Cuba pode ser uma Ilha geograficamente, no entanto representa um continente inteiro de diversas constituições e representações culturais, sociais, ideológicas e políticas.

Historicamente a ilha é marcada por diversos fenômenos e não restringe-se apenas ao período revolucionário de 59, a resistência começa já com os povos indígenas locais (Hatuey e Guama) sendo queimados por não curva-se ao poderio de Velásquez e da grande instituição romana a qual narra Frey Bartolomé numa luta árdua contra um Império praticamente invencível; ora pelos negros escravizados exigindo liberdade na Conspiração de Escalera, a qual Plácido recita seus versos sendo fuzilado: “y aun essa misma nada os obedece/Pues de ella fue la humanidade creada”; ora nas montanhas em Sierra Maestra com 300 homens liderados por um nacionalista lutando contra uma ditadura sangrenta de Fulgêncio Batista.

Se a riqueza natural é escassa do ponto de vista material, o mesmo não se aplica aos verdadeiros oásis paisagísticos e criatividade na produção de bens e consumo como o famoso tabaco cultivado desde o primitivismo absoluto e enraizado no modo de vida desta população conhecido e reconhecido no mundo todo, o famoso charuto cubano. Desde o Sistema de Flotas e a consequentemente abertura portuária possibilitou para o mundo o conhecimento não só de uma natureza exuberante mais também de um potencial turístico que ao lado do tabaco é a fonte de riqueza desta população até hoje.

A mestiçagem floresceu de maneira harmoniosa e ao mesmo tempo sangrenta deixando suas marcas temporais e genéticas através dos traços indígenas, africanos e europeus formando assim a identidade nacional cubana, algo que possibilitou o impacto direto na vasta produção artística, literária, cinematográfica e revolucionária. Um grande “Pez Rojo”, como pinta o modernista Fabelo.

Os líderes figuras sempre reverenciadas como costumeiramente em toda américa-latina, sendo que não há como discorrer sobre este continente sem relacioná-lo a influência direta de Cespedez, Martí e Fidel neste processo todo. Um processo de luta e independência contra a imposição hegemônica imperial de uma metrópole que causou por diversos séculos a miséria, exploração e subjugamento dos povos americanos colocando à margem do processo, condenando ao subdesenvolvimento, impondo uma narrativa incapaz de representar os verdadeiros fatos e acontecimentos nesta história épica latino-americana ou apenas Americana, a qual até hoje não só os cubanos tentam se desvencilhar, porém sempre representaram um norte na questão.

A igualdade sempre por vezes sacrifica a liberdade, ou vice-versa, como demonstrada nas duas revoluções (francesa ou americana) que influenciaram todas sociedades do mundo, inclusive na Caribenha numa espécie de Salsa da qual narra Carpentier em suas novelas. O apelo de um povo vivendo pelo big-stick, Emenda Platt, sobre a doutrina Monroe fazia deste lugar criminalizado e desigual conforme denunciava o suplemento Lunes de la Revolución, revelando o apelo por ideais mais igualitários da qual Cabrera Infante narrou nas suas novelas e o mesmo tempo numa espécie de “Mea Cuba”, o mesmo perguntou-se depois qual era o preço a ser pago de um povo que não conhecia o mundo? “Así como en La Paz como en la guerra” ou até hoje não conhece? Cabrera revela estes subterrâneos escuros “Três tristes tristes” e morre no exílio geográfico como o primeiro poeta romântico da América Heredia: “Sin pátria, sin amores/solo miro ante mí llanto y dolores…” neste mesmo contexto de exploração que a Coroa Espanhola praticava conforme também discorreu o primeiro periódico El Habanero do maestro cubano Professor Filósofo Felix Varela, sempre propondo e buscando alternativas neste grito por vezes alto ao ponto de haver sangue, mas também por vezes baixos, porém não inaudíveis.

O poder colonial dizimou os povos originários nos primeiros 100 anos e dispersaram os africanos de suas terras para compulsoriamente e violentamente morrer sem deixar sua marca na narrativa vencedora, num espaço dual como mostrado na novela e heroína do povo cubano, Cecilia Valdéz, porém tudo está enraizado em cada metro quadrado da “Ilha de Colba.”

Não é só o Ajiaco (cocido de carnes, tubérculos y vegetales) ou Casabe (torta de yuca) que está enraizado na alimentação cubana, a resistência e a luta também faz parte deste cardápio recheado em uma apresentação sincrônica e ao mesmo tempo complexa interiormente e exteriormente encontrada dentro da e na música, dança, arte, literatura e do cinema. O denominador comum, se houver, é o engajamento daqueles que fizeram e fazem desta imensa produção cultural ser o que é.

Não há apenas uma forma de traçar e discorrer os caminhos que Cuba trilhou, impossível também é prever o que possa vir desta potência intelectual revolucionária, pois sua representação é e continuará sendo uma personificação do continente americano. Nesta grande peça onde o palco é distribuído de forma injusta, por vezes autoritária, revelando-se neste cenário a incapacidade não de resistência e intelectual, mas de forma subjugada a uma consciência dupla forjada prendida e pretendida por aqueles que não querem que pensemos por nós mesmos autonomamente de forma a destruir o construto geográfico provinciano.

Em “Verso Simplici”, aprisionado en “El Presidio Político”, este país do Caribe mostra que “Nuestra América”, pode ser ainda uma nação apenas, se soubermos como disse Martí en In Hardman Hall, Nova York, 1890: “En el lado del deber” ou “un grano de poesía basta para perfumar todo um siglo...”