A ARTE DE ESCREVER DE CADA UM

Numa entrevista do filósofo argentino contemporâneo José Pablo Feinmann, que me foi recomendada pelo meu amigo jornalista e escritor Marlon Aseff, dizia o filósofo que detesta ?blogs? ("Cualquier pelotudo tiene um blog!") e falava daquelas pessoas que, na impossibilidade de terem seus escritos publicados em jornais ou revistas, criam blogs e neles escrevem na esperança de que alguém as leia, mas não caem em si de que seus textos, às vezes, possam ser demasiado chatos, de má qualidade, ininteligíveis ou difíceis de ler.
Dou ao filósofo argentino razão, de que existem bons e maus escritores, mas por outro lado sei das formalidades e frescuras de que se revestem as vias de acesso de certos jornais ou revistas que se julgam importantes demais e, como tais, exigem de um desconhecido escritor credenciais, apadrinhamentos ou cartas de recomendação para publicar uma matéria, mesmo que a reconheçam como boa, bem escrita e fundamentada. Isto, aliás, não é de hoje. Aconteceu no início de suas carreiras com grandes escritores e todos eles são unânimes em reconhecer que o caminho do escritor é um caminho difícil, árduo e solitário. João Antonio (1937-1996), escritor paulista, depois de haver perdido num incêndio os manuscritos do seu primeiro livro, teve a paciência e a árdua tarefa de reescrevê-lo, encerrado numa biblioteca. E esta segunda versão, segundo ele, saiu melhor do que a primeira.
Sobre o ato de escrever, Artur da Távola (1936-2008), um dos maiores escritores do nosso tempo, disse o seguinte: "Escrever é permanecer horas, dias e anos na esperança do encontro, hoje, amanhã ou depois de morto, com algumas pessoas ou muitas almas irmãs com quem sintonizar, o que impossível foi com a maioria das pessoas, até mesmo com quem se conviveu." Um apaixonado pela literatura e pela música, Artur da Távola nos deixou esta frase que também é uma sábia recomendação: "Música é vida interior, e quem tem vida interior jamais padecerá de solidão."
Quanto a escrever bem ou mal, é outra coisa. Tem gente que ainda não aprendeu. Ou está brincando com a boa vontade e a paciência dos leitores. Escrever assim ou assado ou dar a formatação que quiser ao seu texto é um direito de cada um. Existem escritores para todos os gostos e de todos os tipos, qualidades e categorias. E alguns se outorgam a liberdade, de propósito, ou por ignorância, de desobedecer às regras. Mário Quintana em seu Caderno H, sob o título de ?Hermetismos?, diz o seguinte sobre certos autores e seus respectivos leitores: "Leitor ideal, mesmo, é o que, quanto menos entende, mais admira. Se não fora essa claque providencial, o que seria dos autores herméticos? Eles foram feitos um para o outro."
Aqueles que se propõem a escrever devem estar apetrechados de alguns conhecimentos básicos de fonética, morfologia e sintaxe, pelo estudo da gramática, de preferência identificando e aplicando tais conhecimentos, caso a caso, em cima do texto. Além disso, temos o exercício da leitura, e o aprendizado que ela, por si mesma nos proporciona. Antes de alguém se aventurar a escrever é preciso ter aprendido a ler, exercitando desde a pronúncia até a escrita correta das palavras, os diferentes tipos de pausa ou pontuação, a construção da frase e a divisão das etapas do pensamento através de períodos e parágrafos.
A arte de escrever não se aprende nas escolas nem em academias ou oficinas literárias. Escrever, depois de saber ler, é como aprender sozinho a nadar ou andar de bicicleta. É um aprendizado solitário, onde cada um, bem ou mal, forja o seu próprio estilo.

Luciano Machado