GERENCIAMENTO DE CUSTOS NOS TERMOS DE PARCERIA DO ESTADO DE MINAS GERAIS

 

GUSTAVO HENRIQUE RIBEIRO SANTOS

 

 

RESUMO

No contexto de reforma do Estado foram criados em Minas Gerais os Termos de Parceria, celebrados entre o governo do Estado de Minas Gerais e as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público – OSCIPs, os quais se tornaram uma alternativa interessante de execução de políticas públicas. Por meio desses instrumentos é repassado um volume considerável de recursos públicos, o que torna o conhecimento e sistematização desses custos fundamental. Recentemente, os demonstrativos financeiros utilizados nos Termos de Parceria foram alterados para se adaptar ao sistema de custeio ABC. Este trabalho analisou os demonstrativos e as adaptações realizadas. Foram relatadas algumas limitações a essa adaptação, sendo o sistema de custeio simplificado para determinados tipos de gastos. Todavia, as mudanças geraram novas informações que possibilitam aos responsáveis pelas políticas públicas dos Termos de Parceria aprimorar seu processo de tomada de decisão, pois passam a ter uma visão da alocação dos custos pelas atividades. Sugestões de melhoria foram feitas para aprimorar os demonstrativos e tornar mais clara a vinculação dos custos aos produtos e serviços prestados.

 

 

PALAVRAS-CHAVES: sistema de custeio ABC; demonstrativos financeiros; Termos de Parceria;

 

 

Introdução

Na década de 1990, as reformas estatais brasileiras resultaram no estabelecimento de parcerias entre o governo e a iniciativa privada, na tentativa de alterar o Estado de executor para indutor de políticas públicas. (ABRUCIO, 2006). Novos modelos modelo contratuais entre o setor público, o privado e o voluntariado ou não lucrativo foram estabelecidos. Desse esforço sugiram as Organizações Sociais, Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público, (TORRES, 2007).

O Estado de Minas Gerais começou a utilizar desses novos modelos a partir de 2003, por meio da Lei nº 14.870, que estabelece a qualificação das organizações do terceiro setor como Organização da Sociedade Civil de Interesse Público – OSCIP e institui o Termo de Parceria, que é a contratualização do Estado com as OSCIPs focado em resultados. Com esse novo modelo, Minas Gerais passa a executar políticas públicas não exclusivas de Estado por meio de parcerias, com objetivo de obter maior flexibilidade e eficiência.

Para que haja uma distribuição eficiente dos gastos públicos, é necessário que haja informações plenas acerca dos serviços públicos e de seus custos, sendo que o desconhecimento dos custos é demonstrativo claro de ineficiência no provimento de serviços públicos (Alonso, 1999). Esta observação pode ser atrelada aos instrumentos contratuais celebrados entre o poder público e as organizações do terceiro setor.

Para avançar nesta questão, nos últimos anos foi adotado nos documentos financeiros dos Termos de Parcerias uma metodologia adaptada do Custeio ABC (activity-based costing). Como explicado por Ching (2006), o Custeio ABC apropria os custos às atividades, pois conforme sua filosofia, são as atividades as geradoras dos custos. Desta forma, os custos são relacionados às suas respectivas atividades por meio de direcionadores de recursos, que melhor representam as formas de consumo desses recursos.

Tendo em vista essa contextualização, busca-se com este trabalho avaliar a adaptação da metodologia de gerenciamento de custos adotada nos Termos de Parceria de Minas Gerais à luz da literatura a respeito do tema. Tendo em vista que o custo dos serviços públicos é de suma relevância, como foi relatado anteriormente, analisar a forma de como são demonstrados os recursos envolvidos nesses instrumentos de contratualização, que já movimentaram tantos recursos públicos, se faz plenamente necessário. Importante destacar também que uma demonstração de custos de forma clara e objetiva pode melhorar a alocação dos recursos e, consequentemente, aprimorar as políticas públicas envolvidas.

Assim, pretende-se avaliar como o Custeio ABC foi aplicado, como suas ideias foram integradas aos instrumentos de previsão e execução financeira utilizados nos Termos de Parceria. Busca-se analisar se sua aplicação gerou novas informações para os tomadores de decisão envolvidos e se essas informações são relevantes.

Portanto, primeiro será feita uma revisão sobre o modelo de parcerias com o terceiro setor estabelecido em Minas Gerais, para situar os demonstrativos financeiros e uma revisão sobre o sistema de Custeio ABC. Posteriormente serão analisados os demonstrativos financeiros, para verificar como foi realizada a adaptação do Custeio ABC aos instrumentos existentes e quais melhorias podem ser feitas na metodologia utilizada, tendo em vista a bibliografia levantada.

Desenvolvimento

Os Termos de Parcerias Celebrados no Estado de Minas Gerais

A contratualização por resultados com organizações do terceiro setor em Minas Gerais se iniciou com o advento do “Choque de Gestão – Pessoas, Qualidade e Inovação na Administração Pública”, projeto implantado no Estado a partir de 2004 (LEMOS et al., 2006). De acordo com os autores, foram feitas inovações em diversos campos do planejamento e gerenciamento governamental, dentre os quais iremos abordar a pactuação de resultados entre organizações públicas e privadas, mais especificamente os Termo de Parceria.

Esta pactuação de resultados possui como base a Lei Estadual n° 14.870/03, que dispõe sobre a qualificação de entidades de direito privado sem fins lucrativos como OSCIP no Estado de Minas Gerais e disciplina o Termo de Parceria, sendo regulamentado pelo Decreto nº 46.020 de 2012.  O Termo de Parceria define o objeto da parceria, todas as cláusulas contratuais, o Programa de Trabalho, que contém todas as metas e os descritivos de como deverão ser consideradas, assim como os cronogramas de avaliação e repasses de recursos.

 Por meio do Termo de Parceria, qualquer órgão estadual, como uma secretaria de estado ou uma autarquia publica pode celebrar o Termo de Parceria com uma entidade do terceiro setor mediante seleção pública. Qualquer organização pode participar do certame, mas para assinar o termo de parceria, a instituição precisa obter o título de Oscip por meio de ato vinculado junto a Secretaria de Estado, desde que ela cumpra requisitos estabelecidos pela Lei.

O Termo de Parceria contém uma tabela com a previsão de receitas e despesas, em nível sintético, de forma que todo o detalhamento é feito separadamente, por meio de documento denominado Memória de Cálculo, a qual é definida pelo inciso V do art. 27 do Decreto 46.020 como  “a previsão das receitas e despesas em nível analítico, estipulando, item por item, as categorias contábeis usadas, a previsão de receitas e despesas em nível sintético e o detalhamento das remunerações e dos benefícios de pessoal a serem pagos a seus dirigentes e trabalhadores...”  

Após a assinatura do Termo de Parceria, a cada período avaliatório, a OSCIP produz o Relatório Gerencial de Resultados - RGR, contendo os resultados dos indicadores de desempenho e dos produtos, assim como o Relatório Gerencial Financeiro - RGF. O RGF possibilita verificar a movimentação financeira ocorrida no período, demonstrando entre outros itens, a vinculação ao objeto do Termo de Parceria, a comparação da movimentação financeira com o planejamento estabelecido na Memória de Cálculo e como foram alocados os recursos de acordo com a natureza de despesa em cada mês.

Esse trabalho se atentará à Memória de Cálculo, instrumento de planejamento financeiro, e ao Relatório Gerencial Financeiro, mecanismo de demonstração da execução financeira do Termo de Parceria, uma vez que estes foram os documentos modificados pelo Estado para se adaptarem ao sistema de custeio ABC.

Embora esses demonstrativos sejam de cunho financeiro e não possuam nenhuma vinculação ou relação direta com as demonstrações contábeis usuais, é por meio dos mesmos que são demonstradas todas as movimentações dos recursos financeiros dos Termos de Parceria. Percebe-se que foram construídos tendo em vista o seu público alvo, os servidores dos órgãos signatários dos Termos de Parceria, os responsáveis da Oscip e os membros das Comissões de Avaliação, de forma que estes não necessitem de conhecimento contábil para realizar a elaboração ou análise de tais documentos.

Importante destacar, também, que a análise contábil dos recursos públicos repassados às OSCIPs é feita pelo Órgão Estatal Parceiro, responsável pelo acompanhamento e fiscalização do uso desse recurso, normalmente é realizada ao final do ano ou na rescisão do Termo de Parceria, por meio da prestação de contas. Cumpre ressaltar que tal análise não faz parte dia a dia de quem acompanha o termo de parceria, até mesmo por ter um caráter mais fiscal, não impactando de forma significativa na tomada de decisão por parte de quem elabora e avalia a política pública envolvida.

Sistema de Custeio ABC

Esclarecido o funcionamento básico dos Termos de Parceria e quais são os documentos objetos de análise deste trabalho, passaremos a fazer uma breve revisão acerca da contabilidade de custos e do sistema de Custeio ABC, permitindo elucidar a análise posterior dos demonstrativos financeiros.

De acordo com Leone (2002), a Contabilidade de Custos pode ser definida como a função responsável por acumular, organizar, analisar e interpretar os custos dos produtos, dos estoques, dos serviços, dos componentes da organização, dos planos operacionais e das atividades de distribuição, de forma a determinar o lucro, controlar as operações e para auxiliar a administração no processo de tomada de decisão.

A gestão estratégica da organização, incluindo o estabelecimento de seus objetivos e metas será mais fácil, caso consiga estabelecer e aplicar precisamente conceitos e técnicas de custos (Rocha e Selig, 2001). Martins (2003), complementa essa afirmação, ao estabelecer que a contabilidade de custos possuí duas funções: o auxílio ao controle gerencial e à tomada de decisão.

O sistema de custeio ABC (activity-based costing) surgiu nas últimas décadas em razão dos sistemas de custeios tradicionais não satisfazerem mais as necessidades informacionais dos gestores, até mesmo porque os custos indiretos, que antes tinham uma participação baixa nos custos totais, passaram a ter impacto significativo nos custos finais dos produtos, conforme destaca Megliorini (2007).

Isso não acontece com o custeio ABC pois, segundo Ferreira (2007), este possui uma visão horizontal dos processos dos negócios, ultrapassando barreiras departamentais, estabelecendo relações entre as atividades dos processos e o consumo de recursos, para permitir que os custos sejam alocados aos produtos. Assim, “as atividades serão custeadas pelo rastreamento dos recursos absorvidos em sua execução ou elaboração – como materiais, mão de obra, seguro consumo de energia elétrica – e definidas pelos direcionadores de custos, que são os fatores ou medidas de consumo que fazem que as atividades sejam realizadas”.

Com relação às vantagens do custeio ABC, Megliorini (2007) observa que este permite identificar e eliminar as atividades que aumentam o custo dos produtos ou serviços sem que haja geração de valor para o cliente. Entretanto, também relata que a desvantagem é que acaba se assemelhando ao custeio por absorção, uma vez que não destrincha os custos fixos e faz sua apropriação aos objetos de custeio.

Embora aproprie melhor os custos indiretos aos produtos e serviços do que outros sistemas de custeio, outra desvantagem do ABC é que a sua complexidade pode implicar em mais dispêndio de tempo e recursos para sua utilização, aumentando o seu custo-benefício, conforme relatado por Ferreira (2007).

Quanto à sua recomendação e aplicação, Ferreira (2007) afirma que o sistema de custeio ABC é aplicável a qualquer empresa, porém, sua aplicação é mais recomendada a organizações em que o custo indireto é significativo frente ao custo total, a empresas que possuem produtos ou serviços muitos diversos, tanto no que diz respeito ao volume de produção ou processo produtivo e aquelas que trabalham com clientes com necessidades distintas de volume de encomenda, de especificações especiais e de serviços adicionais.

A primeira etapa do custeio ABC é a identificação das atividades executadas pela empresa. De acordo com Megliorini (2007), as atividades são ações ou trabalhos específicos, realizados para converter recursos em produtos ou serviços, ou, visto de outra forma, são consequência da combinação de recursos como pessoas, materiais, tecnológicos e financeiros. O autor sugere que para identificação deve se realizar entrevista ou aplicação de questionário com os gestores, ou mesmo observação direta dos processos. Para Ferreira (2007), atividade é um conjunto de tarefas com um objetivo comum. Desta forma, a atividade é capaz de relacionar e integrar as tarefas, as quais são o menor segmento das operações empresariais, sendo importante destacar também que o conjunto de atividade interligadas para satisfazer determinado objeto de custo é o que se chama de processos.

Para Megliorini (2007), após identificadas as atividades, é preciso atribuir os custos dos recursos a elas. Primeiro, deve ser realizada a apropriação direta que é possível quando o recurso pertence tão somente a uma atividade específica. Depois, deve ser feito o rastreamento por meio de direcionadores de custos, relação de causa e efeito entre a ocorrência da atividade e a geração de custos, como o número de funcionários, área ocupada, consumo de energia. Por último, deve ser utilizado o rateio, realizado por uma base considerada adequada e necessário quando não for possível a utilização de nenhum dos meios anteriores.  

Após as apropriações dos custos às atividades, os mesmos devem ser transportados para os produtos ou serviços, utilizando-se, para isso, direcionadores de atividades, ou em outras palavras, deve-se lançar os custos das atividades de acordo com a sua vinculação aos produtos e serviços da empresa.

Questiona-se como se o sistema de Custeio ABC foi devidamente adaptado à metodologia de gerenciamento de custos adotada nos Termos de Parceria de Minas Gerais. Assim, este trabalhado irá avaliar como o Custeio ABC foi aplicado, como seus conceitos foram integradas aos instrumentos de planejamento e execução financeira dos Termos de Parceria, além de verificar se essa aplicação gerou novas informações para os tomadores de decisão envolvidos e se essas informações são relevantes.

Será realizada uma análise de como era a Memória de Cálculo e o Relatório Gerencial Financeiro antes da adaptação ao Custeio ABC, para depois verificar quais alterações foram realizadas nesses demonstrativos financeiros. A partir das alterações realizadas, iremos avaliar como se deu a adaptação do Custeio ABC, para verificar quais conceitos e etapas foram aplicados, quais novas informações foram geradas, qual o grau de relevância dessas informações e quais melhorias podem ser realizadas.

Inclusão do Sistema ABC na Metodologia de Custos dos Termos de Parceria

Conforme destacado anteriormente, o Programa de Trabalho, cujo modelo está presente no sítio eletrônico da SEPLAG[1], detalha os produtos e serviços que devem ser entregues pela entidade parceira. Essas entregas são definidas pelo estabelecimento de indicadores de mensuração, que podem ser de eficiência, eficácia, efetividade, execução excelência e economicidade, como também pela pactuação de produtos estratégicos, frutos de ações específicas. Nota-se, portanto, que não há no Programa de Trabalho a necessidade de definição de todas as entregas do Termo de Parceria, relacionando todas as atividades a serem executadas.

O orçamento do TP é construído pela OSCIP para compor o processo de celebração por meio do preenchimento da Memória de Cálculo, que é uma planilha eletrônica disponibilizada pela SEPLAG. Nesse instrumento deve ser inserida a previsão de todas as receitas e gastos relativos à execução do objeto, chegando-se ao valor global de recursos envolvidos. Posteriormente, para contrapor-se a essa previsão, o Relatório Gerencial Financeiro é elaborado periodicamente, seguindo moldes similares aos da Memória de Cálculo.

A seguir, será apresentado como eram esses demonstrativos ainda sem o custeio ABC. Não se pretende esgotar os detalhes de todos os itens destes demonstrativos por não ser objeto deste trabalho, de forma que será explicado o necessário para compreensão das mudanças realizadas a partir da adaptação para o custeio ABC.

Como a adaptação resultou apenas em pequenas mudanças, notadamente a inclusão de algumas tabelas e alguns campos de preenchimento, mantendo-se a estrutura das tabelas já existentes, essa apresentação também contribui para o entendimento da composição desses documentos após a adaptação realizada. Desta forma, primeiro serão apresentados os modelos de demonstrativos financeiros e depois as mudanças realizadas, para, então, passar-se à discussão da inclusão do sistema ABC.

A Memória de Cálculo era composta por 05 tabelas[2], sendo a principal delas a “Tabela 3 - Previsão Analítica de Receitas e Gastos Mensais em Regime de Competência”, a qual contém toda a previsão de entradas e saídas de recursos mensais por natureza de despesas, ou seja, a previsão detalhada por subcategorias a cada mês. As subcategorias são as rubricas utilizadas para classificar os gastos e receitas por natureza de despesa em nível analítico, sendo o nível sintético o agrupamento das subcategorias, denominado categorias.

São utilizadas 03 categorias de saídas, sendo elas Gastos de Pessoal, Gastos Gerais e Aquisição de Bens permanentes, e 02 categorias de entradas, Receitas e Devoluções, compondo, assim, o nível sintético. A movimentação financeira é também demonstrada nesse nível na “Tabela 1 - Previsão Sintética de Receitas e Gastos Mensais em Regime de Competência”, é inserida posteriormente no Programa de Trabalho.

A “Tabela 4 - Previsão Mensal dos Encargos e Benefícios de Pessoal” apresenta o detalhamento completo dos gastos com pessoal, onde estão relacionados todos os cargos disponíveis, a quantidade de trabalhadores de cada um e os valores da remuneração bruta, assim como todos os encargos e benefícios, que são demonstrados detalhadamente também por cargo. A “Tabela 5 - Previsão de Gastos com Pessoal” é utilizada para demonstrar a carga horária de trabalho, o início e término de trabalho dos empregados, os reajustes de salários, encargos e benefícios ao longo da vigência do Termo de Parceria e para comparar os valores dos cargos escolhidos com uma pesquisa de mercado, demonstrando que as remunerações estão compatíveis com aquelas praticadas pelo mercado.

A última tabela existente antes da implantação do custeio ABC é a “Tabela 6 - Previsão de Aquisição de Bens Permanentes”, na qual são relacionados todos os bens permanentes a serem adquiridos, com o valor unitário, a quantidade, a descrição do bem e a justificativa para a aquisição.

É possível perceber que esse documento não possui nenhuma vinculação direta ao Programa de Trabalho, que contém os produtos e serviços. De forma simplificada, podemos concluir que o documento continha apenas uma classificação de natureza de despesa por tempo, bem como o detalhamento de dois grandes grupos de gastos, aqueles a serem realizados com trabalhadores celetistas e aqueles com a aquisição de bens. Desta forma, o mesmo não permitia mensurar o custo das entregas físicas elencadas no Programa de Trabalho.

Após a assinatura do Termo de Parceria a OSCIP passa a executar o Programa de Trabalho e possui flexibilidade para custear as atividades. Conforme relatado anteriormente, periodicamente a OSCIP encaminha o Relatório Gerencial de Resultados e o Relatório Gerencial Financeiro à Comissão de Avaliação, a qual se reúne para avaliar os resultados. Basicamente, no primeiro estão contidos os resultados apurados nos indicadores e os produtos entregues, sem tratar diretamente dos custos. Já o RGF, demonstra em moldes similares à Memória de Cálculo como se deu a execução dos Gastos.

O primeiro demonstrativo do RGF é a “Tabela 1 - Resumo das Movimentações Financeiras no Período em Regime de Caixa”, que permite uma visão geral das movimentações financeiras mensais do período avaliatório em questão: entradas, saídas e saldos financeiros. A “Tabela 2 - Comparativo entre Receitas e Gastos Previstos e Realizados no Período em Regime de Competência” apresenta um comparativo em nível sintético entre as movimentações financeiras do período e a previsão feita na Memória de Cálculo. A “Tabela 4 - Demonstrativo Analítico das Receitas e Gastos Mensais em Regime de Caixa Tabela” e a “Tabela 5 - Demonstrativo Analítico das Receitas e Gastos Mensais em Regime de Competência” demonstram a natureza de despesa por tempo, em nível analítico, de toda a movimentação financeira do período.

A “Tabela 10 - Diário de Entradas e Saídas do Termo de Parceria” é fundamental para o Relatório, pois demonstra todos os lançamentos financeiros ocorridos no período e é fonte de alimentação para outras tabelas. Sendo assim, cada uma das linhas do diário se refere a um lançamento de entrada ou saída e contém a data de pagamento, a classificação da subcategoria, o favorecido, o valor, a vinculação daquele gasto ao objeto do TP, entre outros, de forma a permitir aos interessados visualizar detalhadamente os gastos e receitas.

A “Tabela 9 - Demonstrativo dos Recursos Comprometidos ao Final do Período” é preenchida para cálculo do saldo remanescente (saldo disponível) ao final do período e para completar o regime de competência de outras tabelas, tendo em vista que a tabela 10, apresentada acima, é elaborada utilizando o regime de caixa. Desta forma, os lançamentos desta tabela complementam os lançamentos da tabela 10.

Por fim, cumpre ressaltar que por não ser objeto do estudo deste trabalho e não restar prejuízo ao entendimento do mesmo, não serão apresentadas as tabelas 6, 7, 8 e 9. Pode-se observar que assim como na Memória de Cálculo, o RGF também não permitia saber o custo das entregas físicas elencadas no Programa de Trabalho.

Ao observar a Memória de Cálculo após a sua adaptação ao custeio ABC, primeiro precisa-se destacar a inclusão da “Tabela 2 - Previsão de Gastos Gerais das Atividades do Termo de Parceria”. É nesta tabela que ocorre a primeira etapa determinada pela literatura acerca do tema, que é a identificação das atividades. Importante observar que o Programa de Trabalho é elaborado com indicadores e produtos, não fazendo menção a atividades. Como nessa tabela temos a lista de atividades, sem se referir a indicadores e produtos, conclui-se que não há uma relação clara entre esses itens. Na tabela que contém a lista das atividades, há a demonstração do valor absoluto e percentual relativo ao total de cada uma delas.

Outra observação relevante consiste na existência de uma atividade que já vem preenchida no modelo do demonstrativo, que é “Área Meio – Atividades e Gastos”, restando os demais espaços das atividades livres para inserção de qualquer atividade definida pelo Órgão Estatal Parceiro. Desta forma, o rol de atividades passa a ser composto por essa atividade obrigatória e as demais, que podem variar de acordo com os Termos de Parceria e principalmente, de acordo com a forma com que a Oscip e o Órgão Estatal Parceiro entendem as tarefas, atividades e processos da política pública.

Ainda sobre a primeira atividade, definida como área meio, podemos entender que se trata de gastos necessário para a execução do Termo de Parceria, mas que não tem relação direta com os produtos e serviços previstos no seu Programa de Trabalho. Seria o caso, por exemplo, de serviços administrativos necessários, como assessoria contábil ou jurídica, auditoria externa, ou mesmo tarefas ligadas à prestação de contas. Delimitando a área meio a essa atividade, espera-se que as demais estejam diretamente ligadas à execução da política pública, ou seja, que possuam caráter de atividades finalísticas.

A outra alteração significativa na Memória de Cálculo foi a criação da “Tabela 7 - Previsão Detalhada do Fluxo de Gastos Gerais em Regime de Competência”. Havia detalhamento para as outas duas categorias de saída, Gastos com Pessoal e Aquisição de Bens Permanentes, mas não para a categoria Gastos Gerais. Nessa tabela, que se constitui em formato de lançamentos, é importante destacar o campo “Atividades do Termo de Parceria - Vinculação ao Programa de Trabalho”, que permite apropriar aquele lançamento às atividades definidas.

Além dessas duas novas tabelas, há apenas outra inclusão: o campo “Área Destinada” na “Tabela 5 – Previsão de Gastos com Pessoal”, que permite definir se o cargo em questão é de área meio, o que faz referência à atividade tida como obrigatória, ou área fim, que seria referente às demais atividades, mas sem ser possível escolher, qual atividade fim. O resultado dessa classificação pode ser observado ao final da “Tabela 2 - Previsão de Gastos Gerais das Atividades do Termo de Parceria”.  Após essa tabela há um quadro acessório que demonstra o valor absoluto e o percentual relativo de área meio e de área fim, da categoria Gastos de Pessoal e da Categoria Gastos Gerais, bem como da soma das duas.

Com relação ao RGF, primeiro destaca-se a criação da “Tabela 3 - Demonstrativo dos Gastos das Atividades do Termo de Parceria”, elaborada nos mesmos moldes da Tabela 2 da Memória de Cálculo, de forma a permitir a comparação do que foi previsto para cada atividade, com os valores de fato executados. Também há um quadro acessório que demonstra o valor absoluto e o percentual relativo de área meio e de área fim para os gastos de pessoal e para o total do Termo de Parceria.

As outras alterações foram inclusões do campo “Apropriação às Atividades”, na “Tabela 10 - Diário de Entradas e Saídas do Termo de Parceria” e na “Tabela 9 - Demonstrativo dos Recursos Comprometidos ao Final do Período”. Como toda a movimentação financeira passa obrigatoriamente por essas tabelas, pode-se apropriar todos os gastos gerais às atividades do Termo de Parceria.

Há uma orientação para que os gastos das demais categorias não são sejam apropriados nessas tabelas, já que o cálculo de área meio e área fim da categoria Gastos com Pessoal é realizado de forma simplificada frente à sua complexidade de cálculo, tendo em vista os provisionamentos trabalhistas necessários. Esse cálculo é realizado no quadro acessório da Tabela 3 do RGF mencionado acima, a partir da proporção da distribuição dos Gastos com Pessoal entre área meio e área fim observada na Memória de Cálculo[3].

Análise da inclusão do Sistema ABC

Aproveitando essa constatação, e para começar a discutir as adaptações realizadas, ressalta-se que o custo total do Termo de Parceria não é totalmente apropriado às atividades. Os custos com aquisição de bens permanentes ou mesmo a sua depreciação, o que seria mais adequado, não são apropriados. Constata-se que o valor global de saída de recursos do Termo de Parceria de fato nunca será igual ao valor apurado no somatório dos custos das atividades, em razão dessa lógica de se apropriar apenas a depreciação do bem ao longo do período de execução, em detrimento do custo de aquisição do bem. Sendo assim, é importante constatar que no caso de Termos de Parceria que possuem custos elevados com bens permanentes, os valores encontrados pela apropriação às atividades estarão distorcidos da realidade.

Com relação aos gastos com os empregados celetistas, a simplificação foi considerável, tendo em vista que se calcula apenas o valor da primeira atividade (área meio) e o valor global das outras atividades, sem apurar o custo de cada uma delas. Para fazer essa apropriação, de acordo com o que foi relatado anteriormente sobre o custeio ABC, deveria ser usado um direcionador de custo adequado, que no caso seria a hora trabalhada para cada atividade de cada trabalhador. De fato, casa haja uma variedade considerável de trabalhadores dedicados a uma quantidade diversa de atividades, o custo de medição pode ser excessivo ao ponto de se questionar a utilização do sistema de custeio. Por outro lado, caso isso não ocorra e a estrutura permita uma apropriação mais simples, seria oportuno mensurar o valor dos gastos de pessoal por atividade. Também nesse caso é importante relatar que quanto maior o custo de pessoal, maior a distorção frente a realidade dos gastos das atividades e o valor apurado.

Outra limitação que deve ser observada é referente à atividade área meio, uma vez que seria ideal que os custos lançados para a mesma fossem, na verdade, apropriados às demais atividades. Apesar de dificilmente ocorrerem custos dessa natureza capazes de passarem por apropriação direta às atividades com caráter de área fim, mesmo que não haja um trabalho pormenorizado com direcionadores de custos, seria interessante trabalhar com algum tipo de rateio, de forma a transferir a totalidade desses custos para as demais atividades.

Fica evidente que a adaptação nos demonstrativos não permite a apropriação por meio de direcionadores de custos ou mesmo por rateio no caso dos gastos com pessoal e dos gastos de área meio da categoria Gastos Gerais. Apesar disso, destaca-se que, nas atividades finalísticas, os Gastos Gerais podem ser apropriados a quantas atividades forem necessárias, pois as tabelas referentes a esses gastos funcionam por meio de lançamentos, permitindo, assim, mais de um lançamento para um determinado gasto para se realizar a apropriação a mais de uma atividade.

Embora tenham sido relatadas diversas limitações acerca do custeio ABC adotado para os demonstrativos financeiros dos Termos de Parceria, é importante destacar que foram geradas novas informações relevantes para a tomada de decisão. Se antes se conhecia apenas a natureza de despesa dos gastos e sua distribuição ao longo da vigência da parceria, agora evidencia-se o custo das atividades definidas. Isso abre uma nova perspectiva de análise dos gastos para os responsáveis do órgão signatário do Termo de Parceria.

O custeio ABC gera um novo foco de análise e permite a esses atores a verificação de como se dá a distribuição dos recursos pelas atividades. Isso irá permitir que novas decisões sejam tomadas, refletindo na alocação futura dos recursos, seja pela redução de atividades que não agreguem valor diretamente aos produtos ou serviços, ou simplesmente pela melhor distribuição dos custos de acordo com as necessidades das políticas públicas.

Conclusão

Este artigo objetivou demonstrar como os conceitos do sistema de Custeio ABC foram adaptados e implementados nos demonstrativos financeiros dos Termos de Parceria, tendo em vista a importância do conhecimento acerca dos custos das políticas públicas e da necessidade de se ter uma alocação de recursos eficiente.

Após apresentar o demonstrativo de planejamento (Memória de Cálculo) e o demonstrativo de execução (Relatório Gerencial Financeiro) foram analisadas as mudanças geradas com a adaptação desses demonstrativos para o Custeio ABC e como as informações de custo por atividade são geradas nesses instrumentos. A partir disso, foram apontadas as limitações e oportunidades de melhoria dos dois documentos.

Nesse sentido, constatou-se que as escolhas durante o processo de construção da metodologia podem gerar distorções no cômputo final dos custos por atividades. Isso se deve, principalmente, pelo fato dos gastos com trabalhadores celetistas e dos gastos com bens patrimoniais não serem apropriados às atividades. Enquanto os custos com os bens permanentes são ignorados, os custos gerados por pessoal são classificados apenas entre área meio e área fim.

Outra limitação evidente refere-se ao fato dos gastos tidos como área meio, tais como despesas administrativas necessárias a obrigações legais e de prestação de contas, serem lançados diretamente a uma única atividade, sem que depois haja qualquer tipo de realocação desses custos para as atividades finalísticas.

Apesar das limitações apontadas, percebe-se que a implantação do custeio ABC resultou em alterações significativas e relevantes para esses demonstrativos. Os responsáveis pelas políticas públicas dos órgãos signatários agora possuem a possibilidade de analisar os custos pela ótica das atividades, enquanto antes a única forma existente era por meio da análise de natureza de despesa por tempo. Assim, com essas modificações, pode ser possível uma alocação melhor dos recursos públicos.

Uma oportunidade de melhoria possivelmente fácil de ser implantada seria a vinculação e, consequentemente, o direcionamento dos custos das atividades ao Programa de Trabalho do Termo de Parceria, se possível, a partir da vinculação direta aos indicadores e produtos. Esse registro deve ser feito não só pela constatação durante a análise, mas também em razão de constituir uma parte importante do custeio ABC que não foi abarcada nos demonstrativos objetos de estudo.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

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MEGLIORINI, Evandir. Custos: análise e gestão. 2. Ed. São Paulo: Person Prentice Hall, 2007.

 

MINAS GERAIS. Decreto Estadual 46.020/12. Disponível em: < http://www.almg.gov.br/consulte/legislacao/completa/completa.html?tipo=DEC&num=46020&comp=&ano=2012 > Acesso em 5 de jul. de 2018.

 

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MINAS GERAIS. Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão. OSCIP. 2018. Disponível em: < https://www.mg.gov.br/planejamento/pagina/planejamento-e-orcamento/oscips-e-organizacoes-sociais > Acesso em 5 de jul. de 2018.

 

ROCHA, Joseilton Silveira da; SELIG, Paulo Maurício. O sistema de gestão balanced scorecard e seus impactos sobre a teoria de custos. In: CONGRESSO DEL INSTITUTO INTERNACIONAL DE COSTOS, 7, 2001, León - España. Anais... León: Asociación Española de Contabilidad Directiva, 2001.

 

TORRES, Marcelo Douglas de Figueiredo. Agências, contratos e OSCIPS; a experiência pública brasileira. Rio de Janeiro: Ed. FGV, 2007.

 

 

 

[1] Para consulta acessar https://www.mg.gov.br/planejamento/pagina/planejamento-e-orcamento/oscips-e-organizacoes-sociais

[2] Com as inclusões de tabelas nos demonstrativos para adaptação ao sistema ABC, a numeração das tabelas foi alterada. Para facilitar a referência e o entendimento, far-se-á referência apenas à nova numeração, utilizada após a adaptação realizada, até mesmo porque os modelos de Memória de Cálculo e RGF anteriores não estão mais disponibilizados pela Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão.

[3] Os percentuais de área meio e fim encontrados na elaboração da Memória de Cálculo, são multiplicados pelo valor total executado de Gasto com Pessoal, valor esse calculado e disponível no RGF.