A CASA MAL  ASSOMBRADA” SOBRAL – A CIDADE PRINCESA

Por Jose Wilamy Carneiro Vasconcelos | 29/01/2019 | Crônicas

CRÔNICA “A CASA MAL  ASSOMBRADA”

SOBRAL – A CIDADE PRINCESA

CAUSO DE NÚMERO 5

A rua estava repleta. Tinha gente em todo canto. Uma multidão tomava conta nas calçadas, nas casas vizinhas, nas varandas, denpedurados nos pés de algaroba. De repente, um grito e todos correm assustados, uns pisoteados deixando chinelos para trás. O corre-corre é intenso. Era cotidiano ver isso na Casa Mal Assobrada. 

Os moradores da casa não se importavam com as coisas que aconteciam dentro da casa, creio eu; ou então já se acostumaram com tal situação. Confesso a vocês que difícil é conviver diariamente com as circunstâncias que abordarei mais adiante. Especuladores falavam dos acontecimentos numa forma a debochar das coisas sobrenaturais existente naquele casarão.

A Casa Mal assombrada situava na Rua Monsenhor José Ferreira, muitos não sabem quem é, pois a rua recebeu o apelido de Rua do feijão. Acreditam os antigos moradores que esse nome pegou devido ficar próximo ao Rio Acaraú, e os vazateiros das proximidades estendiam feijão em baja nas calçadas para secar sol abrasador e depois ensacar, costurar e vender no mercado central e para as cidades vizinhas. Outros estocavam em tambores de ferro, lacravam com cera de abelha para não dar o gorgulho; e separavam uns alqueires para comer no verão.

Um dia, os curiosos entraram na casa e disseram que viram uma tesoura andar sozinha no corredor, fazendo ziguezague, abrindo e fechando. Essa era as histórias que contavam para quem quiser ouvir. Outros falavam que o sofá dançava sozinho, arrastando de um lado para outro.  Os quadros nas paredes se mexiam, as portas se fechavam. Luzes se apagavam e acendiam no mesmo intervalo de tempo.

No final da casa, depois do quintal, um grande caldeirão na parte do subsolo fazia medo só de olhar. Media (2X2) de diâmetro e a profundidade cabia um homem em pé. Feito de ferro fundido, junto aos escombros tinha uma passagem que dava acesso num piso de madeira mal cuidado. Ao pisar um chiado acompanhava os passos de quem andava, coisas que acontecia nos filmes. Talvez pó isso a tão grande expectativa desse lugar sombrio. Alguns perguntavam como esse caldeirão foi parar lá. Pois o muro protegia das outras casas. Era bem alto. O peso aproximava mais que meia tonelada. Coisas de impressionar.           

Enquanto isso na Televisão era época de grande audiência do Filme “A Família Adam”. Confesso que não assistia; meus pais não permitiam esses filmes em nossa casa. Diziam que influenciava a coisas que não era de Deus. E éramos proibidos de falar, de sair para ver a casa. Afinal, morávamos na outra rua e da janela do oitão de nossa casa, avistava a multidão se aglomerando na rua.

O casarão era bem antigo, de arquitetura européia, influenciado pela arquitetura portuguesa no século XVIII e vindo de Recife. Muitos croquis, e arranjos vieram copiados de lá, da Cidade Maurícia e outros da cidade do Maranhão.  Na fachada da casa tinha uns desenhos de estilo clássico. As janelas com frontais de pedra mármore, com arcos góticos e grandes portões de madeira que iam do canto direito até o piso de madeira. Os ferrolhos eram enormes, que nem as portas das igrejas. Uma entrada com um hall aberto separava a casa que tinha duas portas. Uma na lateral e outra defronte que servia como porta principal. No início, duas colunas com artefatos e desenhos seguravam um grande portão de ferro com design bem arrojado. Em um de sua lateral, a letra do antigo morador difundia no centro do portão. No lado direito a letra “F” indicava o nome da família. E do lado esquerdo a letra “G”. Comumente, que vivenciou esse período, era de práxis encontrarmos residências com as letras nas paredes, o ano de fundação do casarão e nos portões acompanhava o nome da família. Aqui encontramos muitos desses casarões.

O assunto foi repercutindo por toda a cidade até que chegou aos ouvidos do pároco de nossa Igreja Matriz. Não deu outra. A população queria tirar a limpo o que realmente acontecia naquela casa.  Foi marcado o dia em que o padre iria benzer a Casa Mal assombrada.

Chegou o grande dia.  Se antes existia uma grane multidão, agora multiplicou por dez. A rua não suportava mais. Toda a população da cidade se encontrava naquele lugar. Só não apareceram àquelas que tinham medo de visagem. É dessa maneira que falamos por aqui, nas cidades do interior. Assim sou eu, também tenho certa aversão esses infortúnios.  Não tenho medo, procuro não dá muita ênfase, acredito  no poder da oração e nas providências de Deus. O Deus do Impossível. Minha mãe sempre nos ensinou muitas jaculatórias e uma delas é: “Senhor eu confiou em Vós”. “Se Deus é por nós , quem será contra nós”.

Então voltemos. O padre estava lá com sua batina até os pés, sua mala, seus apetrechos, água benta, e seu fiel sacristão segurando o guarda-sol. Foi convidado para entrar pelo dono da casa. Um de seus pedidos dado ao anfitrião da casa pelo pároco era levar toda sua família para se confessarem e receber a eucaristia. Assim o fizeram no dia marcado que o sacristão confirmou.

A expectativa tomou conta dos curiosos. Padre Domingos de Araújo entra devagarzinho, com um terço em uma das mãos e a outra segurando a Bíblia. Balbuciava bem baixinho e fazendo o sinal da cruz de um lado a outro. Perderam o padre de vista e ele foi abençoando o casarão jogando água benta, entrava num cômodo da casa, na sala, na cozinha, fazia suas orações olhava para cima, fitava para baixo. Chamava o Nome de Jesus cristo filho de Deus em tom mais forte e foi fazendo seu serviço.

O dia ia se escondendo, quando o padre apareceu, com seu auxiliar, os dois suados, com olhar cansado.  A casa mal assombrada estava por terminar. A multidão não agüentava de tanta expectativa para desvendar os mistérios. Seus moradores puderam enfim dormir uma noite em paz. Duas; três semanas depois as coisas foram normalizando. A multidão já não era a mesma. As fofocas desapareceram. Voltou tudo ao normal. A Casa Mal assombrada já não assombrava mais. Até as crianças podiam passar por sua calçada. Coisas que antes, o povo desviava e passava por longe com certo arrepio.