A ERA DA PÓS-VERDADE E FAKE NEWS

Todos os anos, a Oxford Dictionaries – departamento da universidade de Oxford encarregado pela produção de dicionários – escolhe uma palavra para ser “A palavra” da língua inglesa, em 2016, a expressão elegida fora post-truth ou pós-verdade.

O termo utilizado pela primeira vez em 1992, pelo dramaturgo sérvio-americano Steve Tesich, tem sentido de “descrever a situação, na qual, na hora de criar e modelar a opinião pública, os fatos e/ou objetivos têm menos influência que os apelos às crenças pessoais”, além disso, o uso da palavra cresceu cerca de 2.000% em 2016, isso porque, a pós-verdade saiu do patamar periférico para se tornar central no espaço político.

Dois casos políticos recentes, a eleição de Donald Trump nos Estados Unidos e a campanha do Brexit a favor da saída do Reino Unido da União Europeia, salientaram duas características predominantes que envolvem a pós-verdade, a primeira é que já sabemos que a desonestidade é algo teoricamente “comum” na atual conjuntura, o que impressiona agora é a resposta da sociedade que antes abominava, mas hoje aceita e convive com mentiras “naturalmente”, isso ocorre pelo poder de persuasão do apelo sentimental utilizado pelos políticos. A segunda característica é o total desinteresse por parte dos políticos de aparentar simpatia aos seus eleitores, não há consideração em convencer, talvez seja isto que torna a mentira mais real.

O uso indevido, ou melhor, o uso devido da mentira para tocar os sentimentos das pessoas, é o cultivo semeado para a proliferação de fake news – termo neologista, para referir-se a notícias fantasiosas, falsas e fabricadas –, fato esse que ocorre há tempos, porém com as novas tecnologias, como por exemplo, a internet que com suas tantas redes sociais, desencadeou digamos que um surto, através dos sistemas de big data – manipulação de dados – cria uma opinião hegemônica ou seja, uma pessoa receberá somente informações que ela se identifica.

O Brasil é um dos países que mais sofre com essas duas táticas políticas, isso porque, como já foi visto, a população brasileira é extremamente ignorante tanto em relação a si mesmo, quanto ao mundo ao seu redor. É o que diz a pesquisa realizada no final de 2017 pelo Instituto IPSOS Mori, a respeito da taxa de ignorância sobre a realidade em 38 países diferentes, o Brasil se encontra na preocupante vice-liderança da lista elaborada, perdendo apenas para África do Sul. Foram utilizadas como base para tal resultado, questões sobre diversos assuntos pertinentes ao momento do país, como por exemplo, saúde, segurança, imigração e religião. Ainda que tais resultados não possam ser equiparados, porque as perguntas foram diferentes, em 2016, o Brasil se encontrava na sexta posição deste ranking, o que demonstra uma grande piora no espaço-tempo de um ano.

Podemos confirmar tal fragilidade, com a atual situação política em que se encontra o país, uma sociedade desunida e dividida em dois lados profundamente opostos. É claro que já sabemos o resultado desta eleição e, que ela foi palco para não somente pós-verdade e fake News, mas também atrocidades de ambos os lados, o que não se pode negar é que o resultado dessa votação foi fortemente influenciado por essas artimanhas.

Começando pelos ataques sofridos do lado perdedor, mas ainda assim, talvez o mais digno, o candidato do partido dos trabalhadores, Fernando Haddad teve seu nome envolvido em várias polêmicas, ou melhor, em várias mentiras. Acusado diversas vezes por seu opositor direto de distribuir Kits Gays nas escolas quando exercia o cargo de Ministro da Educação, facilitou a crença de pessoas mais azêmolas que ele também distribuía mamadeiras no formato de genitália masculina nas creches, para combater a homofobia a partir das crianças. Ambas as notícias são fake news.

Com um PT intensamente desgastado perante o olhar público, apelar para os sentimentos da população foi mais fácil do que se imaginava. Prometer um governo sem corrupção e uma população armada para gerar “segurança”, não é nada além de pós-verdade, usar o slogan “Brasil acima de tudo”, foi como dizer: nós queremos um Brasil como unidade. Vamos unir a nação, com ideais e pensamentos semelhante contra O inimigo (parcela da população que se difere no pensar – gays, negros, mulheres feministas, nordestinos, comunistas e petistas), quem não for como nós ou será preso, ou sairá do país. Algo que além de ser anti democrático é inconstitucionalmente impossível.

Já do lado ganhador é claro que os ataques não foram tão efetivos assim, contudo, é válido falar sobre o atentado que Jair Bolsonaro sofreu. Mesmo que Adélio Bispo afirme que não houve ninguém por trás da violência, apenas ele, é comprovado que sua motivação foi política. Temos ainda a propaganda eleitoral pró Haddad que expunha frases racistas, machistas, misóginas e preconceituosas ditas por Bolsonaro, mas na voz de crianças. O apelo sentimental usado fez com que o TSE tirasse tal vídeo do ar.

Além de emparvoecer a população, discursos regados de fake news e pós-verdade inviabiliza os debates entre os indivíduos, pois das duas uma, ou eles irão discutir até resultar em briga, ou um se calará diante da opinião alheia, dificilmente haverá um consenso. Alguns dias atrás, estive de estádia no estado do Rio de janeiro e essa minha experiência só confirma o que é dito acima.

É possível entender o fenômeno com mais facilidade utilizando o auxílio da Espiral do Silêncio, o ser humano demasiadamente complexo, recorre ao silêncio como resposta a uma infinidade de ações, e a fala é uma projeção que tem o poder de bloquear ou fixar uma ação, o que o silêncio significa? Muito, porque é o puro medo do isolamento social. Eu estava em um ambiente totalmente novo, com um ciclo social novo, quando Bolsonaro era mencionado, eu me calava para não ser excluída.