UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE

Faculdade de Direito 

A EFICÁCIA DO TESTAMENTO VITAL NO DIREITO BRASILEIRO 

Hannetie Kiyono Koyama Sato 

São Paulo

2013

Hannetie Kiyono Koyama Sato 

A EFICÁCIA DO TESTAMENTO VITAL NO DIREITO BRASILEIRO

Trabalho de Curso apresentado à Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie como requisito parcial à obtenção de aprovação da disciplina Biodireito.

Professor Carlos Eduardo N. Camillo 

São Paulo

2013

1. O que é o testamento vital?

Testamento Vital é a declaração antecipada de vontade, ou seja, é o conjunto de instruções e vontades apresentadas por uma pessoa especificando qual o tratamento deseja receber no caso de vir a padecer de alguma enfermidade que a medicina não disponha de cura ou tratamento que possibilite a vida saudável física e mental.

O testamento vital pode ainda ser chamado de testamento de diretrizes antecipadas.

O testamento vital é feito pelo próprio indivíduo enquanto se encontra são e pode ser usado para guiar o tratamento de um paciente desde que respeite a ética médica. O testemaneto será utilizado caso sobrevenha situação em que a pessoa não se encontre capaz de prestar consentimento informado de forma autônoma.

2. Precedentes

Ainda não há nenhuma lei (lato senso) no ordenamento pátrio que preveja o instituto do testamento vital, mas esta modalidade de manifestação de vontade é muito conhecido nos países europeus e nos Estados Unidos, conhecido como “living will”.

Caso mais notável que temos na américa do sul é a do Uruguai, em que, mais uma vez, de forma vanguardista aprovou lei que instituiu o testamento vital em seu ordenamento jurídico. A Lei possui  onze artigos, estabelecendo o primeiro deles que toda pessoa maior de idade e psiquicamente apta, de forma voluntária, consciente e livre, pode expressar antecipadamente sua vontade no sentido de opor-se à futura aplicação de tratamentos e procedimentos médicos que prolonguem sua vida em detrimento da qualidade da mesma, se se encontrar enferma de uma patologia terminal, incurável e irreversível. Isso permite que a pessoa possa antecipadamente declarar que recusa terapias médicas que apenas prolongariam sua existência, em detrimento da sua qualidade de vida.

3. Requisitos

Poderíamos falar em requisitos se tivéssemos  previsão legal deste instituto no ordenamento pátrio, mas não é o caso. Entretanto sempre que se discute o testamento vital pressupõe-se algumas situações.

Os requisitos exigidos, assim como em qualquer negócio jurídico, podem ser de validade e de nulidade. Para evitar o risco de ser proclamada a invalidade do testamento vital, pode-se entender que, no mínimo, o documento deve cumprir os requisitos de validade da mais "informal" das modalidades ordinárias de testamento – o particular –, que exige que o texto seja escrito de próprio punho ou por processo mecânico, sem rasuras, na presença de pelo menos três testemunhas, que também devem subscrevê-lo, conforme determina o art. 1.876 do Código Civil.

Neste sentido, a legislação uruguaia cuidou de estabelecer os pressupostos formais de validade do instrumento, que deve conter a assinatura do interessado e de duas testemunhas, não podendo testemunhar o médico responsável pelo tratamento, seus empregados os funcionários da instituição de saúde responsável pelo paciente. Ademais, a feitura do documento por meio de instrumento público é mera faculdade, sendo reconhecida a validade do ato quando realizado por instrumento particular.

Independente do que expõe a lei Uruguai, a possível edição de lei específica sobre o assunto no Brasil reclamaria a indicação dos pressupostos formais relativos ao testamento vital.

No Brasil, para além da questão formal, cabe proclamar que o testamento vital deve ser realizado pelo interessado plenamente capaz (embora os testamentos contemplados pelo Código Civil possam ser realizados pelos maiores de 16 anos, consoante estipula o seu art. 1.860, parágrafo único), sendo também fundamental averiguar se o consentimento é prestado de forma livre e espontânea, isto é, isento de erro, dolo ou coação.

Analogicamente às regras civis concernentes aos testamentos, a capacidade do agente deve ser averiguada no momento da realização do ato, uma vez que "a incapacidade superveniente do testador não invalida o testamento, nem o testamento do incapaz se valida com a superveniência da capacidade". Além disso, compete reconhecer a revogabilidade do ato a qualquer tempo, também por analogia ao art. 1.858 do Código Civil, que determina que "o testamento é ato personalíssimo, podendo ser mudado a qualquer tempo".

Ultrapassada a análise dos requisitos de validade, subsistirá a discussão quanto ao conteúdo do documento. Afinal, não estão assentadas as discussões a respeito da possibilidade de recusa a tratamento médico necessário para preservar a vida do paciente, ou quanto à legitimidade da supressão da vida humana pela eutanásia, nem mesmo nos casos de ortotanásia (ou eutanásia passiva), em que ocorre a interrupção de tratamento vital, deixando-se de ministrar a medicação adequada ao paciente em estado terminal e irreversível.

Por isso, ainda que se reconheça a possibilidade da elaboração de um testamento vital, embora sem previsão legal, poderia surgir outro empecilho à validade do ato: como os arts. 104, II e 166, II do Código Civil exigem que todo ato jurídico depende da licitude do objeto, poderá ser questionada a subsistência do testamento vital, sobretudo por aqueles que entendem que a vida, bem maior de todos, deve sempre ser preservada a qualquer custo, ainda que contra a vontade do próprio paciente.

Aqui, no entanto, devemos apontar que admitimos ser direito do paciente optar pela submissão ou não a qualquer tipo de intervenção médica. Além disso, nos manifestamos a favor da morte digna e da possibilidade de haver a interrupção de tratamentos que apenas prolonguem a vida do paciente que já se encontre em estágio irreversível. Portanto, compete estabelecer as balizas do entendimento que adotamos: de plano, proclamamos à partida que a vida, além de não ser disponível, prevalece sobre todos os demais direitos, por ser aquela o alicerce destes. Por isso, em situações em que se coloca em causa o direito à vida, numa eventual colisão com outros bens ou valores, pode-se defender que, em princípio, a primazia recai sobre o primeiro.

Adentramos a seara da eutanásia, que comporta diferentes perspectivas: na eutanásia ativa direta, provoca-se a morte do paciente, para aliviar-lhe o sofrimento; na eutanásia ativa indireta, não há a intenção de suprimir a vida, mas de aplicar ao paciente medicamentos que, embora abreviem o sofrimento, podem ter por efeito a morte; na eutanásia passiva ou ortotanásia, simplesmente se deixa de aplicar ao paciente a medicação adequada, havendo a interrupção de tratamento vital, o que nos parece solução perfeitamente admissível.

Reforçando este último entendimento, encontra-se no capítulo I do novo Código de Ética Médica, que prevê os seus princípios fundamentais, o item XXII, nos seguintes termos: "nas situações clínicas irreversíveis e terminais, o médico evitará a realização de procedimentos diagnósticos e terapêuticos desnecessários e propiciará aos pacientes sob sua atenção todos os cuidados paliativos apropriados". Assim, desde que se comprove o estágio terminal e irreversível do paciente, a interrupção do tratamento que o mantém vivo não pode configurar ato ilícito, por não haver sentido em prolongar a vida de uma pessoa nestas condições, impingindo-lhe um dever de viver, quaisquer que sejam as condições. O novo Código de Ética Médica, nesse particular, se afastou da distanásia, que representa o ato tendente ao prolongamento artificial da vida, já que não deve o médico empreender condutas inúteis ou obstinadas, que apenas retardariam a morte de uma pessoa.

Desta forma, pode-se afirmar que a vida humana não pode ser analisada à margem da discussão sobre a dignidade do indivíduo, muito embora ainda sejam necessárias profundas e urgentes reformas na legislação penal brasileira, com o objetivo de determinar quais condutas seriam permitidas ou vedadas nessa área. Se a vida, por um lado, não é um bem jurídico disponível, não cabe, por outro lado, impor às pessoas um dever de viver a todo custo, o que significa, assim, que morrer dignamente nada mais é do que uma decorrência lógica do princípio da dignidade da pessoa humana.

Diante das bases expostas, resta concluir que o testamento vital não somente deve encontrar espaço no ordenamento brasileiro, como urge reconhecer sua validade por meio de lei, o que consagra o direito à autodeterminação da pessoa quanto aos meios de tratamento médico a que pretenda ou não se submeter.

4. Testamento Vital no Brasil

No Brasil, como dito anteriormente, não temos legislação específica sobre o testamento vital, entretanto a Constituição Federal apresenta princípios que podem ser aplicados quando se fala da do testamento vital.

Como por exemplo o princípio da Dignidade da Pessoa Humana (art. 1, III, Constituição da Republica Federativa do Brasil), da Autonomia Privada (princípio implícito no art. 5o) e a proibição constitucional de tratamento desumano (art. 5o, III).  O que Significa dizer que a Lei Maior do Brasil reconhece o direito à vida desde que esta seja digna, além de reconhecer a autonomia do ser humano.

Desta forma, obrigar um indivíduo a se submeter a um tratamento que ele não deseja quando este não terá função de lhe devolver uma vida plena é degradante, contrariando, desta forma o princípios constitucionais apontados.

Outrossim, se faz necessário conceituar o que é paciente terminal, que é todo aquele cuja doença é irreversível, ou seja, com ou sem tratamento o paciente chegará ao óbito.  Tal definição é deveras importante pois a prática da eutanásia, em que se pratica atos para abreviar a vida, é vedada no Brasil.  Ou seja, quando se fala disposição sobre interrupção ou suspensão de tratamento, está falando da prática de ortotanásia, reconhecida como lícita pelo Conselho Federal de Medicina no artigo 41 do Código de Ética Médica além de já reconhecido judicialmente pela sentença do processo judicial de número 2007.34.00.014.809-3.

Em 30.08.2012, Conselho Federal de Medicina aprovou a resolução n. 1995/12 que permite ao paciente registrar seu testamento vital na ficha médica ou no prontuário. Esta resolução é de grande significado no ordenamento pátrio, isto pois garante que o médico deve se ater à vontade do paciente. Entretanto, é necessária a edição de uma lei específica para esclarecer o procedimento de registro em cartório, a capacidade do outorgante, a existência ou não de prazo de validade e, principalmente, a criação de um Registro Nacional de Testamento Vital.

5. Conclusão

Desta forma, tendo em vista que a Carta Magna pátria dispõe expressamente os princípios a serem observados e seguidos, como o da Dignidade da Pessoa Humana da Autonomia Privada e a proibição constitucional de tratamento desumano, além do previsto no Código de ética médico, de que não motivo de submeter qualquer paciente à tratamentos que não irão curar ou ainda melhorar o estado de saúde, e que ao fazê-lo seria submeter o paciente à situação degradante, situação esta vedada tanto pela Carta magna como pela código de ética.

Tendo em vista que o tratamento não poderá melhorar o estado do paciente, não há porque não aplicar o testamento vital se este respeitar os requisitos formais e subjetivos que a legislação pátria exige.

Biografia

 

Biografia Digital

http://www.portal.cfm.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=23585:testamento-vital&catid=46

http://www.testamentovital.com.br/legislacao.php

http://pt.wikipedia.org/wiki/Testamento_vital

http://jus.com.br/revista/texto/15066/testamento-vital-e-o-ordenamento-brasileiro

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L3268.htm

Bibliografia

Dadalto, Luciana. Testamento Vital. São Paulo: Lumes Juris, 2010.

Lippmann, Ernesto. Testamento Vital – o direito a dignidade. São Paulo: Matrix, 2013.