma regra de ligação entre "studium" e "punctum". Não há motivo ou justificativa para o detalhe.

Assim, de conhecimento dos verdadeiros elementos da foto, podemos prosseguir para as análises do grupo.

Exposição dos Resultados

Em maio de 2007, o grupo aplicou os questionários de forma estratificada para os alunos do curso de Jornalismo da Unitri. Nestes, pedimos que os alunos identificassem personagens, local e ano referentes a cada uma das três fotos retiradas da revista Veja, sendo que deixamos uma questão aberta para cada fato (A que fato esta foto te remete?- se não souber deixe em branco), buscando entender o que cada aluno assimilava da imagem. Na segunda etapa do questionário, apresentamos aos alunos quatro fotos com as respectivas legendas, solicitando-lhes que respondessem: a que fato cada fotografia remetia, a descrição deste fato com a identificação de personagem, local e ano.No total, 74 alunos preencheram os questionários.

Primeiro e segundo períodos

Naqueles questionários referentes ao 1º/2º períodos, que representam 54% do total respondido, constatamos que 72,5% dos estudantes têm contato com a revista Veja, de onde foram retiradas as fotos para este artigo. Contudo, a maioria, 82%, respondeu que lê a revista com pouca freqüência, assinalando a opção "de vez em quando".

Ao pedirmos que identificassem a personagem da foto 1 (Anexo A),50% dos alunos não souberam responder e apenas 18% marcou a opção correta (Bia Furtado). Na questão seguinte, referente ao local, 64% dos estudantes marcaram a opção incorreta (São Paulo), sendo que 14% escolheu a certa (Rio de Janeiro). Ainda assim, o número de estudantes que não souberam responder foi maior: quase 18%. Quanto ao ano do ocorrido, 32% marcou a opção certa (2006). Porém a percentagem foi superada em 10% pelos que marcaram a opção "2007", sendo que 25% dos alunos não souberam responder. Na questão aberta, a maioria, 57%, deixou em branco. Dos que responderam, apenas 28% chegou a mencionar corretamente o acontecimento.

Já na foto 2 (Anexo B), a maioria, 64%, não soube identificar a personagem. Apenas 14% dos estudantes acertaram a questão, sendo que o número foi superado pelos que escolheram a alternativa "Stela Edberg". Quanto ao local, novamente a maioria, 57%, não soube responder e as alternativas "São Paulo" e "República Tcheca" tiveram o mesmo percentual, 21,5%. Referente ao ano, a quantidade de alunos que não souberam responder e que respondeu corretamente foi igual, 43%. O restante, 14%, marcou a alternativa errada. Na questão aberta, novamente a maioria, 54%, deixou em branco. Apenas 11% mencionou corretamente o fato.

Em relação à foto 3 (Anexo C), uma mudança: 86% dos estudantes identificaram corretamente a personagem (Dorothy Stang). Apenas 11% não soube responder. Na identificação do local, 61% dos alunos marcaram a opção correta (Pará), sendo que 21% marcou Amazonas e 14% não soube responder. Quanto ao ano, 71% acertou, marcando a opção "2005", sendo que 11% deixou em branco, e 18% marcou a alternativa errada. Na opção aberta, grande parte, 36%, deixou em branco. Somando a quantidade de alunos que mencionaram (25%) e acertaram o fato (21,5%), cerca de 45% deles identificaram corretamente os elementos desta foto.

Em um segundo momento da análise, em que procuramos comprovar se as legendas têm um papel fundamental ou não na assimilação e memorização das fotos, propusemos quatro fotos com as respectivas legendas, do que obtivemos:

Referente à foto 1A do questionário (Anexo D), mesmo com a legenda, 39% dos alunos erraram a descrição do fato, sendo que 28,5% mencionou o acontecimento e 14% acertou. Deixaram em branco 18% dos alunos. Da foto 2A (Anexo D), mais de 40% dos questionados deixaram em branco, sendo que 32% mencionou o ocorrido e apenas 7% soube remeter a imagem corretamente ao fato. Na foto 3 A (Anexo D), 53,5% dos alunos deixaram a questão em branco e somente 14% respondeu corretamente. O percentual de questões em branco se repete na foto 4 A (Anexo D), e 21% menciona o acontecimento, sendo que apenas 10% assimila corretamente fato e foto.

Terceiro e quarto períodos

Analisando o 3º/4º períodos, que correspondem a 21,5% do total de questionários, 81% dos alunos responderam ter contato com a Veja e, novamente a maioria, 77%, afirmou ser só de vez em quando.

Em relação à foto 1 (Anexo A), 54% não soube identificar a personagem e 46% respondeu corretamente. Na marcação do local, a maioria, 61,5%, não soube responder. O percentual que marcou a opção correta foi de 15,5%. Este mesmo percentual escolheu a opção errada. Na identificação do ano, o resultado volta a se repetir: 61,5% não sabe, e 15,5% representa tanto os que responderam certo (2006) quanto os que escolheram a alternativa errada (2007). Na questão aberta, 38,5% deixou a questão em branco e a mesma percentagem mencionou o fato. Apenas 8% acertou, remetendo corretamente a foto ao fato.

Na foto 2 (Anexo B), grande parte, ou seja, quase 70%, não soube identificar a personagem, sendo que somente 8% respondeu corretamente, e 15% marcou a alternativa errada. Quanto ao local, 54% não soube responder, porém 31% dos alunos acertou. Curiosamente, 15% dos alunos assinalaram a alternativa "República Tcheca". Referente ao ano, 46% não soube responder e 31% respondeu corretamente. Na questão aberta, 61,5% deixou em branco e 23% acertou a assimilação.

Já na foto 3 (Anexo C), a quantidade de acertos foi de 54%, mas 46% dos alunos não souberam responder. Quanto ao local, 38,5%, dos alunos marcaram a alternativa correta; a mesma percentagem não soube responder. Referente ao ano em que se passou o fato, 46% marcou a alternativa incorreta. Apenas 15% acertou e 38% dos estudantes não souberam responder. Deixaram a questão aberta em branco, 54% dos alunos. A quantidade dos alunos que erraram, 23%, foi maior em relação a dos que mencionaram (15%) e acertaram o fato (8%).

Na etapa com legendas, na foto 1A (Anexo D), ninguém acertou a descrição, sendo que apenas 8% dos alunos mencionaram o acontecimento e, a maioria, 54%, deixou em branco. Na foto 2A (Anexo D), apenas 8% assimilou corretamente fato e foto. Mencionaram o ocorrido 23% dos alunos. Houve 61,5% de questões em branco. Na foto 3A (Anexo D), apenas 8% acertou a questão e, a maior parte, 77%, deixou em branco. Na última foto (4A Anexo D) , 69% dos estudantes não preencheram a questão e 23% apenas mencionou o ocorrido.

Quinto e sexto períodos

Nos questionários do 5°/6° períodos (24% do total), 72% dos alunos afirmaram ler a revista Veja, sendo que destes, 77% o fazem só de vez em quando.

Na foto 1 (Anexo A), somente 15% dos alunos marcaram a opção correta, e 61,5% não soube identificar a personagem. Apenas 23% marcou corretamente o local do ocorrido, sendo que 61,5% não soube responder. Quanto ao ano, a maioria, 69%, também não soube identificar, e apenas 15% marcou a opção correta. Na questão aberta, 54% dos alunos deixaram em branco, e 23% mencionou o ocorrido. Apenas 8% acertou a assimilação.

Na foto 2 (Anexo B), grande parte dos estudantes, 85%, não souberam reconhecer a personagem, e ninguém marcou a alternativa correta. Quanto ao local, novamente a maioria, 77%, não soube responder, sendo que 23% dos estudantes marcaram a opção correta. Referente ao ano, 77% não soube responder. Marcaram a alternativa errada 15% dos alunos, e apenas 8% acertou a questão. Na pergunta aberta, a maioria deixou em branco.

Já na foto 3 (Anexo C), 77% dos estudantes reconheceram a personagem "Dorothy Stang". Somente 15% não soube responder. Referente ao local, 31% marcou a opção correta. Esta percentagem foi superada pelo número de erros, que somaram 53,5%. O número de acertos (38,5%) foi igual ao de erros na questão referente ao ano, sendo que 23% dos alunos deixou em branco. Deixaram sem preencher a questão aberta 38,5% dos alunos. A percentagem de alunos que apenas mencionaram o fato foi igual a percentagem dos que fizeram a assimilação incorretamente, ou seja, 23%.

Nas fotos com legendas, considerando a foto 1A (Anexo D), somando os que mencionaram e acertaram o fato, temos 46%. Deixaram em branco 15,5% dos alunos, e 38,5% dos que responderam assimilaram incorretamente foto e fato. Na foto 2A (Anexo D), a mesma percentagem de alunos que deixou a questão em branco (31%), errou na assimilação. Somando os que mencionaram e acertaram o fato, temos 38,5%. Na foto 3A (Anexo D), ninguém conseguiu remeter corretamente a foto ao fato. Apenas 38,5% mencionou o fato e 46% deixou em branco. Na última foto (4A Anexo D), a maioria deixou em branco (69%). Do restante, 15% errou e apenas 8% acertou a descrição.

Análise dos Resultados

De acordo com a exposição dos resultados, percebemos que grande parte dos estudantes tem sim contato com a revista Veja, muito embora acompanhem as notícias neste veículo com pouca freqüência.

Quando solicitados para identificar, nas três fotos, personagens, local e ano dos fatos ali exibidos, mais da metade dos estudantes, no geral, não soube responder ou respondeu as questões errado. Uma exceção aconteceu na foto 3 (Anexo C), referente ao assassinato da missionária Dorothy Stang. Mais da metade dos alunos, nos três estágios do curso, souberam identificar a personagem, ainda que não tenham identificado o local, e que somente no 1º/2º períodos a maioria tenha acertado também o ano.

Com este resultado, cai por terra a hipótese que a foto delimita tempo/espaço, mas não personagens. Observamos que, com raras exceções, as pessoas não conseguem identificar tempo e espaço apenas olhando para uma foto. Inclusive, podem ser "enganadas" pela imagem, como o que aconteceu na foto 2 (Anexo B). Optamos por esta foto pela presença de elementos de choque (a expressão de dor no rosto da árbitra e seu pé perfurado pelo dardo) e porque o cenário (gramado verde bem cuidado, pessoas usando casaco, cores neutras) transmitia uma idéia de não ser no Brasil. Esta mesma interpretação foi feita pelos estudantes do 1º/2º e 3º/4º períodos. Nos dois estágios do curso, a percentagem de alunos que relacionaram a personagem a alguém de nome estrangeiro foi maior que a dos que relacionaram corretamente. E no 1°/2º períodos, a mesma percentagem que identificou corretamente o local (21,5%), marcou erradamente a opção "República Tcheca".

Estas observações se relacionam ao que já expusemos anteriormente sobre o "studium", pela fala de Barthes. Há informações e elementos na imagem que são apreendidos em função de já fazerem parte de signos coletivos, da nossa cultura, do senso comum.

Quanto à outra hipótese trabalhada pelo grupo, de que a imagem jornalística induz à memória não para o fato em si, mas para os acontecimentos mais recentes ligados à imagem, por meio dos questionários não conseguimos comprovar na etapa sem legendas a veracidade desta afirmação. Com a utilização de legendas e fotos na segunda etapa, notamos que, mesmo assim, apesar da legenda ter ajudado a situar a foto no seu contexto, não foi capaz de remeter os estudantes para os elementos do fato, sendo que houve grande número de respostas vagas e não pertinentes ao acontecimento em si. Com base neste resultado, notamos que este assunto merece um estudo mais profundo, focado especificamente na comparação de casos mais antigos que tenham elementos ou imagens mais parecidos com as notícias mais recentes. Por ora, percebemos que a composição de imagem casada com texto continua sendo a mais eficaz para evitar que erros de assimilação aconteçam, como o de atribuir a um acontecimento recente uma imagem de outro fato passado.

Outra curiosidade é que, embora as três notícias tenham sido amplamente exploradas pela mídia, os estudantes se recordaram, com mais detalhes, apenas da terceira foto. As outras duas eram dotadas de elementos de choque (modelo com rosto e parte do corpo queimados e árbitra com o pé perfurado), mas nem por isso marcaram as pessoas. A foto de Dorothy Stang[15] com um sorriso, um olhar inspirador, longínquo, um certo ar de graça, um céu ao fundo, foi a que remeteu os estudantes para o fato. Por quê? O que ela tem que as outras não têm?

Primeiramente, foi uma notícia bastante explorada também pela televisão. Provavelmente a maioria se lembrará da cena da missionária caída, meio de lado, no chão de terra marrom, seu rosto em um ângulo quase sem visibilidade e as vestes claras manchadas de sangue. Trata-se de uma notícia sobre a violência, mas em que ponto mais chocante, mais revoltante, mais dolorida que do incêndio no ônibus da viação Itapemirim ou a do pé perfurado de Lia Mara? Talvez por se tratar de um crime pessoal, contra uma senhora defensora de uma causa digna, uma figura materna, alguém supostamente frágil e indefesa, que poderia ser a minha avó, ou a sua, e uma heroína nacional...

Novamente recorremos à Barthes e seu conceito de "punctum". Na foto 3, parece haver um vínculo afetivo entre objeto e espectador. Aquele que vê a imagem encontra em algum ponto dela (nos óculos? no olhar? na pele enrugada? no jeito de sorrir? na atitude frágil mas desafiadora?) algo que o fere também e compartilha com ele uma visão. Não se trata exatamente de uma foto jornalística que quer dar testemunho indubitável de um fato, pelo contrário, ela parece construir uma leitura de uma pessoa que por suas atitudes é digna de lembrança. Talvez exatamente pela foto em si explorar o lado artístico (como uma pintura sacra), ela possua um "não-sei-que", desafiando a ser desvendado. É a esse elemento misterioso que conferimos o caráter de "gatilho", para desencadear e trazer a tona as demais lembranças.

A guisa de uma conclusão, notamos que a foto não fornece os elementos para a identificação precisa de um fato ou para uma lembrança histórica do ocorrido. Ela funciona como um índice, no muito, chamando a atenção e servindo como este "gatilho" mnésico para a gama de detalhes que constituem um acontecimento.

O papel da fotografia é conservar o traço do passado ou auxiliar as ciências em seu esforço para uma melhor apreensão da realidade do mundo. Em outras palavras, na ideologia estética de sua época, Baudelaire recoloca com clareza a fotografia em seu lugar: ela é auxiliar (um "servidor") da memória, uma simples testemunha do que foi.[16]

A foto é sim uma testemunha, mas como tal, não é dona de todas as informações do que ocorreu. Como em um drama policial, em que para se solucionar o caso é preciso ouvir (neste caso ver) várias testemunhas, interrogá-las profundamente, ligar pistas e até visitar o local do "crime" onde o fato aconteceu para achar uma verdade que faça sentido, para se obter todas as informações de uma foto, deve-se analisar todo o processo e contexto, para então atribuir-lhe uma significação. "Sua realidade primordial nada diz além de uma afirmação de existência. A foto é em primeiro lugar índice. Só depois ela pode tornar-se parecida (ícone) e adquirir sentido (símbolo)".[17]

Nem por isso, a fotografia deixa de ter significado. Na verdade, acreditamos que a foto seja uma testemunha confiável, porém muda, que pode simplesmente apontar para inúmeras significações, muitas vezes, subjetivas de quem a vê. O jogo de significações da foto funciona mais ou menos como aquela brincadeira: uma pessoa, para saber algo, vai fazendo várias afirmações, ao que a outra responde piscando ou apontando o dedo para o nariz – uma vez, em caso afirmativo, e duas vezes, em caso negativo. Como menciona Henri Von Lier: "A foto pode ser uma prova instrutiva e irrefutável. É tão evidente que não é preciso insistir nisso. Mas, ao mesmo tempo, ocorre com freqüência que não se sabe bem o que ela prova".[18]

CONCLUSÃO

Por isso, com base em todas as informações apresentadas, consideramos que a imagem, somente quando subordinada a um texto, consegue remeter (com precisão) a um registro histórico. Porque é no campo da palavra que o espectador vai achar as significações para o que ele vê, pela foto, que existe. O texto é o elemento que esclarecerá o "corte" que representa o ato fotográfico, ao captar a desordem dos objetos do mundo. E é por meio dele que acontece o processo de significação.

Ainda assim, como a fotografia se configura como aparelho psíquico, do ponto em que ela é impressa na memória até o "algo" que a faz ressurgir, o caminho é incerto. Da escolha do fotógrafo por uma cena e não outra, o equipamento que usa, o processo de revelação, o tratamento com o auxílio de softwares até que a imagem chegue aos olhos dos espectadores, muito se fragmenta e se perde.

Se tudo se inscreve na memória psíquica e ali permanece gravado intacto, nem tudo volta. O recalcamento é originário, e sempre haverá restos perdidos, parcelas inacessíveis à consciência. Sempre haverá uma parcela de imagem invisível na imagem. Sempre haverá uma espécie de latência no positivo mais afirmado, a virtualidade de algo que foi perdido (ou transformado) no percurso. Nesse sentido, a foto sempre será assombrada.[19]

Portanto, a solução para se ter o significado completo (ou um deles), é ir além, ao lado e através. Não acreditar no que se vê e saber que a fotografia, por mais que não tenha profundidade, é dotada de uma "densidade fantástica"[20].

Iniciamos este artigo com o objetivo claro de desvendar até que ponto uma fotografia é capaz de informar; se, por meio de uma imagem, consigo identificar personagem, local, e tempo de um fato. Optamos por trabalhar com três hipóteses das quais considerávamos a mais provável a de que a imagem jornalística induz a memória não para o fato em si, mas para os acontecimentos mais recentes ligados à imagem.

Partimos de um experimento que já atestava que os estudantes não conseguiam fazer a ligação correta entre foto e fato, sendo que a tendência era mesmo associar as imagens com o que estava mais recente na memória de cada um. Porém, no desenvolvimento do trabalho percebemos que a imagem sozinha, descontextualizada, aceita quaisquer interpretações que seus espectadores ou visualizadores lhes conferirem, seja a falta total de assimilação ou a relação com um acontecimento recente.

Em vista do resultado que predominou nos questionários, em que a maioria dos estudantes não soube fazer a ligação correta entre a imagem e o fato, comprovamos que o caráter informativo, de esmiuçar o acontecimento e fornecer detalhes cabe ao texto. À imagem cabe o papel de testemunha, de prova da existência do fato. Descobrimos ainda que a fotografia em relação à memória funciona como um aparelho psíquico e mnésico, registrando traços, ainda que inconscientemente, e trazendo à luz o fato, mesmo que apenas em fragmentos ou ruínas.

Cabe então ao fotógrafo, na figura de jornalista, ser "analista-arqueólogo", e passar as imagens latentes ao estado de imagens manifestas. Para isto, deve manter em mente os conceitos de "punctum" e "studium" de Barthes, conservando o aspecto da fotografia verídica, testemunhal, porém dotada de traços humanos, que possam criar vínculo afetivo com os visualizadores. Fotos que firam ou perpassem o espectador apenas por terem sangue ou ferimentos abertos ou cenas de terror expostas podem ser impactantes, mas não são necessariamente registráveis. Por outro lado, aquelas que tocam o emocional do espectador e o desafiam a ir mais fundo, a escavar estas ruínas e entender o que nelas é tão notável, ou memorável permanecem por mais tempo.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BARTHES, Roland. Câmara Clara.

BENJAMIN, Walter. Sobre Arte, Técnica, Linguagem e Política. Trad. Maria Luz Moita et al. Lisboa: Relógio D'Água, 1992.

DUBOIS, Philippe. O ato fotográfico e outros ensaios. Trad. Marina Appenzeller. Campinas: Papirus, 1994. Coleção ofício de arte e forma.

VEJA. São Paulo: Abril, ed. 1893, ano 38, nº 8, 23/02/2005, p.54.

VEJA. São Paulo: Abril, ed. 1976, ano 39, nº 39, 4/09/2006, p.114.

VEJA. São Paulo: Abril, ed. 2000, ano 40, nº 11, 21/03/2007, p.72.

2 – "Fotojornalismo" da dissertação A Produção de Efeitos de Sentido nas Fotografias de Imprensa Brasileira: análises técnicas, plásticas e semânticas, de Lúcio Kürten dos Passos. (Dissertação apresentada ao programa de Mestrado em Comunicação e Linguagens da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre, pelo aluno.)

Internet

http://doragarrido.wordpress.com/2007/05/01/imagens-da-fotografia-brasileira-i-e-ii-de-simonetta-persichetti/



[1] Cf. capítulo 2 – "Fotojornalismo" da dissertação A Produção de Efeitos de Sentido nas Fotografias de Imprensa Brasileira: análises técnicas, plásticas e semânticas, de Lúcio Kürten dos Passos. (Dissertação apresentada ao programa de Mestrado em Comunicação e Linguagens da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre, pelo aluno.)

[2] http://doragarrido.wordpress.com/2007/05/01/imagens-da-fotografia-brasileira-i-e-ii-de-simonetta-persichetti/, acessado em 22 de maio de 2007.

[3] Câmara Clara, p.20.

[4] Idem, p.16

[5] Câmara Clara, p.19.

[6] Idem, p.31.

[7] Idem, p.31-32.

[8] BARTHES, Roland. Câmara Clara, p.37.

[9] Idem, p.44.

[10] Idem, p.44-45.

[11] BARTHES, Roland. Câmara Clara, p.48-49.

[12] Idem, p.46.

[13] Idem, p.57.

[14] BARTHES, Roland. Câmara Clara, p.67.

[15] Na foto original, aparece estampado na camiseta da missionária os dizeres: A morte da floresta é o fim da nossa vida – CNS - GTA. Recortamos estes dizeres para que não dessem pista da identificação da personagem.

[16] DUBOIS, Philippe. O Ato Fotográfico e outros ensaios, p.30.

[17] DUBOIS, Philippe. O Ato Fotográfico e outros ensaios, p.53.

[18] Apud DUBOIS, Philippe. O Ato Fotográfico e outros ensaios, p.84.

[19] DUBOIS, Philippe. O Ato Fotográfico e outros ensaios, p. 326.

[20] Idem, p.36.