Tecnologia microarray (biochips de DNA)

Por Laurí Mayer | 22/04/2009 | Arte

O acúmulo de conhecimento que está sendo gerado pela ciência nas últimas décadas é algo sem precedentes na história da humanidade. Este processo continua em aceleração e, a cada ano que passa o volume de descobertas científicas bem como de artigos publicados aumenta consideravelmente. Na área da biologia celular e molecular, por exemplo, têm se conseguido progressos fantásticos e inimagináveis quando a estrutura da dupla hélice do DNA foi desvendada a pouco mais de meio século. Os avanços nas técnicas de biologia molecular, aliada ao considerável desenvolvimento da bioinformática em anos recentes têm possibilitado gerar uma enorme quantidade de dados, bem como fazer descobertas fantásticas com aplicações igualmente maravilhosas. Como exemplo, podemos citar as pesquisas com células tronco, vacinas recombinantes, seqüenciamento de vários genomas (desde bactérias até o homem), etc.

Os microarrays, também popularmente conhecidos como biochips de DNA, são micro arranjos de DNA dispostos em um suporte sólido, geralmente um vidro especial, com tamanho semelhante com uma lâmina de microscópio óptico. Esta recente tecnologia, que ainda não é muito difundida no Brasil, permite analisar um grande volume de dados simultaneamente, sendo uma técnica poderosa na análise prévia da composição genômica de determinado organismo ou traçar um perfil da expressão gênica deste genoma em determinado momento.

Basicamente, eles são constituídos de uma lâmina de vidro (geralmente) onde estão aderidos oligonucleotídeos de DNA fita simples de aproximadamente 50 a 70 pb. Cada oligonucleotídeo possui uma seqüência representativa de um determinado gene. Ainda, cada oligonucleotídeo está aderido em um ponto específico do slide (microarray), conhecido como spot. Uma único slide pode conter dezenas ou até centenas de milhares de spots, cobrindo assim um determinado genoma inteiro. Para a sua construção, o genoma de interesse é primeiramente seqüenciado e então um oligonucleotídeo de DNA fita simples de cada gene é representado no microarray. O processo de construção do biochip é todo robotizado e requer uma estrutura complexa para a sua execução. Os oligonucleotídeos podem ser impressos (aderidos) no biochip ou sintetizados diretamente sobre ele. O laboratório que deseja trabalhar com esta técnica não necessita possuir toda a estrutura para a construção do biochip, pois há empresas especializadas que fornecem o microarray.

Objetivos da técnica

A principal aplicação desta tecnologia está no estudo de perfis de expressão gênica de todos os genes de determinado genoma. Outra aplicação é no mapeamento genômico de genomas relacionados com o genoma de referência (representado no biochip). No primeiro caso utiliza-se o mRNA e no último caso o DNA genômico. Em estudos de expressão gênica, a maior vantagem, é que é possível em um único experimento, mensurar a expressão de milhares de genes simultaneamente. Quando se deseja analisar a expressão de apenas alguns genes, a técnica de real-time PCR é geralmente empregada, que consegue analisar a expressão de até 4 genes simultaneamente. Quando se deseja analisar o perfil da expressão gênica no nível de genoma, esta técnica é tecnicamente inviável, já que, por exemplo, para um genoma bacteriano de 4 mil genes, seriam necessários 1000 análises. Esta tecnologia usa o princípio da complementaridade de bases dos ácidos nucléicos. Essencialmente, microarray é uma técnica de hibridização de ácidos nucléicos em grande escala.

Executando a técnica

Para explicar o funcionamento da técnica, será abordado seu uso em experimentos de expressão gênica. O protocolo geral não difere muito nas duas aplicações.

Primeiramente, é feita a extração do mRNA nas condições do estudo. Em qualquer experimento, sempre será utilizado material genético de duas situações distintas, onde uma será a amostra controle e a outra a amostra experimento. No momento de coletar a amostra de células para a extração do mRNA, as mesmas devem ser imediatamente colocadas em temperaturas de congelamento, para evitar que enzimas RNAses degradem parcialmente o RNA, comprometendo seriamente a confiabilidade dos resultados. Após a extração do mRNA conforme protocolo específico para cada caso, é realizada uma RT-PCR, obtendo como produto final de interesse o cDNA. As amostras de cDNA são coradas com compostos fluorescentes, geralmente as cianinas Cy3 e Cy5, sendo que uma amostra é corada com Cy3 e a outra com Cy5. Este cDNA corado é então desnaturado por aquecimento e hibridizado com o biochip (Fig. 1).

Fig. 1. Esquema mostrando as principais etapas da técnica de microarray. (Céditos da foto: http://www.scq.ubc.ca).

Quando a solução contendo o cDNA corado for colocado sobre a lâmina de microarray, ocorrerá a hibridização entre este cDNA e o DNA do biochip, pelo princípio da complementaridade das bases de DNA. Após a hibridização o biochip é colocado em um scanner especial, que irá fazer a leitura da intensidade da fluorescência nos comprimentos de onda referente aos 2 compostos fluorescentes utilizados. Cy3 emite a cor verde, e Cy5 a cor vermelha. É fácil deduzir que quando um determinado gene é expresso em ambas as amostras, o spot correspondente no microarray irá hibridizar com ambos os mRNAs. Como conseqüência, este spot emitirá tanto a cor verde como a cor vermelha, resultando na cor amarela. Durante a leitura o scanner digitaliza a imagem em alta resolução, para análise posterior. As imagens digitalizadas são então analisadas por um software específico que irá converter a cor e a intensidade da fluorescência em um conjunto de valores numéricos. Os arquivos resultantes (valores numéricos) são analisados posteriormente em outros softwares onde os dados são filtrados e tratados estatisticamente.

Esta tecnologia está auxiliando pesquisas nas mais diversas áreas. Um exemplo importante é na pesquisa do câncer, onde normalmente se compara a expressão gênica de células saudáveis e de células do tumor, para analisar as diferenças na sua expressão gênica e assim identificar genes que possuem uma função chave no desenvolvimento do câncer.