1. Breve História do Voto no Brasil

As eleições surgiram no mundo no século XVII ao apareceram governos com representantes na Europa e na América do Norte. No Brasil o voto surgiu assim como o Direito, imposto pelos colonizadores lusitanos que tinham a tradição e elegerem seus administradores (PLENARINHO, 2009).

A história do voto no Brasil começou 32 anos após Cabral ter desembarcado no País. Em 1822, foi proclamada a Independência do Brasil – dando início ao Período Imperial -, que deixou de ser colônia de Portugal. Com a independência, o imperador D. Pedro I mandou fazer a primeira legislação eleitoral brasileira, mas apenas os ricos e donos de terra podiam votar (CÂNDIDO, 2004).

Os períodos colonial e imperial foram marcados pelo chamado voto censitário e por episódios frequentes de fraudes eleitorais. O voto direto para presidente e vice-presidente só veio aparecer pela primeira vez na Constituição Republicana de 1891. Em 1932, a presença feminina, cada vez mais marcante, chegou às urnas. Nesse ano foi instituída uma nova legislação eleitoral e as mulheres conquistaram o direito ao voto (CASTELLO BRANCO, 2004).

Com a 1ª República muita coisa não havia mudado no Brasil, as extremas desigualdades sociais ainda existiam, o que havia realmente mudado era apenas o sistema de governo:

Na 1ª República a legislação continuou esparsa, sensivelmente ainda, influenciada pelas práticas que vigoraram no Império. Na verdade embora tivessem ocorrido nessa época algumas transformações sociais dignas de nota – como a libertação dos escravos, v.g. – não mudou muito a nossa realidade social; o que mudou foi o Estado e sua organização política. (CÂNDIDO, JOEL J., 2004, p.28)

O voto obrigatório foi instituído com o Código Eleitoral de 1932 e mantido até hoje: "A atual Constituição brasileira manteve a tradição do voto obrigatório iniciada com o Código Eleitoral de 1932." (SOARES, 2004, p. 107).

2. Situação Atual do Voto no Brasil

Nos últimos anos o número de eleitores no Brasil aumentou, no começo de 2008 já eram registrados 127,4 milhões de títulos. Apenas em 2007, quase 1,5 milhão de novos eleitores foram cadastrados. São informações do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) (POMPEU, 2008).

A nossa atual Constituição mantém o voto obrigatório, iniciado com o Código Eleitoral de 1932. Se realmente no Brasil, votar é um direito, então por que a aplicação de sanções a quem se abstém desse "direito"? Quem não votar três seções consecutivas, sem justificativa, terá problemas com seu CPF, não poderá matricular-se em universidade públicas e terá ainda problemas com o passaporte. O voto é um direito de cada um, e não uma obrigação. Por que obrigar alguém a exercer seu direito?

Sabe-se que hoje 80% dos brasileiros vivem nos centros urbanos, todos têm livre acesso à informação, seja pela TV, rádio, internet, etc. Se um dia foi necessário que o voto fosse imposto como obrigatório por motivos de que a maioria dos brasileiros vivia em áreas rurais, vemos que hoje isto não é mais favorável a nossa política. "É certo que o Brasil de 1932, quando adotado o voto obrigatório entre nós, era um país eminentemente rural, com pequeno número de eleitores, muito diferente do país em que vivemos nos dias atuais." (PORTELA, 2008, p. 3)

[...] o Brasil tem hoje oitenta por cento de sua população morando nas cidades, sendo significativa sua presença nos grandes centros populacionais e regiões metropolitanas e, ainda, que o fácil acesso aos meios de comunicação de massa permite a todos ter acesso fácil a informações do mundo inteiro, influindo, assim, na consciência do cidadão mediante o conhecimento sobre a vida de outros povos, ou mesmo de outras regiões brasileiras, mormente sobre os aspectos de liberdade política, marginalidade social, racismo, comportamento sexual, violência urbana, consumo de drogas pelos jovens, desenvolvimento científico e tecnológico outros temas da atualidade. (SOARES, PAULO HENRIQUE, 2004, p. 111)

O Estado impor ao povo que vote é característica dos estados totalitários, onde é necessário que haja a participação do povo para que se tenha a aparência de legalidade. Um dos princípios da democracia é justamente a liberdade, é explícito que não deixar ao povo o poder de escolher livremente entre o votar e o não votar fere diretamente esse principio. "A democracia, pois supõe a liberdade e a igualdade" (AZAMBUJA, 1941, p. 238)

[...] os países que adotam o voto compulsório têm sua história associada a intervenções militares, golpes de estado e autoritarismo político, com exceção de Costa Rica; no Brasil, o instituto do voto obrigatório esteve a serviço do autoritarismo político, seja na longa ditadura de Getúlio Vargas, seja no recente ciclo de governos militares que sufocaram as liberdades políticas no Brasil, bem como em quase toda a América Latina. (SOARES, PAULO HENRIQUE, 2004, p. 112)

O voto hoje no Brasil é obrigatório e igual para homens e mulheres, entre 18 e 70 anos e facultativo entre 16 e 18 e acima de 70 anos, havendo inclusive sanção para ausência não justificada. O eleitor possui a liberdade de escolher diante dos candidatos inscritos, ou votar em branco e até mesmo anular seu voto. (VALVERDE, 2005).

3. Voto Obrigatório versus Voto Facultativo

Vemos hoje a incredibilidade do povo com os políticos. O povo brasileiro ao ouvir a palavra "política" já traz à mente coisas ruins. Enquanto a maioria da população brasileira vive na pobreza, vemos sempre através dos meios de comunicação os escândalos políticos que chocam o país. "Cada vez mais se aceita que a pobreza tem, por trás, o problema da desigualdade social, o que implica reconhecer que se trata substancialmente de dinâmica política." (DEMO, 2006, p. 26)

Defensores do voto facultativo dizem que essas más atitudes dos políticos mudariam, visto que o povo espontaneamente iria às urnas, tirando os maus políticos do poder, fazendo com que a qualidade da política no Brasil ascendesse paulatinamente. (SOARES, 2004)

Talvez o brasileiro não precise ser obrigado a ir a cada dois anos – ou a cada quatro anos, no caso do Distrito Federal – a uma seção eleitoral registrar seu voto. Mas o que o brasileiro precisa mesmo é de conhecimento e consciência. Isso sim mudaria o quadro da pobreza política de nosso país.

A qualidade política depende crucialmente do desenvolvimento da aprendizagem e do conhecimento, razão pela qual é uso valorizarmos educação como investimento fundamental na cidadania individual e coletiva. Depende igualmente da iniciativa de cada qual e de cada sociedade, em especial de procedimentos associativos, por meio dos quais as pessoas unem forças para fins comuns. (DEMO, PEDRO, 2006, p. 39)

Voto facultativo versus voto obrigatório é um tema bastante discutido no Congresso Nacional e pela população, mormente quando se chega ano eleitoral. Começam a surgir discussões e opiniões sobre este assunto:

O tema em análise é um dos mais recorrentes do Congresso Nacional e da opinião pública, sendo retomado com ênfase sempre após os pleitos eleitorais, em virtude, principalmente, da crescente tendência ao absenteísmo do eleitor e ao aumento dos votos brancos e nulos. (SOARES, PAULO HENRIQUE, 2004, p. 107)

Os adeptos do voto obrigatório dizem que a classe inferior – por falta de informação – se omitiria, o que é rebatido pelos adeptos do facultativo quando estes dizem que vivemos em uma época onde a informação está de fácil acesso a todos. Adeptos do voto obrigatório dizem ainda que as pessoas aproveitariam o feriado de eleições pra viajarem, assim se ausentando de seu local de votação, o que é rebatido pelos adeptos do voto facultativo quando estes dizem que os que se ausentarem serão os desinteressados com a situação do país; os que permanecerem e votarem, serão os conscientes, os que trarão a mudança ao país (SOARES, 2004).

É defendido pelos adeptos do voto facultativo que a compra de votos seria consideravelmente reduzida, sendo que é mais fácil se comprar o voto de alguém que já ia votar obrigadamente, do que de alguém que não é obrigado a votar. E ainda, que com o voto facultativo os políticos teriam que convencer os eleitores a irem às urnas, o que faria os políticos melhorar consideravelmente em atitudes, pois não quereriam desgostar o eleitor (SOARES, 2004).

Na Revista de Informação Legislativa (Brasília, a. 41 n. 161 jan/mar. 2004), Paulo Henrique Soares mostra os principais argumentos dos defensores do voto obrigatório e do voto facultativo:

1. ARGUMENTOS FAVORÁVEIS AO VOTO OBRIGATÓRIO

a) o voto é um poder dever

b) a maioria dos eleitores participa do processo eleitoral

c) o exercício do voto é fator de educação política do eleitor

d) o atual estágio da democracia brasileira ainda não permite a adoção do voto facultativo

e) a tradição brasileira e latino-americana é pelo voto obrigatório

f) a obrigatoriedade do voto não constitui ônus para o País e o constrangimento ao eleitor é mínimo se comparado aos benefícios que oferece ao processo político-eleitoral

2. ARGUMENTOS FAVORÁVEIS AO VOTO FACULTATIVO

a) o voto é um direito e não um dever

b) o voto facultativo é adotado por todos os países desenvolvidos e de tradição democrática

c) o voto facultativo melhora a qualidade do pleito eleitoral pela participação de eleitores conscientes e motivados, em sua maioria

d) a participação eleitoral da maioria em virtude do voto obrigatório é um mito

e) é ilusão acreditar que o voto obrigatório possa gerar cidadãos politicamente evoluídos

f) o atual estágio político brasileiro não é propício ao voto facultativo

A educação é a única forma de conseguirmos a melhoria pro país, esta traz a consciência pra população. Segundo Pedro Demo, o Brasil vive hoje em intensa pobreza política:

Pobreza política começa, geralmente, com a ignorância. Não se trata de ignorância cultural, pois esta não existe, já que todos possuímos língua própria e saberes compartilhados. Trata-se da ignorância historicamente cultivada, por meio da qual se mantêm grandes maiorias como massa de manobra, cujo destino está lavrado na sustentação dos privilégios de minorias cada vez mais minoritárias. (DEMO, PEDRO, 2006, p. 30)

Há expectativas de mudança no nosso Código Eleitoral, como enuncia Joel J. Cândido:

Está na hora, portanto – passados mais de três anos da promulgação da Constituição de 1988 – de se modificar o atual Código Eleitoral. Não só para manter nossa tradição histórica, é evidente, mas porque diversos órgãos da justiça Eleitoral, cujo trato com a matéria é quase diário, já tem essa convicção. Estudiosos desse Direito, a se turno, também comungam do entendimento que, de resto, contra ressonância positiva no egrégio Tribunal Superior Eleitoral. (CÂNDIDO, JOEL J., 2004, p. 39)

Enfim, liberdade é uma garantia a todos no Estado brasileiro, porém essa liberdade é ferida a cada dois anos. Chamar o voto aqui no Brasil de direito é paradoxal. No art. 14 de nossa Constituição encontramos como título: "Dos Direitos Políticos", no entanto, por conta da obrigatoriedade seria mais correto que se colocasse "Dos deveres Políticos". E o que trará a mudança, o amadurecimento do cidadão não será obrigação de votar, e sim, uma educação de qualidade.

REFERÊNCIAS

AZAMBUJA, Darcy. Teoria Geral do Estado. 25 ed. Rio de Janeiro: Globo, 1941.

BRASIL. Constituição. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, Subsecretaria de Edições Técnicas, 2008.

CÂNDIDO, Joel J.. Direito eleitoral brasileiro. 11 ed. rev., atual. e ampl. Bauru, SP: EDIPRO, 2004.

CASTELLO BRANCO, Poliani. Conheça a história do voto no Brasil. Adital. 2004.

Disponível em: < http://www.adital.org.br/site/noticia2.asp?lang=PT&cod=13981>. Acesso em: 28 de maio de 2009.

PLENARINHO. Eleições brasileiras, um direito do povo. Disponível em: <http://www.plenarinho.gov.br/camara/Reportagens_publicadas/eleicoes-brasileiras-um-direito-do-povo>. Acesso em: 26 de maio de 2009.

POMPEU, Renata. Brasil já tem mais de 127 milhões de eleitores, mostra TSE. Agência Brasil – EBC. 15 de Janeiro de 2008.

Disponível em: < http://www.agenciabrasil.gov.br/noticias/2008/01/15/materia.2008-01-15.2405369243/view>. Acesso em: 28 de maio de 2009.

PORTELA, Licoln. PDC-1149/2008. 2008.

Disponível em: <http://www.camara.gov.br/sileg/Prop_Detalhe.asp?id=418033>. Acesso em: 25 de março de 2009.

SOARES, Paulo Henrique. Vantagens e desvantagens do voto obrigatório e do voto facultativo. Revista de Informação Legislativa. Brasília, a. 41 n. 161 jan/mar. 2004. Disponível em: http:// www.senado.gov.br/web/cegraf/ril/principal.htm. Acesso em: 03/05/2009.

VALVERDE, Thiago Pellegrini. Voto no Brasil: democracia ou obrigatoriedade?. Doutrina Jus Navigandi. Dezembro de 2005.

Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8282>

Acesso em: 25 de março de 2009.