A BALCONISTA

Embora o nosso progresso comercial, industrial, desenvolvimento educacional e intelectual, Montes Claros em tudo o que se faz, passa pela Rua Doutor Santos. Eu, como sempre morei no centro, ou próximo a ele, uso a via central preferencialmente.
Acontece que durante dois anos circulei por ruas, logradouros, e demais vias carregando às costas e de cavalinho a minha neta. Como ela veio ao mundo muito prematuramente e seguindo orientações de profissionais médicos, a expunha às situações, sons e movimentos variados, visando o seu pleno desenvolvimento reflexo.
Após tantas idas e vindas passando pela Rua Doutor Santos, certa manhã fui interceptado por uma jovem senhorita próximo ao antigo Cine Fátima e em frente a uma loja de cosméticos. Ela chegou de repente e abriu os braços impedindo a minha passagem. Exigiu uma explicação por eu estar sempre conduzindo aquela criança e passar sempre à frente do local onde ela trabalhava.
Suava em bicas, gesticulava nervosamente e atropelava a voz ao falar!
Na sua argumentação o meu ato não era comum e carecia de esclarecimentos. Afiançou-me, na sua indiscreta curiosidade, representar as suas colegas de balcão, também incomodadas, assim como ela, com o meu ir e vir carregando aquela criança, talvez pensando que o mundo não tivesse cancela.
Como cidadão, dei lhe os reais motivos médicos já que era um exercício de adaptabilidade com a criança, embora por direito não carecesse de lhe fornecer ciência das minhas ações individuais.
Aquelas balconistas, assim como muitas outras e a bem da verdade oriundas das roças e povoados próximos, vieram para nossa cidade em busca de estudo e de trabalho. Saíram do mato, mas o mato ainda não saiu de dentro delas. Elas representavam a vivência campesina, típicas de povos subdesenvolvidos. É o estigma do povo da roça.
Uma caixa reflexa entupetada de critérios subjetivos e inúteis à praticidade da vida. Pura titica de galinha na cabeça.
A cisma não era localizada. Todo e qualquer pessoa que transita mais de uma vez pelo mesmo local ou caminha nessa terra de Figueira, é monitorado pelos roceiros que carregam o universo do mato dentro deles.
A maioria desses rurícolas que compõem o nosso universo urbano e fazem parte da nossa vida, emprega o tempo livre para trocarem comentários inúteis aventando hipóteses e avaliando social e mesmo moralmente todos que ousem circular às suas frente. Sãos uns predadores da liberdade, pois basta ver uma vítima inocente desse interesse mal-são, para meterem o pau!
Montam verdadeiras campanas e investigações variadas para satisfazer às suas curiosidades mórbidas. Alguns chegam a viajar, gastando do próprio bolso para obter informações estratégicas sobre os investigados e poder falar coisas que só eles sabem e acreditam ter visto. É o máximo do mínimo!
Tornam-se, na falta do que melhor fazer, voyeurs e meros analistas inúteis focados no ir e vir da população.
São as crias da urbanidade que tiveram as suas mentes programadas pelo nada das novelas e deletérios programas de BBB, exibidos pela mídia televisiva, escrita e falada.
Muito embora a nossa cidade, tenha à disposição de todos, várias bibliotecas públicas além de vasta e diversificada programação cultural propícias ao desenvolvimento social, filosófico, intelectual e moral do cidadão, preferem cultivar o que a citada jurãozada lhes impõe, ou seja, o ócio montado na maledicência e no nada!
No litoral do Piauí, se define tais ações, como o efeito da bufa expelida em alto mar.
Nada, de nadinha!