A MISSÃO SACERDOTAL DE JESUS E DOS CONTEMPLATIVOS

"Eu te louvo, Pai, Senhor do céu e da terra, porque ocultaste estas coisas aos doutores e sábios e as revelaste aos pequeninos. Sim, Pai, assim é do teu agrado. Deus escolheu o que é loucura no mundo, para confundir os sábios; o que é fraqueza, para confundir o que é forte; e o que não é, o que é vil e desprezado, para reduzir a nada o que é, pra que nenhuma criatura possa vangloriar-se diante de Deus. Pois, o que é loucura de Deus é mais sábio que os homens, e o que é fraqueza de Deus é mais forte que os homens. Daí, basta-te a minha graça, pois é na fraqueza que a força de Deus manifesta todo o seu poder. Com todo ânimo prefiro gloriar-me das minhas fraquezas, para que pouse sobre mim a força de Cristo. Comprazo-me nas necessidades e perseguições, nos opróbrios e frquezas, nas angústias por causa de Cristo. Pois, quando sou fraco, então é que sou forte" Mt 11,25-26; 1 Cor 2,25.27-31; 2 Cor 12,9-10.

Introdução: O pequeno grande caminho da intercessão silenciosa

 A figura do servo sofredor é central no judeo-cristianismo e se liga à vivência sofrida da fé do povo de Deus, no confronto inevitável dos valores éticos vividos pelo povo-servo  com o cinismo a-ético do mundo. Direito e justiça são valores éticos básicos do Reino. O servo é parceiro da aliança e se põe a serviço de Javé, Parceiro outorgador da aliança.

A parte do servo na aliança efetiva-se pela fé, vivida pela prática dos valores e critérios éticos do Reino de Deus, consubstanciada no respeito ao direito e à justiça, na fidelidade e misericórdia. Na escala de valores éticos não há lugar pra malquerença, discriminação, desvalores geradores de baixa estima e morte. O espírito da aliança é prática do direito e da justiça, no nome de Javé, em particular com as vítimas da opressão institucionalizada, da injustiça, do pecado social: os fracos, pobres, viúvas e órfãos. Por fidelidade ao Deus da vida, o servo sofrel, mas não pratica o mal, dá a vida, mas não a tira. Não se trata de sadomasoquismo, de sofrimento passivo, mas ativo, assumido, consentido, em fidelidade à aliança. Não interessa a Javé a morte de alguém, mas vida abundante, mesmo que ao preço da vida do seu servo. "Se o Servo oferece a vida em sacrifício pelo pecado, verá  numerosa descendência. Por ele, triunfará o desígnio de Javé: Eu vim para que tenham vida e a tenham em abundância. Dou a vida por minhas ovelhas. Por isso o Pai me ama, porque dou minha vida para retomá-la. Ninguém a tira de mim, mas a dou livremente" Jo 10,10.15.17-18. Na nova aliança, o Servo sofredor se personifica no Cordeiro Divino, que assume o pecado do mundo (pecado social), pecados pessoais de cada ser humano e os destrói mediante a entrega livre do seu corpo à morte como vítima expiatória na cruz. O pecado do mundo e os pecados do povo são a dívida insolúvel com Javé. Assumindo-os com o Goel dos pecadores, o Cordeiro de Deus as paga, entregando-se livremente à morte de cruz. Morto o devedor, acaba a dívida. Fazendo-se pecador vicário, assumindo nossos pecados, morrendo na cruz por nós (em nosso lugar e em nosso favor) o Cordeiro de Deus, Servo sofredor por antonomásia, Jesus rasga a sentença que nos condenava à morte e nos livra das mãos do príncipe deste mundo. Como seres livres, assumimos, pela fé, os frutos da oblação do Cordeiro. "Se Cristo morreu por todos, todos morremos com ele. Se Cristo libertou-me, serei verdadeiramente livre". Livremente também assumimos e vivemos, em nome dele, na fé, as conseqüências da morte vicária do Cordeiro de Deus, carregando a cruz da fidelidade aos valores éticos, o direito, a justiça, o perdão e a misericórdia. Mediante a fé, sofremos por causa de Jesus, pra que seja vitorioso por nós o amor que viveu e pregou. Por amor levamos os fardos de nossas limitações e pecados alheios, e Jesus está conosco, assistindo-nos com a misericordia. Assim, "completamos em nossa carne o que falta das tribulações de Cristo por seu Corpo, que é a Igreja" Cl 1, 24. Praticando a fé nas pegadas de Jesus estamos participando da sua missão sacerdotal que, antes de ser celebração litúrgica, é dom generoso da vida. No seguimento de Jesus pela fé, fazemos da vida generosa oferta ao Pai, para os valores éticos vençam e Jesus "cresçam e eu diminua" Jo 3,30. A doação da vida ao Pai é máximo sacrifício de louvor, participação na missão sacerdotal, no sacerdócio existencial, não ritual de Jesus, eterno Sacerdote da nova aliança segundo a ordem de Melquisedec (Hb). O sacerdócio de Jesus consiste em dar a vida pelos pecadores. Esta é a vocação de quem vive pela fé. "Exorto-vos, irmãos, pela misericórdia do Pai, que ofereçais vossos corpos como hóstia santa, viva e agradável ao Pai: este é o vosso culto espiritual" Rm 12,1. Jesus não é sacerdote aarâmico, é leigo. Pela fé, somos sacerdotes existenciais por participação no sacerdócio leigo de Jesus, substancialmente diferente do sacerdócio ministerial das Igrejas. Desde a antiga aliança sacerdotal é o povo de Deus. "Se guardardes a aliança, sereis para mim um reino de sacerdotes e uma nação santa" Ex 19,6. Do povo sacerdotal, Javé separou a tribo de Levi pra exercer o sacerdócio ritual nas celebrações litúrgicas. Na aliança nova, alguns são tirados do povo sacerdotal para exercerem o sacerdócio ministerial em nome do povo. O batismo ratifica o sacerdócio existencial de quem crê, mais importante que o sacerdócio ministerial. "Vós sois o sacerdócio régio: oferecei vossos corpos como culto espiritual agradável ao Pai. Eu sou cristão com vocês, bispo para vocês" (Agostinho).

[1] Desde antes da criação do mundo, o Unigênito tem a tríplice missão: rei para servir (diaconia), sacerdote para oferecer a vida pelos irmãos, profeta para falar o que ouviu e viu junto do Pai e Deus Mãe, Senhora que dá vida ao Pai e ao Filho e a toda a criação. O sacerdócio existencial é a mais importante missão do Primogênito das criaturas. Apesar da aparente inutilidade, o sacerdócio existencial é a missão essencial de Jesus, que inclui as missões de servir e falar: ninguém pode servir ou falar em nome de Deus a menos que seja movido por Ruah, comunicada durante a oração permanente do eterno Sacerdote da nova criação, unido aos contemplativos. A missão sacerdotal de Jesus só se realizou em plenitude ao término de sua vida pública, durante a qual ele exerceu as missões profética e diaconal. A morte de cruz é o ponto alto da missão sacerdotal de Jesus, consumação da sua missão diaconal e profética de Jesus: "Eu vim pra servir, não pra ser servido; vim para dar a vida em resgate da multidão de pecadores, para que tenham vida abundante" Jo 10,10. O ponto alto da missão profética de Jesus foi seu silêncio na paixão, depois de nos falar de tudo que viu e ouviu do Pai; o ponto alto da diaconia foi o dom de seu corpo e sangue em alimento, sob os sinais de pão e vinho, como o selo da sua encarnação, vida pública, paixão e morte de cruz; o ápice da missão sacerdotal de Jesus foi o dom da vida na cruz e a ressurreição, na qual, pela qual, com a qual a vida abundante prometida às ovelhas pelo bom pastor explodiu sem limite sobre a criação inteira. A ascensão de Jesus em poder configura a vida gloriosa do Servo sofredor, seguida da efusão de Deus Mãe "sobre toda a carne" Jl 3,1. A efusão de Deus Mãe em Pentecostes custou o alto preço da traição, desprezo, flagelação, humilhação, crucificação e morte vergonhosa de Jesus. É que a entrega da vida em sacrifício de louvor ao Pai é o foco da sua missão sacerdotal. O sacerdócio de Jesus não é ritual, mas existencial: oferta da vida em louvor ao Pai, para resgatar os filhos mortos pelo pecado. "Não quiseste sacrifício e oferenda, mas formaste-me um corpo. E eu disse: eis-me aqui, eu vim, ó Deus, pra fazer tua vontade. E graças a esta vontade é que somos santificados pela oferenda do corpo de Cristo, realizada uma vez por todas" Hb 10,5.7.10. Aqui está o ponto alto do sacerdócio existencial de Jesus, fecho da sua missão profética e diaconal no mundo. Depois de traído por todos, entregue por Judas Iscariote, preso, espancado, triturado como um grão no moinho, pregado na cruz como bode expiatório de Azazel, feito pecado, maldição, Cordeiro de Deus que tira do pecado do mundo, no limite da consciência e da resistência interior, na solidão mais absoluta, Jesus exclama: "Deus meu, Deus meu, por que me abandonaste". E num gesto sem precedente, clama: "Pai, perdoa-os: não sabem o que fazem. Depois, sabendo que o Pai lhe havia entregue tudo nas mãos e que chegou ao fim a missão diaconal e profética no mundo, Jesus disse: Tenho sede. Deram-lhe vinagre: tomou e disse: Está consumado. Pai, em tuas mãos entrego meu espírito. Dito isto, deu grande grito, inclinou a cabeça e expirou. E, depois de ter realizado a purificação dos pecados, entrou no céu, sentou-se à direita do Pai, para comparecer diante dele em nosso favor, visto que vive para sempre a interceder por nós", no exercício do "sacerdócio imutável" Mc 15,37; Mt 27,50; Lc 23, 34.46; Jo 19,28-30; Hb 1,3; 7,24-25. Depois da ressurreição e entronização à direita do Pai, a missão exclusiva de Jesus é exercer o sacerdócio existencial eterno, sacerdote e vítima. Na condição de Cordeiro imolado e de pé, cristaliza-se a missão intercessora e mediadora de Jesus entre o céu e a terra, cuja tarefa é enviar continuamente o Espírito de santidade sobre os seus enviados na terra, para que tenham força de cumprir fielmente a missão diaconal e profética no mundo, ou interceder pelos irmãos, conforme o carisma recebido de Ruah enviada pelo Pai e pelo Filho. Aos Doze e através deles, a todo o povo da nova aliança, filhos da fé, Jesus a confiou a missão diaconal e profética. Imolado e ressurreto na glória, Jesus continua soprando sobre os Doze e todos que crêem, como fez na tarde do dia da ressurreição, transmitindo-nos a força do Alto pra missão profética de evangelizar toda criatura: "Jesus veio e, pondo-se no meio dos discípulos, lhes disse: A paz esteja convosco. Dito isto, mostrou-lhes as mãos e o lado. Eles ficaram cheios de alegria ao verem Jesus. Ele então repetiu: a paz esteja convosco. Como o Pai enviou-me, eu vos envio também. Dizendo isto, soprou sobre eles e lhes disse: Recebei o Espírito de santidade. Aqueles a quem perdoardes os pecados lhes serão perdoados; aqueles a quem os retiverdes lhes serão retidos". A Pedro Jesus disse: "Apascenta minhas ovelhas, meus cordeiros" Jo 20,21-22; 21,15-17. No Dia da ascensão, Jesus ratifica a transmissão da missão diaconal e profética aos Doze e a todo que crê, para continuarem a missão régia e profética, apoiados pela missão sacerdotal do Cordeiro de Deus. "Disse-lhes: Assim está escrito que o Cristo devia sofrer e ressuscitar dos mortos aos terceiro dia, e que, em seu Nome, fosse anunciado a todas as nações o arrependimento para a remissão dos pecados, a começar por Jerusalém. Vós sois testemunhas disto. Toda autoridade me foi entregue sobre o céu e sobre a terra. Ide pelo mundo, proclamai o evangelho a toda criatura. Fazei que todas as nações se tornem discípulos, batizando-as em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, ensinando-as a observar tudo quanto vos ordenei. Estes são os sinais que acompanharão os que tiverem crido: em meu nome (com meu poder, incorporado pela fé) expulsarão demônios, falarão em novas línguas, pegarão em serpentes, e se beberem algum veneno mortal, nada sofrerão; imporão as mãos sobre enfermos e ficarão curados. Eis que estou convosco todos os dias até a consumação dos séculos. E o Senhor Jesus, depois de ter-lhes falado, foi arrebatado ao céu e se sentou à direita do Pai. Eles saíram a pregar por toda parte, agindo com eles Jesus, confirmando a Palavra através dos sinais que a acompanhavam" Mc 16,15-20; Mt 28,18-20. A missão profética anda pari passo com a missão diaconal: curas, exorcismos, assistência aos pobres, prática da fraternidade são os sinais da eficácia da palavra profética. A missão diaconal foi transmitida por Jesus aos Doze e a nós por ocasião do lava-pés, durante a última ceia da antiga aliança, antes da instituição da ceia da nova aliança no corpo e sangue de Jesus, durante a mesma ceia antiga. O espírito da diaconia é o serviço. O lava-pés é o sinal diaconal da missão sacerdotal de Jesus e discípulos: a eucaristia é o ápice do serviço, em que, ao invés de dar coisas, Jesus dá o seu corpo e sangue, sua vida como alimento. "Antes da Páscoa, sabendo que chegara a hora de passar deste mundo para o Pai, tendo amado os seus que estavam no mundo, até o fim Jesus os amou. Durante a ceia, sabendo que o Pai colocara tudo em suas mãos, que viera de Deus e para ele voltava, Jesus levantou-se da mesa, depôs o manto e, tomando uma toalha, cingiu-se com ela. Depois coloca água na bacia e começa a lavar os pés dos discípulos e enxugá-los com a toalha com que estava cingido. Depois de lhes lavar os pés, retomou o manto, voltou à mesa e disse-lhes: Compreendeis o que vos fiz? Chamais-me de Mestre e Senhor e dizeis bem, pois eu o sou. Se, pois, eu, o Mestre e Senhor, vos lavei os pés, também deveis vos lavar os pés uns aos outros. Dei-vos o exemplo para que, como vos fiz, também o façais vós" Jo 13,1-5.12-15. Dois dias antes da Páscoa, no discurso escatológico sobre o Juízo Final (Mt 24-25), Jesus revela como será a prática do lava-pés: socorrendo os mais pobres em suas necessidades. Com o detalhe: na última ceia, Jesus lavou os pés dos discípulos; mas seus seguidores lavarão os pés de Jesus nas pessoas dos seus irmãos menores: sedentos, famintos, prisioneiros e doentes, com os quais se identifica. Os irmãos de Jesus são membros do seu Corpo. São  Jesus também, assim como os membros de alguém identificam-se com ele. Por isso, toda ação de Jesus é paradigmática. Quando diz: "Eu sou o caminho", exemplo a seguir, diz a mesma coisa que quando instituiu a eucaristia: Fazei isto em memória de mim: praticai em vossas vidas aquilo que eu fiz por vós, uma vez por todas, de maneira paradigmática; sede eucaristia. Como Jesus lavou os pés dos Doze e deu a vida por todos, ele convida-nos a fazer o mesmo na vivência da fé, na prática do amor fraterno, no seguimento dele: "Dei-vos o exemplo para que, como eu vos fiz, também o façais vós" a mim na pessoa de cada irmão meu menor. Eis o espírito da nova diaconia: servir com desprendimento. No discurso escatológico, Jesus aparece como objeto da misericórdia de seus seguidores, nas pessoas dos irmãos menores. Sintomaticamente, ele disse isto pouco antes do lava-pés e instituição da eucaristia. Por isto, o discurso escatológico perfeitamente encaixa-se na seqüência do lava-pés (Mt 25,31-46; Jo 13,15): "Dei-vos o exemplo para que, como eu vos fiz, vós o façais também", socorrendo-me em cada irmão menor que cruzar vosso caminho: "Eu tive fome e destes-me de comer. Tive sede e me destes de beber. Eu era forasteiro e me acolhestes. Estive nu e me vestistes; doente e prisioneiro e me visitastes. Cada vez que fizestes isto a um dos meus irmãos menores, a mim o fizestes". Aos que não praticaram a diaconia do amor generoso, direi: "tive fome e não me destes de comer. Tive sede e não me destes de beber. Fui forasteiro e não me acolhestes. Estive nu e não me vestistes; doente, preso e não me visitastes. Cada vez que o deixastes de fazer a esses pequeninos, a mim o deixastes de fazer". A memória da eucaristia começa com a prática do amor fraterno. Celebrar a eucaristia é celebrar as dores do mundo (o pão) e a alegria da festa da vida abundante que está em Jesus (vinho). Só faz sentido fazer a memória da eucaristia, se na vida real se fizer memória do amor de Jesus pelos pobres, praticando o humilde serviço do lava-pés, configurado em gestos de solidariedade e de amor fraterno. Não é fácil para os Doze nem para nós entender a diaconia da nova aliança. O exemplo de Jesus não bastou para convencer-los sobre o espírito da nova diaconia. Pois, assim que terminou a instituição da eucaristia, em Jesus deu aos Doze seu corpo e seu sangue, "entre eles houve uma discussão: qual seria o maior? Jesus lhes disse: Os reis das nações as dominam, tiranizam e são chamados benfeitores. Quando a vós, não deverá ser assim; mas, o maior dentre vós torne-se como o mais jovem e o que governa, como quem serve. Pois, qual é o maior: quem está à mesa ou quem serve? Não é aquele que está à mesa? Eu, porém, estou no meio de vós como aquele que serve" Lc 22,27. Do final de Jo 13 até Jo 17, Jesus continua explicando aos Doze o verdadeiro sentido da eucaristia: dar a vida pelos irmãos. São chamados a ser eucaristia no exercício da missão profética e diaconal: "Não há maior prova de amor que dar a vida pelos irmãos. No mundo tereis tribulações. Se o mundo vos odeia, odiou-me primeiro. Se receberam minha palavra, receberão a vossa também. Mas farão tudo isto por causa de mim. Mas, coragem, eu venci o mundo. Vossa vitória sobre o mundo é a vossa fé. Crede em Deus Pai, crede em mim também". Jesus também diz aos Doze que não se perturbem e entristeçam com sua partida, pois lhes enviará da parte do Pai Deus Mãe, que ficará com eles para sempre, revelando-lhes o sentido das suas palavras, inspirando-os e dando força pra missão diaconal e profética.

[2] Jesus terminou os últimos dias conosco com a mais bela oração depois do Pai-Nosso: a oração sacerdotal (Jo 17), iniciada em clima grave, mas sereno, perto do Monte das Oliveiras e continuada no Jardim de Getsémani em clima de angústia, que prenunciava o drama e a agonia de um homem corajoso diante da dor, mas também com ternura filial e confiança no querido Aba, Paizinho. Jesus sabe que está marcado para morrer, sua hora chegou e dela não escapará. Poderia fugir, mas fica. Será covardemente desmoralizado, humilhado, maltratado antes de ser crucificado, mas está pronto a dar a vida livremente para salvar os irmãos da morte, restando-lhe tão só seguir seu caminho de dor até o fim e consumar na cruz a entrega incondicional de si, em obediência ao Pai, que ama o Filho e a ele entregou o destino da criação, mesmo ao custo da vida do Filho amado, no qual o Pai deposita toda sua afeição. O amor do Pai por Jesus e deste pelo Pai e os irmãos são a força que mantém sua bravura diante da morte iminente. "O Pai me ama porque dou minha vida para retomá-la. Ninguém a tira de mim, mas dou-a livremente. Tenho poder de entregá-la e de retomá-la; eis o mandamento que recebi do meu Pai" Jo 10,17-18. A instituição da eucaristia sela a missão sacerdotal de Jesus e o estabelece como mediador único da nova criação, a interceder dia e noite por nós. Ao alimentar os Doze com seu corpo e sangue, Jesus já não pertence mais ao mundo, pois está no exercício pleno de sua missão sacerdotal eterna de dar a vida para gerar vida. Também não são do mundo, embora vivam no mundo, aqueles que aderem pela fé ao sacrifício de Jesus. "Pai, Santo, rogo pelos que me deste; eles não são do mundo, como eu também não sou do mundo. Já não estou no mundo, meu Reino não é do mundo. Desde que realizou a purificação dos pecados pela morte de cruz, o Cordeiro de Deus sentou-se para sempre nos céus à direta da Majestade, do Pai." Lc 22,69; Jo 17,9.11. 6; Hb 1,3. Jesus entra no mundo pela encarnação e sai dele pela instituição da eucaristia, que estabelece a nova, eterna aliança no sangue do Cordeiro de Deus e abole a antiga aliança em sangue de animais. Desde a primeira e única ceia da nova aliança, o Cordeiro está de pé, imolado, entronizado como nosso sumo Sacerdote e Intercessor à direta do Pai, na unidade de Ruah. Antes da oração agoniada do Getsémani, momento forte da oração sacerdotal, cujo ápice se dará na cruz com as sete palavras e a morte, diante dos discípulos amedrontados e na expectativa do pior acontecer, "Jesus falou assim: erguendo os olhos ao céu, disse: 'Pai, chegou a hora: glorifica teu Filho, para que teu Filho te glorifique, e que, pelo poder que lhe deste sobre toda a carne, ele dê a vida a todos os que lhe deste. A vida eterna é esta: que conheçam-te, o único Deus verdadeiro, e aquele que enviaste, Jesus Cristo. Glorifiquei-te na terra, concluí a obra que me encarregaste de realizar. E agora, glorifica-me, Pai, junto a ti, com a glória que eu tinha junto de ti antes do mundo existir. Manifestei teu nome aos homens que do mundo me deste. Eram teus e os deste a mim e guardaram a tua palavra. Agora, reconheceram que tudo quanto me deste vem de ti, porque as palavras que me deste, dei-as a eles, que as acolheram e reconheceram de verdade que saí de junto de ti e creram que me enviaste. Não rogo pelo mundo, mas pelos que me deste, porque são teus, e tudo que é meu é teu, tudo que é teu é meu, e neles sou glorificado. Já não estou no mundo (desde a instituição da eucaristia); mas eles permanecem no mundo e eu volto a ti. Pai santo, guarda no teu amor os que me deste, para que sejam um como nós. Quando estava com os que me deste, eu os guardava em teu nome; guardei-os e nenhum deles perdeu-se, exceto o filho da perdição, Judas Iscariote, para a Escritura se cumprir. Porém, agora vou para junto de ti e digo isso no mundo, para que tenham em si a minha plena alegria. Dei-lhes a tua palavra, mas o mundo os odiou, porque não são do mundo, como eu não sou do mundo. Não peço que os tires do mundo, mas os preserves do mal. Eles não são do mundo, como eu também não sou. Santifica-os na verdade; a tua palavra é a verdade. Como tu me enviaste ao mundo, eu também os enviei ao mundo. E por eles, santifico-me, pra que sejam santificados na verdade. Não rogo somente por eles, mas pelos que, por meio de sua palavra, crerão em mim: a fim de que todos sejam um. Como tu estás em mim e eu em ti, Pai, que eles estejam em nós, para que o mundo creia que enviaste-me. Eu lhes dei a glória que me deste, pra que sejam um como nós somos um: eu neles e tu em mim, para que sejam perfeitos na unidade e para que o mundo reconheça que me enviaste e os amaste como me amaste. Em Cristo, o Pai nos escolheu antes da criação do mundo para sermos santos e irrepreensíveis diante dele no amor. Ele nos predestinou pra sermos seus filhos adotivos por Jesus Cristo, segundo o beneplácito da sua vontade, para o louvor e glória da sua graça, com a qual nos agraciou no Amado. Pai, quero que, onde estou, também estejam comigo aqueles que me deste, para que contemplem a glória que me deste, porque me amaste antes da fundação do mundo. Pai justo, o mundo não te conheceu, mas eu te conheci e estes reconheceram que me enviaste. Dei-lhes a conhecer teu nome e lhes darei a conhecê-lo, a fim de que o amor com que me amaste esteja neles e eu neles. Dito isto, Jesus seguiu com os Doze o Monte das Oliveiras", onde continuará a oração sacerdotal Jo 17-18,1; Ef 1,4-6. Aí ele viverá dos piores momentos na terra.

    Jesus terminou sua missão profética e diaconal no mundo com o discurso escatológico e o lava-pés. A instituição da eucaristia é o sinal da missão sacerdotal de Jesus. Ele sabe que está condenado à morte e pode fugir, mas por livre decisão se entrega nas mãos dos algozes e dá a vida para livrar seus irmãos morte: "Eis que subimos a Jerusalém, o Filho do homem será entregue aos chefes dos sacerdotes e escribas, condenado e entregue aos gentios pra ser escarnecido, açoitado, crucificado, mas ressuscitará ao terceiro dia. O Pai me ama, porque dou minha vida para retomá-la. Ninguém a tira de mim, mas livremente a dou" Mt 20,18-19; Jo 10,17-18. Mas, embora livre, a decisão de Jesus é traumática. Ao entrar no Jardim do Getsémani, ao pé do Monte das Oliveiras, a tristeza e a angustia já haviam invadido sua alma: "Minha alma está conturbada, triste até a morte. Que direi? Pai, salva-me desta hora? Mas foi precisamente para esta hora que vim. Pai, glorifica teu nome. Então, veio uma voz do céu: Glorifiquei-o e o glorificarei de novo" Mt 26,38; Jo 12,27-29; Lc 22,40. Durante as horas que precederam sua prisão, a oração sacerdotal se tornou mais angustiada, em face da violência que Jesus sofrerá, pela ingratidão de tantos que socorreu, pela falta de solidariedade dos Doze na hora da mais intensa angústia. Sem suportar a pressão, "abandonam Jesus e fogem". Sobretudo, o silêncio do Pai, cujo ápice é o "Elohim, Elohim, lama sabaktani", angustia Jesus. Ele sabe que os Doze são fracos na fé e não suportam a pressão de Jerusalém e Roma sobre ele. Diz-lhes decididamente: "Eis que chega a hora - e ela já chegou - em que vos dispersareis, cada um para seu lado, e me deixareis sozinho. Mas eu não estou só, porque o Pai está comigo" Jo 16,32. Jesus sabe que concluiu a missão profética e diaconal para a qual o Pai o enviou ao mundo e é vontade do Pai que ele beba até a última gota desse amargo cálice de dor, que representa todas as desgraças da humanidade (falta de liberdade, baixa auto-estima), configuradas no pecado do mundo que levava sobre si e extirpará uma vez por todas, que o perdão dos pecadores representa o mais elevado louvor ao Pai. Só o Goel divino poderia assumir tão elevado papel. Jesus está interiormente estraçalhado. Sua desgraça se completará quando ele verter a última gota de sangue para lavar todas as iniqüidades dos seus irmãos maus e ingratos. A morte de cruz, seguida da ressurreição, é o ápice da missão sacerdotal de Jesus. "Javé fez cair sobre ele a iniqüidade de todos nós. Nós o tínhamos como vítima do castigo, mas eram nossas enfermidades que tomava sobre si, nossas dores que carregava. Foi traspassado por nossas transgressões, esmagado por causa das nossas iniqüidades, pelos transgressores fez intercessão. O castigo que havia de nos trazer a paz caiu sobre ele: sim, por causa de suas feridas fomos curados. Mas, se oferece a vida como sacrifício pelo pecado, por ele o desígnio do Pai triunfará" Is 53,5.10.12. Todos os acontecimentos infaustos das últimas horas de Jesus no mundo não o pegaram de surpresa, pois ele tinha consciência de sua missão dolorosa: "Saí do Pai e vim ao mundo, agora deixo o mundo e vou para o Pai. Eu vim para dar a vida em resgate de uma multidão" Jo 16,28. Apesar da dor, Jesus confia no Pai, que sempre o ouve e salvará da morte, porque cumpre fielmente sua vontade, especialmente na sua hora (kairós), quando, lutando contra a angústia e o medo, com o coração partido, alma empapada na dor, está decidido a dar a vida pra tirar o pecado do mundo, tirar de Satanás o poderio sobre os pecadores. Está selado o fim do senhor do mal. Jesus sabe que sua decisão agrada o Pai, "que quer que todos os homens se salvem e cheguem ao conhecimento da verdade. Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará. Eu sou a verdade" 1Tm 2,4; Jo 8,32. Na solidão da sua hora, ele intensifica a oração sacerdotal, "apresentando com lágrimas e veemente clamor, pedidos e súplica àquele que o podia salvar da morte: Abba! Ó Pai! Para ti tudo é possível: afasta de mim este cálice; mas, não o que eu quero, mas o que tu queres. E foi ouvido por causa de sua piedade. Embora seja Filho, aprendeu a obedecer pelo sofrimento; e, levado à perfeição, tornou-se para todos que lhe obedecem princípio de salvação eterna, tendo recebido do Pai o título de sumo sacerdote segundo a ordem de Melquisedec" Hb 5,7-10; Mc 14,36. Na instituição da eucaristia, o sacerdócio ritual é substituído pelo sacerdócio existencial de Jesus, prefigurado no sacerdócio de Melquisedec, o primeiro a oferecer, pão e vinho, prefiguração do corpo e o sangue de Jesus na nova aliança. A instituição da nova ceia, memorial do sacrifício de Jesus, anula os sacrifícios no sangue de animais e inaugura a nova e definitiva aliança no sangue do Cordeiro Divino. Por ser memorial da entrega da vida de Jesus por nós, a eucaristia foi instituída no mesmo dia da sua crucificação. Pois a última ceia da antiga e a primeira, única ceia da nova aliança que anulou a antiga, ocorreu depois das 18 horas da Quinta-Feira, que já é Sexta-Feira no calendário judaico. Daí, tudo que se passa da instituição da eucaristia à morte de cruz constitui a essência da missão sacerdotal de Jesus, cujo ápice é o último suspiro. Apesar destes fatos ocorrerem na terra, a missão sacerdotal de Jesus desenrola-se por completo na eternidade. "Ainda estou no mundo, mas não sou mais do mundo". Os contemplativos de todos os credos estão no mundo, mas não são mais do mundo. O Cordeiro de Deus, unido a eles à direita do Pai e à esquerda de Deus Mãe, "imolado (crucificado) e de pé (ressurreto)", intercede dia e noite por nós Ap 5,6. Eis a grandeza da missão sacerdotal dos contemplativos.

   A primeira etapa da oração sacerdotal vai da última ceia à agonia Monte das Oliveiras (Jo 17). Jesus se recolhe com os Doze no Jardim do Getsémani, será traído por Judas, preso, abandonado por todos. Antes de retomar a oração sacerdotal, recomenda-lhes a vigilância e oração para não serem traídos pela fragilidade humana na hora da tentação, como lhes ensinou no Pai-Nosso: "Não nos deixes cair em tentação, mas livra-nos do mal. Chegando ao lugar, disse-lhes: Orai para não entrardes em tentação. Sentai-vos aí enquanto vou ali para orar. Levando consigo Pedro, Tiago e João, afastou-se dos outros, e começou a se entristecer e a angustiar-se. Disse-lhes: Minha alma está triste até a morte. Permanecei aqui, vigiai comigo. Indo um pouco adiante, prostrou-se com o rosto na terra e orou: meu Pai, se possível, afasta de mim este cálice; mas, não seja o que eu quero, mas o que queres. Ao voltar, encontra os discípulos dormindo. Disse a Pedro: Como assim? Não fostes capazes de vigiar comigo por uma hora? Vigiai, orai, para que não entreis em tentação, pois o espírito está pronto, mas a carne é fraca. Afastando-se pela segunda vez, orou: Meu Pai, se não é possível que isto passe sem que eu o beba, seja feita a tua vontade! Ao voltar de novo, encontrou-os dormindo: seus olhos estavam pesados de sono. Não sabiam o que dizer. Deixando-os, afastou-se, orou pela terceira vez e disse as mesmas palavras. E, cheio de angustia, orava com mais insistência ainda, e o suor se lhe tornou semelhante a espessas gotas de sangue que caiam na terra. Ergueu-se após a oração, veio pra junto dos discípulos e encontrou-os adormecidos de tristeza e lhes diz: Dormi agora, repousai: está chegando a hora e o Filho do homem está sendo entregue às mãos dos pecadores. Por que estais dormindo? Levantai-vos, orai, para não entrardes na tentação! Vamos! Meu traidor está chegando: é a hora do poder das trevas" Mt 6,13.Lc 22,39.44.53; Mt 26,56.36-42. Judas Jesus beijou e os guardas do Templo lhe deram ordem de prisão. Num gesto de defesa do amigo, sem pensar Pedro tirou a espada que trazia e decepou a orelha direita de Malco, servo do sumo sacerdote. "Jesus disse a Pedro: embainha tua espada. Deixarei eu de beber o cálice que o Pai me deu? Deixai! Basta! E tocando a orelha do servo, curou-o" Jo 19,10-11. Depois, ataram e levaram Jesus à casa do sumo sacerdote Caifás, onde foi humilhado pelo público e guardas até o amanhecer. De manhã, o Sinédrio se reúne, interroga Jesus, instiga a multidão a apupá-lo e pedir sua morte. Como só ao Imperador Romano cabia condenar alguém à morte, o Sinédrio o enviou a Pôncio Pilatos, decidido a conseguir a condenação formal de Jesus. Os guardas e a multidão enfurecida levaram Jesus à presença do Governador Romano e o acusaram de impedir a cobrança dos impostos e pretender ser rei. Jesus afirma que é rei, mas seu reino não é deste mundo. Não encontrando motivo de condenação contra ele e sabendo que era Galileu, querendo livrar-se dele, Pilatos envia Jesus ao Governador da Galiléia, Herodes. Jesus nada fala diante de Herodes, que o trata com desprezo, zomba dele, veste-o com roupa de rei e o remete a Pilatos. Tentando resolver pacificamente a questão diante da multidão enfurecida que pedia a morte de Jesus, sabendo que ele era inocente e, talvez, querendo, libertá-lo, Pilatos propõe à turba escolher entre o assassino Barrabás e Jesus. Escolhem Barrabás e pedem a morte de Jesus. Pilatos manda flagelá-lo, esperando que a multidão se acalmasse. Mas, instigada pelos sacerdotes, não parava de gritar: crucifica-a! crucifica-o! Puseram uma cruz nos ombros de Jesus, que a carrega sob tortura e zombaria até o Monte Calvário, onde é crucificado. Pregado na cruz, Jesus intensifica a oração sacerdotal, que se cristaliza no pedido de perdão por seus algozes. No início da oração sacerdotal Jesus orou pelos discípulos e pelos que crerão nele pela pregação deles, para que todos sejam um, mas não orou pelos inimigos nem pelo mundo. Agora, suspenso na cruz, exangue, Jesus, o perdão em pessoa, hóstia viva, ora até pelos inimigos: "Pai, perdoa-os, não sabem o que fazem". Tocado pela atitude de perdoar os inimigos, um dos dois ladrões que estavam crucificados com Jesus suplica-lhe: "Jesus, lembra-te de mim quando vieres no teu reino. Respondeu-lhe: Hoje mesmo estarás comigo no Paraíso". Aproximava-se a hora sexta (15 h), Jesus estava nos estertores da morte. Abandonado de todos, entregue pelo Pai, consumido pela dor, dá lancinante grito de desamparo: "Deus meu, Deus meu, por que me abandonaste". Mas continua lúcido: até o fim, é autor e realizador do comovente drama humano, o auto de Deus sem par na história: Deus se faz homem para viver o drama humano até as últimas conseqüências, destruindo no seu corpo toda iniqüidade, restituindo-nos a dignidade. Incorporamos pela fé os efeitos do perdão dado por Jesus, vivendo como nova criatura. Porque, o que era velho passou, agora todas as coisas são novas, em virtude do dom da vida, selado pela ressurreição de Jesus. Ciente disto, ao ver sua Mãe ao pé da cruz com outras mulheres e o discípulo amado, Jesus diz a ela: "Mulher, eis aí teu filho. E a ele: eis tua mãe. Depois, ciente que havia acabado sua obra, obediente à Escritura, Jesus diz: tenho sede". Deram-lhe vinagre, "ele o tomou e disse: Está consumado. O véu do Santuário rasgou-se ao meio e Jesus deu grande grito: Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito. E, inclinando a cabeça, entregou o espírito". O véu do Santuário (Santo dos Santos, onde é guardada a arca da aliança) rasgando-se no exato momento em que Jesus expirava na cruz, emitindo sobre toda a criação o Espírito que pousava sobre ele, era dado o sinal do fim do templo antigo e entrava em vigor a nova shekiná de Deus: o corpo do Cordeiro imolado e de pé, morto e redivivo para sempre. "Destruí este templo e eu o reconstruirei em três dias. Ele falava do templo do seu corpo. Quando ressuscitou dos mortos, seus discípulos creram nele" Jo 2,18-21. Doravante, não será mais em Jerusalém que Deus será adorado, porque "os adoradores do agrado do Pai, adoram-no em espírito e verdade em qualquer lugar". O Cordeiro imolado e de pé comunica Deus Mãe a todos os povos e raças. Doravante, o Corpo do Cordeiro imolado e de pé é o novo Templo de portas abertas dia e noite, para acolher a multidão de adoradores "de todos os povos, línguas e raças" Ap 7,1-10; Ap 22, que nele, com ele e por ele, adorarão o Deus verdadeiro em espírito e verdade.

[3] Entre seus seguidores, Jesus Cristo "concedeu a uns ser apóstolos, a outros, profetas,

a outros, evangelistas, a outros, pastores e mestres, para edificarem o Corpo de Cristo,

no qual sois co-edificados para serdes a habitação de Deus, no Espírito" Ef 4,11-12;2,22.

Concedeu ainda a outros a missão de ser adoradores em espírito e verdade, cujo carisma é participar exclusivamente da missão sacerdotal de Jesus e, junto com ele, interceder dia e noite pelos irmãos e irmãs. Orar não é perda de tempo, não faz do orante espécie de cristão de segunda categoria, alguém ocioso. Ao contrário, orar é a vocação primeira de quem vive pela fé. Ela nos faz participar do sacerdócio existencial de Jesus, sua missão essencial, que consiste em dar a vida pra salvar os irmãos e irmãs pecadores. Portanto, orar é missão genuína, simbioticamente ligada à missão diaconal e profética. Apesar da aparente inutilidade e improdutividade, orar é a mais importante missão do cristão, que dá apoio às outras. A energia da tríplice missão de Jesus e de seus enviados vem de Deus Mãe, que pousa neles. A oração intercessora, a missão sacerdotal é o lugar pneumático privilegiado, pois nela e por ela Ruah é comunicada àqueles e àquelas por quem o orante intercede. Interceder é o sacrifício de louvor perfeito, pois é esquecer de si e interceder pelos irmãos, especialmente pelos que trabalham ostensivamente na missão profética e diaconal de anunciar o Reino de Deus em palavras e atos em Nome de Jesus. Por isto, "os adoradores do Pai em espírito e verdade, os contemplativos escolheram a melhor parte", que os faz partícipes da missão sacerdotal de Jesus. Portanto, os contemplativos são missionários da primeira linha. Santa Terezinha, monja reclusa carmelita, que nunca participou da missão profética e diaconal de anunciar a boa nova aos povos, mas ofertou a vida em oração pelos missionários ostensivos, é padroeira das missões e doutora da Igreja. Porque fez da oração sua missão, Santa Terezinha foi é missionária de peso, que exerceu e exerce a missão sacerdotal, intercessora com Jesus. Portanto, não é por acaso que a Igreja a escolheu por padroeira das missões. Entregando-se por amor à oração, ao sacrifício de louvor, integrou-se à missão sacerdotal de Jesus, e prestou apoio decisivo aos missionários jesuítas da Índia e do Japão. Missão oculta, porém mais eficaz que a missão diaconal e profética. Por isso, quem menospreza o papel dos contemplativos na comunidade de fé ignora a dimensão missionária da oração. A exemplo de Jesus, orante paradigmático, todo missionário é impulsionado por Deus Mãe, que abundantemente lhe comunica a força do Alto na oração. A missão de Ruah no povo de Deus é invisível, no segredo dos corações, nos escaninhos da alma que se entrega generosamente à ação do Senhor. O exemplo vem de Jesus, que passava noites inteiras em oração a sós com o Pai. Também o encontramos em oração nos momentos decisivos de sua missão visível. Foi assim quando da escolha dos Doze, quando estes lhe pediram para ensiná-los a orar, na convivência com os pobres: "Eu te louvo, Pai, Senhor do céu e da terra, que escondeste estas coisas aos sábios e entendidos, mas e as revelaste aos pequeninos". No Getsémani, Jesus orou intensamente: "Pai, se queres, afasta de mim este cálice! Porém, não a minha, mas a tua vontade se faça. Apareceu um anjo do céu que o confortou. Cheio de angústia, Jesus orava com mais insistência ainda, o suor se tornou semelhante a espessas gotas de sangue que caiam na terra". Nos estertores da morte na cruz, ele orou desesperadamente o Salmo 22 (21): "Meu Deus, meu Deus, porque me abandonaste". No dia da ascensão, ante os discípulos atordoados com sua partida, Jesus os recomenda que permaneçam em oração para receberem a força do alto, serem fortalecidos e iluminados, e continuarem no mundo em seu nome a missão diaconal e profética. "Eis que vos enviarei o que meu Pai prometeu. Por isso, permanecei na cidade até serdes revestidos da Força de Ruah, e sereis minhas testemunhas até os confins da terra. Unânimes, perseveravam na oração com algumas mulheres, entre as quais Maria, a mãe de Jesus, e os irmãos dele. Tendo o dia de Pentecostes chegado, estavam todos reunidos no mesmo lugar. De repente veio do céu um ruído como o agitar-se de um vendaval impetuoso, que encheu toda a casa onde se achavam. Então, apareceram-lhes línguas como de fogo que se repartiam e pousavam sobre cada um deles. Então ficaram repletos do Espírito Santo e começaram a falar em línguas, conforme Ruah lhes concedia exprimirem-se. Pedro de pé, junto com os Onze, falou..." Lc 24,49; At 1,8.14;2,1-4;14. Inicia-se o tempo da Igreja, a caminhada de fé do novo povo de Deus, que, iluminado e impulsionado por Deus Mãe, continuará a missão diaconal e profética de Jesus. À direita do Pai, à esquerda de Deus Mãe, definitivamente imolado e de pé, Jesus estará eternamente exercendo a missão intercessora, sacerdotal, mediadora do perdão para a criação pecadora, particularmente os irmãos. Desde a morte de cruz e ressurreição, configurada na instituição da eucaristia, interceder é a missão exclusiva de Jesus, que ele partilha com milhões de anônimos e silenciosos adoradores em espírito e verdade, do agrado do Pai como Jesus disse à Samaritana no poço de Jacó. Jesus é o mesmo ontem, hoje, sempre e sua missão continua através de seus enviados, mediante a fé. Ele continua convocando reis para servir, profetas para anunciar a boa nova, sacerdotes e sacerdotisas existenciais para ofertarem as vidas como hóstia viva, na oração juntamente com, pelo crescimento do Reino. Jesus continua chamando Paulos, Martas e Marias para continuarem sua missão profética, diaconal e intercessora. Embora oculta, a missão sacerdotal é a mais importante missão do Redentor e seus seguidores. Na oração, a energia de Deus Mãe inunda o orante, cuja intercessão potencializa os dons dos membros do Corpo de Cristo, impelindo-os à missão a que foi chamado e enviado: "Tendo dons diferentes, segundo a graça que nos foi dada, quem tem o dom da profecia, exerça-o segundo a proporção da sua fé; quem tem o dom do serviço, exerça-o servindo; quem o de ensinar, ensinando; quem o de exortar, exortando; quem distribui os bens, o faça com simplicidade; quem preside, com diligência quem a misericórdia, com alegria. Há diversidade de dons, mas o Espírito é o mesmo; diversidade de ministérios, mas é o mesmo o Senhor; diversos modos de ação, mas o mesmo Deus realiza tudo em todos. Cada um recebe o dom de manifestar o Espírito para a utilidade de todos. Falando em línguas, falai para edificar a Igreja de Deus. Se vossa linguagem não se exprime em palavras inteligíveis, como se há de entender o que dizeis? Estareis falando ao vento. É por isso que aquele que fala em línguas deve orar para poder interpretá-las. Se há quem fale em línguas, falem dois ou, no máximo, três, um após o outro. E que alguém as interprete. Se não há intérprete, cale-se o irmão na assembléia: fale a si mesmo e a Deus. Se a Igreja se reúne e todos falarem em línguas, os ouvintes e incrédulos não dirão que estais loucos? Que tudo se faça para a edificação (sem exibição), para que Jesus Cristo seja louvado e glorificado em tudo" Rm 12,6-8; 1 Cor 12,4-7; 14,6.12-13.23.27-28. A oração intercessora precisa, portanto, ser realizada como oferta da vida a Deus, renúncia aos interesses pessoais, para que sobressaia a Pessoa de Jesus. "É preciso que ele cresça e eu diminua" Jo 3,30. O sacrifício da vida em louvor é a essência da missão sacerdotal de Jesus e dos contemplativos. Nosso sumo Sacerdote Jesus oferece para sempre a vida ao Pai por nós e continua a enviar Ruah sobre o seu povo e toda a criação, comunicando-nos a vida em plenitude: dele "todos nós recebemos graça sobre graça" Jo 1,16. Dom da vida gratuito e generoso, desdobrado no louvor celebrativo e profético. Jesus é dez!!! 

[4] Jesus Cristo é o único Mediador entre o céu e a terra, mas comunica sua mediação a todos que aderem a ele pela fé, para que partilhem com ele o múnus sacerdotal único. O sacerdócio existencial de Jesus e seus discípulos vai de encontro ao sacerdócio ritual em vigor desde Moisés, e se tornou um fóssil religioso em Israel. A diferença entre os dois sacerdócios não é de forma, mas de conteúdo e essência. A inovação do sacerdócio existencial é tão profunda que destruirá o sacerdócio ritual aarâmico uma vez por todas. Pra começar, Jesus não é sacerdote levítico, sediado em Jerusalém, mas um judeu leigo, homem do povo, originário da Galiléia das nações, bem na periferia de Jerusalém. Jesus não é da tribo sacerdotal de Levi, mas da tribo de Judá, da realeza davídica de Belém. Explica-se porque vivia em conflito aberto com a burguesia sacerdotal de Jerusalém, que transformou a "Casa de oração para todos os povos" em casa de comércio religioso, cuja renda só beneficiava a casta sacerdotal, que oferecia sacrifícios rituais inaptos a perdoar pecados, por matarem o espírito da Lei, que é a misericórdia de Javé com seu povo. Nos sacrifícios rituais do Templo, as vítimas eram animais, oferecidos anualmente, visando finalidade de perdoar os pecados dos sacerdotes, os de sua família e os pecados do povo. Para perdoar os pecados do sacerdote e sua casa (tribo de Levi), matava-se um novilho e queimava-se a gordura de um carneiro como holocausto. Para perdoar os pecados do povo, o sacerdote "receberá da comunidade dos filhos de Israel dois bodes destinados ao sacrifício e um carneiro para o holocausto. Depois de oferecer o novilho pelo próprio pecado e fazer o rito de expiação por si e sua casa (impõe as mãos na cabeça do novilho) e incensar, por detrás do véu (que separa o Santo do Santíssimo) o propiciatório com incenso aromático e brasas tiradas do altar, aspergir o lado oriental do propiciatório uma vez com o dedo e sete diante do mesmo, Aarão tomará os dois bodes, os colocará diante de Javé na entrada da Tenda da Reunião. Lançará sorte sobre eles, atribuindo uma sorte a Javé e a outra a Azazel (demônio do deserto). Oferecerá o bode sobre o qual caiu a sorte "para Javé" e fará com ele um sacrifício pelo pecado do povo. Levará o sangue do bode para detrás do véu e asperge sobre o propiciatório e diante deste com o sangue do novilho. Fará assim o rito de expiação pelo santuário, impurezas dos filhos de Israel, suas transgressões e por todos os seus pecados. Depois que tiver feito a expiação por si mesmo, por sua casa e toda a comunidade de Israel, o sacerdote sairá e irá até o altar que está diante de Javé e fará no altar o rito da expiação. Tomará o sangue do bode e do novilho e porá nos chifres do altar, ao redor. Com o sangue fará sete aspersões sobre o altar, com o dedo. Assim o purificará e o separará das impurezas dos filhos de Israel. Quanto ao bode sobre o qual caiu a sorte "para Azazel", será posto vivo diante de Javé, para se fazer com ele o rito da expiação (bode expiatório), a fim de ser enviado a Azazel, no deserto. Aarão imporá as mãos sobre a cabeça do bode e confessará sobre ele todas as faltas, transgressões e pecados dos filhos de Israel. Depois de ter posto os pecados sobre a cabeça do bode, enviá-lo-á ao deserto, conduzido por um homem, e o bode levará sobre si todas as faltas do povo para uma região isolada. Em seguida, oferecerá seu holocausto e do povo, queimando sobre o altar a gordura do sacrifício (do novilho e do bode) pelo pecado. Tudo que sobrar do novilho e do bode do sacrifício, cujo sangue é usado no rito de expiação, será queimado fora do acampamento" Lv 16,3. 5-10-25. O ritual do Yomkipur (dia do perdão) era um banquete sagrado, um 'sacrifício de comunhão, no qual a vítima era repartida entre Deus e o ofertante: sacerdote e o povo por ele representado. As partes mais vitais da vítima são ofertadas a Javé; a melhor parte é atribuída aos sacerdotes e a restante é consumida pelos fiéis'. O Yomkipur acontecia uma vez por ano, repetidamente. Portanto, não havia perdão completo, expiação perfeita dos pecados. Por isso, o povo continuava no pecado, necessitando de repetidos rituais de perdão, para voltar a ser santo diante de Javé. Com o tempo o ritual de expiação virou rotina vazia e o pecado só se multiplicava na comunidade dos filhos de Israel. A roda morta do pecado era a maldição que pesava sobre o povo: a "maldição da Lei". Mas "quando chegou a plenitude do tempo, enviou Deus seu Filho, nascido de mulher, sob a lei, em carne semelhante à do pecado e em vista do pecado, condenou o pecado na carne e nos remiu da maldição da lei" Gl 4,4; 3,13; Rm 8,3. Jesus encerrou a interminável cadeia de maldição e de perdão ineficaz, ao realizar, uma vez por todas, a expiação dos pecados no seu corpo santo feito pecado por nós. Por força disto, não será mais preciso oferecer sacrifícios rituais pelos pecados: o perdão agora se obtém por graça, mediante a fé no sacrifício definitivo de Jesus, que é ao mesmo tempo o sacerdote e a vítima do sacrifício. O Cordeiro Divino doa a vida livremente (sacerdote), carrega vicariamente no seu corpo os pecados de toda a criação (vítima), não só do povo judeu, como faziam touros e bodes, e morre na cruz no nosso lugar (sacrifício), fora de Jerusalém, sedento e faminto como morria o bode expiatório no deserto da Judéia. Sendo o Bendito de Deus do ventre de Maria, Jesus se faz maldito, pecado sem ter pecado, para, em definitivo, libertar o povo do pecado, da maldição da Lei. Dando a vida voluntariamente por nós, Jesus faz o papel de Goel (redentor), de irmão mais velho do marido da viúva, que casa com ela, paga suas dívidas e dos órfãos (os irmãos de Jesus são filhos órfãos da viúva, a humanidade pecadora, que traiu o Esposo e o abandonou). Assumindo a carne pecadora pela encarnação, Jesus faz aliança (núpcias indissolúveis) com a humanidade pecadora, resgata e redime os filhos dela, irmãos seus, paga suas dívidas (pecados) em definitivo, e reconduz a esposa com os filhos à casa do seu e nosso Pai, concluindo uma vez por todas seu ofício sacerdotal, não havendo mais necessidade de repetir o sacrifício: "Tudo está consumado", entregando-nos sãos e salvos nas mãos do Pai. Neste ato sacerdotal definitivo, Jesus oficia o sacrifício (sacerdote), oferece a própria vida por nós (vítima). Assim, Ele se torna "o nosso Perdão" perfeito, consumado da parte de Deus. Doravante, vai valer a fé, não mais a lei. Pela fé incorporamos o perdão merecido por Jesus na cruz para nós. Fé é aceitação, adesão voluntária ao sacrifício de Jesus por nós. A conversão e a fé também eram exigidas pela Lei para obter o perdão, mas os rituais vazios mataram a fé. Os profetas diziam: antes que circuncidar o prepúcio e sacrificar animais, circuncidai o coração (convertei-vos), fazei oferenda de uma vida ética; praticai as boas obras em sacrifício de louvor agradável a Deus. "Cortai, pois, o prepúcio do vosso coração, cessai de endurecer vossa cerviz. Javé teu Deus circundar-te-á o coração e da tua descendência, para que ames o Senhor de toda a tua alma e de todo teu coração, para que possas viver" Dt 10,16;30,6. Por falta de conversão e fé, em vez de perdoar os pecados, libertar o povo psicologicamente, restituir-lhe auto-estima, cidadania, os sacrifícios rituais o mantinham no pecado, socialmente excluído e com baixa auto-estima. O sacerdócio de Jesus veio tirar o pecado do mundo (pecado social), de que o povo era vítima passiva, libertá-lo da maldição da lei, da opressão religiosa dos rituais sem vida e sem fé, e restituir-lhe e a cidadania e a auto-estima, e despertá-lo para a fé na SS Trindade e incentivá-lo a viver o perdão com alegria. Quando encontrava com alguém com baixa auto-estima, a primeira coisa que Jesus fazia era despertar a autoconfiança da dele. Disse ao paralítico: "levanta-te, anda, vai para tua casa, tua fé te salvou". Auto-estima é fé antropológica que prepara para a fé teologal, livre da lei. O sacerdócio existencial de Jesus decorre da dimensão política de sua realeza. Sabendo-se acolhido, o povo recupera a auto-estima e predispõe-se a viver em comunhão com Jesus, fazendo da vida um louvor a Deus. "Oferecei vossos corpos como hóstia viva, santa e agradável a Deus: este é vosso culto espiritual" Rm 12, 1. Doar a vida por amor é a essência do sacerdócio existencial, não do sacerdócio ritual.     

   A fé judeu-cristã e o sacerdócio de Jesus remontam a Abraão e Melquisedec, não à Lei mosaica. Com o tempo, os sacrifícios rituais minaram o espírito da lei, que perdeu raízes na fé de Abraão. Fazendo o sacerdócio existencial remontar a Melquisedec, Jesus o liga à fé de Abraão. Melquisedec é rei de Salém (rei da Paz) e sacerdote do Deus Altíssimo, prefiguração do sacerdócio existencial de Jesus e nosso. Abraão é o pai da fé, o modelo de todo aquele que crê, judeu ou não judeu. "Abraão creu em Deus e isso lhe foi levado em conta de justiça. Os que são pela fé são filhos de Abraão. Prevendo que justificaria os gentios pela fé, Deus prenunciou a Abraão esta boa nova: Todos os clãs da terra serão abençoados em ti. Assim, os que são pela fé são abençoados com Abraão, que acreditou. Os que são pelas obras da lei estão sob a maldição: maldito todo aquele que não se atém a todas as prescrições da lei para serem praticadas". Como era impossível cumprir todos os preceitos da lei, o povo estava condenado ao pecado. Por isso, "ninguém é justificado pela lei diante de Deus, pois o justo viverá pela fé. Ora, a lei não é pela fé. Cristo remiu- nos da maldição da lei tornando-se maldição por nós – pois está escrito: Maldito aquele que é suspenso no madeiro – a fim de que a bênção de Abraão em Cristo Jesus estenda-se aos gentios, para que, pela fé, recebamos o Espírito prometido. A Escritura encerrou tudo debaixo do pecado, para que a promessa, pela fé em Jesus Cristo, fosse concedida aos que crêem" Gl 3,6-14.22. Ora, a fé de Abraão é contemporânea do sacerdócio de Melquisedc e nossa fé é a fé de Abraão através do sacerdócio de Jesus, prefigurado pelo sacerdócio de Melquisedec. O sacerdócio de Melquisedec surge no contexto da fé nos primeiros anos da estadia de Abraão em Canaã, cerca de 500 anos antes da instituição do sacerdócio levítico, no contexto da lei, sob Moisés. "Então Javé disse a Aarão: os sacerdotes levitas, toda a tribo de Levi, não terrão parte ou herança em Israel. Eu sou tua parte, tua herança entre os filhos de Israel. Dei-te o encargo do que me é consagrado. Tu, teus filhos e a casa de teu pai levareis o peso das faltas cometidas contra o santuário. Tu e teus filhos levareis o peso das faltas do vosso sacerdócio. Tu e teus filhos assumireis as funções sacerdotais no que se refere ao altar e ao que está atrás do véu. Realizareis o serviço do culto, cujo ofício concedo a vosso sacerdócio. Todos os dízimos arrecadados em Israel, dou por herança aos filhos de Levi em compensação pelo serviço que prestam na Tenda Reunião. Quando os filhos de Israel pagarem o dízimo, separareis para Javé o dízimo do dízimo. Viverás dos manjares oferecidos a Javé e do seu patrimônio. Javé é tua herança: tudo o que os filhos de Israel consagrarem eu te dou, como a parte que te é atribuída e aos teus filhos. Eis o que te pertence das oferendas entregues em sacrifício, as coisas santíssimas: todas as oferendas que me restituírem os filhos de Israel, a título de oblação e sacrifício pelo pecado, e de sacrifício de reparação, são coisas santíssimas que te pertencerão e aos teus filhos. Nutrir-vos-eis de coisas santíssimas. Do gado ou do rebanho das onze tribos, serão dados ao sacerdote a espádua, as queixadas e o estômago. Dar-lhe-ás as primícias do teu trigo, do teu vinho novo, do teu óleo, e as primícias da tosquia do teu rebanho também. Pois foi ele e seus filhos que Javé escolheu dentre todas as tuas tribos para estarem diante de Javé realizando o serviço divino e dando bênçãos em nome dele, todos os dias, além de ganhar pela venda do seu patrimônio" Dt 18,1-8; Nm 18,1.7.20. Aos poucos, o comércio com o patrimônio de Javé pra sustentar os levitas sacerdotes e famílias, justo a princípio, tornou-se meio de corrupção e enriquecimento ilícito da classe sacerdotal: no tempo de Jesus, o que era venda lícita (manter sacerdotes e famílias) se tornou um rendoso comércio, deturpando o objetivo do Templo – o culto. Daí surge a oposição fé x lei, doação da vida x ritual vazio, vida x morte, homem novo x homem velho, que motiva as intrigas das autoridades religiosas de Jerusalém com Jesus, e que será explanada por Paulo em Rm e Gl. "Pela lei ninguém se justifica diante de Deus, pois o justo viverá pela fé. O homem é justificado pela fé, sem as obras da lei" Gl 3,11; Rm 3,28. A fé se obtém pela adesão livre à vida divina que brota do sacrifício de Jesus, prefigurado pelo de Melquisedec. "Depois de derrotar os reis inimigos, recuperar seus bens, o parente Ló e seus bens, assim como as mulheres e as tropas, Abraão voltou ao "Carvalho de Mambré", em Hebron, onde se estabeleceu com a família, construiu lá um altar a Javé. Melquisedec, o rei de Salém, sacerdote do Altíssimo, trouxe vinho e pão, pronunciou a benção: Bendito seja Abrão pelo Deus Altíssimo que criou o céu e a terra; bendito seja o Deus Altíssimo que entregou teus inimigos em tuas mãos. Abrão lhe deu o dízimo de tudo" Gn 13,18; 14,16-20. Melquisedec e Davi prefiguram o Messias Jesus, rei e sacerdote. "Senta-te à minha direita, até eu por teus inimigos como escabelo de teus pés. Desde Sião, Jerusalém, Javé estende seu cetro de poder e domina em meio aos teus inimigos. A ti o principado no dia do teu nascimento, as honras sagradas desde o seio e aurora de tua juventude. Javé jurou e jamais desmentirá: Tu és sacerdote para sempre segundo a ordem de Melquisedec" Sl 110(109). Após a instituição do sacerdócio levítico, o sacerdócio de Melquisedec foi esquecido até a encarnação do Unigênito, que destruirá o sacerdócio ritual levítico, ao oferecer seu Corpo como sacrifício expiatório, em ação antes da criação do mundo, restabelecerá e a atualizará o sacerdócio tipológico de Melquisedec. Jesus usará os mesmos elementos materiais (pão e vinho) e formais (bênção) usados pelo rei e sacerdote de Salém, incorporando elementos materiais do sacerdócio levítico: a vítima, o sangue derramado, o sacrifício, o altar, para se cumprir a Escritura. "Não penseis que vim revogar a Lei e Profetas. Não vim revogá-los, mas dar-lhes cumprimento pleno" Mt5,17. Mas a vítima do sacrifício é ontologicamente outra na nova aliança. Em lugar do bode expiatório, o Cordeiro de Deus, cujo corpo imolado e o sangue derramado substituirão uma vez por todas a carne e o sangue de animais. O pão e o vinho ofertados por Melquisedec tornaram-se símbolos, sacramentos, sinais eficazes do corpo e o sangue de Jesus. A dupla transignificação e transubstanciação das vítimas levíticas e dos símbolos de Melquisedec ocorreu durante a última ceia da antiga aliança, durante a qual Jesus institui a eucaristia, primeira, única, definitiva ceia da nova aliança, memorial de seu corpo dado e de seu sangue derramado por nós, a qual pôs fim à antiga aliança, uma vez por todas: "Tomou o pão, deu graças, o partiu e deu aos Doze, dizendo: Isto é o meu corpo que é dado por vós. Depois de comer, fez o mesmo com o cálice e disse: Este é o cálice da nova aliança em meu sangue, que é derramado por vós. Fazei isto em minha memória" Lc 22,19-20. A nova ceia restabeleceu uma vez por todas as relações do ser humano com Deus, interrompendo a interminável cadeia de sacrifícios rituais, incapazes de expiar pecados, como o sacrifício expiatório do Cordeiro de Deus. O sacrifício de Jesus, configurado nos sacramentos, símbolos do pão e vinho, significa o perdão definitivo dos pecados pessoais e do mundo, que é apropriado pela fé sem outra mediação, sem necessidade de repetir anualmente sacrifícios de animais. "Jesus Cristo é o nosso perdão". Para perpetuar nas gerações futuras os efeitos do perdão merecido na cruz, Jesus instituiu o memorial de sua encarnação, vida privada, pública, paixão, morte, ressurreição e ascensão no mesmo dia da sua morte na cruz. Este memorial atualizará o evento salvífico único e definitivo de Jesus, toda vez que a comunidade de fé, presidida por um presbítero, repetir pela fé as palavras ditas e os gestos feitos por Jesus sobre o pão e o vinho ao instituir o sinal eficaz, símbolo, sacramento da eucaristia. A anámnesis eucarística realiza em símbolos exatamente o mesmo sacrifício, mesma kénosis do Filho Único, desde a vida intratrinitária, encarnação e outros estágios da sua vida até a parusia: "Anunciamos, Senhor, vossa morte, proclamamos vossa ressurreição. Maraná tá! Vinde, Senhor Jesus!" Quem, pela fé, comer o pão e beber o vinho sagrados, comerá o corpo e beberá o sangue de Jesus, encarnado, "imolado e de pé já antes da criação do mundo", ressuscitado e entronizado Senhor e Rei para o perdão dos pecados 1 Pd 1,18-20. nesta condição, junto ao Pai, na comunhão com Deus Mãe, o Sumo Sacerdote Jesus continua dizendo a seus seguidores na fé: "Eu sou o pão vivo que desceu do céu. O pão que eu dou é a minha carne, entregue pela vida do mundo. Se não comerdes a carne do Filho do Homem e não beberdes o seu sangue, não tereis a vida em vós. Quem come minha carne e bebe meu sangue tem a vida eterna e eu o ressuscitarei no último dia. Pois minha carne é verdadeira comida e meu sangue é verdadeira bebida. Quem come minha carne e bebe meu sangue permanece em mim e eu nele. Assim como o Pai, que vive, me enviou, e eu vivo por meio do Pai, assim aquele que come minha carne viverá por meio de mim. Eu vivo, não eu, mas Cristo vive em mim. Minha presente vida na carne, vivo-a pela fé no Filho de Deus, que me amou e entregou-se por mim. Nele, por seu sangue, obtemos a redenção, o perdão de nossas faltas" Jo 6,51-57; Gl 2,20; Ef 1,7. O perdão agora obtém-se pela fé no dom da vida efetuado por Jesus na cruz, uma vez por todas, não pela lei. "Quanto a nós, temos um sumo sacerdote que atravessou os céus, o Filho de Deus Jesus. Por isto, permaneçamos firmes na profissão de fé. Pois, não temos eminente sacerdote incapaz de se compadecer das nossas fraquezas, pois foi ele mesmo provado em tudo, à nossa semelhança, sem, todavia pecar. De fato, todo sumo sacerdote é tomado entre o povo e o representa nas suas relações com Deus, para oferecer dons e sacrifícios pelos pecados. Ele sabe ter compaixão dos que estão na ignorância e no erro, pois ele mesmo está cercado de fraqueza. Por isso, deve oferecer por si como pelo povo sacrifícios pelo pecado. Ninguém deve se atribuir essa honra senão aquele que foi chamado por Deus, como Aarão. Igualmente, Cristo não atribui a si mesmo a honra de ser sumo sacerdote, mas àquele que lhe diz: Tu és meu Filho, eu hoje te gerei. Tu és sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedec. Nos dias de sua vida terrestre, Cristo dirigiu súplicas e preces com forte clamor e lágrimas, àquele que tinha poder de livrá-lo da morte. E foi atendido por causa da sua piedade. Mesmo sendo Filho, aprendeu por aquilo que sofreu o que significa obediência. Mas, ao levar a termo sua vida, tornou-se causa de salvação para todos que lhe obedecem (crêem nele). De fato, por Deus foi ele proclamado sumo sacerdote segundo a ordem de Melquisedec" Hb 4,15-5,10. Portanto, acabou o reino da lei e da morte, reina agora a vida mediante a fé, graças ao perdão universal merecido  pela entrega do Filho Único por nós à morte de cruz; perdão assumido, vida incorporada pela fé no sacrifício de Jesus Cristo. "Deus, rico em misericórdia, pelo imenso amor com que nos ama, quando estávamos mortos por causa de nossos pecados, deu-nos a vida em Cristo. Ele nos ressuscitou com ele e nos fez sentar nos céus, em virtude da nossa união com Cristo Jesus. Assim, por sua bondade para conosco no Cristo Jesus, Deus escolheu-nos nele antes da fundação do mundo para sermos santos e íntegros diante dele no amor, predestinou-nos à adoção filial, por obra de Jesus Cristo: mostrou nos séculos futuros a incomparável riqueza de sua graça, pela qual fostes salvo, pela fé. Isto não vem de vós: é dom de Deus. Não vem das obras da lei, para que ninguém possa gloriar-se. Pois foi o Pai que nos fez, criando-nos no Cristo Jesus, em vista das obras boas que preparou de antemão, para que as praticássemos" Ef 2,4-10. A fé nos faz novas criaturas, capazes de obras teândricas, humanas com valor salvífico. As obras da lei sem a fé não salvam, pois não são feitas em, com, por Cristo. Sendo partícipes da natureza divina de Jesus, pela fé vivemos o seu sacerdócio existencial, doando a vida pelos irmãos em louvor ao Pai.     

   Há, pois diferenças substanciais entre os sacerdócios de Melquisedec e o levítico, por um lado, e de ambos com o sacerdócio de Jesus, que os assumiu e transubstanciou, por outro. (1) O sacerdócio de Melquisedec é anterior ao levítico. "Aarão ainda estava nos rins de seus pais quando se deu o encontro de Abraão e Melquisedec, sacerdote do Deus Altíssimo, rei de Salém, que significa 'Rei da Justiça', 'Rei da Paz'. Foi ao encontro de Abraão quando ele regressava do combate contra os reis e o abençoou. Abraão entregou-lhe o dízimo de tudo". (2) Há evidente superioridade de Melquisedec sobre Aarão e seus descendentes que, na pessoa do antepassado Abraão, pagaram o dízimo a Melquisedec Ora, a lei mosaica ordenava que onze tribos pagassem o dízimo de tudo à tribo de Levi, cuja herança era Javé, não uma porção de terra. Mas, na pessoa do Patriarca Abraão, do qual descendem as doze tribos de Israel, todas pagaram o dízimo a Melquisedec, depois de abençoadas por ele na figura corporativa de Abraão, assim como são benditos todos povos em Cristo, o herdeiro da bênção de Abraão para todos as nações: "Serão benditas em ti todas as nações da terra. Ora, sem dúvida o inferior é abençoado pelo superior". (3) Ao ser abençoado por Melquisedec, na figura corporativa de Abraão, Aarão o foi na condição de inferior ao 'Rei da Justiça', figura do Verbo encarnado, ambos vindo do céu. "Aquele que vem do alto está acima de todos; o que é da terra é terreno e fala como terreno. Vós sois do mundo, eu não sou do mundo. Vós sois de baixo, eu sou do alto. Saí do Pai e vim ao mundo; deixo o mundo de novo e vou para ao Pai" Jo 3, 31; 8,23; 16,28. Como o Filho do Homem vindo sobre as nuvens do céu, Melquisedec também não era um ser terreno (Dn7,17). "Sem pai e mãe, sem genealogia e princípio nem fim da vida, Melquisedec se assemelha ao Filho de Deus e permanece sacerdote eternamente" Gn 12, 3; Hb 7,1-3. (4) Se é do alto, o sacerdócio do Rei da Paz é eterno. Superior ao sacerdócio levítico, pois, como eterno é o sacerdócio existencial de Jesus, preexistente à encarnação do Filho. "Fostes resgatados pelo sangue de Cristo, como de um cordeiro sem defeito e sem mácula, conhecido antes da criação do mundo, eternamente sacerdote segundo a ordem de Melquisedec" 1Pd 1,18-20; Hb 5,6. (5) O sacerdócio de Melquisedec é ainda superior por se exercer em ambiente de fé e perdão, não no âmbito de lei e maldição, como o levítico. "Antes que chegasse a fé, éramos guardados sob a tutela da lei para a fé que haveria de revelar-se. Assim, a lei se tornou nosso pedagogo até Cristo, para que fôssemos justificados pela fé. Porém, chegada a fé, não estamos mais sob a lei. Cristo nos remiu da maldição de lei, tornando-se maldição por nós. Aquele que não conheceu o pecado, Deus o fez pecado por nossa causa, a fim de que por ele nos tornássemos justiça de Deus. Fui crucificado junto com Cristo: se um só morreu por todos, todos morreram. Ora, ele morreu por todos a fim de que aqueles que vivem não vivam mais para si, mas para aquele que morreu por eles e ressuscitou. Já não sou eu que vivo, mas Cristo vive em mim. Minha vida presente na carne eu a vivo pela fé no Filho de Deus, que me amou e se entregou por mim como sacrifício de odor suave". Ora, pela boca dos profetas, Javé odiava a fumaça das gorduras de animais, oferecidas por que tinha vida ética torta. "Que me importam vossos inúmeros sacrifícios? Estou farto de holocaustos de carneiros e da gordura de bezerros cevados. Basta de trazer-me oferendas vãs: elas são para mim um incenso abominável. Odeio e desprezo as vossas festas e não gosto das vossas reuniões. Pois, se me ofereceis holocaustos, não me agradam as vossas oferendas e não olho para o sacrifício de vossos animais cevados". Ora, o sacrifício do Primogênito agradou ao Pai. "Javé fez cair sobre ele a iniqüidade de todos nós. Foi traspassado por causa das nossas transgressões. Mas, ele oferece a vida em sacrifício pelo pecado, certamente verá descendência e prolongará seus dias, através dele o desígnio salvífico de Javé triunfará. Após o trabalho fatigante de sua alma, verá a luz, se fartará. Está comigo quem enviou-me, não me deixa sozinho, porque sempre faço o que lhe agrada. Vim pra dar a vida em resgate de muitos, para que tenham vida em abundância. O Pai me ama, porque dou minha vida por minhas ovelhas para depois retomá-la. O Filho do Homem sofrerá muito, será rejeitado pelos chefes dos sacerdotes, anciãos e escribas, morto, e, ao terceiro dia, ressuscitará" Is 53,5.10-11; Mc 8,31. A auto-oferta de Jesus é o sacrifício agradável ao Pai, que supera de uma vez por todas os sacrifícios de Melquisedec e Aarão. O sacrifício de Jesus agradou ao Pai, levou à perfeição o sacerdócio de Melquisedec e anulou de vez os sacrifícios imperfeitos da lei. "Se a perfeição tivesse sido atingida pelo sacerdócio ritual - é nele que se apóia a lei dada ao povo - que necessidade haveria do sacerdócio segundo a ordem de Melquisedec e não segundo Aarão? Mudado o sacerdócio, se muda necessariamente também a lei. Ora, Jesus Cristo surgiu de Judá, tribo a respeito da qual Moisés nada diz quando se trata de sacerdotes. Ele pertence a uma tribo da qual membro algum se ocupou com o serviço do altar". Nele "se constitui outro sacerdote, semelhante a Melquisedec, não segundo a regra de uma prescrição carnal, mas conforme o poder de uma vida imperecível. Pois diz o testemunho: Tu és sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedec. Sendo assim, está abolida a prescrição anterior, porque era fraca e sem proveito. De fato, a lei nada levou à perfeição; e está introduzida uma esperança melhor, pela qual nos aproximamos de Deus. Jesus tornou-se a garantia da esperança melhor. Ademais, os outros se tornaram sacerdotes em grande número, porque a morte os impedia de permanecer. Mas, ele, visto que permanece para a eternidade, possui um sacerdócio imutável. Por isso, é capaz de salvar totalmente aqueles que se aproximam de Deus, por ele, na fé. Ele vive para sempre para interceder por eles. Precisamente, tal é o sumo sacerdote que convinha: santo, inocente, imaculado, separado dos pecadores, elevado ao mais alto dos céus. Ele não precisa oferecer sacrifícios a cada dia, como os sumos sacerdotes levíticos,  primeiro por seus pecados, depois pelos do povo. Ele já o fez uma vez por todas, oferecendo-se a si mesmo. A lei estabeleceu sumos sacerdotes sujeitos à fraqueza. Mas Javé jurou e não se arrependeu: Tu és sacerdote para sempre e estabeleceu um Filho eternamente perfeito" Gl 2,19-20; 3,13.23-26; 2 Cor 5,14-15.21;

Ef 1,5-7; 5,2; Is1,11-13; Am 5,21-22; Hb 10,4-10; Jo10,17.10;8,29; Hb7,11-19.22-28.

  Portanto, a oferenda do Cordeiro de Deus anula em definitivo os sacrifícios rituais de animais incapazes de perdoar pecados. Jesus é nosso Goel. Por seu sacrifício expiatório, foi constituído definitivamente "o nosso Perdão", mediante a fé. Agora, o perdão obtém-se, não por rituais de animais, mas "pela fé no Filho de Deus, que me amou e entregou-se por mim". Pela fé, cada um assume, incorpora o perdão contido na imolação de Jesus. As liturgias também exigem a fé pra terem eficácia salvífica. Elas são "sacramentos da fé", expressão da fé mediante sinais sensíveis – água, óleo, vinho, pão. Sacramentos são sinais sensíveis, símbolos, memória da fé, que tem a mesma eficácia dos fatos salvíficos que os fundamentam. O sacerdócio ritual expirou, deu lugar ao sacerdócio existencial, eucaristia, oferta da vida em louvor ao Pai para salvar os irmãos. "Ao entrar no mundo, o Filho afirmou: sacrifício Tu não quiseste nem oferenda. Holocaustos e sacrifícios pelo pecado não foram do teu agrado: De que me serve a multidão dos vossos sacrifícios? Estou farto de holocaustos de bodes, da gordura de touros. Detesto sangue de novilho, de cordeiros e cabritos. Quando entrais para ver a minha face, quem vos pediu para fazer isto, passear na minha casa? Parai de trazer oferendas mentirosas! Coisa aborrecida para mim é o incenso! Lua nova, celebração solene, sábado, não suporto mentira com festa religiosa. Tudo isto é peso que não suporto carregar. Quando estendeis as mãos, desvio o olhar. Ainda que multipliqueis as orações, não ouvirei. É que vossas mãos estão sujas de morte. Sacrifícios, oferendas, holocaustos pelo pecado são oferendas prescritas na lei. Porém, formaste-me um corpo. Por isso eu digo: eis-me aqui, eu vim, Deus, para fazer a tua vontade. Dizendo: 'Eu vim fazer tua vontade', ele suprime o primeiro sacrifício para estabelecer o segundo. Graças a esta vontade, fomos santificados pela oferenda do corpo de Jesus Cristo, realizada uma vez por todas. Os sacrifícios oferecidos pelos sacerdotes são incapazes de elidir pecados. Mas Jesus, depois de ter oferecido o sacrifício único pelos pecados, para sempre sentou-se à direita de Deus. Com esta única oferenda levou à perfeição, e para sempre, os que ele santifica. É que pela graça de Deus ele provou a morte em favor de todos os homens. Convinha, pois, que aquele, por quem e para quem todas as coisas existem, querendo conduzir muitos filhos à glória, levasse à perfeição pelo sofrimento o Autor da salvação deles. Nos dias de sua vida mortal, Jesus, mesmo sendo Filho, aprendeu o significado da obediência por aquilo que sofreu; dirigiu preces e súplicas, com forte clamor e lágrima, a quem podia salvá-lo da morte. Dobrou os joelhos e orou: Pai, se queres, afasta de mim este cálice! Contudo, não a minha, mas tua vontade se faça. Apareceu-lhe um anjo que o confortava. E, cheio de angústia, orava com mais insistência ainda e o suor se lhe tornou semelhante a espessas gotas de sangue que caiam por terra. Sendo de condição divina, não se prevaleceu de sua igualdade com Deus, mas aniquilou-se a si mesmo, humilhou-se ainda mais, tornando-se obediente até a morte de Cruz. Por isso, foi atendido pela sua piedade. Este homem, vós o matastes crucificando-o pelas mãos dos ímpios. Mas Deus o ressuscitou, libertando-o das angústias da morte. Exaltado pela direita de Deus, recebeu do Pai o Espírito Santo prometido e o derramou em nossos corações "selando a aliança eterna conosco. Eis a aliança que farei com eles: porei minhas leis em seus corações e as inscreverei na sua mente, não mais me lembrarei dos seus pecados e iniqüidades. Ora, onde existe remissão dos pecados, já não se faz mais a oferenda por eles" Hb 10,5-18; 2,9; Is 112,20; Hb 5,7-9; Lc 22,41-44; At 2, 23-24; Rm 4,4. Concluída a obra salvífica, está aberta a porta do céu, pela fé em Jesus. Por sermos membros do seu Corpo, somos mediadores por participação na mediação única do Cordeiro de Deus. Tudo que Jesus é por natureza, Maria e seus filhos, os irmãos de Jesus,  somos por participação na natureza divina dele (2 Pd,1,4 ).

[5] A existência do Templo sempre foi problemática em Israel, assim como a existência

do sacerdócio e da realeza, ambos objeto das apóstrofes, das catilinárias dos profetas. A

exemplo da realeza, as relações do povo com Javé sobre o Templo sempre foram tensas.

Davi queria um templo material suntuoso para Javé. Javé lhe disse que não queria morar

em templo material, pois seu prazer era morar no meio do povo sob tendas como sempre

morou. O templo do agrado de Javé não será edificado pelo rei, mas por um descendente seu. "Tua linhagem após ti, gerada de tuas entranhas, construirá uma casa para o meu Nome. Eu serei para ele um Pai, ele será para mim um Filho" 2 Sm 7,14. Levando ao pé da letra a promessa de Javé a Davi, Salomão construiu para Javé um templo suntuoso em Jerusalém, com madeira de cedro e ouro importados do Líbano e da Etiópia, à custa da exploração do trabalho povo pobre. Isto não agradou ao Deus de Israel. Era previsível o resultado: após a morte de Salomão, as nove tribos do Norte, exploradas, rebelaram-se contra o rei opressor, se separaram das tribos três do Sul, beneficiárias do Templo e das benesses do rei, e formaram o Reino de Israel, Capital Samaria, independente do Reino de Judá, ao Sul, Capital Jerusalém. Os dois reinos viviam em litígio permanente. Esta divisão enfraqueceu a nação, que tornou-se presa fácil dos invasores. Não demorou, os Assírios tomaram o reino de Israel e avassalaram o reino de Judá. Parte da população do Norte foi para a diáspora. Depois vieram os Babilônios, que expulsaram os Assírios do reino do Norte, tomaram o reino do Sul, destruíram o Templo, escravizaram a população e deportaram as autoridades políticas, religiosas e proféticas para a Babilônia, deixando a população sem rei e sem profetas. Depois os persas ocuparam a Palestina. O templo foi reconstruído por Esdras no retorno do exílio babilônico, com o consentimento de Ciro, rei dos persas, simpatizantes dos Judeus e de Javé. O templo foi profanado e destruído pelos invasores gregos, que, sob o comando de Alexandre Grande, expulsaram os persas da Palestina. Por fim, vieram os romanos, que expulsaram os gregos e reconstruíram o Templo. Não demorou, o Templo foi profanado pelos próprios judeus e deixou de ser a casa de orações e se tornou casa de comércio, agredindo o Nome e a santidade de Javé. A decadência religiosa e social generalizou-se. O povo jazia nas trevas do pecado ritual e social, da baixa auto-estima e da religião esclerosada. Até que Javé resolveu pôr ordem na casa. "Quando chegou a plenitude do tempo, Deus enviou seu Filho, nascido de uma mulher" Gl 4,4, para morar em definitivo com seu povo e construir o templo do agrado de Javé, segundo promessa feita a Davi. Mediante a encarnação do Filho, ratificada pela ressurreição, ascensão, efusão de Deus Mãe nos corações e na criação, Jesus construiu o Templo agradável ao Pai, tornando caduco o antigo templo e os sacrifícios de animais. "Destruí este templo e em três dias eu o levantarei. Quarenta e seis anos foram precisos para construir este Templo e tu o levantas em três dias, disseram-lhe eles? Ele, porém, falava do templo do seu corpo". 'O corpo de Jesus ressuscitado é o centro do novo culto em espírito e verdade, lugar da presença divina na terra, templo espiritual donde mana a fonte de água viva'. Conforme Javé disse a Davi, o templo novo é feito de pessoas, não de materiais. O Verbo encarnado, Goel da criação e daqueles que salvou em sua Pessoa, é o novo templo, nova shekiná de Javé na Terra. "Estabelecerei a minha habitação entre vós e não mais vos rejeitarei. Estarei no meio de vós, serei o vosso Deus e vós sereis o meu povo. Nós é que somos o templo do Deus vivo. O Verbo se fez carne e habita entre nós. Nele habita corporalmente toda a plenitude da divindade e nele fostes levados à plenitude" (santidade). 'No Ressuscitado se reúne todo o mundo divino, a que pertence por seu ser preexistente e glorificado, e toda a criação, que Cristo assumiu diretamente (humanidade) e indiretamente (cosmo) pela encarnação e ressurreição, em suma, toda a plenitude do ser. Participamos da plenitude do Cristo pela fé, como membro do seu Corpo (o pleroma). "Nele aprouve a Deus fazer habitar toda a Plenitude e reconciliar por ele e pra ele todos os seres, os da terra e os dos céus, realizando a paz pelo sangue de sua cruz" Jo 1,14; 2 Cor 6,16; Lv 26, 11; Ef 2,19.21; Cl 1,19; 2,9. Assumindo a condição humana e cósmica, Jesus restaurou a morada de Deus uno e trino. "Se alguém me ama, guardará minha palavra, meu Pai também o amará, a ele viremos e nele estabeleceremos morada. Não vos pertenceis: sois o templo de Deus, Deus Mãe habita em vós" Jo 14, 23; 1 Cor 3,16; 6,19. Cristo é a pedra angular, de sustentação da estrutura do novo templo, e nós, as pedras vivas desse templo. "Estais edificados sobre o fundamento dos apóstolos e profetas, cuja pedra angular é Cristo. Nele, todo o edifício se ergue bem articulado em morada sagrada no Senhor, e vós também nele sois co-edificados para serdes a habitação de Deus, no Espírito. Como pedras vivas, chegai-vos à Pedra viva, construí o edifício espiritual em vós, dedicai-vos ao sacerdócio santo, oferecei sacrifícios espirituais do agrado de Deus em Cristo. Oferecei vossos corpos como hóstia viva, santa, agradável ao Pai, este é vosso culto espiritual" Ef 2,20-22; 1 Pd 2,4-5; Rm 12,1. Assumindo nossa fragilidade, o Unigênito restaura o ser humano, restituindo-lhe a perfeição que tinha ao ser criado, divinizando-o por participação na natureza divina de Jesus, habilitando-os a ser embaixador de Cristo no mundo, mostrando por atos e palavras a presença de Deus, assim como a imagem retrata o original. Deus fez o homem e a mulher à sua imagem e semelhança: a imagem espelha o original, a semelhança atesta que a imagem não é igual ao original, mas se lhe assemelha. Jesus espelha com perfeição a natureza de Deus uno e trino. Nele a natureza divina se manifesta de maneira perfeita no humano. "Eu estou no Pai e o Pai está em mim; eu o Pai somos um; eu: quem me vê, vê o Pai. Faço aquilo que vejo o Pai fazer" Jo 10,30; 14,9-10. Em Jesus Cristo, divindade e humanidade estão tão consubstancialmente unidas que é impossível separá-las. A união hipostática é união da natureza divina com a natureza humana, em tal profundidade que o ser humano torna-se participante da natureza divina, chamado a ser misericordioso como misericordioso é o Pai. O Primogênito é Deus e homem, em tudo é igual a nós, menos no pecado, do qual nos livrou, restituindo-nos a semelhança divina. Em Jesus Cristo o divino assemelha-se ao humano: os atos humanos de Jesus tem valor divino (dar de comer aos famintos); os atos divinos de Jesus (perdoar pecados) se expressa humanamente "Nele o Pai colocou o seu sinal (Ruah, santidade do Pai e do Filho). Ele é a Imagem visível do Deus invisível, o resplendor de sua glória, a expressão do seu ser. Quem vos ouve, ouve-me, quem me ouve, ouve o Pai que me enviou". Em Jesus Deus se fez palpável. Ele assumiu nossa condição para comunicar a santidade de Deus com sensibilidade humana. O coração de carne que substituirá o coração de pedra nos que crêem, bate em primeiro lugar no peito de Jesus. O santo precisa ser humano para ter credibilidade. Por isto o Verbo se fez carne. Paulo nos exorta a termos os mesmos sentimentos, a sensibilidade do coração de Jesus. Nele o Pai "nos escolheu antes da criação do mundo para sermos irrepreensíveis e santos diante dele no amor. Ele nos predestinou a sermos seus filhos adotivos por Jesus Cristo, a sermos conformes à imagem de seu Filho, para ele ser o Primogênito de muitos irmãos" Jo 6,27; Cl 1,15; Hb 1,3; Ef 4,5; Rm 8,29. Jesus condenava a santidade legalista e desumana dos fariseus, que coavam um mosquito, pagavam o dízimo do cominho e do endro, mas desprezavam o espírito da Lei: a misericórdia. O Verbo se fez carne pra fazer tornar a sensibilidade humana semelhante à de Deus, por participação da natureza divina do Filho, no qual fomos enxertados, quais ramos na videira, membros no Corpo, pedras vivas do templo novo. Na criação, Deus fez o homem à sua imagem e semelhança. Na redenção, o Filho assumiu a condição humana, e Deus se tornou semelhante ao homem: Em Jesus, Deus tornou-se semelhante ao homem, para tornar o homem semelhante a Deus. Por isso, preciso cuidar do meu corpo, morada de Deus Mãe, Espírito do Pai e do Filho. Por força da encarnação do Unigênito, a natureza, a cultura, a história tornam-se manifestação de Deus, lugares teologais. Por isso, podemos dizer de qualquer pessoa, lugar, situação: "Senhor, eu sei que este lugar, esta situação, esta pessoa são lugares de encontro contigo. Reina, Senhor neste lugar, nesta pessoa, nesta situação e dá-me fé e sensibilidade para ver-te onde realmente estás". Deus não é adorado em primeiro lugar nos templos materiais, mas todo lugar, pessoa, coisa, porque o Verbo se fez carne. Deus uno e trino está em toda parte: coisas e pessoas são lugares teologais, e neles podemos adorar Deus em espírito e verdade. Surpreendida pelo diálogo acolhedor de Jesus, que se mostrou interessado e conhecedor da vida dela, a samaritana lhe disse: "Senhor, vejo que és um profeta. Nossos pais adoraram sobre esta montanha (Monte Garizim), mas vós dizeis: é em Jerusalém (Monte Sião) onde está o lugar adorar Deus". Jesus desfaz o equívoco dessa mulher sincera, sedenta de justiça, ao dizer: "Crê, mulher, vem a hora em que nem sobre esta montanha nem em Jerusalém adorareis o Pai. Vós adorais o que não conheceis; nós adoramos o que conhecemos. Mas vem a hora, e é agora, em que os verdadeiros adoradores adoram o Pai em espírito e verdade, pois tais adoradores são que o Pai procura. Deus é espírito e os que o adora, devem adorá-lo em espírito e verdade" Jo 4,19-24. 'O Espírito, princípio do novo nascimento, é também o princípio do novo culto espiritual. Culto em verdade, pois responde à revelação de Deus faz por Jesus'. Por sermos pedras vivas do novo templo, Ruah nos é comunicada pela união consubstancial nossa com a pedra angular, Jesus ressuscitado, casa de Deus Mãe na terra. "Recebestes o espírito de filhos adotivos, pelo qual clamamos: Pai! Ruah se une ao nosso espírito para testemunhar que somos filhos do Pai. Temos suas primícias e gememos interiormente, suspirando pela redenção do nosso corpo. Deus Mãe socorre nossa fraqueza, pois não sabemos pedir como convém; ela intercede por nós com gemidos inefáveis. A criação inteira geme e sofre as dores de parto até o presente, na esperança de ser libertada ela também da corrupção para entrar na liberdade da glória dos filhos de Deus" Rm 8,15-16. 21s. Ruah geme em nós como gemeu em Jesus tão fortemente no Getsémani que suou sangue. Mas amor de Ruah e do Pai era maior que a angústia do Filho e lhe deram força pra levar a cruz, sorver até a última gota o cálice das nossas iniqüidades, que o Cordeiro Santo levou nos ombros inocentes. Mais forte que a morte, teimosamente o amor salva o que está perdido, tira a pedra do túmulo e ressuscita Jesus conosco, nos assentando com ele no céu, como filhos e concidadãos dos santos e membros da Família Divina, gozando os mesmos direitos do Irmão Primogênito (Ef 2,6.19. Pela fé, somos gerados filhos todo dia pelo Espírito e a água. Quem bebe da água que Jesus dá, não mais terá sede. Pois a água que ele dá se tornará no que crê fonte de água jorrando pra vida eterna. Morremos e renascemos criaturas novas cada dia pela fé. "Os que creram nele, deu-lhes o poder de se tornarem filhos de Deus. Quem crê em mim reviverá, inda que esteja morto. O Espírito do que ressuscitou Jesus dos mortos dará vida aos vossos corpos mortais. Quem está em Cristo é criatura nova. Passaram-se as coisas antigas e tudo se faz novo. Tudo vem de Deus: somos criaturas suas criadas no Cristo pras boas obras que tinha preparado antes para que andássemos nelas. Marana tá" Rm 8,11;2Cor 5,17; Ef 2,10; Ap 22,20.

No tempo de Jesus, a religião havia-se tornado o principal fator de opressão do povo judeu. O Templo, o lugar mais sagrado de Israel, foi transformado em casa de comércio, a serviço da casta sacerdotal, dos escribas e fariseus, que a cada dia ficavam mais ricos à custa das doações da população e do comércio do Templo e não se incomodavam com a miséria do povo. A chegada do Primogênito na Palestina fará a mais profunda revolução antropológica da humanidade. Ele não nasceu na tribo sacerdotal de Levi, mas é o Filho do homem: é simplesmente humano, tem aspirações e preocupações humanas como nós. Desde seu nascimento Jesus causou problemas às autoridades civis de Roma e religiosas de Jerusalém. Quando sabe que nasceu em Belém o rei dos Judeus, Herodes tenta matá-lo. Jesus tornou-se exilado político no Egito com seus pais. Quando começou a anunciar a boa nova com autoridade, ele atraiu sobre si a ira das autoridades religiosas judaicas, que entraram em confronto aberto com ele por toda a sua vida pública, culminada com a  tortura física e moral que acarretaram seu assassinato covarde na cruz. A gota d'água foi a entrada messiânica em Jerusalém montado num jumento, sendo aclamado Rei de Israel pelo povo. Expulsou os vendilhões do Templo à vista dos corruptos sacerdotes, doutores da lei e fariseus, com a aclamação dos pobres e das crianças. Montado num jumentinho, o rei Messias avançava para Jerusalém, enquanto "o povo estendia suas próprias vestes no caminho dele. Já estava perto da descida do Monte das Oliveiras, quando a multidão dos discípulos começou, alegremente, a louvar Deus com voz forte pelos milagres que viram. Diziam: "Bendito aquele que vem, o rei, em nome do Senhor! Paz no céu e glória no mais alto céu. Fariseus da multidão lhe disseram: Mestre repreende teus discípulos". Mas ele respondeu: "Eu vos digo, se calaram as pedras gritarão" Lc 19,28-40. O conflito de Jesus com as autoridades judaicas atingia o ponto crítico: não havia mais retorno no seu caminho para a cruz. Aproximava-se a hora de concluir a obra que o Pai lhe confiou realizar. A paixão e morte de cruz serão o ato final deste doloroso auto de Deus, quando as coisas antigas ficarão para trás, dando lugar e vez às coisas novas, criadas pela doação da vida do Cordeiro, por amor da criação pecadora. Em seu corpo imolado, destruirá o templo antigo e construirá o novo templo do agrado do Pai, conforme promessa feita a seu pai Davi; consagrará em sua pessoa o sacerdócio segundo a ordem de Melquisedec e liquidará uma vez por todas o sacerdócio levítico. O kairós dessas coisas acontecerem é agora. Jesus não perde tempo, tem pressa. Depois de aclamado rei, do alto do Monte das Oliveiras contempla Jerusalém rebelde e corrupta, e lamenta: "Ah! Se neste dia também tu conhecesses a mensagem de paz! Agora, porém, isto está escondido aos teus olhos. Pois, dias virão sobre ti, teus inimigos te cercarão com trincheira, te rodearão e apertarão por todos os lados. Deitar-te-ão por terra e teus filhos no meio de ti, e não deixarão de ti pedra sobre pedra, porque não reconheceste o tempo em que foste visitada" Lc 19,41-44. Não havia mais tempo a perder. Chegou a hora, é preciso agir. Então, Jesus entrou no Templo para mostrar que é a peça central do processo histórico de mudanças profundas em Israel e em suas velhas instituições, começando pelo que eles têm de mais sagrado: o Templo. Ao entrar no Templo, indignado com a falta de respeito com a Casa do Pai, "não permitia que ninguém carregasse objetos através do Templo; Jesus fez um chicote de cordas, expulsou os vendilhões e cambistas, com as ovelhas e bois; lançou o dinheiro dos cambistas ao chão, derrubou as mesas, disse aos que vendiam pombas: "Tirai isto daqui; não façais da casa do meu Pai uma casa de comércio. Minha casa é uma casa de oração para todos os povos. Porém, vós fizeste dela um covil de ladrões. Está escrito: o zelo por tua casa me consome. Os judeus, então, o interpelaram, dizendo: "Que sinal nos mostras para agires assim? Respondeu-lhes ele: Destruí este templo, e o levantarei em 3 dias. Disseram-lhe: Quarenta e seis anos foram precisos para construir este Templo e tu o levantarás em três dias? Porém, ele falava do templo do seu corpo. Quando ressuscitou dos mortos, seus discípulos creram nele". Os Judeus ficaram furiosos com Jesus, mas os excluídos, os pecadores vibraram com o gesto profético dele. "No Templo, cegos, coxos dele se aproximaram, ele os curou. Vendo os prodígios que fizera, a alegria das crianças aclamando: Hosana ao filho de Davi, os chefes dos sacerdotes e os escribas indignados ficaram e lhe disseram: Estás ouvindo o que estão a dizer? Respondeu Jesus: Sim, nunca leste: Da boca das crianças de peito e dos pequeninos preparaste um louvor para ti? Ele ensinava no Templo. Os chefes dos sacerdotes, os escribas e os fariseus ouviram isto e procuravam como matá-lo; mas o temiam, pois toda a multidão estava maravilhada com o ensinamento de Jesus" Jo 2,13-17.18-21; Lc 19,46; Mc 11,15-19; Mt 21,12-16.

O Templo de Jerusalém esteve presente na vida de Jesus desde a sua infância: (1) No oitavo dia do nascimento do Menino Deus, Maria e José foram ao Templo pra cerimônia da purificação pós-parto da mãe, circuncisão e consagração de Jesus; (2) "Seus pais iam todos os anos a Jerusalém para a festa da Páscoa. Quando Jesus fez 12 anos, subiram pra festa, segundo o costume. Terminados os dias, voltaram, mas Jesus ficou em Jerusalém, sem que seus pais o notassem. Três dias depois, o encontraram no Templo, sentado entre os doutores, ouvindo-os e interrogando-os; todos que o ouviam ficavam extasiados com sua inteligência e suas respostas. Ao vê-lo, ficaram surpresos, e sua mãe lhe disse: "Meu filho, por que agiste assim conosco? Olha! Teu pai e eu, aflitos, te procurávamos". Ele respondeu: "Por que me procuráveis? Não sabíeis que devo estar na casa do meu Pai?" Lc 2,41-49. O incidente dos 12 anos foi proposital, pois marcou a maturidade de Jesus, cerimônia celebrada ainda hoje nas famílias judaicas quando o menino se torna adultos ao atinge os doze anos de idade. Pode, portanto, tomar decisões por conta própria, como Jesus fez, ficando em Jerusalém "sem que seus pais notassem". Com sua independência Jesus mostra a seus pais que, embora seja filho deles, é dono de si e tem consciência da missão que veio cumprir por ordem do Pai; que a paternidade e maternidade de Maria e José estão sob a paternidade universal do pai de todo ser humano. Jesus deixou isto claro durante sua vida pública. "Estando ainda a falar à multidão, chegaram sua mãe e seus irmãos. Ficando do lado de fora, mandaram chamá-lo. Havia uma multidão sentada em volta dele. Disseram-lhe: "Teus irmãos e irmãs e tua mãe estão lá fora e te procuram". Ele perguntou: "Quem é minha mãe e meus irmãos?" E, repassando com o olhar os que estavam sentados ao seu redor, disse: "Eis meu irmão, irmã, minha mãe: são aqueles que ouvem a palavra e praticam a vontade de meu Pai que está nos céus" Mt 12,46-50; Mc 3, 31-35; Lc 8,19-21. O Pai o enviou à terra para construir "a casa de oração para todos os povos", não apenas o templo material pra um povo, por mais legítimo que fosse o desejo deste de homenagear seu Deus com uma bela casa. Javé já havia dissera a Davi que não precisava de templo material para morar, pois o lugar preferido de sua morada é no meio do povo. Salomão teimou, fez o templo mais luxuoso do Oriente, julgando agradar Javé. Mas não agradou e sabemos no que deu. Jesus, que é Deus, mostrou o desagrado de Javé com o Templo, dando escândalo com os vendilhões. Teve atitude semelhante com a Lei, que deixou de ser santa e se tornou legalismo a serviço da manipulação, discriminação e opressão do povo humilde por parte das autoridades religiosas de Israel, que se julgavam santas por cumprirem a Lei. Como o povo não a cumpria porque era analfabeto, era tido como pecador legal. Prostitutas e cobradores de impostos eram pecadores públicos, que pecavam à vista de todos. O povo ignorante era a massa sofrida dos pecadores, que Jesus veio libertar. Por serem pobres, viviam na marginalidade religiosa, econômica, política e social, moravam e alimentavam-se mal. Por isso tinha baixa imunidade, baixa estima e adoecia com facilidade. As autoridades religiosas interpretavam os males do povo como castigo de Javé pelo pecado de não cumprir a Lei. Julgavam que as mazelas do povo era sinal evidente que era pecador. Os doentes, aleijados, pobres, cegos, prostitutas, pastores eram os pecadores legais. Pela condição sócio-econômica miserável em que vivia, esta multidão de pobres tinha baixa auto-estima e muita culpa patológica. Sofriam pressão forte de fariseus, sacerdotes, doutores da Lei, guardiões da Lei, cuja palavra tinha forte repercussão no meio do povo. O legalismo opressor gerava a baixa auto-estima do povo, abandonado como rebanho sem pastor. Quando Jesus chegou e pôs-se do lado do povo, declarando-os perdoados, inocentes, mas pecadores eram os que condenavam o povo e se julgavam santos porque cumpriam a letra da Lei, embora burlassem seu espírito. Foi o maior rebu entre as autoridades e grande alívio para o povo! "Feliz o ventre que te pariu e os peitos que te amamentaram", gritava uma mulher da multidão. Para maior confusão das autoridades religiosas, Jesus declarava feliz toda a massa dos infelizes e apostrofava os santos pela Lei. "Vendo as multidões, Jesus subiu ao Monte das Bem-Aventuranças e sentou-se. Os discípulos se aproximaram e ele começou a ensinar: Felizes os pobres no espírito, porque o Reino dos Céus é seu. Felizes os que choram, pois serão consolados. Felizes os mansos, porque terão a terra em herança. Felizes os que têm fome e sede de justiça, pois serão saciados. Felizes os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia. Felizes os puros de coração, porque verão Deus. Felizes os promotores da paz, porque serão chamados filhos de Deus. Felizes os perseguidos por causa da justiça, porque deles é o Reino dos céus. Felizes sois quando vos injuriarem e, mentindo, disserem todo o mal contra vós por causa de mim. Alegrai-vos, exultai, porque é grande a vossa recompensa nos céus. Pois foi deste modo que perseguiram os profetas que vieram antes de vós" Mt 5,1-12. Era demais ouvir tanta novidade de um jovem saído do povo marginalizado da Galiléia, que era solidário e compassivo com o povo sofrido, que acolhia e perdoava de graça; mas era duríssimo com os fariseus, doutores, sacerdotes: "Sepulcros caiados, raça de víboras, não entrais no Reino de Deus, e fechais a porta aos que nele querem entrar. Coai mosquito e pagais o imposto do endro e cominho, mas desprezais o espírito da lei: a misericórdia. Colocais pesados fardos nos ombros dos fracos, e não moveis uma palha para carregá-lo. Espoliais viúvas e órfãos, pagais o tributo ao templo, mas deixais vossos pais idosos passarem necessidade. Ai de vós, ricos, pois já tendes vossa consolação. Aí de vós que agora estais fartos, porque passareis fome. Ai de vós que agora rides, porque ficareis de luto e chorareis. Aí de vós quando todos falarem bem de vós, pois assim os antepassados tratavam os falsos profetas" Lc 6,24-26. Finalmente alguém abertamente se põe do lado de fracos e pobres. Alguém ousava declarar inocente quem realmente era, e pecador quem o era de fato. A primeira coisa que Jesus dizia ao se aproximava de um infeliz era: "Teus pecados estão perdoados". Trata-se dos pecados rituais. Dizia que veio buscar pecadores e doentes, não justos e sadios; que preferia misericórdia a sacrifício. O povo se sentia amado e perdoado pela presença acolhedora de Jesus. O primeiro sinal do perdão é acolher o errado. Quem rejeita não perdoa, mas condena. Este estado de pecado ritual vivido pelo povo era uma paralisia que estagnava sua capacidade. Para exorcizá-la, Jesus realizou a mais profunda catarse psicoreligiosa nas mentes e nos corações dos pecadores. Em primeiro lugar, dizia-lhes: Teus pecados estão perdoados. Isto é: restituo tua dignidade humana que a religião opressora tirou, tolhendo-te a liberdade, fazendo-te mercadoria humana de autoridades que deveriam cuidar de vós, não explorar o rebanho, cooptando sacrifícios rituais incapazes de perdoar pecados. Levanta-te e anda; põe teu leito nas costas e vai para a tua casa; vai lavar-te na piscina de Siloé; apresentar-se ao sacerdote para atestar tua cura". A primeira coisa que Jesus faz com o pecador é elevar-lhe a auto-estima, perdoando-o e o tirando da marginalidade religiosa e social, mudando sua relação com Deus e a religião, que saem do templo para a vida do povo. Deus deixa o templo e vive, caminha com o povo, partilha seu destino. É na vida real do povo que Deus tem prazer de estar, agindo, sofrendo, se alegrando com ele, gerando confiança e fé e esperança nele mesmo. "Os discípulos saíram a pregar por toda parte, agindo o Senhor com eles" Mc 16,20. Com isto, lhes devolve a capacidade de exercer os dons que Deus lhes dá. "Vai, tua fé te curou". Isto é, ao assumires tua capacidade humana, ficas curado de tua baixa estima e estás apto a construir o Reino de Deus. O principal fator de elevada auto-estima é o perdão. Por isso que Jesus o "nosso Perdão": ele nos livra do fardo da culpa patológica imposta pela sociedade moralista, como forma de dominar, oprimir os fracos. Vivendo sob o olhar amoroso do Pai que perdoa, o pecador muda a mentalidade, sente-se salvo. Seu juiz não é mais a sociedade hipócrita, moralista, mas Deus-Conosco, Jesus. Como não veio condenar, mas salvar, acaba o medo, o maior fator de baixa auto-estima. A sociedade oprime reprimindo os dons das pessoas que incomodam o 'status quo', a mediocridade, gerando medo nos corações e culpa patológica. A repressão social gera baixa estima, acomodação e medo no coração do povo. O medo nasce da sociedade preconceituosa que o usa como arma de paralisia da criatividade. Medo gera conflito e ódio, tira a paz. Elevada auto-estima é fator de paz. Por isso, Jesus é "a nossa Paz". Ao quebrar a cadeia de opressão, Jesus tira o medo, eleva a estima, traz paz ao povo: salva. "Porque vocês têm medo, homens de pouca fé". Não pode haver fé onde há medo e baixa auto-estima. Deus não age em pessoas não assumidas, mal resolvidas, não donas de si. É preciso resgatar o humano antes assumir o divino. A religião verdadeira resgata o humano, dá condição para a fé verdadeira. O perdão de restitui a dignidade, humaniza. Onde não há consciência de si, não há imputabilidade, responsabilidade por seus atos. Onde há fome, doença, miséria, não entram ética nem Deus. "Não existe pecado do lado de baixo do Equador", para a massa marginalizada, oprimida pela sociedade hipócrita, cinicamente auto-justificada. Ora, Jesus assumiu a condição humana pra resgatar a auto-estima que o ser humano tinha na criação. Ele defende a auto-estima, o amor próprio ao nos mandar "amar o próximo como a nós mesmos". Quem não tem auto-estima, não se ama nem ama ninguém. Como posso gerar auto-estima no povo, se não confio em mim, nos dons que Deus me deu? Jesus tinha auto-estima elevada; por isso passava confiança às pessoas que cruzava seu caminho. "Vai, tua fé, tua auto-estima te salvou. Somada à confiança e esperança em Deus, tua auto-estima gerou o milagre do sucesso que vês em tua vida". Milagre acontece toda hora na vida de quem tem elevada auto-estima e fé. Desgraça acontece na vida de quem cultiva energia negativa, baixa auto-estima. Doença, fracasso, acidentes, frustração são frutos da baixa auto-estima, que a religião castradora e sociedade opressora rotulam como pecado. De fato, a pessoa de baixa auto-estima se acha um lixo, incapaz porque introjeta a culpa patológica que a sociedade hipócrita lhe impõe e ela aceita. Culpa patológica que castra, paralisa. A culpa verdadeira, assumida, resgata a dignidade mediante o arrependimento e propósito de retomar a vida reta. Após o perdão, vem a liberdade, acaba a culpa. Paralisa as pessoas a culpa patológica incutida pela hipocrisia religiosa apegada à letra da lei, que funciona apoiada na desconfiança e má-fé, que gera vítimas e depois as pune para se desculpar. Os pecadores imputados são bodes expiatórios que levam as culpas dos reais pecadores, como Jesus. Carregando nos ombros as culpas patológicas do povo, o pecado do mundo, o Cordeiro de Deus o liberta de suas culpas reais ou patológicas e restitui-lhe a liberdade saudável e a auto-estima. O pecado do mundo é a patologia social que Jesus veio tirar, quebrando a cadeia da baixa auto-estima no coração dos pobres, colocando-se do lado dos oprimidos, inocentando-os e revelando os verdadeiros culpados. "Deixa de lamento: os teus pecados estão perdoados, levanta-te, vai para tua casa, viver tua vida na casa do dever e ambiente de trabalho, no teu habitat pessoal: vai ocupar teu lugar na sociedade". Restituindo auto-estima aos oprimidos, Jesus gera neles nova relação com Deus e as pessoas. Pois o Deus verdadeiro liberta, não gera culpa patológica, que tira a liberdade do povo. Religião sem amor é "sinagoga de Satanás", não vem de Deus, não é lugar de encontro com os irmãos. Jesus nos leva a sério, dando-nos oportunidade de crer em nós, em primeiro lugar. Quem não tem fé antropológica, não pode ter vida de fé teologal. É que a graça não violenta a natureza, mas a potencializa para que funcione com perfeição. Não podemos ser santos contrariando a natureza, que saiu boa das mãos do Criador. Tudo que o Criador colocou no ser humano é bom e Jesus resgatou. Primeiro, precisamos vencer o medo, recuperar a auto-estima e dignidade. Só então estaremos prontos pra viver na fé teologal a liberdade dos filhos de Deus. Jesus é a garantia da liberdade dos seus irmãos: "Se Jesus me liberta, sou livre de verdade". Ele liberta o paralítico restituindo-lhe auto-estima pelo perdão da culpa patológica imposta pelo Templo: "Tu não és pecador, mas doente; pecadores são os que te oprimem e fingem que são santos porque cumprem a letra da Lei, mas não vivem seu espírito – a misericórdia. Garanto que estás limpo da culpa que te impingem. Perde o medo, recupera a auto-estima e caminha sem medo com teus pés, exercendo teus dons. E segue-me, levando sem culpa nem medo a cruz dos teus limites com alegria e gratidão por seres amado, perdoado pelo Pai misericordioso. Eu levo teu fardo contigo: "Vinde a mim, vós que estais cansados e carregados de pesados fardos e eu vos darei descanso. Tomai sobre vós o meu jugo e sede discípulos meus, porque sou humilde e manso de coração, e encontrareis descanso. Pois o meu jugo é suave o meu fardo é leve" Mt 11,28 30. Quero aliviar-vos o fardo da opressão, do medo, da baixa auto-estima, falta de fé e confiança em ti. Resgatando o humano, Jesus resgata o divino no povo. Religião não é culto e oração, em primeiro lugar, mas serviço. Sacerdócio sem realeza, culto sem serviço é falsa religião. Em Jesus realeza precede sacerdócio: "Não vim ser servido, mas servir (realeza) e dar a vida (sacerdócio) para o resgate de muito".