EXECUÇÃO AUTÔNOMA DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DE SUCUMBÊNCIA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA: UM ESTUDO SOBRE SUA APLICABILIDADE

 

 

André Luiz da Silva Lopes[1]

Andréa dos Santos Melquisedec[2]

 

 

RESUMO: Considerando a grande ausência de estudos específicos sobre a execução contra a Fazenda Pública, ainda mais sobre o tema aqui tratado, este trabalho teve como objetivo definir de forma concreta e prática se o profissional da advocacia tem ou não direito de executar, de forma autônoma, os honorários de sucumbência, mediante Requisição de Pequeno Valor – RPV, quando o valor principal estiver sujeito ao regime de precatório, bem como analisar e buscar demonstrar se o §8º do Art. 100 da CF/88 aplica-se ou não aos honorários de sucumbência arbitrados em desfavor da Fazenda Pública.

Após a coleta e análise de dados, concluiu-se que o advogado não só pode, mas sim tem o direito em executar os honorários de sucumbência de forma autônoma do valor principal, conforme dispõe a Lei n. 8.906/94, considerando que a tese que defende a acessoriedade dos honorários sucumbenciais é fundada no art. 20 do CPC, que é de 1976, ou seja, anterior ao Estatuto da Advocacia e OAB que, por sua vez, estabeleceu, expressamente, que os honorários de sucumbência pertencem ao advogado, tendo este legitimidade para executar seus honorários de forma autônoma. Assim, não se aplicando à execução de honorários o disposto §8º do Art. 100 da CF/88, haja vista a verba honorária não ter a mesma titularidade do valor exequendo principal.

 

Palavras-Chave: Honorários de sucumbência – Execução autônoma – Fazenda Pública.

 

 

INTRODUÇÃO

O presente trabalho foi motivado pela experiência adquirida ao estagiar na 2ª Vara da Fazenda Pública, da Comarca de Porto Velho - RO, onde pude constatar a ausência de entendimento pacífico na jurisprudência sobre o tema, fato esse que de certa forma pode causar uma insegurança jurídica e até mesmo social, visto a importância dos honorários para o profissional da advocacia.

Mesmo não restando dúvidas da importância dos honorários para um advogado, tratando-se de execução contra a Fazenda Pública, onde os créditos em regra são pagos por ordem cronológica do precatório e, por exceção, através de Requisição de Pequeno Valor – RPV, nos termos do artigo 100 da Constituição da República, a maioria da jurisprudência vem adotando o entendimento de que os honorários sucumbenciais, mesmo em valor inferior ao teto de RPV, não podem ser executados de forma autônoma do valor principal quando este estiver sujeito ao regime de precatório.

A questão principal que se busca com o presente trabalho é estabelecer se é possível ou não o advogado executar os honorários arbitrados por consequência da sucumbência de forma autônoma do valor principal numa execução contra a Fazenda Pública.

De um lado o entendimento atual da maioria da jurisprudência que assegura que não é possível o fracionamento dos honorários de sucumbência do valor principal, com fundamento no §8º do art. 100 da CRF, considerando que os honorários de sucumbência são acessórios do valor principal e que por isso prevalece a regra que estabelece que o acessório segue a sorte do principal. De outro lado a corrente que defende que os honorários de sucumbência pertencem ao advogado e que por isto podem ser executados de forma autônoma do valor principal, nos termos do art. 23 e 24 da Lei 8.906/94, formado, assim, um litisconsórcio ativo facultativo na execução contra a Fazenda Pública.

Assim, como visto, atualmente, há expressiva divergência no que se refere à execução de honorários de sucumbência contra a Fazenda Pública. O ponto controverso é exatamente se é ou não possível o advogado executar de forma autônoma os honorários de sucumbência, num valor não superior ao teto da RPV, mesmo quando o valor principal seguir a ordem cronológica do precatório.

O tema em estudo divide a jurisprudência e a doutrina em duas correntes, quais sejam, a que defende a possibilidade da execução autônoma dos honorários de sucumbência do valor principal, e a que defende a impossibilidade de tal execução autônoma.

Entretanto, necessário é um estudo e questionamento mais profundo sobre o tema divergente tentando esclarecer pontos como:

            A quem pertence os honorários de sucumbência?

            O preceito contido no §8º do Art. 100 da CF/88, que aduz que é vedado o fracionamento do valor da execução para fins de expedição de RPV, aplica-se aos honorários de sucumbência?

            O Advogado tem ou não o direito de executar, de forma autônoma do valor exequendo principal, os honorários de sucumbência fixados em desfavor da Fazenda Pública?

Deduz-se, portanto, que essa discussão faz-se necessária e necessita de posições que definam de uma vez por todas a quem pertence os honorários de sucumbência, bem como se é possível ou não o advogado executar os honorários de sucumbência de forma autônoma do valor exequendo principal.

Sendo assim, considerando a grande ausência de estudos específicos sobre a execução contra a Fazenda Pública, ainda mais sobre o tema aqui tratado, vem este trabalho definir de forma concreta e prática se o profissional da advocacia tem ou não direito de executar, de forma autônoma, os honorários de sucumbência, mediante Requisição de Pequeno Valor – RPV, quando a verba principal estiver sujeita ao regime de precatório.

 

1 OS HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA E A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA

Os honorários de sucumbência foram introduzidos no nosso sistema normativo através da Lei n. 6.355/76 que, por sua vez, alterou o disposto no artigo 20, do Código de Processo Civil (CPC), que passou a vigorar com o seguinte texto:

 

A sentença condenará o vencido a pagar ao vencedor as despesas que antecipou e os honorários advocatícios. Esta verba honorária será devida, também, nos casos em que o advogado funcionar em causa própria.

 

Antes do vigente Estatuto da Advocacia e da OAB, que é do ano de 1994, somente o art. 20 do CPC tratava sobre honorários de sucumbência, assim, houve, por muito tempo, uma grande divergência a respeito de quem pertencia os honorários de sucumbência. A corrente predominante entendia que tal verba era de natureza indenizatória e, portanto, pertencia à parte vencedora, considerando a expressão utilizada pelo legislador “a pagar ao vencedor”. A corrente minoritária, por sua vez, defendia que os honorários fixados em razão da sucumbência pertenciam ao patrono da parte vencedora, ou seja, ao advogado, e que tinham natureza remuneratória e não indenizatória.

Ocorre que, com o advento da Lei n. 8.906/94, os advogados passaram a ter legitimidade expressa sobre os honorários de sucumbência, visto que o artigo 22 da referida lei assim dispõe:

 

A prestação de serviços profissionais assegura aos inscritos na OAB o direito aos honorários convencionados, aos fixados por arbitramento judicial e aos de sucumbência [Grifei].

 

Logo, hoje não há mais divergência a quem pertence os honorários de sucumbência, visto a clareza da legislação especial citada.

Apesar de não ser tão relevante para o presente estudo, visto que para o enquadramento na forma de pagamento (RPV e Precatório) leva-se em conta o valor do crédito e não sua natureza, pertinente é dizer que hoje é pacífico o entendimento de que os honorários de sucumbência são tidos como verba alimentícia.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao decidir o Recurso Especial 608.028-MS, concluiu que “os honorários advocatícios, mesmo de sucumbência, têm natureza alimentar” (disponível no banco de jurisprudência do site www.stj.jus.br). Nesse mesmo sentido é também o entendimento adotado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) que assim entende: “os honorários advocatícios incluídos na condenação pertencem ao advogado e possuem natureza alimentícia” (RE 415.950, disponível no banco de jurisprudência do site www.stf.jus.br).

Com o atual estatuto da advocacia e da OAB também não há mais controvérsia sobre a natureza dos honorários de sucumbência. Tornou-se sedimentado o entendimento de que os honorários de sucumbência são de natureza remuneratória ao advogado e não indenizatória à parte vencedora como anterior entendimento.

Cahali, discorre sobre a natureza dos honorários de sucumbência com a seguinte afirmação:

 

As alterações operadas pela Lei 8.906, em matéria de honorários de sucumbência, desloca-se nitidamente da clave de indenização para a de remuneração. Deixaram de ser uma condenação, destinada a inteirar os desfalques sofridos pela parte, para se configurarem exclusivamente como pago pelo trabalho desenvolvido pelo advogado. Ou seja, perderam sua natureza indenizatória para assumirem a natureza retribuitória (1997, p. 803).

 

Lôbo mantém o mesmo entendimento ao comentar a Lei n. 8.906/94. Senão, vejamos:

 

A legislação anterior estabelecia que os honorários fixados na condenação contra a parte vencida ou sucumbente, na ação, pertencia à parte vencedora. O Estatuto inverteu radicalmente a titularidade desses específicos honorários, a saber, da parte vendedora para seu advogado. Com efeito, mudou o fundamento e a natureza dessa condenação, deixando de ser indenização das despesas despendidas pela parte vencedora para consistir em parte de remuneração de seu advogado, cujo ônus é imputado à parte vencida (2007, p. 148).

 

Assim, dúvidas não há que atualmente os honorários de sucumbência pertencem ao advogado e que possuem natureza remuneratória e não indenizatória.

A divergência aqui analisada e estudada surgiu no procedimento de execução contra a Fazenda Pública, onde, como já dito, seus créditos, em regra, são pagos pela ordem cronológica de precatório e, por exceção, por Requisição de Pequeno Valor – RPV, em atenção ao determinado no artigo 100 e seus parágrafos da Constituição Federal de 1988 (CF/88).

A controvérsia nasce quando se executa um crédito principal, pertencente a parte vencedora, sujeito ao regime do precatório, e uma verba honorária de sucumbência, pertencente ao advogado, não superior ao teto máximo para pagamento mediante RPV. O ponto principal do problema é exatamente se é ou não possível, no caso citado, a execução autônoma dos honorários de sucumbência por regime de RPV, enquanto o valor principal segue a ordem do precatório. Passemos a analisar os dispositivos e teses a respeito da matéria em discussão.

 

2 A IMPOSSIBILIDADE DO FRACIONAMENTO DA EXECUÇÃO CONTRA A FAZENDA PÚBLICA

O §8º do artigo 100 da Constituição Federal, que é um dos artigos que disciplina a execução contra a Fazenda Pública, veda, expressamente, o fracionamento ou quebra do valor da execução para fins de recebimento de Requisição de Pequeno Valor – RPV, vejamos:

 

É vedada a expedição de precatórios complementares ou suplementares de valor pago, bem como o fracionamento, repartição ou quebra do valor da execução para fins de enquadramento de parcela do total ao que dispõe o § 3º deste artigo. [Grifei].

 

Com fundamento no citado dispositivo, bem como entendendo que os honorários de sucumbência e o valor principal formam um valor único, a maioria dos tribunais pátrios, incluindo o Tribunal de Justiça de Rondônia, vem impedindo a execução autônoma dos honorários de sucumbência contra a Fazenda Pública.

Essa corrente entende e defende que, conforme dispositivo citado, não é possível a individualização de cada credor, de modo a adequá-lo ao limite da RPV estabelecido, em regra, pelo inciso I do art. 87 da ADCT, para que, com base no §3º do art. 100 da Constituição, seja dispensada a expedição de precatório.

Admitir a individualização do crédito é admitir o fracionamento da obrigação do Estado frente ao particular visando escapar do rito dos precatórios, o que é expressamente vedado pela Constituição Federal, de 1988.

Nessa linha, se o débito principal se enquadra no rito dos precatórios a execução de honorários não pode seguir outro rito. Devendo-se respeitar esta regra mesmo se for autônoma a execução dos honorários advocatícios e o valor executado inferior ao limite previsto para requisição de pequeno valor.

Nessa primeira linha de pensamento, sobre o tema em estudo, a jurisprudência que vem prevalecendo até então é fundada na orientação fixada no Recurso Extraordinário 141.639/SP, onde o Supremo Tribunal Federal rejeita a hipótese de execução de honorários de forma autônoma, sustentando, em síntese, que:

 

Quando a Constituição excepciona do precatório para execução de créditos de natureza outra que não a alimentícia os créditos que tenha tal natureza, essa exceção só abarca a execução da condenação em ação que tenha por objeto cobrança específica desses créditos, inclusive, portanto, dos honorários de advogado, e não a execução de condenação a pagamentos que não decorram de créditos alimentares, ainda que nessa condenação haja uma parcela de honorários de advogado a título de sucumbência, e, portanto, a título de acessório da condenação principal. Nesse caso, o acessório segue a sorte do principal (RE 141.639/SP, disponível no endereço eletrônico www.stf.jus.br).

 

O entendimento do julgado citado, que é utilizado como paradigma para essa primeira corrente, segue o raciocínio de que a circunstância de a verba pertencer ao credor “A” ou “B” no caso não desnatura a acessoriedade. Ela é acessória por definição, porque ela não decorre de um direito autônomo, mas ela decorre do fato da sucumbência, e aí está a acessoriedade em relação à verba principal. Os julgadores que comungam com esse entendimento usam como exemplo de acessoriedade os juros, que são acessórios da verba principal e que sem esta simplesmente não existem.

Ademais, sabe-se que a execução contra a Fazenda Pública é uma execução que segue um regime especial, onde, por exemplo, não existem atos expropriatórios, nem intimação para pagar sob pena de penhora, mas sim uma fila cronológica de credores (Precatório) que deve ser respeitada, motivo pelo qual, apesar de autônomo, os honorários de sucumbência não podem ser executados de forma fracionada do valor principal, devendo, sim, respeitar o regime constitucional diferenciado da execução contra a Fazenda Pública.

Assim, sob pena de afronto a dispositivo constitucional, defende esta corrente que em face da regra, segundo o qual o direito acessório segue a sorte do principal, os honorários de sucumbência devem ser requisitados por precatório se sob esse regime de execução o crédito principal houver sido processado.

Em resumo, estes são os principais argumentos da corrente que defende a impossibilidade do fracionamento do crédito exequendo em desfavor da Fazenda Pública.

 

3 O DIREITO AUTÔNOMO DO ADVOGADO EM EXECUTAR A SENTENÇA NA PARTE REFERENTE AOS HONORÁRIOS

De outro norte existe uma corrente doutrinária, e até mesmo alguns julgados, apesar de isolados, que vem se fortalecendo cada vez mais com o entendimento de que não só é possível como é um direito do advogado em executar seus honorários de sucumbência de forma autônoma do principal, de tal sorte que, não excedido o teto legal, possam receber seu crédito através de requisição de pequeno valor, mesmo quando o valor principal se submeter ao regime de precatório.

Por sua vez, rebatendo o que vem sendo defendido pela primeira corrente, essa segunda linha entende que a finalidade do preceito contido no §8º do art. 100 da Constituição Federal, que venda o fracionamento da execução contra a Fazenda Pública, é a de evitar que o exequente utilize simultaneamente – mediante quebra do valor da dívida, fracionamento ou repartição – de dois sistemas de satisfação do crédito, quais seja, da requisição de pequeno valor e do precatório.

Logo, razoável é concluir que o preceito constitucional apenas se aplica nos casos em que o crédito exequendo pertença somente a um titular e, tratando-se de honorários de sucumbência, pertencentes ao advogado e não à parte vencedora, não se aplica a regra do §8º do art. 100 da CF/88, tendo em vista estarmos diante de dois créditos com titulares distintos.

Ora, o fracionamento ocorreria apenas e tão somente se o advogado pretendesse receber seus honorários de sucumbência, parte em requisição de pequeno valor e outra parte em precatório.

Limitando-se o advogado a requerer a expedição de RPV, quando seus honorários não excederam ao teto legal, não haverá fracionamento algum da execução, mesmo que o crédito do seu cliente siga regime de precatório. Não haverá fracionamento porque assim não pode ser considerada a execução de créditos independentes, a exemplo como ocorre nas hipóteses de litisconsórcio, tendo em vista a total independência dos honorários sucumbenciais em relação ao crédito principal.

O principal fundamento desta segunda corrente de pensadores repousa exatamente no artigo 23 e §1º do art. 24 da Lei n. 8.906/94, Estatuto da Advocacia e da OAB, que, de forma expressa, faculta ao advogado em executar seus honorários de sucumbência de forma separada ou nos mesmos autos em que foram fixados, bem como assegura ao advogado o direito autônomo de executar seus honorários:

 

Art. 23. Os honorários incluídos na condenação, por arbitramento ou sucumbência, pertencem ao advogado, tendo este direito autônomo para executar a sentença nesta parte, podendo requerer que o precatório, quando necessário, seja expedido em seu favor [Grifei].

 

Sendo o advogado, titular da verba de sucumbência, como o é, assumirá também a posição de credor da parte vencida, independentemente de haver crédito a ser recebido pelo seu constituinte na lide, por exemplo, nas ações declaratórias.

Nesse sentido é o entendimento de Cahali:

 

Com a titularidade do direito aos honorários da sucumbência, que agora lhe é expressamente atribuído, o advogado é introduzido, de alguma forma, na relação processual, que se estabelece a partir da sentença condenatória nessa parte, quando antes, o processo seria a ele uma “res inter alios”.

[...]

Com essa inserção do advogado no pólo dativo da relação executória, na parte referente aos honorários de sucumbência, sem a necessidade ou concomitantemente a exclusão do vencedor titular do todo da condenação principal, permite-se reconhecer agora, na hipótese, mesmo por analogia, o estabelecimento de um litisconsórcio facultativo entre o advogado e o cliente fundado na solidariedade ativa entre ambos (1997, p. 804/805).

 

Isso significa que o advogado poderá requerer a execução do seu crédito decorrente da sucumbência em face da parte vencida, de maneira isolada e autônoma do seu cliente, nos mesmos autos, formando um litisconsórcio ativo facultativo, ou em processo independente. Isso é que autoriza expressamente o §1º do art. 24, do Estatuto da advocacia e da OAB:

 

Art.24. Adecisão judicial que fixar ou arbitrar honorários e o contrato escrito que os estipular são títulos executivos e constituem crédito privilegiado na falência, concordata, concurso de credores, insolvência civil e liquidação extrajudicial.

§ 1º A execução dos honorários pode ser promovida nos mesmos autos da ação em que tenha atuado o advogado, se assim lhe convier [Grifei].

 

Em síntese, nessa linha, a execução pode ser processada, em relação ao direito próprio do advogado, no próprio processo em que lhe foi fixada a verba de sucumbência, se assim lhe convier. Podendo, também, executar o título em processo de execução autônoma de forma individual, fato este que afronta o princípio da celeridade e economia processual.

De forma clara e objetiva, Cahali coloca um ponto final no debate referente à possibilidade ou não da execução autônoma de honorários advocatícios sucumbenciais:

 

Perdeu sentido toda discussão que se estabelecera no direito anterior, quando a saber se o pretenso direito autônomo do advogado aos honorários da sucumbência seria um direito originário da sentença ou um direito derivado do direito do cliente [...]. Estabelecendo o art. 23 da Lei 8.906/94, que os honorários incluídos na condenação, por sucumbência, ‘pertence ao advogado’, concedeu-se-lhe, agora, verdadeiramente, um ‘direito próprio e autônomo’ (expressão que antes era contestada por alguns), com possibilidade de sua execução pelo próprio patrono, ainda que tendo como causa geradora o mesmo fato do sucumbimento da parte adversa do cliente vitorioso (1997, p. 804).

 

Entendimento similar é o de Cimardi que assegura também a autonomia dos honorários de sucumbência arbitrados em favor do patrono do vencedor ao afirmar que:

 

Os honorários advocatícios (decorrentes de sucumbência) e os honorários contratuais (art. 22, §4, da Lei 8.906/94, isto é, honorários convencionados entre as partes, se houver) também são incluídos na requisição de pagamento. [...]. Esses valores são considerados parcelas autônomas, não contando, portanto, para fins de teto legal de requisição de pequeno valor (2007, p. 376).

 

Assim, com fundamento na legislação especial da advocacia, Lei n. 8.906/94, esta segunda corrente entende que o advogado não só pode como tem direito em executar seus honorários de sucumbência de forma autônoma do valor principal, mesmo quando este estiver sujeito ao regime de precatório, não indo, assim, de encontro com o preceito constitucional, visto se tratar de verbas com titulares distintos.

 

4 DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO Nº 564.132

Como demonstrado, grande é o debate sobre o tema aqui analisado, envolvendo, inclusive, dispositivos constitucionais, fato este que acabou dando origem ao Recurso Extraordinário n. 564.132, protocolado no STF em 18 de setembro de 2007, onde o Estado do Rio Grande do Sul se insurge contra decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul que assegurou ao advogado do exequente o direito de requisitar os honorários de sucumbência, fixados na sentença de origem, por meio de requisição de pequeno valor autônoma do valor principal que seguiu a ordem cronológica de precatórios.

Em 17 de dezembro de 2007 o Tribunal Especial (STF) reconheceu a existência de repercussão geral da questão constitucional suscitada, considerando interpretações divergentes dada ao mesmo dispositivo constitucional, incluindo o RE na pauta do pleno do dia 03 de dezembro de 2008.

Em 03/12/2008 foi iniciado o julgamento do extraordinário, onde votaram os Ministros Eros Grau (relator), negando provimento ao recurso, acompanhado pelos votos dos Ministros Menezes Direito, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski e Carlos Brito, votando de forma divergente o Ministro Cezar Peluso, tendo a Ministra Ellen Gracie pedido vistas dos autos para um estudo mais esmiuçado da matéria.

Assim, como se percebe, inicialmente, há uma maioria provisória admitindo a execução de forma autônoma dos honorários de sucumbência, mesmo quando o valor principal seguir o regime de precatório.

Da sessão inicial do RE n. 564.132 destaca-se posições importantes como a do Ministro Relator Eros Grau que negou provimento ao recurso sob o fundamento de que:

 

A verba honorária consubstancia direito autônomo, podendo mesmo ser executada em separado. Não se confundindo com o crédito principal, que cabe à parte, o advogado há o direito de executar seu crédito nos termos do disposto nos artigos 86 e 87 da ADCT. A única exigência a ser, no caso, observada é a de que o fracionamento da execução ocorra antes da expedição do ofício requisitório, pena quebra da ordem cronológica dos precatórios.

 

Nesse sentido também foi o voto do Ministro Menezes Direito que assim concluiu:

 

[...] ficará contraditório nós admitirmos que a verba é autônoma, que é uma verba alimentícia, e não autorizarmos o fracionamento, na medida em que, destacadamente, o credor dos honorários advocatícios é diferente do credor do principal. O argumento de que seria acessório não vale, porque na realidade a acessoriedade só existe se houvesse a mesma titulação, e a titulação é diversa.

 

Completa o Ministro Ricardo Lewandowski:

 

Sem esta autonomia da execução dos honorários – que corresponde na verdade alimentar, como já foi destacado aqui - , é impossível que o advogado exerça de forma autônoma , de forma altiva o munus que a constituição lhe impõe .

 

De forma divergente foi o entendimento do Ministro Cezar Peluso, que defendeu:

 

[...] não nego a exeqüibilidade autônoma do crédito do advogado. Esta é uma tese corrente, desde que não possa ser estendida ao regime de execução de verba devida pela Fazenda Pública, porque essa tem um regime constitucional diferenciado. Em outras palavras, não se está aniquilando a exeqüibilidade autônoma da verba de sucumbência, que pode ser exercida em todos os demais casos, exceto contra a Fazenda Pública, onde a Constituição não permite a fragmentação, exatamente porque [...] o seu regime de pagamento é diferente dos regime de pagamento dos outros débitos, onde os credores vão avançar sobre o patrimônio do devedor independentemente de qualquer outra limitação, salvo as legais.

 

Assim, percebe-se que, apesar de uma maioria provisória pela autonomia dos honorários de sucumbência do valor principal, mesmo quando este estiver sujeito ao regime do precatório, a única certeza que se tem é a de que “muitas águas hão de passar por debaixo da ponte”, tendo em vista que hoje os autos do RE 564.132 ainda encontram-se com vistas para Senhora Ministra Ellen Gracie e, da data da sessão de julgamento (03/12/2008) para os dias de hoje muita coisa já se mudou na nossa Corte Maior, novos ministros entraram e alguns, inclusive que já votaram, saíram.

Ou seja, aquela insegurança jurídica e até mesmo social mencionada no início do trabalho ainda vem aterrorizando, em especial, a classe de advogados no Brasil, tendo em vista a morosidade do nosso judiciário em deliberar as causas postas em sua análise, bem como a grande divergência de entendimento sobre a matéria em estudo nos nossos tribunais pátrios, onde uns continuam determinado que honorários sucumbenciais sejam inscritos em precatórios, mesmo com valores inferiores ao teto de RPV, enquanto outros determinam o pagamento imediato, mediante requisição de pequena monta, mesmo o valor exequendo principal estando sujeito ao regime de precatório.

 

5 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Neste trabalho, foi adotada a pesquisa de natureza exploratória, com levantamento bibliográfico, em especial na área do direito público, utilizando, inicialmente, normas e livros de leitura corrente.

Destaca-se que as obras doutrinárias escolhidas foram eleitas por serem as poucas que tratam sobre o tema em estudo, apesar da grande importância da presente matéria para o mundo jurídico.

Baseando-se na pesquisa de tais estudos, os dados coletados foram analisados para serem incorporados a este trabalho final.

 

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como demonstrado, inúmeros são os argumento e teses a favor e contra a execução de forma autônoma dos honorários de sucumbência do crédito principal, quando este estiver sujeito ao regime do precatório e aquele, os honorários, num valor inferior ao teto para pagamento por RPV. Contudo, como feita a proposta no início do trabalho, cabe-nos, nesse momento, expressar nossa opinião e responder questionamentos relevantes sobre o tema, visando uma solução prática e justa, com fundamento na legislação em vigor.

O primeiro ponto colocado a ser solucionado pelo presente trabalho foi no sentido de esclarecer a quem, efetivamente, pertencem os honorários de sucumbência.

Pois bem, este ponto, como já dito, durante muito tempo gerou grandes conflitos doutrinário e jurisprudencial, todavia, com o advento do em vigor Estatuto da Advocacia e da OAB de 1994, como ressaltou Cahali “perdeu sentido toda discussão que se estabelecera no direito anterior”, visto que o citado estatuto estabeleceu, de forma expressa, em seus artigos 22, 23 e24 atitularidade dos honorários de sucumbência ao advogado, não havendo, assim, mais dúvidas quanto a quem pertencem os honorários de sucumbência.

Logo, hoje não há mais divergência a quem pertence os honorários de sucumbência, visto a clareza da legislação especial citada.

O segundo importante questionamento, de ordem até constitucional, a ser solucionado, foi o de analisar e concluir se o preceito contido no §8º do Art. 100 da CF/88, que aduz que é vedado o fracionamento do valor da execução para fins de expedição de RPV, aplica-se aos honorários de sucumbência.

Mais razoável e plausível é o entendimento de que a finalidade do preceito contido no §8º do art. 100 da Constituição da República é o de evitar que o exequente utilize simultaneamente – mediante quebra do valor da dívida, fracionamento ou repartição – de dois sistemas de satisfação do crédito, recebendo parte do seu crédito através de requisição de pequena monta e outra parte, do mesmo crédito, através do regime de precatório.

Logo, acreditamos que mais acertada é a interpretação de que o preceito constitucional apenas se aplica nos casos em que o crédito exequendo pertença somente a um único titular e, tratando-se de honorários de sucumbência, pertencentes ao advogado e não à parte vencedora, não se aplica a regra do §8º do art. 100 da CF/88, tendo em vista estarmos diante de dois créditos com titulares distintos, ou seja, o vencedor e seu patrono.

Por fim, colocou-se a grande dúvida que gerou e gera toda essa controvérsia aqui analisada e estudada, afinal, o advogado tem ou não direito de executar, de forma autônoma do valor exequendo principal, os honorários de sucumbência fixados em desfavor da Fazenda Pública?

A certeza que podemos dar é a de que a resposta definitiva para esta pergunta só o STF poderá proferir e, como demonstrado, não há de demorar muito, considerando que a lide já está sob a análise daquela corte há mais de 4 (quatro) anos. Contudo, após este trabalho em que tivemos a oportunidade de esmiuçar o tema controvertido, não poderíamos simplesmente deixar o veredito final nas mãos do STF, assim, segue abaixo nossa pequena contribuição para o deslinde da questão.

Percebeu-se que dos inúmeros argumentos utilizados pela corrente que defende a impossibilidade do fracionamento da execução contra Fazenda Pública, dois são tidos como basilares, quais sejam, o disposto no §8º da CRF/88 e o julgado 141.639/SP do STF que concluiu que os honorários de sucumbência são acessórios do valor principal e que, por sua vez, o acessório segue a sorte do principal.

Pois bem, no que se refere ao primeiro argumento fundado no §8º da Constituição, este já foi vencido ao dissertamos no sentido de que incabível é a sua aplicação quanto aos honorários de sucumbência, restando-nos somente discorrer sobre o julgado 141.639/SP do STF utilizado como paradigma pela primeira corrente.

Se analisarmos com muita cautela o RE n. 141.639/SP, certamente veremos que tal julgado originou-se de uma ação judicial que ingressou no STF no ano de 1991, ou seja, antes da Lei 8.906/94, que por sua vez, atribuiu ao advogado os honorários de sucumbência, qualificados como direito autônomo, passando, assim, a ser direito do advogado de executar e receber seus honorários de sucumbência de forma autônoma do valor exequendo principal.

O que estamos querendo dizer é que a acessoriedade dos honorários advocatícios defendida pela primeira corrente decorria do fato de o artigo 20 do CPC, que é de 1976, atribuir tais honorários ao vencedor, e não ao patrono, e que, sob tal premissa originou-se o julgado estabelecedor do entendimento de que o acessório segue a sorte do principal.

Analisando a questão à luz da legislação anterior concluímos que nada mais justo é o entendimento pregado pelo RE n. 141.639/SP, tendo em vista que naquela época tanto a verba principal como os honorários de sucumbência pertenciam à mesma pessoa, qual seja, a parte vencedora, logo não se poderia dividir o acessório do principal. No entanto, analisando a mesma questão à luz da legislação em vigor, forçoso é concluir que o precedente RE n. 141.639/SP, que vem servindo de base a julgados recentemente proferidos, diz respeito a uma situação pretérita, não mais comportada pelo direito positivo em vigor, tendo em vista que hoje os honorários de sucumbência são, nos termos do estatuto da advocacia, autônomos e, por sua vez, o que é autônomo não pode ser acessório de nada.

Assim, acreditamos que certamente o RE n. 564.132, que levou novamente ao plenário do STF o tema em estudo, passará de maioria provisória para maioria definitiva, negando provimento ao citado recurso e, consequentemente, reconhecendo aquilo que já está expresso na Lei 8.906/94, ou seja, o direito do advogado em executar os seus honorários de sucumbência de forma autônoma do valor principal, mesmo quando este se sujeitar ao regime do precatório e aquele ao de Requisição de Pequeno Valor.

 

REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Congresso nacional, 1988.

 

______. Lei 8.906, de 1994. Estatuto da Advocacia e da OAB. Brasília: Congresso nacional, 1994.

 

______. RE 141.639/SP. Disponível em: <http://www.stf.jus.br>.  Acesso em 18 de maio. 2011, 21h33min

 

______. REsp. 608.028 – MS Disponível em: <http://www.stj.jus.br>.  Acesso em 19 de maio. 2011, 14h15min

 

______. RE 415.950 – AgR Disponível em: <http://www.stf.jus.br>.  Acesso em 19 de maio. 2011, 15h00min

 

______. RE 564.132/RS. Disponível em: <http://www.stf.jus.br>.  Acesso em 18 de agosto. 2011, 10h21min

 

CAHALI, Yussef Said, Honorários Advocatícios. 3ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997.

 

FEDERIGHI, Wanderley José, A Execução Contra a Fazenda Pública. São Paulo: Saraiva, 1996.

 

FURASTÉ. Normas técnicas para o trabalho científico. 15ª ed. Porto Alegre: s.n., 2009.

 

GIL, Antônio Carlos, Como elaborar projeto de pesquisa 4ª ed. São Paulo: Atlas. 2002.

 

LOBO, Paulo, Comentários ao Estatuto da Advocacia e da OAB. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2007.

 

SANTOS, Ernane Fidélis... [et al]. Execução Civil: Estudos em homenagem ao professor Humberto Theodoro Júnior. São Paulo. Revista dos Tribunais, 2007;

 

 


[1] [1]Acadêmico do 10º período do curso de Direito da Faculdade de Rondônia – FARO – TCC II – 2011.2

 

[2] Professora Especialista em Direito Processo Civil, da Faculdade de Rondônia – FARO e Orientadora de TCC II.