VOCÊ ESTÁ NO MUNDO PARA BRILHAR

Jesus é o Redentor, o Goel da humanidade. A figura do goel é herdada da antiga ali-ança e está ligada a proteção, resgate, libertação. Primeiramente, ao goel cabe vingar o sangue derramado de um parente próximo ferido de morte (Nm 35,16s). O goel é também o protetor de direito dos parentes, aquele que impede a alienação da terra de parentes pobres em dificuldade (Lv 25,23s). Goel é ainda o parente próximo que res-gata as dívidas e o nome da viúva do irmão dele que morreu sem deixar filhos com a esposa. Cabe-lhe casar com a viúva. O primeiro filho que gerarem terá o nome do pri-meiro marido da mulher, para perpetuar o nome dele (Dt 25,5s). Gerar um filho com Sara é a primeira bênção de Javé para Abraão e sua descendência. Por isso, em Israel mulher que não pare, virgem, estéril é maldita, desprezada. Por isso, surge a figura do redentor que resgata a vida, a dignidade, o nome do parente desvalido. Ana, a mãe de Samuel, era estéril. Por isso, era zombada, humilhada pelas mulheres que pariam fi-lhos. "Na amargura da sua alma, ela orou a Javé, chorou muito pedindo-lhe um filho: Javé dos Exércitos, se quiseres dar atenção à humilhação da tua serva e te lembrares de mim, e não te esqueceres da tua serva e lhe deres um filho" 1 Sm 1,9s. Samuel sig-nifica 'o filho que eu pedi a Deus'. Quando engravidou de Jesus por ação do Pai e de Deus Mãe ("O Espírito Santo [Deus Mãe] virá sobre ti e o poder do Altíssimo [o Pai] te cobrirá com sua sombra"), Maria, feliz por estar grávida, foi dar a notícia a Isabel, grávida de seis meses de João Batista. Explodindo de alegria, ela entoa o Magnificat, que evoca a humilhação de ser estéril, seguida da alegria de ser mãe sentida por Ana: "Meu coração exulta em Javé, porque levanta do pó o fraco e do monturo o indigen-te. Minha alma (nephesh, não psichê: todo o meu ser unido a Deus pela fé) engrande-ce o Senhor e meu espírito (todo o meu ser santificado por Deus Mãe que me habita) exulta em Deus meu Salvador (goel), porque olhou para a humilhação da sua serva" (por não ser mãe) 1 Sm 2,1.8; Lc 1,46-48. Portanto, o papel do goel é tirar o opróbrio, resgatar a dignidade dos humilhados e ofendidos. As mulheres estéreis ou sem filhos eram humilhadas, escarnecidas, zombadas pelas que pariam filhos. Na nova aliança, a viúva estéril é a humanidade devedora, cujo pecado rompeu a aliança com o Criador, seu esposo (Is 54,1-10). Pela encarnação, o Filho, Criador como o Pai e Deus Mãe, é o esposo da humanidade pecadora, viúva desprezada, assume suas dívidas com Deus, fazendo-se pecado por amor solidário com ela, paga suas dividas ao preço do sangue, da vida doada na cruz, enxerta-a em si e a santifica pela efusão do Espírito de santida-de nela, e passa a formar um só corpo com ela como o esposo com a esposa desde a criação temporal: "O homem deixa seu pai e sua mãe, une-se à sua mulher e os dois se tornam uma só carne" Gn 2,24. Pela kenosis encarnatória, ratificada pela kenosis da cruz, Jesus se fez o Goel, o redentor, o esposo salvador da humanidade pecadora, a esposa humilhada, infiel e estéril. A redenção que ele operou configura a nova aliança do Criador Goel com a humanidade. A aliança na Pessoa de Jesus, simultaneamente, Deus e homem, é feita não ao custo de ouro e prata, mas ao preço do sangue do Cor-deiro de Deus, imolado desde antes da criação do mundo (1 Pd 1,18-20). A redenção consiste, pois, em pagar os pecados dos seres humanos e santificá-los por enxertia na Pessoa do Verbo, formando um só corpo com ele. Jesus é a Cabeça, os resgatados por ele são os membros do Corpo, que vivem da mesma vida da Cabeça e da SS Trinda-de. Em virtude do que, tornamo-nos "participantes da natureza divina" 2 Pd 1,4: tudo que Jesus é por natureza, cada ser humano o é por participação na natureza divina de-le. Jesus é o Filho, e nós, filhos por participação graciosa da natureza divina do Filho único. Jesus é a luz do mundo, nós, luz na sua luz. Jesus é a videira, nós, os ramos, que vivemos da mesma vida da cepa. Jesus é o Templo, nós, as pedras vivas da sua construção. Somos corpo no Corpo, templos no Templo. Eis a maravilha da redenção operada por Jesus. "Não sabeis que sois um templo de Deus e que o Espírito de Deus habita em vós? Não sabeis que vosso corpo é templo do Espírito Santo, que está em vós e que recebestes de Deus e que, portanto, não pertenceis a vós mesmos? Alguém pagou alto preço pelo vosso resgate. Se alguém destrói o templo de Deus, ele o des-truírá. Pois, o templo de Deus é santo e esse templo sois vós. Estais edificados sobre o fundamento dos apóstolos e dos profetas, do qual o Cristo Jesus é a pedra angular. Nele, bem articulado, todo o edifício se ergue em santuário sagrado, no Senhor. Vós também, nele sois co-edificados para serdes a habitação de Deus no Espírito. Chegai-vos a Jesus Cristo, a pedra viva. Também, como pedras vivas, constituí-vos num edi-fício espiritual. Glorificai Deus em vosso corpo. Vós sois o corpo de Cristo e cada um por sua parte, membros seus. Tal é a certeza que temos diante de Deus, graças a Cris-to. Não como se fôssemos dotados de capacidade que pudéssemos atribuir a nós mes-mos, mas é de Deus que vem nossa capacidade. Pois é ele quem opera em vós o que-rer e operar, segundo sua vontade. Sendo assim, no nome de Cristo, exercemos a fun-ção de embaixadores e por nosso intermédio é Deus mesmo que vos exorta. Como o Pai me enviou, eu também vos envio. Ide pelo mundo todo, proclamai o Evangelho a toda criatura. Quem vos recebe, recebe-me, quem me recebe, recebe o Pai que me en-viou. Se me perseguiram, também vos perseguirão; se guardaram minha palavra, tam-bém guardarão a vossa. Quem vos ouve, ouve-me, quem vos despreza, me despreza, e quem me despreza, despreza o Pai que me enviou. E eles saíram a pregar por toda parte, agindo com eles o Senhor, confirmando a palavra por meio dos sinais que a acompanhavam" 1Cor 3,16; 2Cor 6,19-20; Ef 2,20-22; 1Pd 2,4-5; 2Cor 3,4-5; 5,20; Fl 2,13; Jo20,21; Mc16,15; Jo 15,20; Mt 10,40; Lc 10,16; Mc 16,20.

Portanto, em virtude de ser o Redentor, o Goel do ser humano, e tê-lo assumido, en-xertado no seu Corpo, "no qual habita toda a plenitude da Divindade", tudo que Jesus Cristo é por natureza, nós o somos por participação na natureza divina dele, pela fé. Jesus é Deus, nós somos divinizados. "Eu sou a luz do mundo; vós sois a luz do mun-do. O Verbo é a luz que ilumina todo homem quem vem ao mundo. Quem me segue não anda nas trevas, mas terá a luz da vida. A luz é a vida do mundo. Brilhe a vossa luz diante dos homens, para que, vendo vossas boas obras, glorifiquem o Pai celestial. Os esclarecidos (pela luz da fé) resplendecerão como o resplendor do firmamento; e os que ensinam a muitos a justiça brilharão como estrelas por toda a eternidade" Mt 5,14-16; Dn 12,3. Deus nos fez luz para brilhar, não para ser apagada. Nada de falsa modéstia, de humildade fingida, de complexo de coitadinho. Jesus diz expressamente: "Não se acende uma luz para ocultá-la, mas para colocá-la em lugar de destaque, para que brilhe à vista de todos. Brilhe a vossa luz diante do mundo". Não para encher de orgulho, para o deleite banal dos que a possuem, mas "para que os homens, vendo as vossas boas obras, glorifiquem o Pai que está nos céus". As boas obras da nossa luz é o humilde serviço aos irmãos, é a construção do Reino de Deus. A fonte da nossa luz são os dons, os carismas inatos, congênitos recebidos do Espírito Criador, Deus Mãe. "Há diversidade de dons, mas o Espírito é o mesmo; diversidade de ministérios, mas o Senhor é o mesmo; diversos modos de ação, mas é o mesmo Deus que realiza tudo em todos. Cada um recebe o dom de manifestar o Espírito para a utilidade de todos. A uns o Espírito dá a mensagem de sabedoria; a outros, a palavra de ciência; a outros, a fé; o dom das curas, de fazer milagres, da profecia, do discernimento dos espíritos, de falar em línguas e de interpretá-las. Mas é o único e mesmo Espírito que isso tudo realiza, distribuindo a cada um os seus dons, conforme lhe apraz. Deus estabeleceu em primeiro lugar, os apóstolos (os enviados por Jesus); em segundo lugar, os profe-tas (os inspirados por Deus Mãe, para falarem em nome de Jesus); em terceiro lugar, os doutores (cuja missão é ensinar a sã doutrina) e o dom de governar" 1Cor 12,28.

A nossa salvação dependerá da prática dos valores positivos presentes nos dons. Não adianta fingir incapacidade, omitir-se com medo de expor-se. Os que se omitem dian-te do mal que presenciam ou se recusam a brilhar pela prática do bem, Jesus os trata como iníquos. "Nem todo aquele que diz 'Senhor, Senhor' entrará no Reino de Deus, mas sim aquele que pratica a vontade do meu Pai que está nos céus (arrisca-se pelos valores do Reino). Muitos me dirão no Dia do Juízo Final: 'Senhor, Senhor, não foi no teu nome que profetizamos, expulsamos demônios, fizemos muitos milagres?' Eu lhes declararei, então: 'Nunca vos conheci. Apartai-vos de mim, vós que praticais a iniqüidade. E os malditos irão para a danação eterna, preparada para o diabo e seus anjos maus" Mt 7,21-23; 25,31-46. O medo de se expor é falta de fé e amor a Deus e ao próximo. Falsa modéstia, acomodação, fingimento não são virtudes, mas omissão covarde de gente sem fé. Mas quem tem fé viva, esperança e amor no coração, em vez do medo e omissão, põe mãos à obra para realizar os dons. Quem não é quente nem frio, fica em cima do muro da omissão, jamais brilhará e pagará alto preço pela omissão: serão vomitados pela Testemunha fiel e verdadeira (Ap 3,15s). Mas os que crêem no Cordeiro são estrelas, não satélites, parasitas acomodados. Têm luz própria com autonomia de brilho, sem precisar mendigar luz exógena para gerar vida em si e em torno de si. Cada pessoa tem luz própria, é estrela, não satélite, parasita de nin-guém. A luz de cada pessoa é pessoal, inimitável, diferente da luz das outras. Por isto, como as estrelas, cada pessoa tem brilho diferente das outras. Quem assume a própria luz brilha e reconhece o brilho da luz de outras pessoas, pois os dons de cada pessoa são diferentes dos dons das outras. As pessoas que brilham têm auto-estima elevada, se amam, vivem espalhando luz, vida em torno de si. Quem não assume a luz que re-cebeu de nascença, quem não se aceita é torturado pelo complexo de inferioridade e a baixa auto-estima, sente-se apagado, incapaz, inútil, acha que só outros são capazes. Tais pessoas, além de não brilharem, são invejosas, passam a vida apagando a luz das outras, criticando-os negativamente, sem proposta construtiva, nivelando todos a suas trevas. Mas, você que se assume, que abraça os dons que recebeu, por menores que sejam, você está no mundo para brilhar. Sinta-se feliz por ver outras pessoas felizes pela luz que você faz brilhar sobre elas. Você é transformador poderoso da luz de Je-sus no mundo. Jesus é a luz, a vida do mundo, e lhe comunicou sua luz para você bri-lhar em nome dele. "Brilhe a vossa luz diante dos homens, para que, vendo as vossas boas obras, glorifiquem o Pai celestial". A glorificação do Pai e Deus Mãe pode estar na boca alguém agradecido e feliz que lhe diz sorrindo: "Você é a minha luz".

Geraldo Barboza de Carvalho