O título do filme, cuja frase fez saltar da memória centenas de imagens, realmente é impossível lembrar. Mas, o efeito da frase encheu a alma. "A verdade é um lugar onde moram os bons". O som metálico foi captado do ator, pronunciado enquanto ele estava absorto em pensamentos. Houve cumplicidade entre o espectador e o personagem; viviam momentos idênticos. É incrível como em algumas situações pequenas coisas, detalhes ínfimos tomam proporções imensas, fazendo a mente borbulhar em rápidas imagens e cenas, recortes de lembranças.

"A verdade é um lugar onde moram os bons". Para quem já correu o mundo em busca de si próprio e achou muitas coisas, a verdade é algo assustador. Uma busca tão ou bem mais desoladora que a do Santo Graal. Mas, é lá que moram os bons e, por isso, muitos a temem.

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Um barzinho em uma das esquinas da cidade. Cerveja e pizza, acompanhando o tom da despedida, o tom de pessoas que não querem se afastar. São impelidas a isso por questões de auto-afirmação e necessidades pessoais. – E aí o que você vai ser quando crescer? – O riso da garota se abre, com perguntas que esquentam um iceberg. – Pelo jeito que as coisas andam, estou é querendo voltar pro útero da minha mãe – Qual é o cara que quando o bicho pega não pensa logo na mãe. A frágil fortaleza, que dá sustentação pro resto da vida. Melhor que ser pai, é ser mãe. Só...

– Eu vou cair na estrada, vou me procurar. Ver aonde ando, o que quero. Porque, o que eu não quero é o tradicional. Tem muita coisa pra viver – a resposta obstinada caracteriza a busca insólita. – Quando você se achar... – disse ela, ajeitando-se na cadeira, fazendo o mesmo com os braços, acotovelados à mesa. – ... diz que eu falei que você é um cara muito legal, não esquece. – Deixa comigo.

O amor que acaba sem querer traz boas verdades, e boas mentiras. "Eu vou te amar pra sempre" é uma delas. O sempre, sempre tem fim, é a boa e perpétua mentira. Depois de tudo, um passeio na rua, o abraço na noite. E aquele silêncio inquebrantável, porque tem horas que falar estraga tudo, quebra a magia do momento. No silêncio se diz muito mais coisas; o tato aflora à alma, a sensibilidade vai a mil por hora. A despedida no portão, o beijo e outro abraço, mais caloroso, apertado, o mais desesperado do Mundo.

No aeroporto nada de despedida. Um adeus nunca ouvido, ficou combinado que aquela seria a noite da eternidade; depois da cama, uma imagem congelada no aceno de mão no portão.

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A vida corre. Fica alta (altos apuros) em alta velocidade, principalmente quando se está no 15º andar de um prédio. Os pensamentos voando pela cabeça, um punhado de papel na mão à espera que a editora avalie o "trabalho literário", e nasça uma coisa um pouco menor que Jorge Amado. Do 15º andar as pessoas ficam do tamanho que são: pequenas. Tudo passa rápido, muito depressa. Esperar é uma arte, viver é fazer a arte. Artisticamente, lá se foi uma coisa um pouco menor que Jorge Amado, voando pela enorme janela de vidro. Flutuando como folhas num bosque de concreto, batendo em alguns prédios, invadindo, sorrateiras janelas entreabertas, que permitiram a invasão de outros sentimentos.

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"A verdade é um lugar onde moram os bons". A frase trouxe o passado que não assusta. Não cobra; pelo contrário alivia. Algumas boas coisas e boas ações são resumidas no silêncio. Não precisando do testemunho de si próprio que assim tenta buscar algo verdadeiro dentro de sua existência: e mentem. "A verdade é um lugar onde moram os bons". Alguns fazem de seu passado esse lugar. Um teto repleto de boas lembranças, do barzinho à pizza com cerveja, o passeio. O abraço, o aeroporto e a despedida que nunca aconteceu. O inverno que nunca chega.