FOUCALT, Michel.  A ordem do discurso. Aula inaugural no College de France, pronunciada em 2 de Dezembro de 1970. Tradução de Laura Fraga de Almeida Sampaio. Edições Loyola, São Paulo, 2004.

Nesse texto, Foucault ao se pronunciar percebe uma voz sem nome, e com isso se deixa ser tomado pela palavra. E assim ele discorre sobre a seguinte Hipótese: em todas as sociedades a produção de discursos é regulada, selecionada, organizada e redistribuída caracterizando, portanto, o poder da palavra e os eventuais perigos decorrentes dela, quais sejam: os procedimentos exteriores de controle e delimitação do discurso, procedimentos internos de controle e delimitação do discurso, imposição de regras aos sujeitos do discurso.

Dentro dos procedimentos externos de controle e delimitação do discurso, implica três tipos de exclusão como, por exemplo: a interdição, separação/rejeição e a vontade de verdade. Na interdição, não se pode falar tudo que pensa em qualquer situação e nem pode falar de qualquer coisa aleatoriamente. Desse modo, fica evidente o distanciamento da transparência do discurso, que Foucault considera como o tabu do objeto, ritual da circunstancia, direito privilegiado ou exclusão do sujeito que fala. E por mais que o discurso seja pouco, revela aqui, sua ligação com o desejo e com o poder.

No que diz respeito à Separação / Rejeição, Separação razão / loucura; o discurso do louco é impedido de circular como os dos outros. Desde a Alta Idade Média, a palavra do louco não é ouvida e quando é ouvida, é escutada como uma palavra de verdade (de uma verdade que os indivíduos normais não percebem).

E para representar como o saber é aplicado em uma sociedade, Foucault propõe uma vontade de Verdade, a qual, se nos situarmos no nível de uma proposição, no interior de um discurso, a separação entre o verdadeiro e o falso não é nem arbitrário, nem modificável, nem institucional, nem violento. Mas se levantarmos a questão de saber, situando-nos em outro nível, qual é essa vontade de verdade que atravessou tantos séculos de nossa história, ou qual é o tipo de separação que rege nossa vontade de saber, então é algo como um sistema de exclusão (sistema histórico, institucionalmente constrangedor).

Nos procedimentos internos (o comentário), o controle do discurso é exercido por ele próprio. Os discursos que se dizem no correr dos dias e das trocas, e que passam com o ato mesmo que os pronunciou, e os discursos que estão na origem mesmo de certo número de atos novos de fala que os retomam, os transformam ou falam deles. A relação do texto primeiro com o texto segundo permite construir novos discursos, permite trabalhar o acaso do discurso, permite dizer algo além do texto mesmo. “O novo não está no que é dito, mas no acontecimento de sua volta”.

Além de todo esse sistema de controle do discurso, ainda temos as imposições de regras ao sujeito do discurso, quais sejam: o ritual, doutrinas e apropriação social dos discursos.  O ritual define a qualificação que devem possuir os indivíduos que falam (e que, no jogo de um diálogo, da interrogação, da recitação devem ocupar determinado tipo de enunciados). Por exemplo: os discursos religiosos, judiciários e políticos não podem ser dissociados dessa prática de um ritual que determina para os sujeitos que falam, ao mesmo tempo, propriedades singulares e papéis preestabelecidos.

A doutrina, por sua vez, constitui o inverso da “sociedade do discurso”: nesta, o número de indivíduos que falam, mesmo se não fosse fixado, tendia a ser limitado; e entre eles o discurso podia circular e ser transmitido. A doutrina, pelo contrário, tende a difundir-se; e é pela partilha de um e mesmo conjunto de discursos que indivíduos, tão numerosos quanto se queira imaginar, definem sua pertença recíproca. Aparentemente, a única condição requerida é o reconhecimento das mesmas verdades e a aceitação de certa regra de conformidade com os discursos validados. “A doutrina liga os indivíduos a certos tipos de enunciação e lhes proíbe consequentemente, todos os outros”.

Apropriação Social dos Discursos é o sistema educacional que é espaço onde os indivíduos m acesso a muitos discursos. E a maneira política de manter ou modificar a apropriação dos discursos, com os saberes e o os poderes que eles trazem consigo, ou seja, uma ritualização da palavra, uma qualificação e uma fixação dos papeis para os sujeitos que falam.

Segundo a visão foucaultiana, podemos destacar os temas filosóficos relativos aos processos de delimitação dos discursos: “o pensamento ocidental tomou cuidado para que o discurso ocupasse o menor lugar possível entre o pensamento e a palavra; parece que tomou cuidado para que o discurso aparecesse apenas como certa contribuição entre pensar e falar; seria um pensamento revestido de seus signos tornando visível pelas palavras, ou, inversamente, seriam as estruturas mesmas da língua postas em jogo e produzindo um efeito de sentido”.

Sendo assim, temos três direções que o trabalho de elaboração teórica deverá seguir: Para analisar a materialidade discursiva em suas condições, seu jogo e seus efeitos, é preciso, optar por três decisões às quais nosso pensamento ainda resiste um pouco, e que correspondem aos três grupos de funções aqui evocadas: questionar nossa vontade de verdade; restituir ao discurso seu caráter de acontecimento; suspender, enfim, a soberania do significante.

O princípio de descontinuidade: Não existe um discurso ilimitado, contínuo e silencioso que nós tivéssemos por missão descobrir restituindo-lhe, enfim, a palavra. Não se deve imaginar, percorrendo o mundo e entrelaçando-se em todas as suas formas e acontecimentos, um não-dito ou um impensado que se deveria, enfim articular ou pensar. Os discursos devem ser tratados como práticas descontínuas, que se cruzam às vezes, mas também se ignoram e excluem.

O princípio de especificidade: Não transformar o discurso em um jogo de significações prévias; não imaginar que o mundo nos apresenta uma face legível que teríamos de decifrar apenas.

O princípio da exterioridade: Não passar do discurso para o seu núcleo interior e escondido, ou para o centro de um pensamento ou de um sentido que se manifestaria nele, mas a partir do próprio discurso, de sua aparição e de sua própria regularidade, passar às suas condições externas de possibilidade.

Reflexão crítica:

Com sólidos conhecimentos acerca das diversas manifestações de poder através do discurso, Foucault nos leva a compreender as idéias básicas de sua linha filosófica sobre o saber, o poder e o sujeito, bem como a descobrir o poder das palavras no discurso do indivíduo, que ora o exclui, reprime, ora o torna dono do saber poder, como muito bem se define nos procedimentos externos ou internos de controle e delimitação do discurso.

É uma leitura que exige conhecimentos prévios para ser entendida, além de diversas releituras e pesquisas quanto a conceitos, autores e contextos apresentados, uma vez que as conclusões emergem a partir das explanações a certa do autor em sala de aula com o professor, como forma de facilitação para uma compreensão mais eficiente, em fim, pode-se amadurecer mais, inclusive para aceitar e até solicitar crítica rigorosa, que em muito pode enriquecer nosso estudo sobre o poder enquanto relação social.