A IGNORÂNCIA NATURAL E O SURGIMENTO DA VIOLÊNCIA EM ROUSSEAU

Rousseau dissera uma vez que, o desenvolvimento da ciência, assim como o das artes e consequentemente do conhecimento, ao invés de purificarem o homem, o corromperam, uma vez que, o homem nascera bom, sendo posteriormente corrompido pela sociedade.

Ao Examinarmos este pensamento rousseauliano entenderemos que, nos primórdios da humanidade, a natureza oferecia-se à essência humana; o homem construía suas virtudes no calor existencial que o universo pulsava; seus pensamentos iam de encontro à paz, à harmonia e ao bem supremo que só o divino poderia ostentar; Isto acontecia porque a ignorância, ou como diz Rousseau, o estado de natureza, concedia ao homem a possibilidade de viver em harmonia com o cosmos e com o outro ao seu redor, sem pretensões violentas, pois nascera bom. Porém, com o desenvolvimento da arte, da ciência e consequentemente do conhecimento, o homem foi se distanciando da sua bondosa natureza ao mesmo tempo que começou a desviar-se para caminhos contrários àqueles que exaltavam suas impressões de bondade, levando-o então à violência.

Como prova disso, podemos observar que as guerras não são patrocinadas pelas mentes medíocres, do mesmo modo, as grandes atrocidades e os grandes conflitos da humanidade não são financiadas pelas mentes menos atentas, muito menos pelas mentes pobres de conhecimento, pelo contrário, as guerras, os conflitos e outros tipos de violência sempre foram provocadas pelas pessoas que de alguma forma, foram instruídas na ciência e na arte. Mas nem sempre foi assim. A violência nem sempre fez parte do mundo como hoje conhecemos, uma vez que, no princípio da vida humana, a violência era uma ofensa à existência, um completo desrespeito à natureza e a toda forma de manifestação divina que apaziguava os relacionamentos humanos e trazia paz às instâncias sociais dos primórdios humanos.

Então, de onde surgiu a disposição humana de cometer violência?

A disposição humana de cometer violência, diria Rousseau, surgiu mediante ao aparecimento da civilização; surgiu através do desenvolvimento da ciência, da arte e do conhecimento; surgiu a partir do momento em que o homem levantou a mão e disse: isto é meu; o que possibilitou o advento da propriedade privada e consequentemente da luta de classe (como dizia Marx), onde o homem tornara-se lobo do próprio homem (como dizia Hobbes). O desenvolvimento das ciências e das artes condicionaram o egoísmo, o individualismo, o privado e portanto, a violência.

Torna-se assim necessário o resgate da ignorância natural, aquela do estado de natureza, que permitia ao homem uma convivência harmoniosa com o universo e com os outros ao seu redor. A ignorância passa a ser a virtude a ser preservada. É importante lembrar que não se refere aqui àquela ignorância de não querer saber ou a de não querer conhecer, mas trata-se aqui da ignorância de querer conhecer e ainda assim não se intitular “conhecedor”; trata-se aqui da ignorância de mesmo sabendo, não se intitular “sábio”; da ignorância de mesmo ser instruído na ciência e na arte, ainda assim não se intitular “pronto”; trata-se aqui portanto, da ignorância de conhecer e ainda assim não perder a humildade de aprender um pouco mais. Lembremos Sócrates, que mesmo conhecendo, preferiu ofuscar-se da sabedoria, declarando a sua mais famosa frase: “só sei que nada sei”; Sócrates, mesmo sabendo, dizia que não sabe. O tipo de ignorância aqui pregada é a de Sócrates, que mesmo sabendo, não se intitulava dono da verdade, mas apto de aprender um pouco mais.

A ignorância natural portanto é a virtude a ser resgatada. Os homens, em suas instruções e erudições, intitularam-se sábios e donos da verdade, ferindo quem assim discorda, o que resultou em conflitos, como todos nós temos testemunhado. A ciência e a arte então, ao invés de nos tornarem mais bondosos e altruístas, tornaram-nos mais insensíveis e cruéis, obrigando-nos a retomarmos o estado primórdio, a ignorância natural, o estado de natureza.

Referência

Rousseau, Jean-Jacques. (1749). Discurso sobre as ciências e as artes. Recuperado de https://www.google.com/url?sa=t&source=web&rct=j&url=http://www.ebookbrasil.org/