A Era dos Idiotas

Por Felipe Milano Riveglini | 18/08/2014 | Sociedade

           Chegamos ao século XXI alcançando um paradigma inovador, conseguimos nos tornar um bando de idiotas. Talvez essa afirmação pareça um tanto quanto agressiva, mas analisemos com profundidade.

            O termo idiota vem do grego – idioetes – o indivíduo que abdica dos benefícios de uma vida voltada para o coletivo e centra-se em si. É, em síntese, o clássico “mito de Narciso”. Tomemos essa definição como parâmetro de reflexão. Estamos em uma era de redes sociais, o que deveria ser um sinal de troca ampla e constante e, logo, de convívio social. A questão, no entanto, não é tão simples quando pensamos a prática de tais redes.

            As redes sociais passaram de espaço onde encontro pessoas com quem me identifico, para a condição de vitrines dos indivíduos. Não há tanto o compartilhamento de ideias, há um predominante compartilhamento de imagens ligadas à apresentação das pessoas tal qual um produto a ser consumido, produto este que se vende a partir de sua intimidade.

            Intimidade, aliás, é um tema que merece reflexão. Afinal, o que é intimidade? Em termos gerais, define-se intimidade como tudo aquilo que temos, pensamos e fazemos de modo solitário, são nossos segredos, são nossas preciosidades. A intimidade é aquilo que não divulgo, ou que divulgo apenas para pessoas escolhidas sob critérios muito rígidos.

            Assim, uma declaração de amor que um namorado faz a uma namorada é algo que deve ficar entre os dois, é íntimo, assim como a saudade no dia dos pais que alguém possa sentir do pai falecido, trata-se de uma dor que merece ser compartilhada, mas entre aqueles com quem se tem intimidade para fazê-lo.

            Frente às redes sociais, o critério de intimidade morreu, ou melhor, a intimidade, que antes tinha apenas função ao indivíduo, passou a ter função social, e tal função está associada à uma constante necessidade, vangloriar-se.

            O ato de se vangloriar associa-se ao princípio central da vaidade, a exposição por vaidade, mesmo que seja às custas da perda da intimidade. Assim, vaidade, intimidade e vanglória, criam uma necessidade de glorificação pautada nos olhares alheios, havendo um deslocamento do desejo de si para o olhar do outro. É uma espécie de terceirização da satisfação.

            Estamos, portanto, vivendo na contra-mão do estilo grego. O idiota, digno de marginalização na Grécia Antiga, é hoje a regra. A era dos idiotas está instaurada.

            Um dado ainda mais sério é uma espécie de inversão dos paradigmas em torno das referências, pois ao longo da História a referência dos mais novos sempre foi os mais velhos. Mesmo que isso tenha começado a mudar a partir dos anos 1950, é hoje, no século XXI das redes sociais, que a coisa se transforma em sua essência. O critério etário não é mais determinante, por vezes não é se quer relevante. Jovens ocupam hoje lugares que eram no passado por direito de pessoas mais velhas.

            O que isso traz de assustador, é o fato de que as redes sociais são espaços criados e povoados pelos jovens, mas que abrem suas portas aos mais velhos. Estes, porém, apenas existem nas redes se assumirem o comportamento dominante. Em outras palavras, estamos vivendo uma época em que o jovem é a referência do mais velho.

            Hoje os mais velhos quebram suas intimidades por vaidade e glorificação. Os idiotas do século XXI contaminam em escala epidêmica aos remanescentes do século XX, o que é compreensível, haja vista que a alternativa a assumir o papel de idiota é sentir a dor do exílio e do esquecimento. Mas assim é o ser humano, precisa de reconhecimento, mesmo que o reconhecimento seja feito por um bando de idiotas.