No artigo Arranjos político-institucionais: a criação de novos municípios, novas estruturas de poder e as lideranças locais. a divisão territorial de marabá na década de 1980 ? apresento a seguinte assertiva: a criação dos municípios decorrentes do desmembramento de Marabá, no Sudeste paraense, na década de 1980, está circunscrita ao processo de modernização capitalista, em especial, na esfera política (local). Neste caso, no âmbito institucional. Para tanto, serão utilizados os conceitos de Campo, Poder Simbólico, Interesse, Partido Político e Liderança. Conceitos desenvolvidos por Bourdieu, bem como conceitos de Liderança, Partido Político e Eleitor, defendidos por Downs. A pesquisa se desenvolveu nos municípios criados a partir de Marabá: Parauapebas (1988) e Curionópolis (1988), que foram desmembrados dando origem a Eldorado dos Carajás (1991), Água Azul do Norte (1991), Canaã dos Carajás (1994). A estrutura física deste trabalho é constituída de capítulos: No primeiro, serão abordados os procedimentos e o percurso metodológico adotado. No segundo, será apresentado o instrumental teórico-analítico, o problema, o objeto, e as hipóteses balizadoras deste trabalho. No escopo do capítulo terceiro, abordar-se-á o surgimento dos novos municípios, a partir da percepção das lideranças políticas de Marabá. No quarto capítulo serão focalizados os mecanismos de controle e o campo político, enquanto espaço de disputa e dominação. No quinto capítulo, estarão em discussão a representação política, as novas estruturas de poder, as alianças, a competição política e a disputa eleitoral. No sexto capítulo será enfatizado o Sudeste paraense no contexto das emancipações a partir das percepções das lideranças dos municípios emancipados. Por último, as conclusões à luz das análises apresentadas no escopo desta tese. Duas são as mais significativas conclusões: 1) A criação desses municípios resultou de um processo de modernização institucional na região em estudo; 2) A criação desses municípios atendeu aos interesses das lideranças políticas, e atores econômicos em escala municipal e estadual. A partir dessas conclusões, serão feitas as seguintes considerações acerca dos municípios emancipados: Curionópolis, Eldorado dos Carajás, Parauapebas e Canaã dos Carajás; em função de apresentarem realidades distintas, tiveram como resultado final, após o desmembramento de Marabá, a experiência da autonomia, sem, contudo, perder, inevitavelmente, as marcas da desigualdade. No entanto, em ambos os casos, registrou-se um processo de democratização, no qual as disputas políticas (eleitorais) e os conflitos decorrentes passam a ser regulados pela regras definidas no marco do Estado de Direito. Por fim, o percurso metodológico adotado elegeu as lideranças locais como importantes interlocutores, tendo por objetivo obter o "olhar" das lideranças políticas locais sobre esse processo.

A divisão territorial de Marabá na década de 1980. Criação de novos municípios, novas estruturas de poderes locais e novas territorialidades.
A nossa referência espacial neste artigo são os municípios criados a partir de Marabá : Parauapebas (1988), Curionópolis (1988), que por sua vez foram desmembrados dando origem a Eldorado dos Carajás (1991), Água Azul do Norte (1991), Canaã dos Carajás (1994). Esses municípios estão distribuídos numa área correspondente a 38.154km2, totalizando uma população de 321.688 habitantes, sendo que o Sudeste paraense está situado numa área equivalente a 292.847,79km2, correspondendo a 23,80% do território do estado, e a sua população residente corresponde a 1.344.359 habitantes. Vale ressaltar que comparativamente a população da região do Sudeste paraense é quase superior à população de estados da Amazônia legal, tais como: Acre (557.526), Roraima, (324.397), Amapá (477.032) que totalizam juntos uma população de 1.361.995 habitantes (Censo 2000).
A estrutura de poder existente era herança das relações socioeconômicas e culturais fundadas no extrativismo vegetal baseado na exploração e comercialização da castanha do Pará. Na medida em que as relações e as estruturas econômicas são modificadas, as estruturas políticas existentes ficam obsoletas, ou melhor, há um conflito de interesses entre os antigos grupos políticos e as novas lideranças. Esse fato provoca um novo arranjo institucional, por meio da divisão do poder que adquire materialidade na criação de estruturas de poder político municipal.
É interessante observar a relação entre a grande extensão de terras e a produção de castanha com o fato de Marabá , à época, deter uma expressiva extensão territorial, período no qual, predominou a economia extrativista da exploração da castanha do Pará, extração madeireira, e a pecuária. Por outro lado, do ponto de vista do poder político, o controle era exercido por uma oligarquia, no caso a dos Mutran , que detinha a posse das estruturas de poder municipal.
É neste contexto que elegemos como objetivo precípuo analisar e explicar o processo de criação de novos municípios decorrentes da divisão territorial ocorrida em Marabá e o processo de modernização político institucional. Desta forma colocamos em tela a relação existente entre a criação dos novos municípios, a emergência de novas lideranças políticas e a apropriação das novas estruturas de poder pelas lideranças emergentes. Tendo como pano de fundo a disputa e a competição político-eleitoral envolvendo as novas estruturas de poder, no caso o Executivo municipal dos municípios criados a partir de Marabá.
2.1 O campo política e troca de bens simbólicos
O campo (político) é entendido como um espaço social, no qual se estabelecem relações entre aqueles que detêm mecanismos de dominação e aqueles que são submetidos a estes, bem como instrumentos de legitimação. No interior do campo ocorrem relações contínuas, nas quais os atores ocupam posições diferentes, decorrentes seja da posição ocupada, ou dos seus interesses que representam no interior do campo, no qual está situado. Ao fim, se percebe a ocorrência de relações desiguais, posto que se registra um processo permanente de concorrência, marcada pela utilização de diferentes estratégias, entre os que querem se manter na condição de dominadores e aqueles que buscam mudar de posição no interior do campo, constituindo assim situações de desigualdade e dominação.
Bourdieu enfatiza que o campo tem certa autonomia em relação aos demais campos. Como exemplo, se reporta ao caso do parlamento, definindo-o como uma espécie de arena na qual se estabelecem disputas. Neste caso regulado fundamentalmente pelo voto, segundo "certas regras, certo número de disputas entre pessoas que supostamente exprimem interesses divergentes ou mesmo antagônicas" (BOURDIEU, 1996, p. 91).
Cada ator tem seu o poder simbólico, e este se define numa relação determinada, ou seja, os que exercem o poder e dispõe de mecanismos para exercê-lo, e os que lhes estão sujeitos. Ou seja, fazer com que a ação de cada ator tenha legitimidade, seja aceita pelos demais, que o discurso proferido que representa o interesse de um determinado ator, seja absolvido, assimilado e aceito pelos demais.
Ao utilizarmos a teoria geral da economia dos campos, buscamos entender a dinâmica, e as estratégias utilizadas pelos diferentes atores constituintes do campo político. Dominar sem que os demais se sintam dominados. Possuir legitimidade nas suas ações, mesmo quando estas se dão em condições de imposição arbitrária. Transformar as desigualdades em distâncias transponíveis trata-se de uma luta na qual, "as diferentes classes e frações de classes estão envolvidas numa luta propriamente simbólica para imporem a definição do mundo social mais conforme aos seus interesses, e imporem o campo das tomadas de posições ideológicas reproduzindo em forma transfigurada o campo das posições sociais". Aliás, esta luta é conduzida nos conflitos simbólicos da vida quotidiana, e na qual está em jogo o monopólio da violência simbólica legitima, quer dizer, do poder de impor, e mesmo de inculcar valores por meio de instrumentos arbitrários, embora sejam ignorados como tais na realidade social.
3-- O PERCURSO METODOLÓGICO ADOTADO
Como parte de nossas estratégias metodológicas adotamos a pesquisa de campo quando estivemos em Marabá, Parauapebas, Curionopolis, Eldorado dos Carajás, Canaã dos Carajás, onde pesquisamos nos cartórios eleitorais. Ao adotarmos esta postura isto nos levou a vivenciarmos a interação entre o pesquisador e os atores políticos, sociais e econômicos envolvidos no trabalho. As observações registradas na convivência do cotidiano local nos possibilitaram a compreensão da fala dos sujeitos em suas ações, estando inseridos nas suas realidades.
Estivemos nas câmara municipais e Assembléia dos Deputados.Analisamos os projetos de leis proponentes da criação dos municípios objetos desta pesquisa, os pareceres, e os pronunciamentos dos parlamentares com relação a esta matéria. E, ainda, o Diário Oficial do Estado, por meio do qual o Poder Executivo instituiu os novos municípios.
Recorremos também a dados estatísticos ao analisamos os resultados dos plebiscitos. Adotamos também à pesquisa documental , analisamos documentos oficiais, correspondendo à esfera federal. Neste caso, destacamos os seguintes: a emenda constitucional número 01 de 1969 , que alterou o capítulo I sobre a organização, projetos de leis propondo a criação dos estados de Tapajós e Carajás, bem como os pareceres e pronunciamentos sobre esta matéria. Optamos por esse procedimento, uma vez que, consideramos importante identificarmos a ocorrência de consensos e divergências com relação à proposta de criação de novos municípios.
2.1-O estado do Para e sua estrutura territorial.
O Estado do Pará têm uma população que totaliza 6.189.550 habitantes, distribuídos numa área correspondente a 1.247.702,7km². Neste caso estamos falando de um estado de grandes dimensões territoriais, ou seja, representa aproximadamente 24% da região Amazônica. Em termos comparativos o Pará equivale à soma dos territórios de Minas Gerais, Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e uma parte do Rio Grande do Sul.
Alguns de seus municípios são maiores do que países como Holanda e Suíça. Um caso emblemático é o município de Altamira com uma superfície de 161.445,93 Km² (considerado o maior município do mundo em extensão territorial) e uma população de 85.901 habitantes, contudo apresenta uma densidade demográfica de apenas 0,5 habitantes /km2 denotando a existência de áreas pouco antropizadas.
A população residente no Sudeste paraense totaliza 1.344.359 habts. Os municípios que apresentam os maiores registros populacionais são: Marabá 167.873, Paragominas 76.095, Tucurui 73.740; Parauapebas 71.591, Redenção 63.197, São Felix do Xingu 34.516, Conceição do Araguaia 43.453. Embora a microrregião de Tucuruí apresente uma população de 250.809 habitantes, sendo a maior individualmente comparada com as demais; é o município de Marabá que tem o maior contigente populacional 167.873 habitantes ou seja o município de Marabá individualmente tem mais da metade da população da microrregião de Tucurui que é composta de seis municípios. Isso demonstra a complexidade da situação, uma vez que o aumento da população leva a uma maior pressão sobre os recursos naturais e eleva a demanda por serviços públicos.
O Estado do Pará, é constituído de 143 municípios agrupados em 6 mesorregiões.(Grande Belém, Baixo Amazonas,Nordeste Paraense, Sudoeste,Sudeste Paraense e Marajó), sendo que alguns municípios foram criados após a constituição de 1989(ver quadro abaixo), sobretudo no Sudeste.

Neste período, vinte municípios foram criados resultando na formatação atual da região em trinta e nove municípios. Este fato tem rebatimento nas alianças políticas, uma vez que estas passam a se inserir num quadro no qual se observa uma pulverização das estruturas de poder, influenciando as novas relações de poder instituídas principalmente a partir da década de 1980.
3. REGRAS, MECANISMOS DE CONTROLE, E OS PROCEDIMENTOS POLÍTICO-LEGAIS .

Para efetuar a emancipação de uma localidade, registrar-se um rito político constituído de regras que servem fundamentalmente para ocultar e legitimar interesses. Observa-se, como as regras estabelecidas e aceitas como legítimas transferem para um corpo de profissionais, quer dizer, a um pequeno número, o monopólio do acesso ao campo político, processo que passa doravante a ser controlado pelos mesmos profissionais. Ninguém questiona a "necessidade" do processo para o âmbito de um espaço específico do campo, no qual os interessados, no caso a população demandante e a localidade sede perde direito de voz e voto, ou seja, perde o poder de decisão, a legitimidade da decisão está relacionada à observação e acatamento das regras.
O primeiro procedimento é a representação dos eleitores da localidade demandante, através de abaixo assinado, solicitando a emancipação e a criação do município, dirigida à Assembléia Legislativa, por meio de um deputado estadual. O deputado que assume a representação da demanda a apresenta e a encaminha ao presidente da Assembléia Legislativa, na forma de projeto de lei, a proposição de emancipação da localidade demandante, uma vez tendo sido tomado esse primeiro passo, deve-se, então seguir os demais:
? O deputado que doravante assume a representação da demanda apresenta na forma de requerimento, dirigido à presidência da Assembléia Legislativa, solicitação de parecer da Comissão de Constituição e Justiça, baseado no regimento interno (inciso I do art. 200 do regimento interno) e em concordância com a lei 4.827 de 15 de fevereiro de 1972 (Lei orgânica dos municípios);
? O presidente da Comissão de Constituição e Justiça encaminha na forma de diligencia solicitação de dados referentes à comprovação da população e da renda da localidade demandante, constante na lei Complementar Federal n 1 de 09 de novembro de 1967, solicitação baseada nos termos & 3 do art. 15 e 16 da lei estadual n 4827-79;
? Pedido de comprovante de residência dos eleitores que subscreveram o abaixo assinado demandando a emancipação e a criação do município;
? Em concordância com os termos da diligência, o Presidente da Assembléia Legislativa encaminha ao Desembargador Presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Pará, solicitação de informações referentes a: a) Qual o eleitorado da localidade de Parauapebas e Curionópolis esse eleitorado é superior a 10%, b) e ainda se com o desmembramento da referida localidade o município de Marabá, permanecera com eleitorado superior a 10%;
? Elaboração e aprovação de decreto legislativo que dispõe sobre a realização de plebiscito;
? Realização do plebiscito nas localidades demandantes (Parauapebas e Curionópolis);
? Homologação do resultado do plebiscito por parte do Desembargador presidente do Tribunal Regional Eleitoral;
? Resolução do município (Marabá-Parauapebas) autorizando a elevação da localidade à condição de município;
? O presidente da Assembléia Legislativa encaminha ao executivo estadual o projeto de lei aprovado por este para ser apreciado e sancionado pelo Governador do Estado;
? O Executivo estadual sanciona na forma de lei a decisão de ser criado o município.
De acordo como estabelecia o decreto legislativo foi realizado o plebiscito consultando as populações residentes nas duas localidades, e no dia 25 de abril de 1988 ocorreu a apuração do plebiscito realizado nos distritos de Parauapebas e Curionópolis.


3.2 - PLEBISCITO, LEGITIMIDADE E AS REGRAS DO JOGO
O plebiscito em Parauapebas contou com a participação de 16.164 eleitores, dos quais 99% votaram favorável à emancipação, correspondendo a 16.034 votos, sendo que o restante está incluso no conjunto dos votos: contra, brancos e nulo (Figura 2). Em Curionópolis a proposta de emancipação foi aprovada por 8.451 eleitores, correspondendo a 91% dos votos, sendo que as duas consultas plebiscitárias contabilizaram 24.485 votos favoráveis, sendo que foram registrados 427 votos que por alguma razão optaram em não votar a favor. No entanto desses apenas 154 votaram de fato votaram contra, os demais ou anularam ou se abstiveram (Figura 3). O elevado índice de aprovação deve ser inserido no seguinte contexto: a) A lei que regulamentava o processo exigia o comparecimento de 50% dos eleitores aptos a votar, e aprovação pela maioria; b) Nesta época o voto era manual; c) o prefeito era do PMDB; d) o governador era do PMDB.
No que diz respeito ao pedido de emancipação de Parauapebas, foram 116 pessoas residentes no então distrito de Parauapebas que o subscreveram encaminhado-o em 09 de março de 1987 a Assembléia Legislativa. 16.034 eleitores se posicionaram pelo sim, ou seja pela emancipação. O município foi criado, através da lei 5.443 de 10 de maio de 1988, sancionada no governo Hélio Gueiros.
No caso da criação do município de Parauapebas a Câmara Municipal de Marabá, no primeiro momento do processo se posicionou , solicitando a presidência da Assembléia Legislativa uma cópia do projeto para ser apreciado por parte do plenário da CMM, e posterior deliberação, sendo que destacaram dentre as informações requeridas as seguintes: delimitação da área geográfica, e os limites do núcleo urbano demandante da emancipação. Por sua vez a Assembléia Legislativa, através da presidência da casa, se manifesta diante da solicitação feita, expressando que nos autos do processo estava contido um mapa do núcleo urbano de Parauapebas, mas que estavam impossibilitados de enviá-lo devido à dimensão física do referido mapa, mas no entanto, remeteriam uma cópia da representação dos eleitores das localidades de Parauapebas e Curionópolis.
Em 09 de novembro de 1987, depois de seis meses, a CMM aprova e autoriza a elevação da localidade de Parauapebas à condição de município. O projeto foi de autoria do vereador Onias Ferreira Dias. No ato da realização desta sessão estavam presentes os deputados estaduais Haroldo Bezerra e Carlos Cavalcante, sendo que os respectivos deputados eram considerados os "verdadeiros" autores do pleito que, por exigência da lei, tinha de ser apresentado à CMM, sendo assim este foi encaminhado pelo vereador supracitado. O deputado Haroldo Bezerra assumiu a coordenação política do processo.
Em entrevista concedida ao jornal Correio do Tocantins Haroldo Bezerra diz que a votação representava "uma vitória para aquela comunidade que, emancipada, teria em seu território o Projeto de Ferro Carajás, Cederes 1, 2 e 3 e o povoado de Água Azul do Norte". Destaca ainda que, neste mesmo período estavam acontecendo movimentos emancipatórios em varias localidades do Sudeste Paraense, a começar por: Parauapebas, Curionópolis, Bom Jesus do Tocantins, Brejo Grande, São João do Araguaia, Tucumã, Ourilândia e Santa Maria das Barreiras, em Santana do Araguaia. Esses processos encontravam-se nessa época, em fase de aprovação da etapa de autorização da Assembléia Legislativa para realização dos plebiscitos pelo tribunal Regional eleitoral, para em seguida ser aprovado o projeto de lei final. No caso específico de Parauapebas, Curionópolis, Ourilândia e Tucumã, segundo o então deputado, havia um problema em relação ao número de habitantes dessas localidades, uma vez que "de acordo com o último censo (1980) do IBGE, a população dessas localidades não atendiam as exigências da lei, como seria o caso de Curionópolis". Sobre isso o deputado pondera, que Curionópolis à época do Censo, nem existia (Correio do Tocantins, 11 a 17 de março de 1988).
A participação do ex-deputado Haroldo Bezerra não foi ocasional ou fortuita, ao contrário, tratava-se de uma ação planejada cujo objetivo fim era a viabilização do estado de Carajás. Nesse sentido, a existência de unidades político-administrativas autônomas se constitui um meio necessário. Sendo assim reportamo-nos a Downs quando ele diz que os partidos e os eleitores agem racionalmente na busca de certas metas claramente especificadas, e segundo ele, os políticos que não buscam votos de maneira racional deixam de ser políticos. O comportamento dos eleitores pode ser ignorante, mas isso não é equivalente a ser irracional (Stanley Keller Jr, 1965).
A posição pró-emancipação do deputado Haroldo Bezerra ainda hoje lhe rende críticas por parte das autoridades atuais, mas essas criticas não são recentes, quando ele disputou a prefeitura de Marabá com Nagib Mutran, este fez o seguinte comentário: "A atuação de Haroldo Bezerra foi desastrosa para Marabá, pois ele foi o principal articulador do desmembramento de Curionópolis e Parauapebas, empobrecendo o município que perdeu milhões do Imposto Único sobre Minério" (Correio do Tocantins, 25 de agosto de 1988). O intrigante é que o vice na chapa de Nagib Mutran foi o Onias Ferreira Dias, autor ou pelo menos a quem coube a "missão" de apresentar a proposta na Câmara Municipal de Marabá.
Na época o prefeito era Hamilton Bezerra, eleito pelo PMDB, eleição que contou com a efetiva participação do deputado Haroldo Bezerra e do então governador Jader Barbalho (PMDB - 1982/1986). O prefeito antes da emancipação esteve nas duas localidades, através do governo itinerante, que consistia no deslocamento do poder executivo para essas localidades através do prefeito e secretários. Em nenhuma das oportunidades se posicionou contra a emancipação.
O deputado Haroldo Bezerra (Marabá) era o primeiro secretário, sendo que o segundo secretário era o deputado Wandenkolk Gonçalves (Itupiranga) da mesa diretora da Assembléia Legislativa..Atualmente esses deputados, não estão exercendo mandatos políticos.O ex-deputado Haroldo Bezerra exerce(2004) a presidência da Companhia de Saneamento do Pará (Cosanpa), e o Sr. Wandenkolk exerce a função de secretário de estado. O então presidente da casa, deputado Mariuadir Santos atualmente não está desempenhando nenhuma função pública, ou seja, está fora do campo político.
No caso da criação do município de Curionópolis (conhecido também pela designação de Km 30), o processo obedeceu o mesmo trâmite, sendo que o pedido foi encaminhado, através de um abaixo assinado subscrito por 120 eleitores domiciliados no referido distrito, tendo sido encaminhado em 24 de março de 1987 a Assembléia Legislativa, sendo que segundo certidão expedita pelo Tribunal Regional Eleitoral, registra-se naquela época no distrito de Curionópolis 13.765 eleitores, correspondendo a 23ª Zona Eleitoral de Marabá. No entanto, fora feita uma revisão nos livros do cartório, durante a qual se constatou que o número de eleitores era de 12.160.
O proponente do projeto de lei foi o ex-deputado Giovani Queiroz, e o relator desta matéria na Comissão de Divisão Administrativa foi o ex-deputado Haroldo Bezerra, e a relatoria na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) foi do então deputado Mario Chermont, que uma vez de posse do resultado do plebiscito ? realizado - favorável à emancipação da referida localidade, se manifesta favorável e pede a provação no âmbito da Comissão. Sendo que o relator do projeto foi num primeiro momento o deputado Paulo Fonteles, sendo substituído pelo então deputado Paulo Lisboa.
Deve-se resgatar que a consulta plebiscitária envolvia apenas a população da área a ser transformada em município, mais precisamente o eleitorado domiciliado no referido distrito. A Assembléia aprovou o decreto legislativo em 3 de março de 1988, determinando a realização do plebiscito, sendo este realizado em 24 de abril do referido ano, resultando na aprovação, ou seja, a população local se manifestou favorável à emancipação e a criação do município de Curionópolis. Este processo político se deu no governo Hélio Gueiros, tendo sido sancionado, através da lei 5.444 de 10 de maio de 1988, sendo que o município foi efetivamente instalado em 1 de janeiro de 1989, no momento no qual fora dado posse ao prefeito e ao vice-prefeito, na Câmara Municipal do referido município.
Na época das referidas emancipações e da criação dos respectivos municípios, a Comissão de Divisão Administrativa estabelecia os seguintes requisitos como condição para reconhecer os processos políticos.
1. Representação por parte dos eleitores da localidade demandante com mínimo de 100 (cem) assinaturas;
2. População estimada superior a 10.000 habitantes;
3. Eleitorado não inferior a 10% da população, no caso de Curionópolis, foi registrado a existência de 13.766 eleitores domiciliados na localidade,
4. A existência de número superior a 200 casas, fora registrado em Curionópolis a existência de 5.000 casas;
5. A arrecadação da receita estadual correspondente ao ultimo exercício devia ser equivalente a 0,005 (5 milésimos);
6. Resolução aprovando a emancipação e a criação do município pela Câmara Municipal do município sede, no mínimo pela maioria absoluta;
7. Decreto Legislativo Estadual determinando a realização do plebiscito na área demandante;
8. A realização do plebiscito pelo Tribunal Regional Eleitoral;
9. Exigia-se o comparecimento de 50% dos eleitores aptos a votar, e aprovação pela maioria.
Consideramos importante registrar que a exemplo do poder legislativo municipal, o poder executivo do município de Marabá foi convocado a se manifestar no processo sendo que a este poder coube apresentar as informações relativas.
1. Número de residências encontradas na área, atestada através de oficio emitido pela prefeitura,
2. A renda na área pretendida no ano de 1985,
3. Mapa e memorial descritivo da área do futuro distrito fornecido pelo GETAT.
Neste período o prefeito era Hamilton Bezerra, eleito em 1985 representava a primeira derrota imposta aos Mutran, ou seja, em tese ele dispunha de capital político, construído a partir de uma frente de partidos e movimentos sociais, ou seja, a população lhe deu um crédito, aliás, a própria ascensão dele à condição de prefeito representou à confiança da população na possibilidade de se mudar a estrutura de poder baseada no mandonismo oligárquico. Ademais o município contava com dois deputados de um lado Haroldo Bezerra, eleito como expressão desse movimento de mudança, e Plínio Pinheiro eleito com o que ainda tinha de capital político das oligarquias dos castanhais e dos pecuaristas.
A não manifestação da prefeitura em relação às informações demandadas pelo legislativo estadual seria suficiente para criar um estorvo político aos processos de emancipação. No entanto, o prefeito responde informando que na localidade de Curionópolis, existia um núcleo urbano constituído de mais cinco mil casas residenciais e comerciais e dando prosseguimento ao atendimento da solicitação encaminhada continua informando que a renda anual do povoado de Curionópolis no exercício de 1985, correspondeu a seis milhões de reais.
Essa micro região passaria por outro processo de emancipação, resultando na criação de dois novos municípios, desta vez seriam os jovens municípios de Parauapebas e Curionópolis que passariam por um processo de divisão territorial A proposta de criação do município de Canaã dos Carajás foi apresentada na forma de projeto de lei pelo então deputado Joercio Barbalho, após receber representação subscrita por 123 moradores do distrito, reivindicando a emancipação da localidade em relação a Parauapebas e a criação do novo município. Neste período ele exercia a primeira vice-presidência e o ex-deputado Ronaldo Passarinho a presidência da casa. Nos argumentos apresentados no projeto de lei, diz que se manifesta para atender "a contundentes apelos dos diversos segmentos do povo". Assim se exime de possuir qualquer interesse individual, colocando-se apenas como instrumento da vontade coletiva, particularmente a população daquela localidade, segundo ele tal medida iria atender os interesses da população residente, que comportaria 15.000 habitantes, dos quais 2.500 seriam pequenos proprietários rurais. Contabiliza-se a existência de 3.437 eleitores .
O processo eleitoral envolvendo a consulta plebiscitária em Canaã registrou a participação de 2.634 eleitores, sendo que dentre as consultas realizadas, essa foi que apresentou o maior número de abstenção (850 votos), sendo que a ampla maioria aprovou a emancipação com 2.574 votos, no entanto 910 eleitores (abstenção, não, branco e nulo) decidiram por não se posicionar favorável à emancipação.
Baseado no resultado do plebiscito, o presidente da Assembléia Legislativa encaminhou o projeto de lei número 135-91, criando o município de Canaã dos Carajás, ao então governador do Estado Carlos José Oliveira Santos , que por sua vez sancionou na forma de lei.
Novamente o deputado Giovani Queiroz (PDT) apresenta um projeto de lei desta vez argüindo a favor da emancipação de Eldorado dos Carajás. O presidente da Comissão de Divisão Administrativa era o deputado Niciais Ribeiro. A localidade, em questão estava circunscrita a jurisdição de Curionópolis. Segundo ele (deputado Giovani Queiroz), a extensão territorial do estado dificultando a eficiência administrativa, motivo pelo qual estabeleceu como um dos objetivos do seu mandato: "trabalhar com responsabilidade para a emancipação de vários povoados e ou distritos", por acreditar que dessa forma estará contribuindo para o desenvolvimento do estado. Sendo assim, encaminhou abaixo assinado subscrito por 150 eleitores domiciliados na localidade de Eldorado dos Carajás. E ainda tem-se registro , de que na localidade em questão existia à época 1.230 eleitores. Baseado nas informações obtidas, o Poder Legislativo aprova decreto legislativo , através do qual autoriza a realização do plebiscito junto à população de Eldorado dos Carajás, devendo ser realizado pelo TRE em consonância com as determinações estabelecida a consulta plebiscitária foi realizada no dia 28 de abril de 1991.
Após a realização do plebiscito que teve como resultado a aprovação da emancipação do município de Eldorado dos Carajás, o procedimento seguinte seria a manifestação da Câmara Municipal, neste caso, assim se procedeu, contudo diferentemente das experiências anteriores, a Câmara Municipal de Curionópolis se posicionou contrária à emancipação, solicitando que fosse revisto o resultado da consulta plebiscitária que indicou a aprovação. Fundamenta sua posição recorrendo à lei orgânica do município, particularmente o artigo 10 . O fato importante é o posicionamento contrário - por parte do parlamento municipal, representado pela sua mesa diretora - à emancipação e a criação de um novo município a partir da divisão territorial do município de Curionópolis. Ademais eles alegaram, ainda, que a efetivação desse processo resultaria em perdas significativas, tais como.
1. O novo município englobaria aproximadamente 65% do território do já pobre município sede,
2. Cerca de 90% das terras agriculturáveis, bem como 60% da pecuária, e ainda, tinha-se o agravante de que 60% do município de Curionópolis se originaria daquele distrito.

Em resposta à manifestação contrária, bem como a revisão do processo, quem se posicionou não foi nem o presidente da Comissão e Justiça, nem tão pouco o seu relator, nem mesmo o presidente da Comissão de Divisão Administrativa, e nem o seu relator. A posição veio por meio de um técnico da casa, - uma vez que o oficio foi assinado pelo presidente da CMC - na condição de secretario legislativo, mas que não dispunha da investidura de parlamentar. Este por sua expressa seu parecer de que se deveria anexar o oficio da CMC aos autos do processo do projeto de lei, para apreciação dos Colegiados.
A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), através de seu relator, o deputado Gervasio Bandeira, se posicionou que, uma vez tendo sido "realizado o plebiscito, ficou comprovado que a grande maioria dos eleitores domiciliados na área territorial do pretenso município de Eldorado dos Carajás é favorável à sua emancipação política administrativa" . Em consonância com os pareceres das referidas comissões temáticas, e posterior aprovação pelo plenário da Assembléia legislativa o presidente desta casa, encaminha o projeto de lei n 13-87 ao governador do estado, Jader Fonteneles Barbalho, para sua apreciação e sanção. O governador do estado, de posse do projeto de lei, sanciona-o em forma de lei com o número 5.687, de dezembro de 1991, estabelece a criação do município de Eldorado dos Carajás.
A emancipação e a criação do município de Água Azul do Norte, povoado pertencente a Parauapebas, foi uma iniciativa em nível da Assembléia Legislativa do deputado Giovanni Queiroz. Esta localidade, segundo o deputado, já dispunha de reais condições de se elevar à condição de município. Sendo assim, ele encaminhou a apresentação dos moradores da localidade formulando o pleito. Segundo o Tribunal Regional Eleitoral, no distrito de Água Azul existiam 2.878 eleitores aptos a votar, em 1990.
O governador do estado na época, Jader Fontenelle Barbalho, sancionou o projeto de lei aprovado pela Assembléia Legislativa, que passa a se constituir na lei 5.694. Observa-se na Tabela 5 que o município dispunha 2.110 aptos a votar, dos quais compareceram 1.484, sendo que a aprovação foi com 1.427 votos. A área denominada Água Azul, pertencente ao município de Marabá, começou a ser ocupada a partir de 1978. A distância da sede de Parauapebas, que ficava a 308 quilômetros da vila, provocou a emancipação política. O plebiscito foi realizado em 1991 e 96% dos moradores aprovaram a transformação da vila em município, ou seja, se tratava de uma vila de moradores com 7.626 km2, que em 2000 registrou 12.153 habitantes.
O total de eleitores que compareceram aos plebiscitos dos municípios de Curionópolis, Parauapebas, Eldorado, Canaã e Água do Norte totalizam 30.233, sendo que aqueles que se posicionaram favoráveis às emancipações correspondem a 99%, ou seja, 29.809 foram favoráveis. No caso de Parauapebas, compareceram 16.164 eleitores, dos quais os votos favoráveis correspondem, 16.034, ou 99,2%. Em relação a Curionópolis, percebe-se que compareceram 8.536, desse 8.451 se posicionam favoráveis à criação do município, ou seja, 99%. Canaã totalizou a presença de 2.634, no caso 97,7% foram favoráveis. Em Eldorado e Água Azul do Norte foram registrados 1.415 eleitores, dos quais 93,5% disseram sim. No segundo caso, totalizou-se 1.454 eleitores que compareceram, sendo que 1.427 foram favoráveis, o que significa que a aprovação se deu com 96,16%.
Considerações finais
Devemos destacar que duas são as nossas mais significativas conclusões sobre o estudo apresentado:
1. A criação dos municípios de Parauapebas, Eldorado dos Carajás, Curionopolis, Canaã dos Carajás, Água Azul dos Norte resultou de um processo de modernização institucional na região em estudo.
2. A criação desses municípios atendeu aos interesses das lideranças políticas, e atores econômicos em escala municipal e estadual.
Do ponto de vista político, a novidade é a estruturação de instituições no âmbito local, executivo e legislativo que passam a ser gerenciadas por lideranças e grupos políticos emergentes das novas relações econômicas (industrial/urbana). É esse processo ? a apropriação das novas estruturas políticas pelas novas lideranças políticas e econômicas locais emergentes das relações capitalistas industriais ? que consideramos como uma das faces da modernização institucional.
Esse processo convergiu para a pulverização de poderes. As regras foram alteradas e, atualmente, a Emenda Constitucional n. 15, de 1996, modificou a lei, atribuindo à União a competência de legislar sobre limites territoriais e processos de emancipação. Mas, o novo dispositivo constitucional prevê que "a criação, bem como a incorporação, o desmembramento de municípios deverão ser realizados por lei estadual, cumprindo o período determinado por Lei.
Projetos foram apresentados ao Congresso, para que o assunto voltasse à esfera dos legislativos estaduais. Somente na Assembléia Legislativa do Pará, desde 1993, tramitam na Comissão de Divisão Administrativa do Estado e nos Assuntos Municipais da Assembléia Legislativa 31processos que pretendem criar igual número de novos municípios (31). Das propostas apresentadas, 14 projetos (45%) referem-se à divisão territorial do sul do Pará. De Marabá , segundo esta proposta, sairiam criados três novos municípios: Brejo do Meio, Vila Santa Fé e Morada Nova.
Atualmente(2012) há registro de outros processos, referentes à criação de novos municípios que seriam desmembrados dos seguintes municípios: Santana do Araguaia (Vila Mandi); Dom Eliseu (Bela Vista do Pará); Floresta do Araguaia (Vila Bela Vista); Água Azul do Norte (Vila Nova Canadá); Itupiranga (Cajazeiras e Cruzeiro do Sul); São Félix do Xingu (glebas Morada do Sol e Sudoeste); Xinguara (distrito de Rio Vermelho e Vila S. José do Araguaia); e São Geraldo do Araguaia (Vila Novo Paraíso).
A história recente da criação de municípios no Brasil está vinculada à Constituição Federal de 1988, um a vez que esta delegou aos estados a prerrogativa de decidir sobre a divisão e fusão de áreas territoriais municipais. No Pará, foram criados 37 municípios, a partir da nova legislação. Até 1988, o Pará era formado por 106 municípios e, hoje, tem 144.