A Cúpula do Alasca de 2025

Por Ivan Santiago | 18/09/2025 | Geral

A CUPULA DO ALASCA DE 2025

 

Nada de novo debaixo do sol. A expressão bíblica, extraída do livro de Eclesiastes, parece resumir com precisão a recente cúpula realizada entre o presidente estadunidense Donald Trump e seu homólogo russo, Vladimir Putin.

O encontro, concebido por dois líderes veteranos que pareciam revisitar os tempos em que seus países ditavam os rumos do mundo, teve como pauta central a Guerra da Ucrânia – ou, como Moscou a define, a “Operação Militar Especial”. As raízes desse conflito são antigas, e mesmo longas aulas de história acompanhadas de leituras especializadas dificilmente esgotariam o tema. Portanto, caros leitores, não nos propomos a tal façanha.

Rússia e Ucrânia integraram o mesmo país até 1991. Grande parte do que a mídia apresenta sobre a questão é superficial. Geograficamente, a Crimeia é o ponto central. Nela se encontra a robusta base militar russa de Sebastopol, ainda que a península tenha pertencido oficialmente à Ucrânia até ser anexada pelos russos em 2014.

A importância da região não é novidade. A Guerra da Crimeia (1853–1856), travada entre a Rússia e uma coalizão liderada pelo Reino Unido, já aparece inclusive na literatura brasileira, como em Dom Casmurro, de Machado de Assis. Essa relevância geopolítica, embora distante de nossas terras, permanece essencial para compreender a atual cúpula realizada no Alasca, em 2025.

Controlar a Crimeia e manter ali uma forte base naval representa intimidação e projeção de poder no Mar Negro, além de garantir influência russa, pela força, sobre países como Ucrânia, Romênia, Bulgária, Moldávia e Geórgia. Esse é o ponto de partida fundamental para entender a Cúpula do Alasca.

Para a Rússia, a invasão da Ucrânia – de forma secundária – também foi uma estratégia de conquistar territórios com grandes populações russas, legitimando assim a posse da Crimeia. Impor a Kiev a impossibilidade de ingressar na OTAN e na União Europeia, além de limitar o tamanho de seu exército, é um modo de exercer poder geopolítico sobre todos os países do Mar Negro. Ao mesmo tempo, emite um alerta a aliados russos e àqueles que migraram para a OTAN.

O Alasca – que já pertenceu à Rússia e foi vendido aos Estados Unidos em 1867 – foi o local escolhido para decidir o futuro da Ucrânia, sem a presença do líder ucraniano. Uma cena que remete aos tempos da Guerra Fria, quando bastava às duas superpotências definirem os rumos do mundo. Ingênuo? Talvez. O fato de a Força Aérea dos Estados Unidos sobrevoar o encontro com o bombardeiro estratégico B-2 Spirit, avaliado em dois bilhões de dólares, parece reforçar essa percepção.

Em 2025, o presidente dos Estados Unidos se vê em posição desconfortável: descobriu que seu país já não é a principal potência econômica global – papel hoje ocupado pela China; constatou que uma Rússia fragilizada ainda é capaz de desafiar a América e a OTAN militarmente; percebeu que o Brasil se antecipou a esse cenário há vinte anos, com a criação dos BRICS, e que medidas protecionistas isoladas não farão da América Latina o quintal de ninguém, como ainda sonha Marco Rubio, atual Secretário de Estado estadunidense; verificou que a Índia consolidou-se como potência econômica mantendo laços históricos com Moscou; e que todos esses países estão unidos no seio dos BRICS. Descobriu ainda que os EUA bancaram a segurança europeia por 70 anos, a um custo altíssimo para sua população.

Diante desse imenso leite derramado, a águia estadunidense tenta recuperar o prestígio inabalável de outrora. Num cenário fluido e em um mundo multipolar – realidade defendida por este autor desde 2008 – observa-se uma mídia ávida por registrar seu lugar na História, embora talvez essa própria História, como advertiu Francis Fukuyama, já tenha se esgotado. Muito se noticiou após a cúpula de três horas, mas os principais atores de 2025, na verdade, não estavam presentes. Como adverte o Eclesiastes: nada de novo debaixo do sol.

Ivan Santiago – Geógrafo e gestor de negócios imobiliários em Piracicaba-SP

 

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