INTRODUÇÃO:
Desde o advento da primeira Revolução Industrial e da Revolução Francesa termos como igualdade, oportunidade, fraternidade, liberdade, solidariedade, foram incorporados como elementos constituintes das mais diversas relações sociais. Neste espaço, os portadores de necessidades especiais, antes vistos como criaturas malignas, indesejáveis ou dignas de caridade dentre outras imputações, também conquistaram um importante e significativo espaço no que se refere ao repensar sobre o próprio conceito de deficiência (ROSADAS,1984). Mediante a este fato, o "corpus social", elevado por pressões políticas, sociais, ideológicas e culturais, forçadamente se viu obrigado a pensar em um projeto de inclusão para àqueles historicamente privados de direitos e deveres, dentre os quais se inserem os portadores de necessidades especiais. Seguindo este movimento ascendente se constroem as primeiras escolas dedicadas ao trabalho pedagógico da deficiência e, indo além, estabelecendo a obrigatoriedade das escolas regulares aceitarem as crianças portadoras de necessidades especiais. Sendo assim a Educação Inclusiva é vista como uma forma de incluir os portadores de necessidades especiais a sociedade intitulada "normal", onde poderão aprender uns com os outros. Porém essa E.I é um dos desejos de uma sociedade que ainda estigmatiza e discrimina seus deficientes, deste modo para garantir dignidade, respeito e integração aos ditos deficientes a educação inclusiva brasileira tem que enfrentar o preconceito de alguns integrantes da sociedade. Portanto seu maior desafio é transformar a mentalidade preconceituosa instalada, desencadeando um movimento coletivo capaz de ao longo dos anos, através da ação de profissionais da educação, mudar este quadro.
A configuração deste novo espaço social repercutiu sobre a forma de inserção e das mais diversas relações sociais estabelecidas por todos os sujeitos do processo educativo sistematizado, dentre os quais se incluem o próprio currículo escolar considerado latu sensu, os diretores, professores, alunos e demais funcionários da escola. Logo, por mais que inicialmente a inclusão dos portadores de necessidades especiais nas escolas tenha se vestido com um aparato mais formal e legislativo do que prático, o simples pensar sobre a diferença, processo forjado pelo novo contexto histórico, já estabelece interessantes apontamentos para a compreensão mais geral do próprio ser humano em questão.
Sabemos que são os seres humanos que fazem a história. Somos nós que transformamos as condições sociais, mudamos o mundo e nos modificamos, com nossas iniciativas, nossos acertos e nossos erros. Mas somos conscientes de que não influímos todos no mesmo nível e com a mesma profundidade sobre o movimento da história: alguns indivíduos ou grupos de indivíduos se destacam num exercício de liderança que lhes confere um papel especial. Porém a ação desses líderes não é arbitrária, eles não são motivados por ímpetos gratuitos, e se tornam líderes justamente porque atendem a uma demanda socialmente significativa. Mediante a esses fatos podemos dizer que com a situação escolar não é diferente, visto que a Declaração de Salamanca (marco na busca da educação inclusiva), assinada por 92 países, o Brasil não esteve presente, durante a Conferência Mundial sobre Educação para necessidades Especiais, em 1994 na Espanha, onde pregou-se a necessidade de reconhecer que a escola para todos é um lugar que inclua todos os alunos e celebre a diferença. Hoje só na cidade do Rio de Janeiro são 5.000 estudantes com necessidades especiais integrando-se em 567 escolas da Rede Municipal, mais da metade das 1.029 unidades escolares municipais. Em relação à situação mencionada ficam as seguintes questões: Até que ponto as escolas brasileiras, estão preparadas para receber e desenvolver um projeto de educação inclusiva? Será que inclusão significa apenas ocupar o mesmo espaço físico? A escola está estruturada para trabalhar com a homogeneidade, mas esta não é a realidade que compõem a diversidade de pessoas carregadas de traços comuns, mas, sobretudo diferenciados. Logo estamos diante de uma nova realidade que inclui, mas tem a diferença como sua marca.
Refletindo sobre esses fatos o trabalho objetiva-se em descrever as deficiências, analisar o papel da família do deficiente e da escola (auxiliados pelas teorias da psicologia da educação) na sua inclusão social e a formação do professor para enfrentar as dificuldades do educando com deficiência. Para exemplificar o trabalho inclusivo foram analisadas diversas pesquisas que mostram a importância da educação física no contexto da inclusão no ambiente escolar.

DESENVOLVIMENTO:
1- Reflexões sobre o estudo das deficiências e a inclusão por Vygotsky:
Antes de relatar os primeiros apontamentos sobre as considerações realizadas por Vygotsky (1995) acerca das crianças portadoras de necessidades especiais, é importante salientar que as terminologias (defeito, defectologia, débeis, retardados) utilizadas pelo referido autor pode, à primeira vista, parecer um tanto quanto pejorativo e depreciativa em relação a estas pessoas, todavia, não podemos esquecer o contexto histórico que influenciava o autor e dos objetivos libertários e humanizadores tecidos sobre os conceitos de cada um destes termos em particular.
A quase um século da morte de Vygotsky, seus estudos demonstram proveitosos entendimentos sobre os múltiplos processos constitutivos dos seres humanos. Sua inserção na Psicologia abarcou temas relacionados a dezenas de áreas afins, tais como a medicina, a pedagogia, a sociologia, a educação e a antropologia, mediante a isso Riviere (1998) o chamou de Mozart da Psicologia.
Em meados do primeiro cinqüentenário do século XX, Vygotsky deu início aos seus estudos sobre as anomalias congênitas que afetavam os processos de socialização das crianças em seu entorno, cujo campo foi por ele denominado de defectologia. O objetivo ao realizar estes estudos consistia em demonstrar como a sociedade e a cultura poderia criar ferramentas e instrumentos que possibilitassem aos portadores de necessidades especiais superarem as dificuldades em seu processo de inserção social, cuja estrutura se encontra em padrões de normalidade e homogeneidade. Para isso, maturou um alicerce teórico que distinguia o desenvolvimento humano a partir de duas linhas diferenciadoras:
? A biológica: coordenada pelos mecanismos de seleção natural e herança genética.
? A histórica: desenhada pelos processos sociais e culturais no qual cada sujeito está envolvido nas esferas cotidianas e não cotidianas. Para Vygotsky (1995), todo o desenvolvimento do ser humano resulta da união dialética e contraditória entre estes pólos, aparentemente opostos, que se expressam em relações de complementaridade.
Partindo do princípio de que os seres humanos se desenvolvem mediados por estas duas linhas formativas, Vygotsky (1995) tece sua consideração sobre as deficiências que acometem os seres humanos como sendo de dois tipos:
a) deficiência primária: a qual é ocasionada pela má formação ou disfunção de algum caractere biológico e/ou hereditário.
b) deficiência secundária: derivada do isolamento das relações sociais e culturais características do entorno em que cada sujeito se insere.
Segundo Vygotsky (1995), a deficiência primária compreende lesões orgânicas como déficit intelectual, disfunções parietais, físicas, cromossômicas, etc., enquanto a deficiência secundária tem como característica o não enraizamento ao contexto externo. Quanto à deficiência primária pouco a educação, a pedagogia e até mesmo a psicologia podem fazer, cabendo intervenções fundamentalmente no campo da medicina, contudo, no que se refere a deficiência secundária em muito a Sociedade e o Sistema Educacional contribuem para introduzir criativamente os portadores de necessidades especiais na cultura da qual fazem parte, e indo mais além, criam um mecanismo de super-compensação da deficiência, minimizando os deletérios efeitos provocados organicamente.
Como Vygotsky (1987) enfatiza que no desenvolvimento humano o social se sobrepõe sobre o biológico, nota-se que atribui grandes potencialidades aos indivíduos portadores de necessidades especiais, desde que as condições materiais lhes ofereçam a possibilidade de se apropriarem do patrimônio sócio-cultural acumulado pelas quase duzentas gerações humanas que habitaram a Terra. Sendo assim, para Vygotsky (1995) a falta de relações sociais se constitui como um problema superior em termos qualitativos a própria deficiência orgânica e biológica. Logo, o grande problema do atraso cognitivo, motor e psíquico dos portadores de necessidades especiais se devem, no seu entender, a uma ausência de educação, considerada em termos amplos, libertária, crítica, democrática e efetivamente humanizadora. É assim que uma deficiência primária se transforma também em deficiência secundária, que a lesão cerebral se converte em deficiência mental e que a cegueira se transforma em uma total perda de visão de qualquer aspecto da realidade. Portanto, mediante a criação de um ambiente rico e acolhedor uma criança com alguma lesão orgânica não é menos desenvolvida do que outra criança tida por normal, mas, sim, uma criança que se desenvolve diferentemente, sob outros olhares, desafios e perspectivas.
É exatamente no desvendar do ambiente acolhedor e motivador que deve se inserir a atuação dos professores quanto aos alunos e alunas portadores de necessidades especiais, mediando seu desenvolvimento através da criação de novas alternativas para superar um mesmo obstáculo. Para isso, entretanto, é necessário que os professores minimamente compreendam os sujeitos com os quais estão trabalhando e tenham como objetivo não a acomodação perante a mesmice da realidade homogênea e pedante, mas, a vontade intrínseca de fazer diferente, ser diferente, transformar a normalidade em diferença. Sendo assim, Vygotsky (1995) ressalta que é fato que o defeito traz algum tipo de limitação ao ser humano, também o é que ele estimula maneiras de se superar estas limitações e alcançar tal desenvolvimento de outra forma. Por isso o defeito origina aquilo que podemos chamar de estímulos para sua compensação.
Todavia, é importante ressaltar que o defeito, de acordo com Vygotsky (1995) pode-se dirigir tanto para a compensação de suas dificuldades, como para o aprofundamento destas, denominada pelo autor de luxação social. Logo, não podemos esquecer que o defeito também pode causar apatia, medo de se relacionar com as dificuldades e um processo de reclusão perante a sociedade e cultura externa, agravando sobremaneira o defeito orgânico, o qual passa também a ser social. Portanto, quando falamos no desenvolvimento das pessoas portadoras de necessidades especiais se faz de fundamental importância sabermos que seu defeito orgânico não pode levá-la, sob quaisquer motivos, a não apropriação do patrimônio cultural historicamente acumulado pelo gênero humano, principal qualidade de nossa espécie. Por conseguinte, podemos considerar a esfera da cultura como o principal elemento que engendra o fenômeno caracterizado como compensação ou super-compensação. Nas palavras de Vygotsky (1995): onde é impossível o desenvolvimento orgânico, ali está aberta de forma ilimitada a via do desenvolvimento cultural.
Ao enfatizar o papel da cooperação e da coletividade com toda a sociedade como fatores fundamentais na superação dialética da deficiência, Vygotsky (1995) se contrapôs frontalmente aos modelos educacionais baseado na segregação dos portadores de necessidades especiais em escolas específicas à suas deficiências, pois considerava este processo como uma forma de deixar estas pessoas a margem da cultura da qual se constituíam, impedindo, portanto, qualquer tentativa de sua transformação. Em vista disso, Vygotsky (1995) se recusava a denominar a educação escolar para portadores de necessidades especiais sob a alcunha de educação especial, pois para ele estas crianças deveriam ser educadas tal como quaisquer outras, cujo objetivo final seria a apropriação da cultura produzida pela humanidade, ainda que efetivada por caminhos diferentes, os quais cabem as escolas e professores instituírem conjuntamente aos alunos e alunas.
A cultura é o principal palco no qual se constroem as mais diversas atividades, ações e representações humanas (VYGOTSKY,1987). É nela que se interpretam e reinterpretam o significado de determinado fenômeno social, assim como, em seu espaço se criam as possibilidades para o humano alcançar seu caráter libertário, conseqüentemente, não pode estar aparte de qualquer sujeito, seja ele pobre, rico, negro, branco, amarelo ou portador de alguma necessidade especial. Tal como Gramsci (1981) destaca: é preciso compreender que quando nos inserimos em determinada cultura além de nos apropriarmos de alguns de seus constructos, neste contato reelaboramos nosso próprio entendimento de ser humano e, portanto, passamos a traçar um caminho completamente diferente em nosso desenvolvimento.
2- O papel da Família e da Escola mediante o portador de necessidades especiais:
2.1- A Família:
Desde o nascimento a criança passa a viver um processo contínuo de socialização. Neste processo, há a intervenção de uma série de instituições, entre as quais, a família que se apresenta como a primeira é a mais importante e decisiva, onde no seio familiar a criança aprende a relacionar-se, a descobrir-se, a iniciar seu processo de autonomia, o qual tem início um desenvolvimento harmônico; mais ou menos ajustado. A família exerce, portanto, um papel fundamental no desenvolvimento cognitivo, físico e social da criança, mas, para que se efetive esse desenvolvimento, é necessário, entre outras coisas que esteja funcionando bem do ponto de vista psíquico, físico e social. No entanto, geralmente isto não ocorre em uma família que descobre que seu filho é portador de alguma necessidade especial.
Tanto a família, como o portador de necessidade especial, geralmente sofrem preconceito e rejeição por parte da sociedade. Podendo acarretar uma rejeição da família a esta criança, gerando uma baixa auto-estima tanto na família, por se achar inferior aos demais membros da sociedade, que tem seus filhos "normais", como também na criança por ser negligenciada por seus parentes. Este contexto pode gerar uma mudança drástica na família, necessitando, então, haver uma reformulação de papéis e um ajuste de sentimentos, esta família não sabe lidar com este novo ser que precisa de cuidados especiais. Essas mudanças não atingem somente os pais, mas sim todos os envolvidos neste contexto familiar (avós, tios, irmãos, entre outros).
Para a Sociologia, a família é definida como um pequeno e interdependente sistema social, onde podemos encontrar subsistemas ainda menores, aos quais irá depender do tamanho da família e do papel que cada um tem definido e em exercício.
Para Cooper (1970) e Laing (1967), família é uma força isolada que prejudica a individualidade, forja o desenvolvimento humano e a personalidade.
Para outros, família é um grupo de pessoas que possuem os mesmos antepassados, vivem sob um mesmo teto, se amam, se apoiam, fazem planos e querem o bem estar de todos, estando inclusos os pais, avós, tios, filhos, netos, bisavós, parentes dos cônjuges, etc.
Partindo desses conceitos, temos que considerar que a família desempenha um papel importante para a construção da personalidade, do comportamento, no curso da moral, da evolução mental, social, mas também, no estabelecimento da cultura e instituições. Qualquer modificação sofrida no grupo familiar irá atingir todos os membros desta família. Isso acontece até mesmo nas que possuem papéis definidos, suas próprias regras e valores, ou seja, nas famílias consideradas saudáveis. Desde o momento em que a mulher tem consciência de que está grávida, há uma alteração ambiental e o nascimento de uma criança gera mudanças nos hábitos da família, por tanto os primeiros anos de vida dessa criança, vê-se mudanças no seu desenvolvimento motor, cognitivo, emocional e social. Isso pode levar a um impacto especial sobre as interações familiares e que exigem adaptações constantes por parte dos genitores, da mesma forma que o nascimento de uma criança desencadeia mudanças familiares, pois está irá influenciar o próprio curso do desenvolvimento da mesma.
Os pais desempenham um papel importante, no desenvolvimento da criança e de sua auto-imagem, mas quando os pais não aceitam de imediato a deficiência de sua criança tanto o seu desenvolvimento quanto sua auto-imagem ficam comprometidos e conseqüentemente a relação entre pais e filhos (COLL,1995). Muitos pais tendem a negar a existência da deficiência, pensam, no entanto conscientemente e inconscientemente, que trata-se de uma situação transitória que a criança vai acabar superando, procurando recorrer, a novos diagnósticos, e a diferentes especialistas, com a finalidade de conseguirem uma informação positiva ou garantias de cura para um futuro próximo.
As relações dos genitores são particularmente importantes e podem atingir outros membros da família, especialmente a mãe, porque quando o envolvimento do pai com o filho deficiente diminui, delegando para a mãe a tarefa de cuidar da criança em suas diversas necessidades, ele pode, com isso, causar efeitos adversos em seu casamento. Os pais tendem a afastar de si o sofrimento, diminuindo seu contato com a família, o que freqüentemente resulta em divórcio.
Os pais tendem a preocupar-se com o sucesso, a aceitação social e a independência financeira do filho deficiente, gerando neles sérias crises quando é
descoberta a incapacidade ou deficiência da criança. Mesmo quando observam uma evolução, não se sentem gratificados, já que, sua revolta a rejeição é muito forte, necessitando de um longo processo de elaboração, para que possam colocar o filho em primeiro plano e não a sua deficiência (BRITTO, 1999).
No entanto há pais que reagem de forma superprotetora, vivendo o problema da criança como se fosse seu, tentando resolver, previamente, qualquer conflito que pudesse ser enfrentado por seu filho, também há outros, que aceitam o fato da deficiência de seu filho e procuram adaptar seus padrões educativos e interativos as características das necessidades especiais da criança (COLL, 1995). A família pode exercer o papel de terapeuta se souber trabalhar com seus dramas, trabalhando de forma direta seus sentimentos, e seus conhecimentos acerca da deficiência. Compartilhando-as abertamente e francamente, os quais não podem ser compartilhados sobre pressão, mas de forma livre e direta. Isso promoverá um conhecimento dos sentimentos que cada um tem em relação à criança com necessidades especiais, fazendo com que tenham ciência do comportamento e sentimentos dos membros da família, onde estes se tornaram mais atentos as mudanças ocorridas. Uma vez que os membros da família apresentarão respostas individuais à criança com necessidades especiais, isso depende diretamente do grau de relação exercida com a criança.
São direitos da família de portadores de necessidade especial: o direito à informação médica sobre o problema físico ou mental da criança, algum tipo de avaliação contínua em intervalos periódicos definidos e a uma explicação completa e lúcida dos resultados das descobertas, acesso às informações úteis, relevantes e específicas quanto ao seu papel no atendimento das necessidades físicas e emocionais da criança, conhecimento acerca de oportunidades educacionais para seu filho, acesso a recursos disponíveis na comunicação para assistência intelectual, emocional e financeira às necessidades da família, interação com outros pais de deficientes, direito de exercer seu crescimento pessoal como indivíduos únicos e distintos.
2.2- A Escola:
No momento em que as mudanças ocorrem de maneira muito rápida, certamente a mais rápida em toda a história da humanidade; num momento em que adquirimos amplos conhecimentos sobre o mundo físico, biológico, psicológico e sociológico, é preciso pensar e repensar intensa e profundamente o papel da escola no seu atendimento, de forma igualitária, não só ao estudante que nela se matricula, mas ao ser humano, que independentemente de sua idade cronológica, sexo, idade mental, condições emocionais e antecedentes culturais, nível social e credo a que pertença (MEC, 1995) possui um valor inerente a sua própria natureza e as suas potencialidades (MORIN, 1998). Embora esteja explícito na Declaração Universal dos Direitos do Homem que todo ser humano tem direito de reivindicar condições de aprendizagem e ação para desempenhar-se como pessoa e como membro atuante de uma comunidade, tais condições nem sempre têm sido oferecidas. Neste sentido, pode se observar um processo de exclusão em relação ao portador de necessidades especiais. Este tem ficado por descaso, preconceito, vergonha, falta de conscientização, e até mesmo despreparo, à margem da sociedade.
A Lei nº. 9.394 de 20 de dezembro de 1996, diz, no seu capítulo V, art. 58:

"...entende-se por educação especial, para os efeitos desta lei, a modalidade de educação escolar oferecida, preferencialmente, na rede regular de ensino, para educandos portadores de necessidades especiais (p. 196)...".

A educação especial trata-se de uma educação voltada para os portadores de deficiências como: auditivas, visuais, intelectual, física, sensorial, surdocegueira e as múltiplas deficiências. O Ministério da Educação e do Desporto utiliza a expressão, portador de necessidades especiais, para indicar pessoas portadoras de deficiência (mental, visual, auditiva, física e múltipla) e pessoas portadoras de altas habilidades e de condutas típicas (MEC, 1995). Isso nos leva a dimensionar a educação dos portadores de necessidades especiais no seu aspecto não só pedagógico, mas social e cultural, no sentido de favorecer o desenvolvimento de suas potencialidades, tornando-o capaz de participar e se integrar em sua comunidade.
Desde meados dos anos 90 a comunidade educacional discute as possibilidades de um projeto que vise à inclusão social, ou seja, educação para todos. O grande objetivo a ser alcançado é obter inclusão de todo e qualquer perfil de aluno, permitindo assim a interação dos alunos típicos com os alunos que possuem necessidades educacionais especiais.
A partir da resolução CNE/CEB N° 2, de 11 de Fevereiro de 2001, de autoria do Conselho Nacional de Educação, foram estabelecidas diretrizes para a educação especial da educação básica. Em linhas gerais, essa resolução estabelece que TODAS as entidades de educação básica são obrigadas a receber alunos com quaisquer necessidades especiais, sem distinção de qualquer ordem.
Os ditames da resolução 02/2001 abordam diversas questões. Inicialmente elas caracterizam as necessidades especiais em:
? dificuldades acentuadas de aprendizagem ou limitações no processo de desenvolvimento que dificultem o acompanhamento das atividades curriculares, vinculadas a uma causa orgânica específica, condicionadas a condições, disfunções, limitações ou deficiências;
? dificuldades de comunicação e sinalização diferenciadas dos demais alunos, demandando a utilização de linguagens e códigos aplicáveis.
A legislação dispõe de recursos para a operacionalização das adaptações necessárias para o atendimento desse perfil de aluno. Uma das possibilidades é a criação de um setor especial que possibilite o atendimento a todas as necessidades que o aluno portador de necessidades especiais venha a ter (art. 3°, parágrafo único). Outra possibilidade partiria de convênios com instituições de ensino superior, podendo ser desenvolvidos inclusive pesquisas e estudos de caso referentes ao processo de ensino, com o intuito de potencializar os profissionais e aperfeiçoar o processo educativo (art. 11°).
Também podemos encontrar no art. 12°, o texto que se refere à eliminação de barreiras arquitetônicas urbanísticas, barreiras de comunicações e criação de recursos de acessibilidade. Deste modo, todas as crianças devem receber o mesmo tipo de ambiente, condições físicas e psicológicas de ingresso nas escolas e no meio social, fazendo com que haja uma preparação de todos os profissionais que trabalham com a educação no sentido de colocar em discussão seus estereótipos e seus preconceitos para que saibam lidar com as diferenças presentes em sala de aula; para que saibam atender as expectativas de um mundo cada vez mais diversificado de crenças, valores, sexos e deficiências.
Trazer aquele indivíduo excluído socialmente para que participe dos aspectos da vida no sentido econômico, cultural, educacional, religioso, político, da saúde e assim por diante é inserir o indivíduo na sociedade. Porém é imprescindível a presença de um profissional da área da psicologia (o psicólogo) prestando apoio psicológico aos familiares dessas crianças portadoras de alguma deficiência antes, durante e depois da inclusão delas no meio escolar e social; prestar auxílio psicológico aos professores e orientadores para conseguirem lidar com as diferentes formas de ensinar e de assistência a essas crianças; e principalmente acompanhar o desenvolver desta inclusão junto com o portador de necessidades especiais para que não haja a exclusão e preconceito contra o mesmo. O profissional da psicologia tem embasamento teórico suficiente para auxiliar o portador de necessidades especiais e também de lidar com as dificuldades encontradas durante este processo, tanto para o da criança com o meio, quanto o da sociedade com a criança (BOCK, 2002).
Em todas as escolas desde públicas a particulares deveriam ter um profissional a disposição para as crianças portadoras de cuidados especiais. No caso do deficiente auditivo, uma pessoa que fale em libras para colaborar com a alfabetização desta criança; se for outra portadora de deficiência visual, alguém que lhe ensine a ler e escrever em Braille; para os que têm deficiências mentais também deveriam ter uma acompanhante para assessorá-lo no que for necessário, e para os portadores de deficiência física é mais do que visível a necessidade de rampas e corrimões para a segurança e acessibilidade dessas pessoas, para que essas crianças possam sentir-se seguras no ambiente escolar, possam comunicar-se e realmente incluírem-se no seio escolar. Porém a escola não deve ser pensada como fortaleza da infância, como instituição que enclausura seus alunos para melhor prepará-los. É preciso articular a vida escolar com a vida cotidiana; articular o conhecimento escolar com os acontecimentos do dia-a-dia da sociedade (BOCK, 2002). Deste modo, a compreensão da sociedade de que o sentido de integração e inclusão é importante para o desenvolvimento e para o bem estar do portador de necessidades especiais, incluí-lo significa trabalhar ele e a sociedade, juntos devem buscar o meio para conviver e solucionar as necessidades e esse trabalho ganha força nas dependências da escola.
Para um trabalho de inclusão efetivo não bastam, apenas, leis e as condições físicas é necessário olhar para o professor e fornecer a esse profissional, condições de conhecimento técnico, condições materiais e psicológicas, de modo a garantir um trabalho de inclusão significativo entre as crianças com necessidades especiais e as ditas normais e consequentemente na sociedade (SILVA, 2008).
Pela resolução 02/2001, o art. 18°, inciso 4° esclarece:
Aos professores que já estão exercendo o magistério devem ser oferecidas oportunidades de formação continuada, inclusive em nível de especialização, pelas instâncias educacionais da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
Diante de um alunado que apresente alguma deficiência, o professor não pode desconhecer o quanto é necessário valorizar as singularidades de cada criança para que o aluno as tenha respeitadas, quando considerado em relação ao seu ritmo e às suas características pessoais. Somente visualizando a criança portadora de necessidades especiais, dentro do parâmetro da individualização, é que se poderá contribuir, com ações concretas, para que a criança tenha assegurada a sua aprendizagem, no âmbito de suas possibilidades.
Partindo do pressuposto de que uma das ocupações mais importantes do homem é a de aprender e que esta função é uma grande tarefa durante a infância e na juventude (Kelly, 1965), cabe ao professor facilitar esta tarefa colaborando para que a criança e o jovem possam sentir-se menos discriminados, que tenham elevada a sua auto-estima e sejam capazes de reinterpretar o mundo como menos hostil e frustrante (MEC, l995).
O professor é o elemento chave na escola, no sentido de ser coadjuvante na tarefa de traçar os rumos da educação e do desempenho dos alunos que a freqüentam. Isto porque a contemporaneidade exige que ele tenha consciência de que lida com individualidades, com seres diferentes e originais, com múltiplas possibilidades. Nessa perspectiva, os alunos de uma classe não podem ser considerados como uma massa amorfa, sem identidade, sem nome. Conforme afirmativa de Silva (2001):
... é preciso que o professor compreenda que as individualidades encontram-se inseridas em um meio social, em permanente interação com seus pares, exercendo e recebendo influências diversas de todas as pessoas, do ambiente a que pertencem, do próximo e do distante, do micro e do macro contexto social (p. 51 ).

O professor é a figura central no processo de aprendizagem, pois além de perceber em sua classe crianças com deficiência, de condutas típicas ou de altas habilidades tem que estar capacitado, se não a lidar com elas, a encaminhá-las para que recebam atendimento adequado e tenham garantida a oportunidade de atingir e manter um nível satisfatório de aprendizagem. Esse professor deve estar aberto a desafios: saber, de uma forma especial, dar atenção a esses alunos; oferecer um currículo mais variado; programar trabalhos que atendam a singularidade de cada criança; ser criativo; ter habilidades diferenciadas; saber usar o bom senso, entre outros. Isto é de fundamental importância para afastar, quase sempre, os comportamentos agressivos e turbulentos, a timidez e a inibição. Ele deve ser o ponto de equilíbrio para que a criança vença o medo e enfrente desafios tendo a certeza de que não lhe faltará apoio. Assim, caminhando paralelamente com o professor, ela construirá a sua identidade pessoal desenvolvendo a independência e a autoconfiança, fruto de um trabalho objetivo, consistente e realista que se efetiva na ação integrada que favorece a evolução e o desenvolvimento dos indivíduos. É importante lembrar ao professor, que possui em sua classe crianças portadora de necessidades especiais, a importância da afetividade, aspecto que engloba e condiciona todas as dificuldades e problemas decorrentes da condição de ser uma criança especial. Se essa criança especial tem sua necessidade de afeto satisfeita, provavelmente saberá, de forma diferente, enfrentar suas dificuldades. O sentimento de segurança, de apoio, de sentir-se querida e amparada, por certo, reforçará a sua coragem, a sua força e a autoconfiança, embora sabendo-se e sentindo-se limitada na sua capacidade de estabelecer contato com o mundo e com as pessoas, ou mesmo, não sendo compreendida nas suas possibilidades de realização.
É relevante que os cursos de formação de professores, nos diferentes níveis, incluam em seus currículos disciplinas que possibilitem ao professor adquirir
conhecimentos nessa área, para que não só os objetivos da educação democrática
sejam atingidos e essas crianças possam receber orientações que possibilitem seu
desenvolvimento, mas, sobretudo, porque é significativo o contingente de alunos que precisam de uma orientação específica para vencer as dificuldades que suas limitações lhes impõe.
Segundo Mutschele (1996) a escola é um dos grupos sociais que por mais tempo, mantém contato sistematizado com indivíduos em desenvolvimento. Daí a sua responsabilidade em favorecer o processo da evolução através da ação integrante de todos os aspectos do viver, com a finalidade de assegurar a consistência e o equilíbrio pessoais.
Assim, conscientizando-se da importância de seu desempenho, de forma acertada, no atendimento a esses sujeitos, o professor estará contribuindo para que a escola se transforme num ambiente de socialização da criança portadora de necessidades especiais, tornando-se um elemento integrador não só de aprendizagens, mas de seres humanos que poderão ser capazes de se perceberem como pessoas e conviverem socialmente, livres do estigma da discriminação.

3- A Inclusão e Educação de Alunos com Necessidades Especiais:
3.1- A Inclusão do Aluno Autista:
Segundo Tanguaya (2000) desde o primeiro olhar para o rosto humano até a compreensão das emoções e ações dos outros e das regras que regem uma cultura, há uma grande caminhada. Infelizmente, nem todas as crianças chegam até aqui. O autismo parece ser o protótipo dessa situação, sendo classificado dentro dos Transtornos do Desenvolvimento. Há um atraso e um desvio no desenvolvimento das habilidades sociais e de comunicação, respostas comportamentais diferentes ao ambiente são típicas, maneirismos, resistências a mudanças e interesses e preocupações estranhos e sem justificativa. Diferentemente do que nos mostram os filmes e a mídia, dificilmente uma criança autista será muito inteligente, superdotada, ou algo do gênero. Estima-se que 70% dos indivíduos com transtorno autista têm funcionamento intelectual em nível de retardo mental. A taxa média de prevalência do transtorno autista em estudos epidemiológicos é de 15 casos por 10.000 indivíduos, com relatos de taxas variando de 2 a 20 casos por 10.000 indivíduos. No Brasil, ainda não se dispõe de estatísticas oficiais. Os indivíduos do sexo feminino tendem a estar mais gravemente afetados em relação ao sexo masculino.
Como deve ser tratada essa criança? A terapêutica pressupõe uma equipe multi- e interdisciplinar ? tratamento médico (pediatria, neurologia, psiquiatria e odontologia) e tratamento não-médico (psicologia, fonoaudiologia, pedagogia, terapia ocupacional, fisioterapia e orientação familiar), profissionalizante e inclusão social, uma vez que a intervenção apropriada resulta em considerável melhora no prognóstico. O sucesso do tratamento depende exclusivamente do empenho e qualificação dos profissionais que se dedicam ao atendimento dos autistas (TOLEDO, 2003).
Pensando dessa forma, basta aplicar essas medidas na prática para que esse aluno possa ter o amparo necessário. A nossa Constituição de 1988, bem como a Lei nº 7853/89 e o Estatuto da Criança e do Adolescente, por meio da Lei nº 8068/90, nos mostram que essa criança tem isso como direito. É interessante analisar, porém, como hoje, as políticas educacionais são contraditórias, e porque não dizer um tanto covardes.
Há na LBD/96 a sinalização evidente, ainda que dúbia, para a educação "preferencial" dos alunos com necessidades especiais na rede regular de ensino. Preferencialmente pode ser o termo-chave para o não cumprimento do artigo, pois quem ?dá primazia a? já tem arbitrado legalmente a porta da exceção (BEYER, 2006).
Antes de uma Lei que promove a inclusão escolar existir, deve-se analisar o contexto, proporcionar as medidas que apóiem as redes públicas de ensino. Não se deveria incumbir, simplesmente, essa tarefa à Instituição de ensino. Isso é o que nos recomenda, por exemplo, a Norma 6, das Normas Uniformes ? para a Igualdade de Oportunidades para as Pessoas com Deficiências ? Nações Unidas (ONU):
Os Estados devem reconhecer o princípio da igualdade, de oportunidades de educação (...) para as crianças, os jovens e os adultos com deficiência e deve cuidar para que a educação dessas se constitua como parte integrante do sistema de ensino.
Entretanto, o projeto político-pedagógico do nosso governo federal não assume essas implicações na operacionalização desse projeto.
Integrando esses pressupostos com a intenção do presente trabalho, podemos refletir sobre o que seria uma Escola que estaria preparada para receber um aluno autista:
? A limitação de 20 alunos para as classes que possuem alunos com necessidades educativas especiais; A presença de, no máximo, dois alunos com essas necessidades em cada classe;
? A presença de um professor de apoio para atuar junto à classe, como suporte de todos os envolvidos (Princípio da Bidocência);
? Estabelecer que esse professor seja sempre que possível parcial e proporcional à intensidade das limitações do aluno, procurando estimular a capacidade do professor regente de turma. (BAPTISTA, 2002);
? O desenvolvimento de uma avaliação compatível com o planejamento de avaliação contínua, coletiva, baseada no sujeito como parâmetro de si mesmo (se melhorou, como estava no início do processo, etc.);
? Além de possuir um profissional preparado, o professor, possa existir um amplo trabalho multidisciplinar, com médico, psicólogo, terapeuta ocupacional, pedagogos, psicopedagogos, enfim, uma equipe preparada para lidar com esse aluno.
De fato, com a inclusão escolar do aluno autista, não só ele estará ganhando, ao interagir socialmente, ao passar a aceitar mais o contato interpessoal, ao desenvolver uma postura mais disponível ao aprendizado e à descoberta; ainda estará ganhando a turma, pois poderão construir canais de comunicação com esse colega, melhorar a qualidade de interação, e acima de tudo, aprender com as diferenças.
3.2- A Inclusão do Aluno Surdo:
O sujeito surdo, como os demais deficientes, têm uma triste trajetória através da história. Na antiguidade, a doutrina da eugenia previa a "exposição" ou eliminação dos deficientes, considerados degeneração da raça humana e transtorno à sociedade. Os surdos eram considerados anormais, pois o normal era falar e ouvir para ser aceito. Assim, os mesmos, dependendo da etnia e do período em questão, eram mortos, presos ou internados. No século VI, com o direito romano, o Código Justiniano é o primeiro a classificar os surdos: surdo-mudez natural, surdo-mudez adquirida, surdez natural, surdez adquirida, mudez natural ou adquirida. A partir dessa divisão foram sendo determinados os espaços e tempos das intervenções no corpo surdo, as quais variam desde a total tutela até o pleno gozo de direitos, desde que a condição patológica tivesse sido superada e em nada interferisse no comportamento do sujeito surdo, que deveria ser similar ao dos que ouviam e falavam.
Com o advento da doutrina cristã, o princípio da caridade gerou tolerância. Os deficientes eram segregados, mas recebiam moradia e alimentação. A deficiência era, no entanto, ligada à expiação de pecados, levando à aplicação de castigos, confinação, torturas e toda sorte de crueldade aos mesmos. Os primeiros a considerarem os surdos foram monges da idade média, que os empregavam em tarefas manuais, mas ainda ignorando seu intelecto.
Na idade moderna inicia-se a investigação do problema. O ponto de vista válido passa a ser o da medicina. A partir do séc. XVI começa o debate sobre a integração social dos surdos, aparecendo, pela primeira vez, professores para surdos (inclusive professores surdos). Girodano Cardano (1501-1578) prova que surdos podem ser ensinados, ocorrendo então as primeiras tentativas nesse sentido. Mais tarde, Ponce de Leão, na Espanha, inicia um trabalho visando desenvolver a fala dos considerados surdos-mudos, atendendo à demanda de tornar crianças nobres com a deficiência aptas à herança legítima.
No século XVIII, na Alemanha, Samuel Heinick (1712-1789), considerado o maior educador de surdos até então, funda a primeira escola pública oralista. O abade Charles Michel L?Epée obtém na mesma época sucesso na educação formal de duas crianças surdas na França e transforma sua casa na primeira escola pública para surdos de seu país, utilizando a abordagem gestualista.
Em 1802, Jean-Marie Garpard Itard, médico, inicia trabalhos de treinamento auditivo e leitura labial. O oralismo é mais divulgado e aceito. Em 1880, no Congresso de Milão, Graham Bell, que inventou o telefone visando ampliar os sons (sua esposa tinha déficit auditivo), defende que a educação dos surdos deve ocorrer exclusivamente pelo método oral. Houve então a grande aprovação do modelo ouvintista, que pressupõe o treinamento dos surdos para agirem como ouvintes, além da repressão e perseguição de sua cultura e da sinalização.
O grande propósito da escola moderna era disciplinar e domar a selvageria que constitui os indivíduos; torná-los sujeitos produtivos e úteis ao nível individual e coletivo, então, no século XVIII acreditava-se que reunir os corpos surdos em instituições totalitárias tornava possíveis as ações do poder disciplinar e viabilizava a produção da docilidade e utilidade. Mesmo com toda a perseguição exercida pelo modelo oralista, no confinamento do convívio em instituições especiais, os surdos desenvolveram sua própria cultura e língua, se aceitando e definindo como um povo.
Em 1857, o Professor Francês Eduard Huet, vindo a convite de D. Pedro II, inaugurou no Brasil o Instituto Nacional dos Surdos Mudos. Priorizou a educação oralista, acreditando que era inútil ensinar surdos a escrever, já que a maioria da população era analfabeta. As meninas só tiveram acesso à instituição em 1932.
Observam-se, mesmo com toda a evolução no tratamento dado aos deficientes, os surdos nunca foram consultados nem tiveram oportunidade de decidir como seria sua própria educação. Essa é uma das maiores críticas dos teóricos sobre o assunto, pois as pessoas surdas identificam-se como tal por ter desenvolvido uma cultura própria através da língua própria, como ocorre em qualquer sistema lingüístico. A surdez é uma experiência extremamente visual. Daí a necessidade do convívio com outros surdos para o efetivo desenvolvimento do sujeito. Para Karin Lílian Strobel, a aplicação de métodos oralistas levou ao fracasso educacional dos sujeitos surdos através da história, pois os relegava à posição de doentes e retardados, com eternização da infância. Mesmo assim, há várias correntes de educadores e até de médicos e fonoaudiólogos que defendem o modelo exclusivamente oralista. Consideram que a língua de sinais deixa a criança "preguiçosa" para a fala e desaconselham os pais a procurar educação especializada, o que é um absurdo. Muitos pais não aceitam a condição especial dos filhos, privando-os de se desenvolver como sujeitos surdos.
A invenção das instituições de surdos, das escolas de surdos, das classes de surdos ou da escola inclusiva, embora variem em seus princípios, coloca o caráter relacional dos espaços pensados para a educação de surdos. Das instituições totalitárias, com o principio de higienizar a sociedade afastando das impurezas, à proposta da educação inclusiva atual, o caráter relacional do espaço passa pela distribuição dos alunos em classes constituídas por semelhança de déficit (classes de deficientes auditivos leves, classes de surdos moderados, classes de surdos severos, classes de surdos profundos) em salas de ensino individualizado e com espelhos para que crianças surdas possam imitar e ensaiar a emissão de sons, e mais recentemente, em salas constituídas por surdos que se assemelham em níveis de conhecimento e por idade ou em situação de inclusão em turmas de ouvintes, com ou sem a presença de interpretes. Mas, embora o cenário da educação dos surdos tenha sofrido redimensionamentos ao longo dos últimos séculos, as práticas pedagógicas parecem permanecer cristalizadas em suas representações sobre o sujeito surdo como anormal.
Há crianças que se adaptam e outras que não se adaptam ao uso de aparelho auditivo e à oralização, dependendo de cada uma e de como a questão é exposta. Portanto, o convívio com outros surdos é de vital importância para que o deficiente se aceite como tal e se identifique com uma comunidade semelhante, além do desenvolvimento da língua de sinais. Ao se aceitar, tudo fica mais fácil, e ele se sente finalmente inserido em uma sociedade e em uma cultura, feita para ele, que finalmente deixa de ser um "alienígena". É por isso que se defende amplamente que o surdo aprenda em escolas especiais para surdos.
Strobel faz grande crítica da política de inclusão de surdos, ressalta ainda que a LDB ignora a ressalva da Declaração de Salamanca, que defende uma escola específica para surdos, pois a escola regular os priva do direito à língua e cultura próprias. Ela vai ainda mais longe, alegando que os sujeitos surdos incluídos no processo educacional não se desenvolveram devido à imposição do ouvintismo, pois a difusão da língua de sinais é que permitiu o desenvolvimento do potencial do povo surdo. A inclusão forçada resulta na exclusão do processo educacional, uma vez que a realidade brasileira pressupõe professores despreparados para o desafio da inclusão surda. Do modo como o governo atual está lidando com a questão, a inclusão de surdos em escolas populares pressupõe a visão do mesmo apenas como deficiente. Tal inclusão é defendida por intelectuais sem experiência prática com classes surdas, ignorando as conseqüências desse processo para a identidade lingüística e cultural do aluno.
A verdadeira democracia implica no respeito às diferenças. A atual força a adaptação do surdo à classe ouvinte não o inclui, pois o surdo precisa do contato com outros surdos para se desenvolver. Strobel defende o direto do surdo ao estudo em escola especial e a luta por espaços de comunicação e atendimento adequado a esse público.
Quando a escola especial não for viável, como em municípios do interior, a escola regular precisa estar muito preparada para receber esse aluno especial. Necessita de recursos materiais, professor especializado e espaços extra-classe para convivência com outros surdos. Thoma concorda com Strobel, afirmando que a atual política de inclusão é questionada pela comunidade surda e por profissionais, defendendo a importância das escolas de surdos, que são espaços de aquisição e desenvolvimento de uma língua efetiva, promovendo a ampliação dos aspectos cognitivos dos sujeitos. As orientações do governo federal sobre as adaptações do currículo não dão conta da complexidade da inclusão de surdos entre ouvintes. Sendo a inclusão do surdo inevitável, alguns cuidados são muito importantes, como o atendimento psicológico para a auto-aceitação e a sala de recursos, assim como um espaço de convivência extra-classe com outros surdos. Aqueles com maior sucesso escolar são os com melhor condição familiar e financeira, que têm acesso à mais recursos e espaços de vivência surda. Por isso é tão importante estender-se o apoio às famílias de surdos menos favorecidas.
Rodrigues afirma que o professor precisa ter uma aula bem planejada e uma rotina de trabalho para conseguir lidar com uma turma de inclusão. Só assim o mesmo transmitirá a segurança necessária à turma. O atendimento à diversidade e às necessidades educativas especiais um enorme esforço no ajustamento de suas rotinas. Essas mudanças devem ser realizadas com assessoria e em cooperação. Mesmo sem a ajuda externa de especialistas, os professores de uma mesma escola têm condições de se ajudar mutuamente.
A maior de todas as dificuldades, que leva o aluno surdo ao fracasso escolar, é, no entanto, a falta de entendimento com o professor e vice-versa. Nesse sentido, a figura do intérprete é fundamental numa turma de inclusão com surdos. Ele funciona como mediador e incentivador da criança, que pode então apresentar um rendimento igual ao dos outros alunos.
O modelo bilinguista e o da Educação Total estão demonstrando maior sucesso, pois ensinam paralelamente em libras e português, além do ensino da fala e da leitura labial. Porém os mesmos têm sido aplicados quase exclusivamente em escolas especiais.
O povo surdo pede ainda a inclusão de disciplinas como teatro e poesia no currículo para proporcionar o acesso à cultura desde cedo, afinal, eles perdem muito por não ouvir. O uso extensivo das tecnologias existentes também se faz necessário, proporcionando um "upgrade" em sua aprendizagem.
A Lei nº. 10.436, de 24 de abril de 2002 oficializa a Libras como língua e dispõe sobre os direitos dos surdos, obrigando todos os serviços públicos a se prepararem para lidarem com os mesmos. É notável que esta última parte não está sendo aplicada. Se os alunos de classes regulares são obrigados a aprender uma língua estrangeira para enfrentar o mercado de trabalho, por que não ensiná-los a Libras para enfrentar o dia-a-dia e diminuir a exclusão do povo surdo? Por que não colocar lado a lado a função social e a comercial de uma língua extra?
3.3- A Inclusão Escolar do Cego:
A criança que enxerga estabelece uma comunicação visual com o mundo exterior desde os primeiros meses de vida porque é estimulada a olhar para tudo o que está à sua volta, sendo possível acompanhar o movimento das pessoas e dos objetos sem sair do lugar. A visão reina soberana na hierarquia dos sentidos e ocupa uma posição proeminente no que se refere à percepção e integração de formas, contornos, tamanhos, cores e imagens que estruturam a composição de uma paisagem ou de um ambiente. É o elo que integra os outros sentidos, permite associar som e imagem, imitar um gesto ou comportamento e exercer uma atividade exploratória circunscrita a um espaço delimitado.
A cegueira é uma alteração grave ou total de uma ou mais das funções elementares da visão que afeta de modo irremediável a capacidade de perceber cor, tamanho, distância, forma, posição ou movimento em um campo mais ou menos abrangente. Pode ocorrer desde o nascimento (cegueira congênita), ou posteriormente (cegueira adventícia, usualmente conhecida como adquirida) em decorrência de causas orgânicas ou acidentais. Em alguns casos, a cegueira pode associar-se à perda da audição (surdo-cegueira) ou a outras deficiências. Muitas vezes, a perda da visão ocasiona a extirpação do globo ocular e a conseqüente necessidade de uso de próteses oculares em um dos olhos ou em ambos. Se a falta da visão afetar apenas um dos olhos (visão monocular), o outro assumirá as funções visuais sem causar transtornos significativos no que diz respeito ao uso satisfatório e eficiente da visão.
Os sentidos têm as mesmas características e potencialidades para todas as pessoas. As informações tátil, auditiva, sinestésica e olfativa são mais desenvolvidas pelas pessoas cegas porque elas recorrem a esses sentidos com mais freqüência para decodificar e guardar na memória as informações. Sem a visão, os outros sentidos passam a receber a informação de forma intermitente, fugidia e fragmentária.
O desenvolvimento aguçado da audição, do tato, do olfato e do paladar é resultante da ativação contínua desses sentidos por força da necessidade. Portanto, não é um fenômeno extraordinário ou um efeito compensatório. Os sentidos remanescentes funcionam de forma complementar e não isolada.
A audição desempenha um papel relevante na seleção e codificação dos sons que são significativos e úteis. A habilidade de atribuir significado a um som sem perceber visualmente a sua origem é difícil e complexa.
A experiência tátil não se limita ao uso das mãos. O olfato e o paladar funcionam conjuntamente e são coadjuvantes indispensáveis. O sistema háptico é o tato ativo, constituído por componentes cutâneos e sinestésicos, através dos quais impressões, sensações e vibrações detectadas pelo indivíduo são interpretadas pelo cérebro e constituem fontes valiosas de informação. As retas, as curvas, o volume, a rugosidade, a textura, a densidade, as oscilações térmicas e dolorosas, entre outras, são propriedades que geram sensações táteis e imagens mentais importantes para a comunicação, a estética, a formação de conceitos e de representações mentais.
Uma demonstração surpreendente da capacidade de coleta e do processamento de informações pela via do tato é o tadoma, mecanismo de comunicação utilizado por pessoas surdocegas. Trata-se de uma comunicação eminentemente tátil que permite entender a fala de uma pessoa, ao perceber as vibrações e os movimentos articulatórios dos lábios e maxilares com a mão sobre a face do interlocutor. Cada pessoa desenvolve processos particulares de codificação que formam imagens mentais. A habilidade para compreender, interpretar e assimilar a informação será ampliada de acordo com a pluralidade das experiências, a variedade e qualidade do material, a clareza, a simplicidade e a forma como o comportamento exploratório é estimulado e desenvolvido.
A definição de baixa visão (ambliopia, visão subnormal ou visão residual) é complexa devido à variedade e à intensidade de comprometimentos das funções visuais. Essas funções englobam desde a simples percepção de luz até a redução da acuidade e do campo visual que interferem ou limitam a execução de tarefas e o desempenho geral. Em muitos casos, observa-se o nistagismo, movimento rápido e involuntário dos olhos, que causa uma redução da acuidade visual e fadiga durante a leitura. É o que se verifica, por exemplo, no albinismo, falta de pigmentação congênita que afeta os olhos e limita a capacidade visual. Uma pessoa com baixa visão apresenta grande oscilação de sua condição visual de acordo com o seu estado emocional, as circunstâncias e a posição em que se encontra, dependendo das condições de iluminação natural ou artificial. Trata-se de uma situação angustiante para o indivíduo e para quem lida com ele tal é a complexidade dos fatores e contingências que influenciam nessa condição sensorial. As medidas de quantificação das dificuldades visuais mostram- se insuficientes por si só e insatisfatórias. É, pois, muito importante estabelecer uma relação entre a mensuração e o uso prático da visão, uma vez que mais de 70% das crianças identificadas como legalmente cegas possuem alguma visão útil.
A baixa visão traduz-se numa redução do rol de informações que o indivíduo recebe do ambiente, restringindo a grande quantidade de dados que este oferece e que são importantes para a construção do conhecimento sobre o mundo exterior. Em outras palavras, o indivíduo pode ter um conhecimento restrito do que o rodeia.
A aprendizagem visual depende não apenas do olho, mas também da capacidade do cérebro de realizar as suas funções, de capturar, codificar, selecionar e organizar imagens fotografadas pelos olhos. Essas imagens são associadas com outras mensagens sensoriais e armazenadas na memória para serem lembradas mais tarde.
Para que ocorra o desenvolvimento da eficiência visual, duas condições precisam estar presentes:
? O amadurecimento ou desenvolvimento dos fatores anatômicos e fisiológicos do olho, vias óticas e córtex cerebral.
? O uso dessas funções, o exercício de ver.
Na avaliação funcional da visão considera- se a acuidade visual, o campo visual e o uso eficiente do potencial da visão.
A acuidade visual é à distância de um ponto ao outro em uma linha reta por meio da qual um objeto é visto. Pode ser obtida através da utilização de escalas a partir de um padrão de normalidade da visão.
O campo visual é a amplitude e a abrangência do ângulo da visão em que os objetos são focalizados.
A funcionalidade ou eficiência da visão é definida em termos da qualidade e do aproveitamento do potencial visual de acordo com as condições de estimulação e de ativação das funções visuais. Esta peculiaridade explica o fato de alguns alunos com um resíduo visual equivalente apresentarem uma notável discrepância no que se refere à desenvoltura e segurança na realização de tarefas, na mobilidade e percepção de estímulos ou obstáculos. Isto significa que a evidência de graves alterações orgânicas que reduzem significativamente a acuidade e o campo visual deve ser contextualizada, considerando-se a interferência de fatores emocionais, as condições ambientais e as contingências de vida do indivíduo.
A avaliação funcional da visão revela dados quantitativos e qualitativos de observação sobre o nível da consciência visual, a recepção, assimilação, integração e elaboração dos estímulos visuais, bem como sobre o desempenho e o uso funcional do potencial da visão.
Na escola, os professores costumam confundir ou interpretar erroneamente algumas atitudes e condutas de alunos com baixa visão que oscilam entre o ver e o não ver. Esses alunos manifestam algumas dificuldades de percepção em determinadas circunstâncias tais como: objetos situados em ambientes mal iluminados, ambiente muito claro ou ensolarado, objetos ou materiais que não proporcionam contraste, objetos e seres em movimento, visão de profundidade, percepção de formas complexas, representação de objetos tridimensionais, e tipos impressos ou figuras não condizentes com o potencial da visão.
O trabalho com alunos com baixa visão baseia-se no princípio de estimular a utilização plena do potencial de visão e dos sentidos remanescentes, bem como na superação de dificuldades e conflitos emocionais. Para isso, é necessário conhecer e identificar, por meio da observação contínua, alguns sinais ou sintomas físicos característicos e condutas freqüentes, tais como: tentar remover manchas, esfregar excessivamente os olhos, franzir a testa, fechar e cobrir um dos olhos, balançar a cabeça ou movê-la para frente ao olhar para um objeto próximo ou distante, levantar para ler o que está escrito no quadro negro, em cartazes ou mapas, copiar do quadro negro faltando letras, tendência de trocar palavras e mesclar sílabas, dificuldade na leitura ou em outro trabalho que exija o uso concentrado dos olhos, piscar mais que o habitual, chorar com freqüência ou irritar-se com a execução de tarefas, tropeçar ou cambalear diante de pequenos objetos, aproximar livros ou objetos miúdos para bem perto dos olhos, desconforto ou intolerância à claridade. Esses alunos costumam trocar a posição do livro e perder a seqüência das linhas em uma página ou mesclar letras semelhantes. Eles demonstram falta de interesse ou dificuldade em participar de jogos que exijam visão de distância.
Para que o aluno com baixa visão desenvolva a capacidade de enxergar, o professor deve despertar o seu interesse em utilizar a visão potencial, desenvolver a eficiência visual, estabelecer o conceito de permanência do objeto, e facilitar a exploração dirigida e organizada.
As atividades realizadas devem proporcionar prazer e motivação, o que leva à intencionalidade e esta desenvolve a iniciativa e a autonomia, que são os objetivos primordiais da estimulação visual.
A baixa visão pode ocasionar conflitos emocionais, psicológicos e sociais, que influenciam o desempenho visual, a conduta do aluno, e refletem na aprendizagem. Um ambiente de calma, encorajamento e confiança contribuirá positivamente para a eficiência na melhor utilização da visão potencial que deve ser explorada e estimulada no ambiente educacional, pois o desempenho visual está relacionado com a aprendizagem. É recomendável, portanto, provocar a conduta de utilizar a visão para executar todo tipo de tarefas, pois a visão não se gasta com o uso. Além disso, o professor deve proporcionar ao aluno condições para uma boa higiene ocular de acordo com recomendações médicas.
Conhecer o desenvolvimento global do aluno, o diagnóstico, a avaliação funcional da visão, o contexto familiar e social, bem como as alternativas e os recursos disponíveis, facilitam o planejamento de atividades e a organização do trabalho pedagógico.
4- A Educação Física como Disciplina Integradora:
Como transformar a deficiência em eficiência nas aulas de Educação Física?
O primeiro passo certamente está em reconhecer as diferenças culturais e motoras que caracterizam cada aluno em uma sala de aula. Saber que a beleza de uma enterrada no basquete para alguns pode ser materializada no acertar de uma cesta para outros. Ou seja, os professores de Educação Física devem admitir a existência de múltiplos movimentos corporais em determinados jogos, brincadeiras, esportes, etc., posto não existir uma norma do certo e do errado. Em virtude disso, as aulas de Educação Física devem se valer de materiais variados e dos conteúdos mais diversos possíveis.
O objetivo principal da Educação Física escolar não pode ser o da formação de atletas nas escolas, mas, sim, o da apropriação cultural de diversos movimentos lúdicos por todas as crianças, independentemente de sua habilidade motora. Sendo assim, podemos transformar uma aula quando estabelecemos outros objetivos gerais, quando modificamos o ambiente, suas regras e, pelo simples fato de valorizar e compreender as diferenças não como desigualdades, as quais precisam ser vivenciadas e experimentadas coletivamente.
Estar na escola é estar na multidão, nossa vida escolar é essencialmente coletiva tanto em seus relacionamentos, como em suas atitudes. Por isso, a Educação Física também deve se embasar em modelos coletivos de relacionamento, fato que está em consonância à criação da zona de desenvolvimento proximal exposta por Vygotsky (1993), que pode ser entendida, grosso modo, como a ampliação do campo de ações individuais possibilitadas pela intervenção mediativa de um sujeito mais experimentado em termos da referida tarefa.
Vygotsky (1993) destaca um papel essencial estabelecido pela cooperação no próprio desenvolvimento humano, pois, para ele, o indivíduo que consegue fazer hoje algo com a ajuda mediada, fará amanhã sozinho. Vygotsky (1995) redefine a rota do desenvolvimento psicológico em voga pelos modelos aritméticos e maturacionais, enfatizando o curso dinâmico do desenvolvimento humano, cercado por suas progressões, involuções, teses, antíteses e sínteses, enfim, mediados ativamente pela contradição.
Na coletividade, os portadores de necessidades especiais podem aprender a realizar tarefas de outras maneiras que não as suas próprias. Melhoram os sentidos do tato, visão, olfato, tal como se orientam de forma mais coesa no espaço das atividades, o que gera um maior domínio corporal e o desenvolvimento muscular considerado de forma global. Todavia, é importante ressaltar que todas essas alterações também se dão nas crianças tidas por "normais", as quais ao experimentarem a diferença modificam sua auto-relação com seu corpo. Em virtude deste elemento, Vygotsky (1987) destaca que apenas conhecendo o outro posso me conhecer, ou seja, o processo de inclusão dos portadores de necessidades especiais no ensino regular traz benefícios para todos os alunos e alunas envolvidos no processo escolar devido à amplificação do sistema cultural, e não apenas aos portadores destas necessidades.
Mediante o contato com nosso corpo conhecemos o universo, ampliamos nossa visão de mundo e a própria percepção auto-identitária. O corpo não é apenas sede de castigos e proibições, é fonte de vivência, de sabedoria, de conhecimento e apropriação cultural, devendo ser valorizado constantemente nas aulas de Educação Física. Segundo Daólio (1995) o homem, por meio de seu corpo, vai assimilando e se apropriando dos valores, normas e costumes sociais, num processo de incorporação. Diz-se correntemente que, um indivíduo incorpora algum novo comportamento ao conjunto de seus atos, ou uma nova palavra ao seu vocabulário ou, ainda, um novo conhecimento ao seu repertório cognitivo. Mais do que um aprendizado intelectual, o indivíduo adquire um conteúdo cultural, que se instala no seu corpo, no conjunto de suas expressões. Em outros termos, o homem aprende a cultura por meio de seu corpo.
A ampliação de nossos movimentos corporais, que deve ser garantida pela Educação Física, possibilita uma melhor qualidade de vida e compreensão crítica da própria realidade cultural, sendo que no caso dos portadores de necessidades especiais suas deficiências devem ser transformadas em eficiências. Assim, o andar rápido que para a criança aparenta ser normal e uma tarefa extremamente fácil, para o deficiente mental é uma atividade de difícil resolução, cuja concretização deve ser vista com grande sucesso, tal qual a enterrada em um jogo de basquete. Mediante a isso, não podemos nos esquecer que a eficiência não deve na escola ser estabelecida em termos de alto rendimento ou anexa à norma, mas como um processo que leva em conta a execução de uma tarefa em relação ao seu ambiente e as capacidade e limitações manifestas por cada sujeito em particular, portanto, não é um processo quantitativo, mas essencialmente qualitativo.

CONCLUSÃO:
Chega ao fim este trabalho destacando-se que a noção de deficiência aponta, sobretudo, para sua complementação dialética, a citar, a superação do defeito por vias e mecanismos auxiliares. Aqui os caminhos são feitos pelas possibilidades e não pelas limitações históricas. Esta nova consideração da deficiência aponta sobre a própria conceituação da deficiência. Será mesmo que ela está no corpo dos portadores de necessidades especiais, ou na forma monocultural que enxergamos a realidade, cuja diferença é vista como defeito, algo a ser corrigido, um equívoco da natureza? E quando é direcionado as análises para a escola, não é transmitindo a incapacidade de criar métodos para a superação das deficiências para o próprio deficiente? Uma resposta a estas duas perguntas é encontrada nas seguintes palavras de Vygotsky (1995, p.45):
É um equívoco ver na anormalidade só uma enfermidade. Na criança anormal nós só vemos o defeito e por isso nossa teoria sobre a criança, o tratamento dado a ela se limita a constatação de uma porcentagem de cegueira, surdez ou alterações do paladar. Detemos-nos aos gramas de enfermidade e não notamos os quilos de saúde. Notamos os defeitos e não percebemos as esferas colossais enriquecidas pela vida que possuem as crianças que apresentam anormalidades.

Coerentemente, é fundamental destacar que o aspecto chave da aprendizagem está na inter-relação social coletiva. Sem o contato com o coletivo, as deficiências apresentadas pelos portadores de necessidades especiais tendem a se agravar ainda mais. Sem mediação da diferença, a homogeneidade impera nas relações sociais. Logo, se existisse algo que pré-determina o destino dos portadores de necessidades especiais, não são seus defeitos, mas, sim, o papel de exclusão que a sociedade lhes outorga, impedindo-os de desenvolver suas potencialidades e as compensações necessárias para a superação de seus defeitos, ou melhor, de seu desenvolvimento diferenciado.
Entretanto, enfatiza-se a atuação do professor, que depende, entre outras coisas, de uma ação vigorosa do Governo, para expandir as políticas educacionais para que as crianças, sobre as quais o trabalho é realizado, sejam beneficiadas, uma vez que inúmeras disparidades existem no que diz respeito ao atendimento aos portadores de necessidades especiais em diferentes regiões, estados e municípios, tendo em vista o Sistema Brasileiro de Ensino. Todavia, cabe também registrar que, analisando o resultado estatístico oferecido pelo censo escolar em 2002, constatou-se que, 24,7% das crianças portadoras de necessidades especiais recebiam atendimento especializado na escola e que em 2006, o percentual de atendimento atingiu 46,4% (www.inep.gov.br). Pelos dados apresentados, observa-se que a atenção aos direitos dos portadores de necessidades especiais nas escolas brasileiras apresentou uma sensível evolução, junto aos esforços das entidades governamentais e também da sociedade como um todo. Pelo próprio objetivo da educação especial que, fundamentalmente, visa oferecer à criança portadora de algum tipo de excepcionalidade, atendimento específico a sua necessidade, levando em consideração suas diferenças inter-individuais e intra-individuais, a referência à necessidade de capacitação dos docentes, no âmbito da educação especial, é de fundamental importância, no sentido de que lhes seja oferecida formação pedagógica e didático-metodológica que os possibilitem atender a essas crianças e transformar a sala de aula num ambiente propício à aprendizagem. Assim sendo, é preciso que se de atenção, sobretudo, ao currículo dos cursos de formação de professores, sejam eles de ensino médio ou de nível universitário, no sentido de imprimir maior consistência à formação docente no que diz respeito à educação especial, o que por certo, facilitará o trabalho com a criança portadora de necessidade. O que tem acontecido é que em inúmeras escolas, o professor acaba aprendendo na prática, com a didática do "aprender a fazer fazendo" ou, o que é muito pior, nada faz para que a criança se desenvolva de acordo com suas necessidades, o que representa uma omissão educacional inadmissível (SILVA, 2001).
Conclui-se ainda que em todas as escolas desde públicas a particulares deveria haver um profissional a disposição para essas crianças. No caso do deficiente auditivo, uma pessoa que fale em libras para colaborar com a alfabetização; para as portadoras de deficiência visual, alguém que lhe ensine a ler e escrever em Braille; para os que têm deficiências mentais também deveriam ter uma acompanhante para assessorá-lo no que for necessário e por último, não mais importante, aos portadores de deficiência física já está mais do que visível a necessidade de rampas e corrimões para a segurança e acessibilidade dessas pessoas.
O foco do trabalho educacional deve ser o potencial de cada um e não a deficiência em si, pois de certa forma, começar a diversificar a sala de aula quebra um modelo de educação padronizado, no qual os professores estão acostumados a lecionar.
Reconhece-se ainda o papel do psicólogo na inclusão social dos portadores de necessidades especiais, sendo o de auxiliá-los a praticar o enfrentamento e a lidar com a exclusão, tentando introduzir principalmente a afetividade no cotidiano dessas pessoas. Para isso, dando assessoria as famílias, assim como os profissionais da educação, no trabalho de educar e incluir o portador no seio social.


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