Conheci uma moça chamada Maria Efhêmera de Aguilar quando ela compareceu à empresa onde eu trabalhava, candidatando-se a uma vaga de secretária. Achei o nome estranho e logo a chamei para a entrevista. Por que Efhêmera? perguntei curioso, já que ela devia ter uns vinte e cinco anos ou um pouco mais e poderia viver mais cinquenta. Senta que lá vem história: “Quando nasci, fui diagnosticada com um problema raro no coração e o médico avisou meus pais que que eu poderia durar um dia ou talvez um ano, não mais que isso. Diante da triste notícia, meu pai resolveu colocar esse nome que significa que eu duraria muito pouco, pouco mesmo, talvez apenas um dia. Foi uma forma que ele encontrou para ir se acostumado com o pouco tempo que me teria viva”.

Efêmera é também o nome de um inseto da família dos Efemerídeos que vivem apenas algumas horas. São insetos pequenos que habitam as margens de rios e lagos de água doce. O nome vem do grego que significa por um dia. O inseto ela descobriu depois, quando lhe falei, pois desconhecia e ficou curiosa em conhecer o bichinho que tinha a vida tão curta.

Mas ela durou muito. Com vinte e cinco anos e com chances de viver bem mais tempo. Será que o médico errou no diagnóstico? Não se sabe se foi isso ou se houve uma estranha capacidade de recuperação do organismo da moça que proporcionou uma superação do problema cardíaco.  Talvez se tivesse feito uma cirurgia conforme foi recomendado na época, mas sem nenhuma garantia, poderia ter ficado na mesa de operações. O pai dela, contou-me depois, era um espanhol anarquista e ateu convicto e ficava furioso quando alguém lhe dizia que foi um milagre. “Milagro uma mierda. No creo en milagros”.

Por outro lado, Efhêmera, mesmo bonita, corpo bem feito, inteligente e simpática, estava solteira e sem namorado. Achava que o nome assustava os pretendentes que talvez tivessem medo de que não sobrevivesse um parto, deixando o marido viúvo ainda jovem com um filho ou filha sem mãe ainda bebê. Apresentava-se como Maria, mas uma hora ou outra os namorados descobriam o seu nome completo e aí a pergunta a qual já estava habituada: “Por que Efhêmera?” Seus relacionamentos então foram mesmo efêmeros, pois duravam muito pouco e ela habituou-se a viver o dia. “Carpe diem” expressão latina que quer dizer “aproveite o dia”, dizia para si mesma. Houve um, confidenciou durante o almoço no refeitório da empresa, que durou mesmo um dia, mas não foi por causa do nome. Marcaram um encontro e apareceu a mulher acusando-o de bigamia. “Onde já se viu um sujeito casado com dois filhos dando pinta de solteiro?” disse a esposa do sujeito.  Esse foi o namoro mais efêmero que eu tive, completou a Maria, como nós a chamávamos por ser menos complicado.

Mas um dia ela me procurou com uma grata surpresa: o convite de casamento. Encontrara um cara-metade disposto a aceitá-la na sua efemeridade, “pero no mucho”. Conheceu um rapaz que além de se apaixonar, gostou muito do seu nome e por via das dúvidas, resolveu pedi-la em casamento o mais rápido possível. Na festa de casamento conheci o seu pai, um espanhol simpático e falante que me contou toda a história que eu já conhecia sobre el nombre de su hija.

Casamento festejado, o casal partiu no dia seguinte em lua de mel para o Rio de Janeiro, mas uma derrapada em uma curva da Via Dutra, levou o carro para a outra pista, chocando-se contra um caminhão que vinha em sentido contrário. Foi, segundo a notícia, morte instantânea do casal. Foi uma triste notícia para todos na empresa, onde ela havia construído muitas amizades. No velório, comentava-se sobre o nome estranho, mas nem todos sabiam o significado e alguns achavam que era o sobrenome dela. Como é habitual, sempre alguém dizia: “Coitada, chegou o seu dia” ou então “O destino dela já estava traçado”.

Enfim, parece que ela nasceu predestinada a efemeridade. Tal como Édipo cujo nascimento foi marcado por trágicas previsões do Oráculo com um destino inescapável, também a pobre Ephêmera tinha seu destino traçado, não sei se pelos deuses ou pelo médico. Como sou cético, prefiro que tenha sido obra do acaso.