O reconhecimento social das mulheres como "seres pensantes" foi e continua sendo um desafio para o equilíbrio nas relações de gênero. Tanto nos conteúdos escolares como nas grades curriculares das universidades é nítida a ausência de conteúdo que tratem das mulheres enquanto filósofas, sendo escassas até mesmo as referências sobre o conhecimento da vida e obra dessas pensadoras. Com isto, é possível verificar facilmente a desvalorização das mulheres na vida acadêmica e sua participação na história da construção do conhecimento. Neste sentido, podemos constatar uma reduzida valorização das mulheres na vida acadêmica e sua participação na história da construção do conhecimento. A maneira como os filósofos, em geral, tratam a mulher ao passar dos séculos, revela um claro desprezo ao ser feminino; entretanto, apesar da discriminação das mulheres no campo filosófico, é possível notar que ao longo da história da filosofia, muitas mulheres se destacaram como entes pensantes que cultivaram saber e conhecimento.
Ainda que a mulher tenha sido rejeitada na história da filosofia, a temática "mulher" foi abordada por muitos filósofos. A mitologia grega destaca as mulheres representando-as na figura de suas deusas: Ártemis, Atena, Afrodite, Deméter, Hera, Perséfone, Pandora e Gaia, ainda que a inteligência e o pensamento sejam simbolizados pela deusa Atena, é importante lembrar que esta não nasceu pelo corpo de sua mãe e sim da cabeça de seu pai, Zeus, o que evidencia desde o início que a mulher já não tinha nenhum valor. Para a história combinar idéias, formar pensamentos, sempre foi julgado um direito pertinente aos homens, mas mesmo com tanta discriminação as mulheres conseguiram garantir uma pequena participação das mulheres na vida acadêmica. Um dos poucos apontamentos históricos sobre o assunto foi à criação de um núcleo de formação intelectual somente para mulheres, educandário fundado por Safo, poetisa de Lesbos que nasceu em 625 a.C. Nesta época, o pensamento que vigorava é o de que as mulheres somente tinham direito a um corpo e uma mente, mas nunca os dois ao mesmo tempo, pois desta forma a mulher nunca poderia gerar a razão.
Na visão de Pitágoras "existe um princípio bom que gerou a ordem, a luz e o homem; há um principio mau que gerou o caos, as trevas e a mulher". Platão já detinha um pensamento diverso, as mulheres eram tão capazes de administrar quanto o homem, pois para ele quem governa tinha a obrigação de gerir a cidade-Estado se utilizando da razão e para Platão as mulheres detinham a mesma razão que os homens. Aristóteles via a mulher como um homem não completo, para ele todas as características herdadas pela criança já estavam presentes no sêmen do pai, cabendo a mulher somente a função de abrigar e fazer brotar o fruto que vinha do homem, idéia esta aceita e propagada na Idade Média. Para São Tomás de Aquino uma vez a mulher tendo sido moldada a partir das costelas de um homem sua alma tinha a mesma importância que a do homem, para ele no céu predomina igualdade de direitos entre os sexos, pois assim que se abandona o corpo desaparecem as diferenças de sexo passando a ser tudo uma coisa só. Para Spinoza:
[...] Os homens, já se sabe, costumam amar as mulheres
exclusivamente por um desejo sexual; estão dispostos a
apreciar sua inteligência e sua sabedoria somente se são
ao mesmo tempo bonitas. Por outro lado, os homens
suportam muito mal as mulheres que amam concedam
a menor mostra de interesse por outros homens; e assim,
contudo [...] Por isso, vemos sem esforço que se os homens
e as mulheres assumissem conjuntamente a autoridade política,
a paz se ressentiria muito com essa possibilidade permanente
De conflitos. (Tratado Político, capítulo XI)
Para Arthur Schopenhauer: "A mulher tem miopia intelectual, seu horizonte é muito pequeno. Só o aspecto da mulher revela que não está destinada aos grandes trabalhos intelectuais, nem aos grandes trabalhos materiais. Tem que obedecer ao homem, ser uma companheira paciente que o tranqüilize. O que faz as mulheres particularmente aptas para cuidar de nós e nos educar na primeira infância, é que elas mesmas continuam sendo infantis, fúteis e limitadas de inteligência. Permanecem por toda vida crianças grandes. Não vêem além do que está diante dos olhos, fixam-se apenas no presente, tomam as aparências por realidade e preferem as frivolidades às coisas mais importantes. O que distingue o homem do animal é a razão. Preso ao presente, é capaz de voltar ao passado e sonhar com o futuro; daí sua prudência, seus cuidados, suas freqüentes apreensões. A débil razão da mulher não participa dessas vantagens nem desses incovenientes. No fundo de seu coração, as mulheres acreditam que os homens vieram ao mundo para ganhar dinheiro, e as mulheres para gastá-lo. [...] a natureza não deu à mulher mais que a dissimulação para defender-se e proteger-se." (O amor, as mulheres e a morte).
Para Hegel a altercação existente entre um homem e uma mulher é igual a que há entre um animal e uma planta, sendo que o animal se identifica mais com o jeito do homem e a planta se molda mais conforme o aspecto da mulher, pois seu progresso é mais pacato, deixando-se levar mais pelo sentimentalismo, se estiverem no comando o Estado corre perigo pois, segundo ele, elas não atuam de acordo com as exigências do agrupamento de pessoas que estão governando e sim conforme seu estado de espírito. Em Rousseau, o quinto capítulo do Emílio é marcado pela construção de um conhecimento que esvazia a possibilidade da mulher pensar. Segundo ele, "elas devem aprender muitas coisas, mas apenas aquelas que lhes convém saber". Para Nietzsche, em Além do Bem e do Mal: "As mulheres têm muito de que envergonhar-se; há na mulher muito pedantismo, superficialidade, primarismo escolar, vaidadezinha, desmesura e indiscrição oculta? que tem sido restringida e dominada por medo do homem. [...] A mulher deve ser considerada como propriedade do homem, como fazem os orientais."
Com isto fica claro que estudos sobre as mulheres geralmente apresentam-se em obras menos famosas, as quais tratam de temas relacionados à moral, o que, indubitavelmente contribuiu para que a questão da discriminação da mulher passasse despercebida. Além disso, quando o tema relativo às mulheres surge em obras filosóficas, este é exageradamente carregado de muitos preconceitos, buscando provar uma suposta inferioridade natural feminina. Todavia, embora a discriminação sofrida pelas mulheres no caminho da filosofia é notável que, ao longo da história da filosofia, certas mulheres se enfatizaram como criaturas humanas que procuraram pela sabedoria e trilharam os passos da ciência. Mesmo sem o devido reconhecimento, A história da filosofia demonstra a presença de várias mulheres filósofas, seus trabalhos não foram reconhecidos e divulgados por questões culturais, mas a filosofia desde as suas origens pertenceu ao gênero humano independente de gênero.
Na Antiguidade temos Temistocléia (filósofa, matemática e uma alta profetisa de Delfos, que viveu no século VI a.C. e foi a grande mestra de Pitágoras, introduzindo-o aos princípios da ética. Depois de Pitágoras criar o termo filosofia, Temistocléia teria sido a primeira mulher filósofa do Ocidente); Safo de Lesbos (representa a criação da poesia lírica grega, em contraposição à poesia épica (Homero). Da sua obra conservaram-se dez livros); Theano (filósofa e física. Theano foi aluna de Pitágoras e supõe-se que tenha sido sua mulher. Acredita-se que ela e as duas filhas tenham assumido a escola pitagórica após a morte do marido); Aspásia de Mileto (sofista da época, e como todo sofista, há relatos de sua habilidade como argumentadora e educadora, bem como sua influência política sobre Péricles); Diotima de Mantinéia (Personagem criada por Platão é apresentada como sábia no diálogo o Banquete. Não se sabe ao certo se existiu, mas acredita-se que sim. A ela atribui-se toda a teoria socrático-platônica do amor); Asioteia de Filos (Ensinava física na Academia de Platão ao lado de outras mulheres que frequentavam a escola) e Hipácia de Alexandria (Cultivou superiormente as matemáticas e a filosofia. Manteve viva a chama do pensamento helênico de raiz ateniense numa Alexandria dilacerada pelas lutas religiosas. Foi brutalmente assassinada por uma multidão de fanáticos cristãos).
Na Idade Média temos Hildegarda de Bingen, Heloísa de Paráclito, e Catalina de Siena (Considerada a primeira autora profissional. Sua obra mais famosa foi escrita em 1405, "A Cidade das Mulheres". Questiona a autoridade masculina dos grandes pensadores e poetas que contribuíram para a tradição misógina e decide fazer frente às acusações e insultos contra as mulheres).
Na Idade Moderna temos Mary Astell (Uma pensadora que unificou suas convicções filosóficas e religiosas em uma visão feminista. Inovou o campo moral e pedagógico de sua época. Tem influência de Locke e Rousseau) e Olímpia de Gouges (São mais de quatro mil páginas de escritos revolucionários, peças de teatro, panfletos, novelas, sátiras, utopias e filosofia. Foi presa por questionar a escravidão dos negros; tomou posições em favor dos direitos da mulher).
Na Idade Contemporânea temos Edith Stein (tradutora de obras de São Tomás de Aquino e Newman e publicou "Sobre o Estado e a Fenomenologia de Husserl". Interessou-se pela questão feminina no campo filosófico e religioso, publicando "Ethos" das profissões das mulheres. Morreu numa câmara de gás); Maria Zambrano (faz parte de um grupo de intelectuais que com missões pedagógicas, iniciam uma experiência de educação popular. A relação entre poesia e filosofia, o mito e a razão, a paixão e o intelecto, a obra e a ação, o papel dos intelectuais e o sentido da história são suas principais preocupações); Hannah Arendt (inicia uma reflexão dos acontecimentos de sua época; pensa de um modo novo a política e critica a tradição filosófica de seu tempo e seus contemporâneos); Simone de Beauvoir (Representante do Existencialismo. Viajou pelo mundo debatendo sua produção filosófica, com grupos políticos e feministas); Simone Weil (Ativista radical dos anos 70 no movimento político Black Power- as panteras negras. Debate os conceitos de liberdade e liberação, bem como a reflexão sobre o sexismo e racismo, ao lado da classe e o poder. Seus escritos trazem um pensamento transformador para a reflexão filosófica no século XX); Susanne Langer (foi uma grande especialista em filosofia da arte, defende que a obra de arte como um símbolo que articula a vida emocional do ser humano); Sarah Kofman (filósofa francesa com mais de 20 livros publicados, sobre diferentes assuntos; estudos sobre a mulher na psicanálise freudiana (considerada a mais completa análise sobre a sexualidade feminina em Freud), a trajetória da mulher na filosofia ocidental e estudos sobre Nietzsche) e Julia Kristeva (filósofa búlgaro-francesa. Erudita, é autora vários livros em variadas áreas de conhecimento, como arte, lingüística, feminismo e pós-estruturalismo).
Após todo o conteúdo exposto, está explícita esta visão do "feminino" que esteve presente na história da filosofia e continua sendo um desafio para as mulheres filósofas, pois mesmo depois de tanta luta feminista e evolução nas leis da sociedade, a mulher continua a ser pouco valorizada dentro da academia, o que nos faz até mesmo pensar que as pensadoras são quase que inexistentes quando na verdade são inúmeras. No entanto, é preciso ter em mente que as abordagens sobre a mulher encontram-se numa história da filosofia que foi escrita por homens; mas também não devemos esquecer que enquanto ser humano, a mulher é dotada de razão, mas o uso pleno e adequado ainda está reservado, em grande maioria, ao ser masculino; o que deve ser mudado imediatamente.