Resumo

            Este artigo tem a finalidade de discutir a existência da escola como meio educativo da sociedade global, pois é considerada pela pedagogia ideológica como uma necessidade. Aqui, a escola é considerada como meio educativo que materializa a ideia de desvio cultural: para preparar a criança para a vida social, é preciso começar por afastá-la da sociedade. A pedagogia ideológica interpreta, portanto, a especialização institucional da escola à luz da ideia da corrupção. Compreendam-me bem: não digo que a escola foi criada para responder aos desejos dos sistemas pedagógicos teóricos. Mas, o pensamento pedagógico reinterpreta esta instituição social, que é a escola, integrando a ideia de escola à problemática pedagógica e fazendo dessa um meio destinado a proteger a criança da corrupção social. Assim, definida pela teoria pedagógica, a escola, continua a responder às necessidades sociais que a fizeram nascer, pensou-se a si mesma e organizou-se num sentido conforme os objetivos que lhe eram atribuídos pela pedagogia: ela se deu como fim explícito, proteger a criança da corrupção e colocar em ação o desvio cultural.

Palavras-chave: Escola. Pedagogia. Corrupção. Sociedade. Sistemas.

 

Abstract

           This article aims to discuss the existence of school education as a means of global society, it is considered the ideological pedagogy as a necessity. Here, the school is considered as a means of education that embodies the idea of ​​cultural bias: to prepare the child for social life, we must begin to remove it from society. A teaching ideological interpretation, therefore, the school's institutional expertise in the light of the idea of corruption. Understand me well: I do not say that the school was created to meet the wishes of education systems theorists. But the pedagogical thought reinterprets this social institution, which is the school, integrating the idea of ​​school teaching and making the issue of a means to protect the child's social corruption. Thus, defined by the pedagogical theory, the school continues to meet the social needs that gave birth, she thought to herself, and organized in a manner consistent with the goals that you were assigned by pedagogy: she gave as an explicit order, protecting children from corruption and put into action the cultural bias.

Keywords: School. Pedagogy. Corruption. Company. Systems.

 

A escola como meio fechado destinado a proteger a criança

            A existência da escola como meio educativo da sociedade global é considerada pela pedagogia ideológica como uma necessidade. Com efeito, a sociedade adulta é uma ameaça constante de corrupção: ou como pedagogia tradicional – leva o indivíduo a seguir essa inclinação natural para o mal que o caracteriza: ou – como pedagogia nova – corre o risco de fazê-lo perder sua bondade natural. A melhor seria reformar a sociedade, a fim de que ela deixe de ser fonte de corrupção.

            Os grandes pedagogos, de Platão a Dewey, passando por Rousseau, Alain e muitos outros, ocupam-se em definir uma sociedade ideal. Mas, esperando a realização da sociedade ideal, e para apressar seu advento, é especialmente proteger a criança da corrupção adulta. Com efeito, a criança em função de sua fraqueza, está particularmente exposta a esta corrupção que sempre espreita a natureza humana. O mundo adulto pode apenas corromper a criança; mas, é preciso, portanto, afastá-la desse mundo e criar um meio pedagógico autônomo, fechado: a escola. Protegida pela escola, a criança poderá adquirir conhecimentos e desenvolver as faculdades que lhe permitirão inseri-se na vida social adulta sem ceder às tentações. A ideia de preparação para a vida social por um desvio cultural, implica assim, a de meio educativo fechado, protegendo a criança e preparando-a para um confronto para o qual ainda é demasiadamente fraca. A escola é o meio educativo que materializa a ideia de desvio cultural: para preparar a criança para a vida social, é preciso começar por afastá-la da sociedade.

            A pedagogia ideológica interpreta, portanto, a especialização institucional da escola à luz da ideia da corrupção. Compreendam-me bem: não digo que a escola foi criada para responder aos desejos dos sistemas pedagógicos teóricos. A escola, seja a dos escribas mesopotâmicos ou aquelas das cidades gregas, tinha inicialmente por objetivo transmitir um saber teórico e fazer a iniciação de certas práticas. Historicamente, a escola satisfaz, de início a necessidade inicial de domínio e transmissão das técnicas da escrita, da leitura e do cálculo.

            Mas, o pensamento pedagógico reinterpreta esta instituição social, que é a escola, integrando a ideia de escola à problemática pedagógica e fazendo assim dessa um meio destinado a proteger a criança da corrupção social. Assim, definida pela teoria pedagógica, a escola, continua a responder às necessidades sociais que a fizeram nascer, pensou-se a si mesma e organizou-se num sentido conforme os objetivos que lhe eram atribuídos pela pedagogia: ela se deu como fim explícito, proteger a criança da corrupção e colocar em ação o desvio cultural. O internato cultural tornou-se  o ideal do modelo pedagógico, ideal que os pedagogos se esforçaram por realizar cada vez que o puderam.

            Mas o tema da clausura da escola jamais foi tão completamente teorizado e colocado em prática como pelos jesuítas, do fim do século XVI à metade do século XVIII. Os colégios dos jesuítas merecem a nossa atenção por um duplo motivo: por um lado, desenvolvem-se ao mesmo tempo o interesse pela infância, se afirma na sensibilidade ocidental (século XVIII), o que mostra bem a ligação entre a concepção de infância e a ideia de clausura da escola; por um lado, oferecem um primeiro modelo do que tornarão mais tarde nossas escolas, colégios e liceus.

            O internato dos jesuítas, que é muito estrito, esforça-se por isolar ao máximo a criança com a vida social. As saídas do colégio são muito raras e vigiadas.

            As férias são muito curtas: uma a duas semanas nas classes inferiores, três semanas a um mês no máximo, para os mais velhos; as crianças mais novas são as mais ameaçadas pela corrupção e só devem, portanto, ter com a sociedade contato tão reduzido quanto possível.

            Certamente, tudo isso não é natural. Mas é precisamente porque esses métodos são antinaturais, mesmo os jesuítas lhes concedendo grande valor pedagógico. Procuram criar um mundo inteiramente artificial, isto é, controlável em sua totalidade. A pedagogia dos jesuítas não é uma simples curiosidade histórica. Influenciou profundamente a organização escolar das sociedades ocidentais e pode-se considerar o colégio dos jesuítas como o protótipo das escolas ordenadas à pedagogia tradicional.

            A escola tradicional é um meio fechado que procura proteger a criança ao mesmo tempo contra a sociedade corrompida e contra a corruptibilidade interna da natureza humana. Não se baseia nos interesses da criança, mas, combate, ao contrário, seus impulsos naturais. Desvia-se, portanto, voluntariamente da realidade social e da experiência infantil e esforça-se em substituí-las pela experiência de uma realidade propriamente escolar.

            A escola tradicional coloca assim em aplicação todos os grandes temas da pedagogia ideológica: desdobramento da natureza humana, cultura concebida como purificação, luta contra si mesmo, elevação na direção dos grandes modelos humanos; distinção da sociedade e da sociedade ideal, entre outros. Não é por erro pedagógico, mas, bem ao contrário, por coerência pedagógica, que a escola tradicional volta às costas para a vida, despreza as necessidades imediatas e a experiência da criança, organiza-se em meio artificial, substitui o conhecimento da realidade pelo das regras e propõe à criança temas de exercício sem relação com sua vida cotidiana. A escola tradicional não esquece a vida, ela a realça.

            Mas, não se deveria crer que a ideia de clausura escolar esteja unicamente ligada à pedagogia tradicional. Toda pedagogia que coloca os problemas educativos em termos de corrupção é levada a conceber a escola como meio que se isola da sociedade para proteger a criança. Também se encontram de novo o tema e o fato da clausura escolar na pedagogia nova. Historicamente, as escolas formam quase sempre internatos, nos quais a vida se organizou segundo princípios muito diferentes dos que reinavam na sociedade global. A pedagogia nova quer respeitar as necessidades e os interesses naturais das crianças, que a sociedade procura sempre sufocar. Para ela, a corrupção é perda da inocência e da plasticidade fundamentais na infância no contato com a sociedade.

            A escola nova organiza-se, portanto, também ela, para proteger a criança da sociedade. A escola deve deixar exprimir-se essa natureza infantil que a sociedade não respeita. A escola nova não volta as costas para a vida; quer, ao contrário, remontar às fontes profundas da natureza e da vida humana. Mas, na medida em que considera que estas fontes estão esgotadas na vida social adulta, também constrói um meio escolar muito diferente do meio social dos adultos. A escola nova pretende ser natural com relação à criança; mais isso a obriga a ser artificial com relação à sociedade global. As motivações e os exercícios escolares são, portanto, na escola nova como na escola tradicional, muito diferentes das motivações e dos trabalhos que têm efetivamente curso na sociedade adulta: nela a expressão é livre, a sexualidade bastante tolerada, nela a cooperação reina entre as crianças, nela as atividades físicas e estéticas ocupam lugar importante.

            Enfim, a escola nova, como a escola tradicional representa um mundo muito diferente da sociedade adulta. E não poderia ser de outra maneira, uma vez que se pensa educação como realização da essência humana e luta contra a corrupção.

            A escola tradicional e a escola nova são, portanto, todas duas, meios fechados a proteger a criança. Entretanto, a clausura escolar não tem os mesmos sentidos nos dois casos, pois sua significação está ligada à interpretação da natureza humana. A clausura tradicional delimita um meio regido por medidas disciplinares que visam a desraigar o mal da natureza humana. A vigilância constante da criança nela é pesada, vivida como opressiva, e considerada frequentemente como manifestação do autoritarismo dos adultos. Por isso, a escola tradicional é apreendida como escola-prisão, escola-caserna. A clausura da escola nova cria, ao contrário, um espaço de liberdade no qual a criança é convidada a se espontânea e a exprimir-se livremente. Desse modo, a escola nova é vivida como livre comunidade. Entretanto, a escola nova não renunciou à educação vigiada pela criança; nela, a vigilância toma somente outras vias, de tipo psicológico. O educador procura conhecer cada aluno, decifrar as manifestações do inconsciente de cada um; observa o comportamento das crianças nos cursos de recreação; utiliza a expressão livre da criança pra melhor controlar sua evolução psicológica: a criança é livre, mas não está em liberdade vigiada. Meio fechado isolado de uma sociedade corrompida, a escola assegura indissoluvelmente funções de proteção e vigilância.