INTRODUÇÃO:

O curso de Pedagogia do Brasil, completa nesse ano de 2009, setenta anos de existência. Num breve relato histórico sobre o curso, pode-se observar um processo turbulento de significações e de identidade pautado em algumas contradições. Sabe-se que os Cursos de Pedagogia no Brasil foi reformulado por diversas vezes, não só com o objetivo de atender as necessidades momentâneas, mas também buscando criar e consolidar uma identidade profissional como detalha o texto a seguir.

I – O Curso de Pedagogia e suas organizações legais.

O primeiro curso de pedagogia do Brasil, foi instituído em 1939, por volta da organização da Faculdade Nacional de Filosofia, e tinha como função formar bacharéis e licenciados em pedagogia. Silva (1999:33) esclarece que "... para a formação dos bacharéis ficou determinada a duração de três anos, após os quais, adicionando-se um ano de Didática formar-se-iam os licenciados..." que poderiam também ministrar aulas, supostamente, das disciplinas constantes em seu curso de bacharelado, sem explicitar quais cursos.. A formação do bacharel tinha a finalidade de formar um profissional para atuar como "...trabalhadores intelectuais para o exercício das altas atividades culturais de ordem desinteressada ou técnica"1. A partir de 1943 "... houvesse exigência dessa diplomação para o preenchimento dos cargos de técnicos em educação do Ministério da Educação" 2 .O curso de pedagogia teve pequenas alterações em 1962, através do Parecer CFE 251/62, relatado pelo conselheiro Valmir Chagas, onde foi fixado o currículo mínimo e a duração do curso de pedagogia, pois o curso estava a beira da extinção, devido, segundo ele, a falta de conteúdo próprio. Somente em 1969, com o Parecer CFE 252/69, já em seu enunciado explicita os profissionais à que se refere, como segue abaixo: "... formação de professores para o ensino normal e de especialistas para as atividades de orientação, administração, supervisão e inspeção no âmbito de escolas e sistemas escolares" (SILVA 1999: 45). Com reação as suas atividades/funções, de acordo com a Resolução CFE 2/69, o diplomado em pedagogia poderia exercer: " a) as atividades relativas às habilitações registradas em cada caso; b) o magistério, no ensino normal, das disciplinas correspondentes as habilitações específicas e à parte comum do curso (quando este tiver duração igual ou superior a duas mil e duzentas horas), observados os limites estabelecidos para o efeito de registro profissional; c) o magistério na escola de 1° Grau ( ensino fundamental) e sempre que haja sido estudada a respectiva metodologia e prática de ensino"3 Diante da grande demanda de professores que estava ocorrendo nessa época, devido a proposta de escola para todos, surgiram também dessa resolução a possibilidade de formação curta, com um total de 1100 horas, ou plena 2200 horas, e compreendia uma ou duas habilitações, permitindo que posteriormente complementassem os estudos para obtenção de novas habilitações. Os cursos de pedagogia no Brasil, ainda continuaram sofrendo regulamentações diversas, porém pequenas, apenas buscando sempre a adaptação as necessidades geradas pelas reformas do ensino, de modo que, o currículo mínimo permaneceu valendo por aproximadamente trinta e sete anos. Com a instituição no Brasil da nova Lei de Diretrizes de Base da Educação (LDB 9394/96) em 1996, os cursos de pedagogia do Brasil sofreram outra reformulação, como podemos observá-la no artigo 64 da mesma: " A formação de profissionais de educação para administração, planejamento, inspeção, supervisão e orientação educacional para a educação básica, será feita em cursos de graduação em pedagogia ou em nível de pós graduação, a critério da instituição de ensino, garantida, nesta formação, a base comum nacional"4 , e entrou em vigor através da resolução CNE/CP 1/2006 de 15/5/2006. O curso de Licenciatura em pedagogia destina-se à formação de professores para exercer funções de magistério na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, nos cursos de Ensino Médio, na modalidade Normal, de Educação Profissional na área de serviços e apoio escolar e em outras áreas nas quais sejam previstos conhecimentos pedagógicos. Parágrafo único. As atividades docentes também compreendem participação na organização e gestão de sistemas e instituições de ensino englobando: Planejamento, execução, coordenação, acompanhamento e avaliação de tarefas próprias do setor da Educação; Planejamento, execução, coordenação, acompanhamento e avaliação de projetos e experiências educativas não-escolares; Produção e difusão do conhecimento científico-tecnológico do campo educacional, em contextos escolares e não-escolares.5 Atualmente, é esse formato que está em vigor .

II – A Identidade do pedagogo. Em setenta anos de existência, o curso de Pedagogia no Brasil adquiriu diferentes identidades, ou como podemos observar, uma falta de identidade. No formato inicial de criação, o curso de pedagogia começou a revelar seu primeiro problema de identidade, pois a formação do bacharel tinha a finalidade de formar um profissional para atuar como "...trabalhadores intelectuais para o exercício das altas atividades culturais de ordem desinteressada ou técnica"6, e que a partir de 1943 "... houvesse exigência dessa diplomação para o preenchimento dos cargos de técnicos em educação do Ministério da Educação" 7 , podendo também esse profissional ministrar aulas, supostamente, das disciplinas constantes em seu curso de bacharelado, sem explicitar quais cursos. Não bastando a falta de esclarecimentos sobre essas funções, deparamos também com a falta de campo de trabalho para o mesmo, pois não era explícito, nem mesmo dava referência aos cursos onde esses profissionais poderiam ministrar aulas. Com a reformulação do curso em 1962, essas questões ainda permanecem implícitas, segundo Silva," o parecer 251/62 não faz nenhuma referência ao campo de trabalho do profissional que, indistintamente, chama de técnico de educação ou especialista em educação" (SILVA1999:38).somente nas entrelinhas e/ou em uma ou outra expressão, que deixa transparecer que à esse profissional recai as funções de administração escolar. Continua portanto a indefinição do campo de trabalho desse profissional, e concomitantemente sua falta de identidade. A representação desse profissional perante a sociedade, bem como a sua identidade, é totalmente obscura e contraditória nesse momento, principalmente quanto se procede entendendo a pedagogia enquanto ciência, que tem por objetivo uma educação humanizadora, onde se busca o desenvolvimento crítico e autônomo dos indivíduos, vislumbrando-os como agentes transformadores da sociedade. Diante de toda a situação incômoda vivenciada pelos licenciados que não tinham cursos determinados para ministrarem aulas, como uma espécie de consolo, Saviani relata que "... foi dado aos licenciados em pedagogia o direito de lecionar filosofia, história e matemática nos cursos de ensino médio"(SAVANI 2008:41).Nesse período já existiam discussões sobre as questões da formação do professor primário, se ela se daria em nível superior; e se a formação dos técnicos em educação aconteceria em nível de pós graduação, aberto portando para todos os profissionais da área de educação, porém era apenas um inicio de discussão. Em 1967, os estudantes dos curso de pedagogia no Brasil, em um Encontro Nacional organizado por eles, questionaram essa imprecisão do curso, e propuseram uma reformulação do mesmo, pois para eles, o curso "...restringe-se à formação teórica do professor; negligencia outros aspectos essenciais à formação de profissionais no campo educacional; possui um currículo enciclopédico; favorece a perda do campo profissional pedagógico, por oferecer insuficientemente capacitação."8 Sugerem também que os cargos relacionados ao setor educacional fossem ocupados especificamente pelos profissionais formados em pedagogia, e que fossem elaborados concursos públicos de títulos e provas. Esses estudantes vislumbraram a possibilidade de que, os licenciados em pedagogia deveriam ser os profissionais aptos a suprir as necessidades educacionais brasileira nos mais variados setores onde pudessem haver uma intencionalidade educacional, além de formar professores para cursos primários. Eles lutavam pelo reconhecimento profissional e pela identidade do pedagogo.

Com a resolução CFE 2/69, essa identidade ficou ainda mais fragilizada, visto que houve uma fragmentação do profissional diante das possibilidades das habilitações serem concluídas isoladamente umas das outras, além do fato de ser permitido a todos os licenciados, independente dos cursos, essa complementação pedagógica. Embora formando um profissional fragmentado, o cunho pedagógico ainda era presente nessa formação, visto que o foco da complementação atendia as exigências correlatas ao ato educativo. Fato esse que se perdeu a partir da nova LDB 9394/96, principalmente após as diretrizes curriculares do curso de pedagogia instituída em 2006, pois o foco principal hoje é a formação docente. Os cursos de pedagogias no Brasil hoje forma professores de Educação Infantil e séries iniciais de Ensino Fundamental, bem como pedagogos. Diante desse vasto e contraditório campo de atuação desse profissional, pergunto: o que é realmente ser pedagogo? Utilizando LIBÂNEO e PIMENTA(1999:252), onde relatam, " A ação pedagógica não se resume a ações docentes, de modo que, se todo trabalho docente é trabalho pedagógico, nem todo trabalho pedagógico é trabalho docente". 9 Cabe a esse profissional bem mais que os saberes técnicos, políticos. É necessário também os saberes pedagógicos. Esse profissional estará realizando assim, uma ação na prática, pela prática e através da prática. É o profissional "do Saber" e não apenas "do Fazer". Um profissional portador de um saber "do" saber-fazer, "para" o saber-fazer, " a partir" do saber-fazer. É da formação desse tipo profissional que os cursos de pedagogia precisam se apoderar. Um profissional detentor de saberes pedagógicos, pois quando se faz o saber se produz conhecimento.

Considerações Finais

A falta de identidade dos cursos de pedagogia, bem como a do pedagogos, está longe de terminar, porém vários estudos e debates estão surgindo no Brasil, desencadeando essa questão. Embora não haja uma única direção no sentido da formação desses profissionais, a intencionalidade pela melhoria dessa formação é unanime, reiterando assim nossa convicção de sua importância para o desenvolvimento de uma sociedade mais humana.

Bibliografia

FRANCO, Maria Amélia Santoro. Pedagogia como Ciência da Educação. Campinas, SP: Papirus, 2003.

_________________________. O lugar do professor na Pesquisa Educacional. Santos: Leopoldianum, 2005.

FRAUCHES,Celso da Costa. CURSO DE PEDAGOGIA _ O QUE FAZER?. Texto elaborado para o Seminário promovido pelo SEMESP, em São Paulo, em 27/09/2006.

GUEDIN, Evandro; FRANCO Maria Amélia Santoro.Questões de método na construção da pesquisa em educação.São Paulo: Cortez, 2008.

HOUSSAYE, Jean. Manifesto em favor dos pedagogos. Porto Alegre: Artmed, 2005.

LIBÂNEO e PIMENTA in: FRANCO, Maria Amélia Santoro. Pedagogia como Ciência da Educação. Campinas, SP: Papirus, 2003

PIMENTA, Selma Garrido; FRANCO Maria Amélia Santoro. Pesquisa em Educação. Possibilidades investigativas/formativas da pesquisa-ação. São Paulo: Loyola, 2008.

SAVIANI, Demerval. Curso de Pedagogia no Brasil: história e teoria. Campinas: Autores Associados, 2008.

1 Decreto-lei 1190/39 – art. 1° , alínea a

2 Iden – Art. 51, alínea c

3 In FRAUCHES, Celso da Costa. Texto elaborado para o seminário Curso de Pedagogia: O que fazer? SEMESP. SP, 2006

4 Idem.

5SAVIANI, 2008

6 Decreto-lei 1190/39 – art. 1° , alínea a in SAVIANI 2008

7 Iden – Art. 51, alínea c

8CONGRESSO ESTADUAL DE ESTUDANTES DE PEDAGOGIA, 1967: 159. In SILVA (1999: 39)

9 LIBÂNEO e PIMENTA in: FRANCO, 2003