Resenha do filme: A MÚSICA E O SILÊNCIO

(Direção: Caroline Link, 1996)

    Este é um filme instigante que aborda, sobretudo, o tema das diferenças entre dois mundos, o mundo dos ouvintes e o mundo dos surdos, a partir das vivências e dificuldades encontradas em uma família de pais surdos e filhas ouvintes.

    Desde pequena, Lara, a primeira filha do casal, sente-se responsável por interpretar o mundo aos seus pais (através da Língua de Sinais), seja na escola (em reuniões com professores), seja em negociações bancárias ou em qualquer situação que os pais necessitem. Seus pais, por sua vez, demonstram não compreenderem as necessidades da filha em relação à sua educação formal, sem valorizar realmente o período em que está na escola, talvez devido às suas próprias dificuldades vivenciadas no passado em sua vida escolar. Fica claro que os pais acreditam que a prioridade para a vida da família é terem uma intérprete, no caso a filha, sempre que precisem, pois em sua cidade não existem bons intérpretes.

    A mãe tenta entender as necessidades da filha, tenta entrar no “mundo” desta, buscando maior aproximação com a mesma. Já o pai evidencia ter muitas dificuldades na relação com o mundo ouvinte, decorrentes de sua própria infância, em que sempre se sentiu excluído em sua família. Sua irmã era musicista (clarinetista) e recebia muita atenção de todos, principalmente do pai pianista, sendo que ele nunca conseguiu compreender esta arte. Além disso, ele sentia que a irmã era o orgulho da família e ele, o deficiente.

    Quando a filha mais velha e protagonista do filme decide dedicar-se à música, também tocando clarinete, o pai não consegue aceitar que sua filha queira seguir o caminho da tia. Além disso, fica claro seu receio de perder o amor, a atenção e o respeito da filha se esta se identificar com a tia, ouvinte e musicista também.

    O filme traz um conflito comum entre a maioria das famílias com surdos e ouvintes, o conflito entre dois mundos totalmente distintos, em que não existe somente a diferença da língua utilizada, mas a diferença de percepção, de compreensão das necessidades de cada um, pois a pessoa surda percebe o mundo principalmente de forma visual, em que o canal auditivo não é usado, sendo difícil entenderem sua importância, que é própria dos ouvintes. Aspectos próprios dos ouvintes como ouvir música ou tocar um instrumento são percebidos de forma diferenciada pelos surdos, pois não fazem parte de suas vidas. Para os pais surdos de uma criança ouvinte, a música pode ser uma dificuldade a mais na relação entre estes, pois é algo incompreensível para os pais e isso é retratado claramente neste filme. 

    Além da identificação de Lara com a música, o pai ainda se preocupa se irá perder definitivamente a filha quando esta resolve se candidatar a uma bolsa de estudos na escola de música de Berlim, indo morar com a tia, a fim de se preparar para o exame.

    A partir do real afastamento da filha, da perda da esposa após um acidente e da atitude da filha mais nova, indo ao encontro da irmã em Berlin, o pai percebe que ele também precisa tomar uma atitude para não vir a perder realmente o amor da filha, pois sente que está cada vez mais sozinho.

    Este filme é muito rico para estimular reflexões necessárias acerca do tema surdez, sentimentos e dificuldades dos surdos em um mundo de maioria ouvinte. Mostra a dificuldade de um pai surdo em compreender algo que não faz parte da sua vida, a música, mas que para sua filha é importante. O filme nos instiga a pensar acerca das diferenças existentes e do quanto é importante aprendermos a lidar com o diferente e a respeitar cada pessoa, com suas características e necessidades próprias.