Discutir a atual crise do sistema capitalista-imperialista implica necessariamente na abordagem dos seus desdobramentos e efeitos desterritorializados, que se evidenciam na esfera política, econômica e social. Tais características, que permeiam a atual crise econômica, acabam por produzir um clima de incertezas e retrações que, repercutem agudamente no mundo do trabalho. Desta forma, o advento da crise acabou por desestabilizar o desenvolvimento socioeconômico na contemporaneidade e, demonstrar que o mesmo não é tão sólido, robusto e democrático quanto se apresentava.

As crises, assim como a superprodução, a depressão e a retomada do poder acumulativo constituem-se em fases do ciclo econômico capitalista e, tal desequilíbrio é inerente ao capitalismo. Sobre isto Giovanni Alves diz:

“Na verdade as crises [...] tem uma função orgânica: são maneiras de progredir deste modo de produção social, maneiras de fazê-lo sobreviver para além de suas barreiras imediatas [...] e desse modo [...] estender com dinamismo cruel sua esfera de operação e dominação” (2011).

Contudo, mesmo levando-se em conta que a crise seja um fenômeno natural dos moldes capitalistas, existem alguns aspectos diferenciados nesta nova crise estrutural. István Mészáros (2002) defende que a crise é de caráter universal (não se restringindo a uma esfera única), possuindo um alcance global (não se limita a um grupo de países), apresentando-se contínua e permanente em lugar de limitada e cíclica e, cada vez mais aguda.

A crise econômica que assola os Estados Unidos da América ecoa em todo o mundo e, possui suas origens nos moldes da “financeirização” da economia, na predileção pelo capital especulativo sem correspondência com a massa de        valores reais    “globalização/repartição”.

A partir de 2001, com a redução das taxas de juros, ocorreu uma expansão no setor de imóveis nos EUA, neste momento a euforia tornou-se incontrolável e houve uma inserção em massa de clientes do segmento de crédito de risco, caracterizados pela baixa renda e histórico de inadimplência. Embora conceder crédito a esse grupo significasse uma ação de risco, as financeiras e companhias hipotecárias fomentaram amplamente o sonho de aquisição da casa própria e, como forma de prevenção estas companhias firmavam contrato de seguros com seus credores, contudo os títulos ilusoriamente emitidos por estas hipotecas circularam por todo o mundo, sem barreiras e desmedidamente. Com o aumento substancial das taxas de juros ocorrido entre 2006/2007, ocorre o desencadeamento da crise imobiliária nos Estados Unidos e, como os clientes do segmento de risco não possuíam recursos suficientes para quitar as suas dívidas, estes foram obrigados até mesmo a abandonar suas moradias. Neste momento ocorre o desmoronamento de uma cadeia alicerçada nas frágeis bases de concessão de crédito com alto risco. Em princípio os papéis circulantes no mercado especulativo dos principais centros financeiros, dentre eles Wall Street, que representa: “o coração histórico do atual Distrito Financeiro da cidade de Nova Iorque, onde se localiza a bolsa de valores de Nova Iorque, a mais importante dos Estados Unidos e do mundo.” (GRUPOSHIELD, 2011), não possuíam nenhum valor real.  

Tal quadro crítico referente a presente crise imobiliária foi retratado brilhantemente pelo cineasta Michel Moore, que por meio de filme intitulado: “Capitalismo, Uma história de Amor”, desnudou a essência do sistema capitalista, representada nas práticas vergonhosas adotadas pelo mercado financeiro e imobiliário, mostrando “um pouco da realidade dessas pessoas comuns, que foram expulsas de suas casas como bandidos e passaram a sentir na pele a            crueldade do sistema capitalista [...].(BOCA NO TROMBONE, 2010). 

Diante do grave cenário, a receita adotada pelos governos mundiais foi “desalavancar” a economia da produção. Frente ao clima de incerteza e de desconfiança generalizado, houve a contração da concessão de crédito.Por precaução, projetos de investimentos foram postergados ou simplesmente cortados, ocorreu a dispensas de empregados, redução de produção, retração do consumo. Em outros termos, foi acionado o freio da engrenagem econômica da produção e, conseqüentemente, do mundo do trabalho.

Segundo Paul Krugman (ganhador do Prêmio Nobel de Economia em 2008), a atual estratégia econômica adotada pelos países em crise, sobretudo os europeus, não surtirá o efeito desejado.  Krugman declara:

“Parece que os políticos europeus vão continuar a fazer mais do mesmo. Eles provavelmente vão dar um jeito de providenciar mais crédito aos países com problemas, o que pode ou não evitar um desastre iminente. Mas eles não parecem entender um fato crucial – a saber, que sem políticas fiscal e monetária expansionistas nas economias mais fortes da Europa, todas as suas tentativas de resgate irão falhar.” (EXAME.COM, 2011)

 

Governantes e ministros de diversos países, são unânimes em afirmar que a “solução” para a crise pressupõe uma ação coordenada entre as nações. Em nota o grupo ministerial de finanças do G7 afirmou que:

"Nós nos reunimos nesse momento de novos desafios[...] para o crescimento, déficits fiscais e dívida soberana. Há agora sinais claros de uma desaceleração do crescimento global. Estamos comprometidos com uma forte resposta coordenada a esses desafios".(INTERNATIONAL BUSINESS TIMES, 2011)

 

O ex-diretor do Fundo Monetário Internacional (FMI), Dominique Strauss-Kahn, reafirma esta necessidade de ações coordenadas ao dizer:

"A coordenação, o consenso, o desejo de trabalhar juntos foi um sucesso no clímax da crise", mas tudo isso é agora "um tanto abstrato”, [...]. "Não há solução interna ou nacional para problemas globais”. [...] Estamos em um mundo globalizado e problemas globais exigem soluções globais. (ITAMARATY, 2010)

 

No Brasil, o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Fernando Pimentel, defendeu a união dos países emergentes para enfrentar os efeitos colaterais da crise econômica mundial. Segundo ele:

"[...] essa é a única forma de alcançar a integração econômica [...]” Gastamos muito tempo com discursos sobre o curto prazo, mas temos, agora, que traçar metas para os próximos dez anos para garantir a sustentabilidade e o desenvolvimento dos nossos países. (JF HOJE, 2010).

 

Neste contexto de crise, a saída encontrada pelo governo americano foi a adoção de medidas de cortes. Tais ações foram duramente criticadas pelo economista Paul Krugman, que é contundente ao diagnosticar que:

“Na verdade, cortar gastos quando a economia está deprimida não ajudará mesmo a situação orçamentária e poderia torná-la pior. De um lado, as taxas de juros sobre empréstimos federais são atualmente muito baixas; então, cortes de gastos agora farão pouco para reduzir os custos de juros futuros. Por outro lado, tornar a economia mais fraca agora também irá prejudicar as perspectivas a longo prazo, que reduzirão as receitas futuras. Portanto, aqueles que estão exigindo cortes de gastos agora são como os médicos medievais que tratavam os doentes com sangrias, deixando-os, assim, mais doentes.” (O POVO ONLINE, 2011)

 

 

O que ocorre neste momento é a socialização dos prejuízos decorrentes da crise, onde “O Estado é chamado para socializar os prejuízos de mais uma especulação financeira globalizada”. (Balanço, Filgueiras e Pinheiro, p 04, 2009). Desta forma, não há perdas para os grandes capitais.

Essa socialização do ônus tem resultado em diversas manifestações de descontentamento popular em torno do mundo. Nos Estados Unidos, o movimento mais ativo é o “Occupy Wall Street, que protesta contra os excessos do sistema capitalista em algumas das principais cidades americanas” (CARTA MAIOR, 2011). O Occupy Wall Street vem recebendo apoio de diversas personalidades, dentre elas o renomado lingüista Noam Chomsky, que diz:

"Os valentes e honrados protestos que continuam em Wall Street deveriam servir para chamar publicamente a atenção da sociedade sobre esta calamidade (provocada pelo setor financeiro) e conduzir a um dedicado esforço para superá-la e conduzir a sociedade para um caminho mais saudável", (CARTA MAIOR, 2011)

 

Outros movimentos inspirados no Occupy Wall Street se propagam por toda a Europa e chegam até o Brasil onde:

"O movimento “Ocupe São Paulo” completa um mês de manifestações contra o capitalismo. Tendo como endereço o Viaduto do Chá, no centro da capital paulista, o movimento ganhou mais adeptos e dos 60 acampados permanentes no início dos protestos, em 15 de outubro, o local conta agora com cerca de 100 pessoas, espalhadas em 40 barracas, que se dizem “unidas por uma mudança global na sociedade”. (CARTA MAIOR, 2011)

 

Logo, ao analisarmos os fatores desencadeadores da atual crise econômica, bem como os seus desdobramentos sociais ,podemos concluir que a superação do presente quadro de crise global decorre de uma ação coordenada entre as nações envolvidas no intuito de fazer com que “os mercados não andem mais rápido que os reguladores e a inovação e criatividade não sejam sinônimo de abusos e desordem, mas de progresso” (ECONOMIA UOL, 2009), pois inegavelmente o contexto crítico por ora vivenciado, decorre de uma "falha massiva na regulação, supervisão e administração do risco”. (NOTÍCIAS RTP, 2009). Desta forma, a sociedade organizada vem se despertado para as práticas desumanas, evidenciadas na ganância implícita no sistema capitalista, que atua promovendo o enriquecimento de poucos à custa da miséria de muitos.

REFERÊNCIAS:

ALVES, Giovanni. Trabalho, Crise e Dessubjetivação da Classe: Notas Teórico-metodológicas.

BALANCO, P. A. de F.; FILGUEIRAS, L.; PINHEIRO, B. R. Economia política e crise capitalista: a crise atual à luz da teoria econômica.

BOCA NO TROMBONE, "Capitalismo: Uma História de Amor" a vitória do bom senso. Disponível em: Acessado em: 03/12/2011.

CARTA MAIOR, Ocupando Wall Street. Disponível em:

Acessado em 05/12/2011.

ECONOMIA UOL, Ministro luso defende ação coordenada contra crise global. Disponível em:< http://economia.uol.com.br/ultnot/lusa/2009/03/02/ult3679u6102.jhtm> Acessado em 05/12/2011.

EXAME.COM, Crise na Europa deixa Paul Krugman “aterrorizado e entediado”. Disponível em: <:http://exame.abril.com.br/economia/mundo/noticias/crise-na-europa-deixa-paul-krugman-aterrorizado-e-entediado> Acessado em: 05/12/2011

INTERNATIONAL BUSINESS TIMES, G7 indica ação coordenada, mas oferece pouco contra crise. Disponível em: Acessado em 03/12/2011.

ITAMARATY, FMI defende solução global para o câmbio. Disponível em: Acessado em  04/12/2011.

JF HOJE, Ministro defende união de países emergentes para enfrentar crise econômica. Disponível em: < http://www.jfhoje.com.br/2011/11/30/ministro-defende-uniao-de-paises-emergentes-para-enfrentar-crise-economica> Acessado em 01/12/2011.

NOTÍCIAS RTP, Conferência Ibero-Americana quer transparência no sistema financeiro. Disponível em: < http://www.rtp.pt/noticias/?t=Conferencia-Ibero-Americana-quer-transparencia-no-sistema-financeiro.rtp&article=205862&visual=3&layout=10&tm=6>

Acessado em 01/12/2011.

OLIVEIRA, M. F. . Elites econômicas e inserção internacional do Brasil no século XXI. In: Corsi, Francisco Luiz; Alves, Giovanni; Camargo, José Marangoni; Vieira, Rosângela de Lima. (Org.). Dilemas da globalização - O Brasil e a mundialização do capital. Bauru: Editora Práxis, 2007, v. , p. 105-135.

O POVO ONLINE, Obama se rende ao teto da dívida. Disponível em: Acessado em: 05/12/2011