UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB

DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS HUMANAS – DCH

CAMPUS IV – JACOBINA

CURSO – BACHARELADO EM DIREITO

DISC. – DIREITO PENAL IV

DOCENTE – PROF. Ms URBANO FÉLIX

DISCENTE – PAULO SÉRGIO RIBEIRO DOS SANTOS

                         NEILAN LEITE

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

ARTIGO ACADÊMICO:

 

Por que o Charlatanismo e o Curandeirismo não são formas de Estelionato.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

                                  Jacobina (BA), dezembro de 2009

 

 

INTRODUÇÃO

 

 

 

 

            O tema deste artigo surgiu quando de uma aula de Direito Penal IV, ministrada pelo Prof. Ms. Urbano Félix, o mesmo discorria sobre “Dos crimes contra a saúde pública”, especificamente Charlatanismo e Curandeirismo.

           

Apesar dos dois tipos terem literalidades diferentes, com tipificações bem definidas a fim de serem configurados, como no Charlatanismo que é preciso “inculcar ou anunciar cura por meio secreto ou infalível”, onde até o próprio médico pode ser agente do tipo e no Curandeirismo que se faz necessário ou “a prescrição, ministração, aplicação ou uso de gestos, palavras ou qualquer outro meio bem como fazendo diagnósticos” através da habitualidade, onde uma pessoa leiga, inculta sem nenhum conhecimento em medicina, sem qualquer habilitação técnico-profissional, se mete a curar enfermidades físicas ou psíquicas, utilizando métodos grosseiros de empirismo.

           

Este trabalho visa desmitificar algumas práticas tão corriqueiras na nossa região que ainda tem uma forte influência sobre as pessoas, principalmente àqueles que não têm pouca ou nenhuma instrução escolar e de baixo poder econômico.

           

Sabemos que isto é uma herança cultural, religiosa e social fortíssima e que não será um simples trabalho acadêmico de bacharelado que fará a diferença, porém pode ser um começo para algo maior.

 

Não queremos oxalá, confrontar com a fé e as crenças das pessoas que adotam estas práticas, pelo contrário, queremos dar nossa contribuição para que isto permaneça, só que de forma sadia, valorativa, satisfatória. Nossa verdadeira intenção e dever, como acadêmicos de Direito, é informar às pessoas de certas práticas que às vezes apresentam-se num certo grupo social de forma despretensiosa, lúdica, rotineiras, mas que na verdade quem a prática tem uma intenção de obter um lucro, uma vantagem material, financeira ou até mesmo outros tipos de vantagem. Fazendo com que a fé popular seja um objeto de valor. Claro que vemos isto em várias igrejas “convencionais”, mas nosso objetivo não é entrar por este viés das igrejas e suas práticas pouco ortodoxas.

 

Além do mais, temos a Constituição Federal que no seu no Art. 5º, inciso VI, “protege a inviolabilidade a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantidos, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e as suas liturgias”.     

 

 

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ESTELIONATO

 

Código Penal – Título II – Dos crimes contra o patrimônio - Capítulo VI – Do estelionato e outras fraudes - Art. 171 – Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento.

 

Pena – reclusão, de um a cinco anos, e multa.

 

Este é o caput da tipificação do artigo 171 do Código Penal Pátrio juntamente com a pena infringida a quem o viole.

 

É sobre o caput deste artigo que nos debruçaremos para tentar esmiuçá-lo e trazê-lo à realidade do presente trabalho acadêmico, tentando trazer os pontos convergentes e divergentes com os outros tipos penais (Charlatanismo e Curandeirismo) enquanto estes podem ser enquadrados, perdendo sua força normativa sendo englobado pelo crime de Estelionato, que a princípio parece ser mais grave que os outros dois supracitados.

 

Esse nosso ponto de vista de que o Estelionato parece ser mais grave que o Charlatanismo e Curandeirismo é uma presunção relativa. Tentaremos explicá-la  quando da análise do objeto jurídico, objeto material e elementos objetivos de cada tipo for examinado.

 

CONCEITO

 

O estelionato, cuja denominação deriva de “stellio” (lagarto que muda de cores, iludindo os insetos de que se alimenta), é definido no art. 171 do CP. Existe o crime quando o agente, que pode ser qualquer pessoa, na modalidade genérica do caput, emprega qualquer meio fraudulento, induzindo alguém em erro ou mantendo-o nessa situação, conseguindo assim, uma vantagem indevida para si ou para outrem, com lesão patrimonial alheia. Sem fraude antecedente que provoca ou mantém em erro a vítima, levando-o à entrega da vantagem, não se há de falar em crime de estelionato.  Nas modalidades previstas no § 2º, é preciso ser pessoa envolvida em algum negócio ou o dono ou o legítimo possuído de determinada coisa. Porém, como já citado anteriormente, nos deteremos exclusivamente na primeira parte do caput do artigo.

 

OBJETO JURÍDICO

 

Tutela-se a inviolabilidade do patrimônio. O dispositivo penal visa, em especial, reprimir a fraude causadora de dano ao patrimônio do indivíduo.

 

OBJETO MATERIAL

 

É a vantagem obtida ou coisa alheia, bem como a pessoa que incide em erro

 

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ELEMENTOS OBJETIVOS DO TIPO:

 

AÇÃO NUCLEAR

 

            Há várias formas de cometimento de estelionato, prevendo a genérica no caput do artigo.

            Trata-se de crime em que, ao invés da violência ou grave ameaça, o agente emprega um estratagema para induzir em erro a vítima, levando-a a ter uma errônea percepção dos fatos ou para mantê-la em erro, utiliza-se de manobras para impedir que ela perceba o equívoco em que labora.

            Os meios empregados para tanto são:

1)      Artifício: significa fraude no sentido material. Astúcia, esperteza;

2)      Ardil: é fraude no sentido imaterial, intelectualizada, dirigindo-se à inteligência da vítima e objetivando excitar nela uma paixão, emoção, convicção pela criação de uma motivação ilusória;

3)      Qualquer outro meio fraudulento: embora compreenda o artifício e o ardil, constitui expressão genérica, a qual deve ser interpretada de acordo com os casos expressamente enumerados (interpretação analógica), ou seja, após ter mencionado duas modalidades de meios enganosos , o tipo penal faz referência a qualquer outro semelhante ao artifício e ao ardil, que possa, igualmente, ludibriar a vítima

 

SUJEITO ATIVO

 

Trata-se de crime comum que pode ser praticado por qualquer pessoa. Nada impede a co-autoria ou participação. É possível que na hipótese do concurso de agentes um sujeito empregue fraude contra a vítima, enquanto outro obtém a indevida vantagem patrimonial. Neste caso, ambos são sujeitos ativos. Pode ocorrer, também, que o sujeito, empregando engano, obtenha da vítima vantagem ilícita para terceiro. Pode ocorrer que o sujeito, empregando engano, obtenha da vítima vantagem ilícita para terceiros. O Código Penal, definindo o fato, diz que a obtenção é para o sujeito ou para outrem. Este terceiro cometerá o crime na hipótese de ser destinatário doloso do proveito ilícito.

 

SUJEITO PASSIVO

 

É a pessoa enganada e que sofre o prejuízo patrimonial. Nada impede que haja dois sujeitos passivos: um que é enganado e outro que sofre o prejuízo patrimonial. É necessário que a vítima seja determinada. Tratando-se de sujeitos passivos indeterminados, há crime contra a economia popular e não estelionato. Por exemplo: balança viciada de um açougue. O enganado terá de ter capacidade para ser iludido, pois, se for louco ou menor, incorrerá o agente no crime de abuso de incapazes (art. 173 CP) ou crime de furto (art. 155 CP).

 

 

 

 

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MOMENTO CONSUMATIVO

 

Trata-se de crime material. Consuma-se com a obtenção da vantagem indevida, em prejuízo alheio, ou seja, quando o agente aufere o proveito econômico, causando dano à vítima. Via de regra, esses resultados ocorrem simultaneamente. Há, assim, ao mesmo tempo, a obtenção de proveito pelo estelionatário e o prejuízo da vítima.            

 

 

ARREPENDIMENTO POSTERIOR

 

Já é pacífica a doutrina o entendimento de que mesmo havendo a reparação do dano patrimonial antes do recebimento da denúncia não afasta o crime de estelionato. Assim, aplicam-se as seguintes regras à figura fundamental do crime de estelionato (caput):

1 – antes do recebimento da denúncia - o arrependimento e reparação constituem causa geral de diminuição de pena;

2 - depois do recebimento da denúncia e antes da sentença – o arrependimento e a reparação constituem circunstâncias atenuantes genéricas.

 

TENTATIVA

 

É admissível. Há tentativa se o agente não logra obter a vantagem indevida por circunstâncias alheias à sua vontade ou mesmo enganando a vítima, não obtém a vantagem ilícita ou obtendo-a, não causa prejuízo a ela ou a terceiro. Exemplo: no conto do bilhete premiado, enganando o ofendido, o sujeito é surpreendido no momento em que está recebendo o dinheiro.

 

FIGURA TÍPICA PRIVILEGIADA

 

O Código Penal, na espécie, define o estelionato privilegiado, impondo ao juiz, se o criminoso é primário e de pequeno valor o prejuízo causado pelo fato, substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços, ou aplicar somente a pena de multa.

 

FIGURA TÍPICA QUALIFICADA

 

Nos termos do art. 171, § 3º do CP, a pena aumenta-se de um terço se o crime é cometido em detrimento de entidade de direito público ou de instituto de economia popular, assistência social ou beneficência.

 

O fundamento da qualificadora reside na maior extensão do dano causado pelo fato, uma vez quer atinge entidades de expressivo interesse coletivo. A forma típica qualificada é aplicável tanto ao caput do art. 171 quanto aos subtipos de seu § 2º.

 

 

 

 

 

 

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AÇÃO PENAL

A ação penal é pública incondicionada. Por isso, a autoridade policial, tomando conhecimento da prática do fato, deve proceder de ofício, instaurando o inquérito. O Promotor Público, recebendo o procedimento policial, está obrigação a iniciar a ação penal por intermédio da denúncia, desde que haja elementos no sentido da existência do estelionato. Excepcionalmente, a ação penal é pública condicionada à representação. Isso ocorre quando o delito é cometido em prejuízo de cônjuge judicialmente separado ou de tio ou sobrinho, com quem o sujeito coabita.

 

 

 

 

 

CHARLATANISMO

 

Código Penal – Título VIII – Dos crimes contra a saúde pública - Capítulo III – Dos crimes contra a saúde pública – Art. 283 – Inculcar ou anunciar cura por meio secreto ou infalível.

 

Pena – detenção, de três meses a um ano, e multa.

 

 

CONCEITO

 

O termo charlatanismo vem de charlar, do italiano ciarlare, que quer dizer conversar. De início, parece que só isso satisfazia os charladores. Enchiam o seu tempo e dos ouvintes, mais ou menos agradavelmente, conversando apenas. É como quem diz “jogando conversa fora” “ou “ dando pontos sem nós”. Depois, esses charladores julgaram de bom aviso unir o útil ao agradável e, então, vendiam drogas, apregoando-as com exageros. Então surge a medicina desonesta. Os homens querem mais do que o alívio e o consolo, querem a cura e por qualquer preço. E assim confiam em tudo o que sejam promessas. Às vezes estimulam essas promessas embusteiras. Nesse terreno propício a impostura, os charlatães ganham espaços. Em suma, charlatanismo é “inculcar ou anunciar cura por meio secreto e infalível”. No segredo e na infalibilidade estão os pontos fundamentais do ilícito moral e legal, porque a medicina não pode agir por meios secretos, devendo ser franca e leal, ficando a infalibilidade num plano utópico.

 

OBJETO JURÍDICO

 

            Tutela-se a saúde pública. Em que pese tratar-se de verdadeiro estelionato, pois presente a fraude e, por vezes, a vantagem patrimonial, o legislador optou por considerá-lo crime contra a saúde pública, na medida em que a falsa cura anunciada pode fazer com que os incautos retardem ou deixem de procurar o tratamento convencional da doença, o que acarretaria riscos para a vida ou saúde dessas pessoas.

 

 

 

 

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ELEMENTOS OBJETIVOS DO TIPO:

 

 

            AÇÃO NUCLEAR: trata-se de ação de ação múltipla. As ações nucleares consubstanciam-se nos verbos:

1)      Inculcar: sugerir, aconselhar, propor, apregoar ou dar a entender;

2)      Anunciar: é a divulgação pelos mais variados meios (rádio, televisão, panfletos, cartazes, etc.).

O agente inculca ou anuncia cura que é o restabelecimento da saúde de alguém que estava enfermo por meio secreto ou infalível. Tem-se por fim punir aquele que, sendo médico ou não, se promove à custa de método dos questionáveis e perigosos de curar pessoas, de maneira oculta ou ignorada do paciente e do poder público, além de divulgar mecanismos inverídicos de cura, visto não existir nada infalível quando se trata de cura de enfermidades. O charlatão, dessa forma, propõe ou divulga a cura de doenças mediante o uso de remédios ou processos de que somente ele tem conhecimento ou então que se diz infalível. O aviso ou anúncio da cura simples não é delito. O Código veda é a indicação ou reclamação de cura por processo secreto ou infalível. Sem isso haverá violação da ética.

 

SUJEITO ATIVO

 

         Qualquer pessoa pode praticar esse delito, inclusive o médico, caso anuncie a cura por meio secreto ou infalível.                                                                                                                                       

SUJEITO PASSIVO

 

         É a coletividade, a sociedade, pois se trata de crime de perigo comum, bem como a pessoa que venha a ser enganada pelo charlatão.

 

MOMENTO CONSUMATIVO

 

         Consuma-se com o mero ato de propor, sugerir, isto é, inculcar, bem como o de divulgar a cura de doença por meio secreto ou infalível. Quando as condutas típicas forem praticadas, independentemente de prejuízo efetivo para a saúde de terceiro. É crime de perigo abstrato, pois a lei presume o risco à coletividade com o mero anúncio da falsa cura.

         Conforme a doutrina, não se trata de crime habitual, isto é, o tipo penal não exige a prática reiterada do charlatanismo para que o crime se configure. Um único anúncio no rádio no sentido de que o agente pode curar a AIDS já se configura esse crime.

 

TENTATIVA

          É admissível.

 

 

 

 

 

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FORMAS:

 

         Simples: prevista no caput do artigo.

         Qualificada pelo resultado: prevista no art. 285: “aplica-se o disposto no art. 258 aos crimes previstos neste Capítulo, salvo quando ao definido no art. 267

 

AÇÃO PENAL

 

         É crime de ação penal pública incondicionada; independe, portanto, de representação do ofendido ou de seu representante legal. Em virtude da pena máxima cominada (detenção de três meses a um ano e multa), trata-se de infração de menor potencial ofensivo, sujeito às disposições da Lei. nº 9.099/95. Em face da pena mínima prevista é cabível a suspensão condicional do processo.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

CURANDEIRISMO

 

Código Penal – Título VIII – Dos crimes contra a saúde pública - Capítulo III – Dos crimes contra a saúde pública – Art. 284 – Exercer o curandeirismo:

I - prescrevendo, ministrando ou aplicando, habitualmente, qualquer substância;

II – usando gestos, palavras ou qualquer outro meio;

III – fazendo diagnósticos.

 

Pena – detenção, de seis meses a dois anos.

 

Parágrafo único – se o crime é praticado mediante remuneração, o agente fica também sujeito à multa.

 

CONCEITO

 

            É a atividade grosseira de cura por quem não possui nenhum conhecimento de medicina. A prescrição, ministração ou aplicação devem ter por objeto qualquer substância, podendo ser do reino animal, vegetal ou mineral. Pouco importa se a substância é ou não nociva à saúde ou se tem propriedades idôneas à cura pretendida pela pessoa que procura o curandeiro.

 

OBJETO JURÍDICO

 

            É a saúde pública da coletividade exposta a perigo pela prática do curandeirismo, pela atividade de pessoas ignorantes e atrasadas, que de medicina não possuem a menor noção, propondo-se a curar os que as procuram.

 

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ELEMENTOS OBJETIVOS DO TIPO:

 

            AÇÃO NUCLEAR: a conduta típica consiste em exercer, isto é, praticar o curandeirismo de forma habitual. Trata-se de crime de forma vinculada, pois a lei elenca os diversos modos de execução:

1.1) Prescrevendo: receitando, indicando como remédio ou receitando;

1.2) Ministrando: fornecendo para ser ingerido ou utilizado por alguém;

            1.3) Aplicando: empregando ou utilizando em alguém;

               2) Usando gestos, palavras ou qualquer ou meio(gesticulando, falando ou agindo de qualquer maneira que simboliza um ritual;

               3) Fazendo diagnósticos: aqui o agente determina qual a doença que acometeu a vítima por meio da análise dos sintomas. Tal ação é extremamente perigosa, na medida em que a vítima, com base no falso diagnóstico, poderá deixar de procurar tratamento médico convencional.

 

SUJEITO ATIVO

 

            Qualquer pessoa que não possua conhecimentos médicos pode praticar esse delito, não se exigindo qualidade especial.

 

SUJEITO PASSIVO

 

            É a coletividade, é a sociedade, pois se trata de crime de perigo comum, bem como a pessoa que venha a ser tratada pelo curandeiro.

 

ELEMENTO SUBJETIVO DO CRIME:

 

            É o dolo, consubstanciado na vontade livre e consciente de exercer o curandeirismo por meio de um dos modos de execução previstos no tipo penal. Se houver a finalidade de lucro, incidirá o parágrafo único, que prevê a aplicação cumulativa da pena de multa. Não é necessário que o agente efetivamente obtenha a remuneração.

 

MOMENTO CONSUMATIVO

 

            Consuma-se com a prática de um dos atos previstos no tipo penal, desde que de forma reiterada. Assim, para a configuração desse crime não se contenta a lei penal com a prática de um único ato de curandeirismo. Trata-se de crime habitual. Não é preciso o agente fazer do curandeirismo sua profissão, basta tão somente reiteração dos atos.

 

TENTATIVA

 

             É inadmissível. Por se tratar de crime de perigo abstrato, uma vez que a lei presume o perigo causado à saúde pública com a prática reiterada de uma das ações típicas. Em razão disso, ainda que o tratamento dispensado tenha sido bem-sucedido, o crime configura-se.

 

 

 

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FORMAS:

 

            Simples: prevista no caput do artigo.

            Qualificada: prevista no parágrafo único: “se o crime é praticado mediante remuneração, o agente fica também sujeito à multa”.

            Qualificada pelo resultado: prevista no art. 285: “aplica-se o disposto no art. 258 aos crimes previstos neste Capítulo, salvo quanto ao definido no art. 267”.

 

 

 

 

 

 

CONCLUSÃO

 

 

         Quando escolhemos este tema para pesquisar achávamos que seria simplesmente estudar os tipos penais nos seus caputs e destrinchá-los. Mas, para nossa surpresa o que notamos é que há algo muito mais profundo quanto se trata de analisar as infrações dos Artigos 283 e 284, Charlatanismo e Curandeirismo, respectivamente. É surpresa maior foi descobrir que o Curandeirismo é um tipo penal muito controverso e polêmico.

 

            Polêmico e controverso porque o que vemos é que as pessoas utilizam a religião e a cultura para tentar livrarem-se impunes perante a Justiça.

 

            Utilizando-se da Constituição Federal no seu art. 5º, inciso VI, os infratores tentam justificar-se através do processamento de suas crenças religiosas. Crenças e práticas estas que, para estes infratores, são ilimitadas, imensuráveis. Se não fossem práticas habituais grosseiras, feitas por pessoas ignorantes, teríamos ao invés de curandeiros, fanáticos religiosos.

 

Cremos que quando da confecção do nosso Código Penal, na década de 1940, onde a sociedade brasileira em sua imensa maioria, além de ser analfabeta, residir na zona rural e ter pouquíssimos ou nenhum acesso aos meios de comunicação e ao sistema de saúde, tendo essas pessoas, em grande  parte, nunca terem sido assistida por um médico ou instituição hospitalar, o Curandeirismo tinha, sem sombras de dúvidas, uma influência enorme sobre essa massa populacional. Era, em muitos locais, aceita a prática do Curandeirismo como forma de acalentamento físico e psíquico aos enfermos.

 

           

 

 

 

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Porém, com o desenvolvimento social alcançado, esta prática tende a desaparecer ou pelo menos tornar-se cada vez mais segregada em pequenos grupos sociais. Inclusive há tendências jurídicas de que o Curandeirismo seja retirado do nosso Código Penal.

 

 Entendemos que no momento presente e num futuro próximo ainda é prematuro falar-se em retirar do Código tal crime, pois o objetivo é justamente preservar a saúde pública individual e coletiva. Num mundo globalizado, onde as pessoas viajam intensamente em todas as direções do globo terrestres, tendo contatos físicos com inúmeras outras pessoas, potencializando assim a contaminação por vários tipos de doenças, temos que tomar todas as providências sanitárias cabíveis, e o Direito tem que fazer parte em tal empreitada, justamente, limitando, em prol de todos, as atitudes individuais. Fazendo com que práticas rudes irresponsáveis, como o Curandeirismo tipificado, sejam controladas.

 

O que notamos, também, nas nossas pesquisas é que nas entrelinhas do tipo penal qualificado como Curandeirismo é que este tipo é tachado exclusivamente dos pobres e basicamente dos negros. Como se da miscigenação do negro africano e do índio nativo tivesse brotado essa herança do curandeirismo. Claro que nas duas culturas não há que se negar do curandeirismo original, autêntico, honesto. Mas, daí partir para a discriminação de que estas duas raças são totalmente responsáveis pelo tipo penal, se torna a posição jurídica totalmente preconceituosa. Dever-se-ia, não retirar o tipo penal do nosso código, mas reformulá-lo, revendo seus conceitos e implicações. 

 

Em comparação com o Charlatanismo, até a pena é maior. Não cremos que seja devido o objeto jurídico tutelado, pois os dois tipos penais resguardam a saúde pública, mas devido a herança cultural de um país autoritário, escravagista e segregacionista.

 

O charlatanismo, que pode ser praticado até mesmo por profissionais da saúde, é um crime que, subentende-se, pode ser praticado por qualquer pessoa que tenha certo conhecimento e que usa esse conhecimento para  ludibriar as pessoas.

 

Não encontramos tantas controvérsias sobre o charlatanismo e estelionato quanto ao curandeirismo e estelionato. Esta se dá como, supramencionado, devido às questões religiosas, culturais, sociais. Porém, a doutrina não é totalmente pacífica quando se trata de se enquadrar Charlatanismo e Curandeirismo como formas de Estelionato. Na verdade, o que se define tal acepção é justamente o caso concreto. O que vimos é que o Charlatanismo e o Curandeirismo quando praticados em concurso de crime são absolvidos pelo Estelionato. Ou então são desqualificados e enquadrados como Estelionato.

 

 

 

 

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Isto se dá, talvez, devido aos objetos jurídicos tutelados: pois enquanto o Charlatanismo e Curandeirismo têm como objetos a saúde pública o Estelionato visa à inviolabilidade patrimonial do indivíduo. Pois, a partir dos casos concretos e seus recursos estudados, notamos que a partir do momento que o agente, em concurso formal de crimes, aufere lucro financeiro em detrimento do patrimônio do sujeito passivo, sobressai-se o Estelionato como a infração pela qual o suposto infrator responde.

 

Concordamos com essa corrente doutrinária. Pois acreditamos que a partir do momento que o sujeito, seja charlatão ou curandeiro, revestindo-se dessas roupagens, tem a intenção, o dolo de, através de um engodo, obter vantagem em prejuízo de outrem, deve responder pelo crime mais grave que neste caso é o Estelionato. Não estamos aqui dizendo que o patrimônio da pessoa é mais importante que a saúde pública. Porém, o que o Código Penal nos expõe é justamente essa situação. Por isso somos a favor de uma total reformulação do nosso Código, onde situação como estas sejam revistas e onde outros valores sociais como a vida, saúde, liberdade sejam mais protegidas do que o simples patrimônio das pessoas. 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

                                                       

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BIBLIOGRAFIA

 

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DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 8ª edição – São Paulo, Atlas, 1997.

 

GOMES, Luiz Flávio; CERVINI, Raúl. Crime organizado: enfoques criminológicos, jurídico e político-criminal. 2ª ed. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1997.

 

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MIRABETE, Júlio Fabbrini. Manual de direito penal; parte especial. 13ª ed. São Paulo, Atlas, 2001. v. 2 e 3.

 

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Biblioteca Jurídica. On LIne Editora. São Paulo. 2008/2009.

 

Pesquisas na Internet:

www.estudos-criminais. Com. Br.

www.stj.gov.br

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