INTRODUÇÃO

Na década de 80, conheci um grupo de jovens numa capela da igreja católica próximo à minha casa. Era um grupo pequeno com mais ou menos seis integrantes que se reuniam todos os sábados para rezar e discutir textos bíblicos. Junto a eles existia um seminarista que tinha sido enviado pela congregação MSC (Missionários do Sagrado Coração) com a função de estruturar e organizar a comunidade. Ele fazia visitas semanalmente, com propostas de trazer a vizinhança para a igreja, e com a ajuda do grupo isso foi aos poucos se concretizando. Baseadas nos estudos e propostas da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), novas ideias foram surgindo. Encontros e estudos eram feitos nas famílias, sempre com a presença de convidados. Tinham roteiros sobre os mais variados temas sociais, o que me fez despertar para um pensamento crítico; vale lembrar que neste período a igreja incentivava um pensamento sobre a consciência política embasada nas propostas da Teologia da Libertação, e foi embalada por estes pensamentos que a igreja participou ativamente dos movimentos das Diretas já, 100 anos de abolição da escravatura, Movimento Jovem Estudantil, entre outros temas polêmicos. Como membro integrante e líder de alguns grupos na comunidade, pude acompanhar e participar de alguns desses movimentos. A liderança era despertada nos grupos. O novo líder participava de retiros e encontros promovidos por uma coordenação de jovens regional, onde eram estimulados a conhecer o grupo liderado a partir de observações e incentivar a participação, democratização, união e integração na comunidade ativa. Para estes objetivos eram utilizados procedimentos como: leituras bíblicas, notícias de jornal e textos variados, dinâmicas, oficinas, jogos, brincadeiras e músicas. "Sal da terra de Beto Guedes, Coração de estudante e Amor de Índio de Milton Nascimento, O que é, o que é de Gonzaguinha e outras eram como hinos nos encontros. Cristo era visto como um jovem, amigo, político, lutador, determinado e forte, aquele que acreditava e fazia acontecer. Com essa forte ideologia fui construída e me construí.
Hoje com olhar voltado para a educação como processo social historicamente construído, comecei a perceber o grande número de analfabetos e de evasão escolar no bairro onde moro, vejo crianças, adolescentes e jovens abandonarem a escola por motivos conhecidos, como: gravidez na adolescência, trabalho, falta de incentivo dos pais, muito deles analfabetos. Acreditando que as dificuldades de aprendizagem seja também motivo para este grande número de abandono escolar e que a falta de compatibilidade curricular, projetos político pedagógicos, estrutura física do espaço escolar, formação dos profissionais de educação, políticas públicas, causas estas geradoras de efeitos como: evasão escolar por motivos de reprovação e repetência, promotoras da exclusão educacional e social sejam reais motivos para esta justificativa, resolvi conhecer os projetos pedagógicos das escolas do 2º e 3º distrito de São Gonçalo, conhecidos popularmente como interiores ou área rural. Ao observar o breve levantamento histórico de leis e documentos sobre educação e inclusão feitas por Abnhaim (2005), comecei a perceber que com o processo de globalização, iniciou-se uma nova era não só na comunicação, mas também no que diz respeito à educação. Mudanças nas relações internacionais quanto a questões econômicas, científicas, culturais, políticas e ambientais, levaram a UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação a Ciência e a Tecnologia) a eleger a educação "como eixo articulador do desenvolvimento", (Abnhaim, 2005) Para tentar amenizar as disparidades entre as regiões, neste mesmo período no Brasil, surgiram maiores cobranças da sociedade e abriram-se espaço à percepção da diversidade na escola com a nova constituição (1988) e a reformulação da LDB (Leis de Diretrizes e Bases - Lei nº 9.424/96) criando e regulamentando o FUNDEF (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério), mais tarde FUNDEB (Fundo de Manutenção e desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação Segundo Vieira (2009).
Como suporte para entendimento teórico metodológico das origens e produções das dificuldades de aprendizagem e o processo histórico de inclusão, utilizei como base teórica Maria Helena Souza Patto, que em A produção do fracasso escolar elabora um quadro de referências histórico e sociológico objetivando a compreensão do fracasso escolar enquanto processo psico-social. Evanir Abnhaim, que em Os caminhos da inclusão: Breve histórico faz um levantamento histórico de leis e documentos sobre educação e inclusão no Brasil e no mundo. Rosita Elder Carvalho, que com Temas em Educação Especial faz uma análise sobre a produção de deficiência relacionada a diversas questões culturais e educacionais. Para entendimento e alcance dos meus objetivos de conhecer e relatar projetos pedagógicos para alunos com dificuldades de aprendizagem de acordo com o lugar onde a escola está inserida como espaço histórico social cultural e apresentar este espaço como objeto de investigação direta como possibilidade de conhecimento, utilizei o texto de Cipriano Luckesi, "O conhecimento: elucidações conceituais e procedimentos metodológico" que faz uma
abordagem sobre o que é conhecimento, seu sentido e significado, mostrando a importância do seu entendimento para a utilidade no exercício das atividades docentes e o texto de Helena Copetti Callai, Aprendendo a ler o mundo: a geografia nos anos iniciais do ensino fundamental, que apresenta a importância e respeito na prática educativa progressista da leitura de mundo partindo da identidade cultural local. Para o alcance de resultados concretos, nestas presentes pesquisas procurei saber se existiam nas escolas do interior de São Gonçalo, projetos para alunos com dificuldade de aprendizagem percebendo algumas questões que dificultavam a permanência desses alunos na escola, conheci e apresentei alguns projetos pedagógicos das escolas da rede pública de ensino, observei como o educador trabalha a educação relacionada à realidade local, relatei a realidade educacional do 2º e 3º distrito de São Gonçalo e apresentei alguns pontos históricos sócios culturais do panorama local, pois embora não reconhecida formalmente, o Município de São Gonçalo possui uma área conhecida como interior ou rural, pela população e também pela divisão regional da Igreja Católica no Estado do Rio de Janeiro (2º e 3º distritos de acordo com a divisão política da cidade) correspondente a mais de 50% de sua extensão territorial. Fazenda fundada no século XVII, Igreja construída por escravos, um cemitério fundado em 1842, serras e reservas que fazem a divisa com o município de Maricá, considerada o ponto mais alto de São Gonçalo integram uma belíssima história cultural a um contexto social e histórico da cidade, possibilitando ótimo recurso para produção de conhecimento na escola. Após as diversas observações, percebi que as questões que dizem respeito às dificuldades de aprendizagem que elevam o grande número de analfabetos em todo País teriam ligações profundas com o processo de inclusão, então, após observar um trecho do principio da Carta de Salamanca para educação especial, direcionei-me com questionário para coordenadores pedagógicos sobre projetos e práticas educativas da escola relacionadas à localidade espacial e aos conceitos de inclusão e exclusão escolar e social. Tive como meta, saber na opinião deles, se a escola dispõe de projetos para alunos com dificuldades de aprendizagem e se o processo de inclusão resolve o problema da exclusão escolar e social. Fiz observações nas escolas quanto ao espaço físico, e se existem adaptações e recursos.
Considerando estes assuntos pertinentes e desafiadores não só para a escola, mas também para toda sociedade, acredito que com este estudo, escolas e sociedade possam refletir sobre seu papel formador de sujeitos na história e tentarem encontrar juntos, de maneira menos segregadora, numa sociedade elitista e ideologicamente seletista, melhores métodos de interação e trabalho, para formar cidadãos, evitando assim a "produção de deficiências", (CARVALHO, 1988, p.135) geradora da exclusão social.