A educação no Brasil tem enfrentado grandes desafios. Desafios estes que nos remetem a um novo pensar, a uma nova forma de agir e principalmente de educar.

Estamos impregnados de velhos modelos e conservadorismos que não condizem mais com o momento planetário atual. Há a necessidade de repensarmos a educação, de forma que possamos sair da utopia e passar para o plano real. Idealizamos uma educação diferente, uma escola diferente e um mundo melhor, porém, o que fazemos é repetir os velhos modelos de séculos passados ou simplesmente negamos o caos, como se não tivéssemos responsabilidade com o todo.

A partir do entendimento de que educar é fazer o indivíduo sair de dentro de si e integrar-se com a sociedade na qual está inserido, relacionando-se de forma que possa construir o progresso próprio e da comunidade planetária da qual todos fazemos parte, concluo que educar não é uma tarefa fácil, e requer pessoas abertas ao novo e, principalmente, dispostas a buscar conhecer o ser humano na sua complexidade 2. A forma como se dará a relação homem / comunidade planetária depende de uma série de fatores, e a educação é um dos principais responsáveis pelo resultado dessa relação.

É imprescindível que mudemos a nossa forma de educar, mas isso depende de nos reeducarmos. Precisamos aprender a olhar o mundo como um todo, cientes de que tudo está interligado. E, a partir disso, adquirir uma consciência coletiva, sabendo que todas as nossas ações, sejam elas positivas ou negativas, irão refletir no todo.

Os problemas que necessitam ser resolvidos são mundiais. A fome no Brasil não é um problema somente dos brasileiros, assim como a miséria na África não é um problema somente dos africanos. As guerras, a violência, a devastação do meio ambiente, enfim, todas essas crises atuais são globais e não isoladas como pensamos e vemos.

Segundo Capra (1996, p. 23), "quanto mais estudamos os problemas de nossa época, mais somos levados a perceber que eles não podem ser entendidos isoladamente. São problemas sistêmicos, o que significa que estão interligados e são interdependentes".

Se passarmos a visualizar a relação entre homem-meio ambiente-comunidade planetária como matérias interdependentes, poderemos ter mais clareza e ampliar a nossa visão a respeito do que temos feito com nossas crianças e jovens no âmbito escolar.

Atualmente, as crianças e os jovens são levados a estudar uma quantidade de disciplinas que são ensinadas isoladamente, o que não os leva a fazer relações desses conteúdos ensinados em sala de aula com a própria vida. Estamos massacrando a mente de nossos alunos com uma série de conteúdos e pouco nos preocupamos com o ser humano que está recebendo essas informações. Queremos que eles compreendam e aprendam, mas poucos são os educadores que se envolvem com a história de vida do aluno que não consegue aprender e "incomoda" o professor e os colegas em sala de aula.

Cury (2003, p. 106), coloca que" o registro na memória é involuntário".

"(...) As experiências tensas são registradas no centro do inconsciente, e a partir daí serão lidas continuamente. Com o passar do tempo, elas vão sendo deslocadas para a periferia inconsciente da memória, chamada de ME, memória existencial.

Em alguns casos, o volume de ansiedade ou sofrimento pode ser tão grande que provoca um bloqueio da memória.

Normalmente as experiências com alta carga emocional ficam disponíveis para serem lidas e gerarem milhares de novos pensamentos e emoções". (CURY, p. 108)

O professor precisa conhecer o interior de seus alunos, os anseios, os medos, as dificuldades, as ansiedades, enfim, precisa conhecer o ser humano para educá-lo. A partir do momento em que o professor vai conhecendo seus alunos, ele passa a se envolver de maneira mais efetiva com os problemas educacionais e sociais e, conseqüentemente, ele deve tornar-se mais sensível, apto a mudanças, quando necessárias e aberto às novas idéias.

Hoje, consideramos bons professores aqueles que têm uma boa cultura acadêmica, são eloqüentes, têm um currículo exemplar e transmitem o seu conhecimento com segurança. Cremos que não há quem discorde de que todas essas distinções sejam importantes para um professor, mas, certamente, não são mais suficientes para um educador. O educador de hoje, ou melhor, o educador do futuro, deve ultrapassar o seu currículo de vários cursos, de vários idiomas, a sua segurança acerca dos conteúdos que deverão ser ensinados em sala de aula, enfim, o educador do futuro tem como grande desafio conhecer o ser humano.

Cury (2003, p. 57), distingue os bons professores dos professores fascinantes:

Bons professores têm uma boa cultura acadêmica e transmitem com segurança e eloqüência as informações em sala de aula. Os professores fascinantes ultrapassam essa meta. Eles procuram conhecer o funcionamento da mente dos alunos para educar melhor. Para eles, cada aluno não é mais um número em sala de aula, mas um ser humano complexo, com necessidades peculiares.

Os professores fascinantes transformam a informação em conhecimento e o conhecimento em experiência. Sabem que apenas a experiência é registrada de maneira privilegiada nos solos da memória, e somente ela cria avenidas na memória capazes de transformar a personalidade.

Estamos nos defrontando com uma crise de percepção, nossos valores estão invertidos e nos remetem a uma série de crises sociais, econômicas, políticas, psicológicas, ou seja, são vários setores que necessitam de uma mudança radical. Enquanto insistirmos em nos mantermos ligados ao nosso eu e à matéria, buscando satisfazer os nossos desejos mais supérfluos, estaremos caminhando na direção do abismo e certamente deixaremos como herança às gerações futuras a violência, a corrupção, a ganância, a competitividade, enfim, a má educação.

Os educadores devem estar abertos a mudarem seus valores para educar, e não podemos pensar a escola como o centro da educação, pois a escola não educa.

Temos nas escolas do Brasil e do mundo, muitos professores despreparados para lidarem com outros seres humanos. Há muitos professores que não estão dispostos a mudar seus olhares e ampliarem suas visões a ponto de comprometerem-se verdadeiramente com os problemas educacionais e sociais. Nossos líderes pouco ou nada fazem em relação à educação e à saúde. A sociedade está doente; as pessoas, sejam adultos ou crianças, encontram-se nervosas, agitadas, agressivas, impacientes, estressadas, por isso a família tende a responsabilizar a escola pela educação de seus filhos.

Em muitas famílias brasileiras, pais e filhos não conseguem ter uma relação amigável, de entendimento, compreensão e amor. Na escola, os professores estressados perdem a paciência com os alunos que não param em sala de aula, são agressivos ou alienados. Então que tipo de educação iremos construir se o que nos resta são pais estressados e negligentes, e professores desinteressados e estressados?

Precisamos seriamente cuidar uns dos outros. Não teremos a escola que sonhamos e que educa se continuarmos a destruir a nossa qualidade de vida, a qualidade de vida de nossos educadores, pais, crianças ou jovens.

Vejamos o que afirma Capra (1996, p.23) sobre a mudança de paradigma que se faz necessária em nosso tempo:

"Há soluções para os principais problemas de nosso tempo, algumas delas até mesmo simples. Mas requerem uma mudança radical em nossas percepções, no nosso pensamento e nos nossos valores. E, de fato, estamos agora no princípio dessa mudança fundamental de visão do mundo na ciência e na sociedade, uma mudança de paradigma tão radical como foi a revolução copernicana. Porém, essa compreensão ainda não despontou entre a maioria de nossos líderes políticos. O reconhecimento de que é necessária uma profunda mudança de percepção e de pensamento para garantir nossa sobrevivência ainda não atingiu a maioria dos líderes das nossas corporações, nem os administradores e os professores das nossas grandes universidades.

Nossos líderes não só deixam de reconhecer como diferentes problemas estão inter-relacionados; eles também se recusam a reconhecer como suas assim chamadas soluções afetam as gerações futuras".

A mudança de valores é o primeiro passo para começarmos a repensar a educação atual e partirmos em busca da escola do futuro. A escola do futuro exige que cuidemos não somente de nossos alunos, mas também de nossos educadores e, que estes estejam abertos para as novas possibilidades, novos pensamentos e novas visões. Mais do que cuidar de nossos educadores e alunos, é mister que resgatemos o valor e a importância da condição humana.

O homem é o centro da educação, pois ele é o gerador dos problemas atuais, então somente ele poderá e deverá solucionar esses problemas. Somos nós os responsáveis por todas as barbáries que o planeta tem passado, somos nós os devastadores do planeta, então, seremos nós os reconstrutores dessas calamidades.

Morin (2001, p. 47) coloca que há sete saberes que são necessários à educação do futuro e, entre eles, ressalta a condição humana:

"A educação do futuro deverá ser o ensino primeiro e universal, centrado na condição humana. Estamos na era planetária; uma aventura comum conduz os seres humanos, onde quer que se encontrem. Estes devem reconhecer-se em sua humanidade comum e ao mesmo tempo reconhecer a diversidade cultural inerente a tudo que é humano.

Conhecer o ser humano é, antes de mais nada, situá-lo no universo, e não separá-lo dele".

A educação atual está voltada para o conhecimento, mas transmite um conhecimento desconexo, fragmentado. O educando necessita receber as informações de modo que possa adquirir uma visão acerca do mundo em que vive, desenvolvendo a capacidade de refletir sobre sua condição enquanto ser humano.

Os educadores precisam reconhecer-se como seres capazes de educar, precisam despertar suas habilidades adormecidas, utilizando sua criatividade. Segundo Morin (2001, p.32), "necessitamos civilizar nossas teorias, ou seja, desenvolver nova geração de teorias abertas, racionais, críticas, reflexivas, autocríticas, aptas a se auto-reformar".

Os educadores necessitam congregar seus objetivos em relação a educação do futuro. É o momento de criarem projetos inovadores, que ultrapassem a fronteira das teorias. A educação exige que se crie um eixo de estudos e projetos educacionais pragmáticos e ao mesmo tempo humanizados. Hoje há um interesse maior em teorias que centralizem o homem e sua relação com o todo. As preocupações com o meio ambiente tem sido ressaltadas em muitas teses, e isso deve ser uma chave para que possamos pensar uma nova forma de educar o homem.

As instituições educacionais deverão assumir um novo posicionamento perante as dificuldades educacionais para que haja a possibilidade de uma nova geração pensante. Se continuarmos a pensar que educamos, há uma grande chance de não haver educação no futuro.

Temos que estar cientes de que os homens são educados por homens, e que estes homens que educam são seres bipolarizados, assim como seus educandos. Há em nós caracteres antagônicos, ou seja, ora somos racionais, ora irracionais, ora "homo sapiens, ora homo demens" 3, o que faz de nós seres humanos como nossos alunos. O que não podemos deixar de fazer é nos reeducarmos, mudar nossas posturas, rever valores, pedir auxílio, se assim for preciso, mas preparar-nos para adentrar no complexo campo da educação.

Os educadores precisam ter clareza de suas obrigações e assumirem suas responsabilidades como cidadãos, enfrentando os desafios que certamente surgirão. Hoje temos um grande desafio na educação, que é o desafio de conhecer o homem em sua complexidade e a partir daí, torna-se indispensável que ensinemos a nossos educandos a sua condição humana. Tanto os educandos quanto os educadores, precisam compreender-se como seres humanos complexos e que fazem parte de um todo. Devem aprender a enfrentar as incertezas do conhecimento e crescer em conjunto como seres éticos, capazes de gerenciar seus pensamentos e emoções. Os educadores necessariamente deverão deixar de se esconder atrás de um quadro-negro e enfrentarem os desafios de hoje, de forma que possam criar seres felizes, revolucionários e empreendedores.

Titles: Rethink the education: the school educates?

Abstract:

This article intends to bring to the reflection what it is to educate. It will be that we are, educators and pretense educators, looking at for what really it must be looked at?

It is essential that let us open hand of the ideas conservatives and let us start to search clarifications concerning what is truily to educate. Will be we them educators of the future or mere unconscious repeaters of the past?

According to Morin, the education of the future will have to be first and universal education, centered in the condition human being. To know the human being are, before more nothing, to point out it in the universe, and not to separate it of it.

Key-words: to educate - to rethink - new values - school - condition human being

REFERÊNCIAS

BUSARELLO, Raulino. Dicionário Básico Latino-Português. 6.ed. Florianópolis: UFSC, 2003.

CAPRA, Fritjof. A Teia da Vida. São Paulo: Cultrix, 1996.

CURY, Augusto. Pais brilhantes, Professores fascinantes. Rio de Janeiro: Sextane, 2003.

MORIN, Edgar. Os sete saberes necessários à Educação do Futuro. 3.ed. São Paulo: Cortez, 2001.

1 Do latim educere - fazer sair, tirar, criar, conduzir para. In Dicionário Básico Latino-Português

2 Complexus significa, segundo Morin, o que foi tecido junto; de fato há complexidade quanto elementos diferentes são inseparáveis constitutivos do todo (como o econômico, o político, o sociológico, o psicológico, o afetivo, o mitológico), e há um tecido interdependente, interativo e inter-retroativo entre o objeto de conhecimento e seu contexto, as partes e o todo, o todo e as partes, as partes entre si. Por isso, a complexidade é a união entre a unidade e a multiplicidade.

3 Segundo Morin, o ser humano é complexo e traz em si, de modo bipolarizado, caracteres antagonistas: homo sapiens e homo demens (ser humano sábio e ser humano louco).

Flávia Rocha David - Formada em Letras pela FAPA- Faculdades Porto-Alegrenses. Este artigo foi escrito no primeiro semestre de 2006, como instrumento parcial de avaliação da cadeira de Metodologia Científica