''Democracia'' Sem a Maioria
Publicado em 03 de julho de 2009 por Luciano Vieira Costa
O título deste texto reflete muito bem a história de toda a
política brasileira.
Desde quando "éramos" colônia, passando pela
"independência" do Brasil, no período chamado de império, república e
chegando nos dias atuais a história é a mesma, trata-se de grupos conservadores
no poder em uma república representativista, onde esta representa os interesses
dos grupos elitistas.
Todas as "revoluções" de grande impacto e tomadas de poder partiu
desta "elite" na defesa de seus interesses, sendo que as classes
populares que apresentam a maioria esmagadora da população conseguiu apenas ser
massacrada em algumas revoltas isoladas pelo Brasil, uma história de sangue e
terror (Cabanada, Canudos, Conjurações mineira e baiana, MST, Movimento
Operário, etc...) e assistir tudo o que acontecia.
A existência de uma verdadeira democracia depende basicamente de boas
instituições políticas e de uma mentalidade social aberta aos valores de
igualdade, liberdade e solidariedade. No Brasil não temos nem uma coisa nem
outra, mas o trabalho mais urgente consiste em educar as novas gerações para a
superação do espírito conservador que nos domina desde os tempos coloniais.
Em que consiste o conservadorismo brasileiro?
Após assistir a mais um fracasso de mais uma tentativa abolicionista por
meio de lei, a Assembléia Geral em 1884 derrubara o ministério Dantas porque
ousara propor a alforria de todos os escravos maiores de 60 anos sem
indenização - Joaquim Nabuco desabafou: "O ideal conservador entre nós
é a estagnação no embrutecimento, o rancor do exclusivismo, o silêncio na
corrupção."
Demonstrando sua grande indignação o tribuno quis mostrar é que, para a
mentalidade dominante , a injustiça social é sempre preferível à desordem,
entendida esta como a possibilidade, sempre aberta numa democracia de mudança
na hierarquia social.
A sociedade divide-se então, claramente em uma classe naturalmente
governante e outra naturalmente governada, onde a predestinação deste sistema
encontra-se na riqueza.
Homens de posse e seus auxiliares imediatos consagrados pelos diplomas
universitários ( a "doutorice"), gozam de uma presunção universal de
competência: não são para ser mandados e sim para mandar.
Na mentalidade conservadora a lei não é uma garantia de liberdade nem
tampouco um instrumento de justiça, mas uma arma a fim de que a
"ordem" na manutenção dos mesmos centros de poder social.
Toda a história do Brasil demonstra que é possível manter e instituir as
maiores injustiças num regime de "legalidade".
Um exemplo clássico foi o que sucedeu durante todo o período monárquico com
a escravidão dos negros, onde a constituição de 1824 proclamava o princípio da
liberdade pessoal e da igualdade de todos perante a lei.
No mesmo período, mulheres, escravos, pobres e analfabetos não eram tidos
como cidadãos e apenas a elite participava das decisões políticas.
Enquanto isso os juristas e magistrados raciocinavam como se as normas
constitucionais nada tivessem a ver com a legalidade, onde o que imperava
soberanamente era a ordem proprietária.
Nos dias atuais, ao meu ver, houveram alguns avanços, porém, muito longe do
ideal e esperado.
A questão racial por exemplo é muito debatida e segundo a Constituição
Federal de 1988 é crime inafiançável e insuscetível de anistia, juntamente com
prática de tortura, o tráfico de drogas e crimes hediondos. Existem muitas
brechas que permitem várias interpretações e o cotidiano do Brasil ainda é
tomado por violência política e urbana.
A idéia de que fazemos parte de uma sociedade cordial que repudia a
violência e o preconceito contra raças e etnias é muitas vezes defendida por
pessoas ou grupos que pretendem apresentar imagens de uma falsa convivência
pacífica entre negros e brancos, pobres e ricos, etc..
Os conflitos inter-racial e social num país miscigenado e tão desigual como
o Brasil remete ao desafio de ampliar de fato a democracia socioracial, onde o
primeiro passo é reconhecer as diferenças.
Segundo indicadores internacionais, o Brasil, mesmo não sendo um país
declaradamente racista, em seu manejo político-social é ainda mais perverso do
que em países onde o racismo é reconhecido como problema.
O Brasil é um país racista e excludente! Constatação simples e óbvia, porém,
ainda nos choca pois não é isso que queremos, este racismo e exclusão são
difíceis de serem combatidos já que se escondem por trás de relações cordiais.
A cor significa no Brasil segregação social e muitas vezes não corresponde
ao espaço já que não temos bairros de negros como nos EUA ou África do Sul, em
relação a questão econômica e sociedade de classes, os pobres tem o seu lugar
na cidade, assim, temos também a segregação espacial.
Desta forma, a democracia verdadeira está distante, um sonho utópico visto
que a maioria dos brasileiros são analfabetos políticos e não conseguem
enxergar as relações de poder que os cercam, tornando uma revolução distante de
acontecer, enquanto isso, as elites conservadoras continuam elegendo os
governantes com financiamentos milionários de campanhas a fim de que a
"ordem" de acordo com os seus interesses seja mantida.
Educar é preciso!
Luciano Costa