ANIELLE KALINE DA SILVA ANDRADE DISCIPLINA ? PSICOLOGIA JURÍDICA ___________________________________________________________________ RESUMO: Diante ao aumento do número de atos infracionais cometidos por menores surgem as oposições de opiniões em relação a como agir frente a estes atos, afinal, há quem defenda os jovens abandonados e flagelados devido a uma sociedade desigual e há quem defenda a punição dos menores por achar que eles possuem mentes formadas para entender o que é certo para a sociedade e o que não é e agirem da forma que acharem mais conveniente, merecendo pagar por seus erros. Portanto, frente a estas opiniões e à curiosidade de saber como se dá o trabalho de reeducação social oferecido por instituições de internação de menores infratores, surgiu o interesse de produzir-se um artigo explicitando opiniões contra e a favor da imputabilidade penal dos jovens menores de 18 anos, no Brasil. Para tal construção, utilizou-se de observação de campo, entrevista a psicóloga da instituição caruaruense de medidas sócio-educativas - FUNASE e pesquisas bibliográficas. Palavras-chave: ato infracional, adolescentes, menoridade penal e imputabilidade. __________________________________________________________________ ATO INFRACIONAL: QUESTÃO DE POBREZA, CLASSE MÉDIA OU PERDA DA IDENTIDADE? Constantemente são noticiados na mídia jovens cometendo infrações e atos brutais que chocam toda população e causam revoltas. "Segundo a subsecretaria de promoção dos direitos da criança e do adolescente no ministério da justiça, em estudo de 2006, dos 15.426 menores privados de liberdade no Brasil, 85% foram apreendidos por crimes contra o patrimônio e trafico de drogas, e 15% por atentado contra a vida. Só 1% fez uso de atos cruéis em seus delitos." (CÉREBRO Mente e, o olhar adolescente. Pág.73). Costumamos ter esquemas formados de que os adolescentes em conflito com a lei são sempre aqueles excluídos da sociedade, pobres e que vivem em condições precárias, sem acesso a educação e a projetos governamentais. Este fato gera em nossas mentes até certo "entendimento" sobre seus comportamentos delituosos, justificando-os como carentes que cometeram infrações por necessidades básicas. Em contraponto a esta posição, podemos citar então, menores pertencentes à classe média e que cometem delitos com freqüência, tais como tráfico, roubos, homicídios, etc. Segundo José Filho "O crescente índice de infrações cometidas por adolescentes, demonstra o aumento da crise econômica e a incapacidade do Estado em promover o reequilíbrio social." A questão dos atos infracionais cometidos por jovens tem vários motivos implícitos, a começar por questões sociais, psicológicas e familiares. O Homem em sua formação de personalidade é levado a introjetar aquilo que presencia. Sabe-se que muitos dos delitos cometidos por adolescentes refletem a violência e os descasos do meio em que vivem, seja dentro de casa ou em seu meio social. Em seu livro, a delinqüência juvenil: seus fatores exógenos e a prevenção, César Leal nos diz que: "As infrações juvenis podem estar ligadas também a: pobreza, carência de autoridade, maus tratos, superproteção, abandono moral, privação paterna e/ou materna, falta de escolaridade, convívio em sociedade impróprios e meios de comunicação social. O crescente número de favelas pode acarretar também um maior problema frente ao combate da violência cometida por menores de classe baixa, pois, nestas áreas faveladas as pessoas passam mais fome, tem menos educação, menos ofertas de emprego e ainda são mais discriminadas." Atualmente, conforme afirma Hall (2001) em seu texto "a identidade em questão", vivemos uma imensa crise de identidade, devido as teorias de Karl Max, Freud, Saussure, Foucault e devido ao feminismo, que juntos abalaram todas as construções egóicas do homem e por isto ele procura apoiar-se em algo ou alguém para se reconstruir ou se auto-defender. Portanto, a violência, que levará aos delitos, pode ser também usada na construção da identidade, como corrobora Jurandir Costa em "Violência e Psicanálise" onde a violência aparece como necessária para a entrada do sujeito no mundo da cultura ou do simbólico. OPINIÔES EM RELAÇÂO À REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL, NO BRASIL. Vimos que há diversas opiniões em relação à diminuição da menoridade no Brasil, entre estas idéias podemos citar pontos contra e a favor. ? Contra redução da menoridade: a redução da menoridade acarretaria vários problemas sociais, tais como a necessidade de se construir mais cadeias públicas, que por sinal hoje já vivem com a capacidade extrapolada e nada se faz em relação a isso. Há também o fato de que apenas a redução da menoridade e a instituição de penas mais rigorosas sozinhas não bastariam para diminuir a quantidade de infrações cometidas por jovens, faz-se necessário também um trabalho de conscientização frente aos valores sociais, para conservarem-se as estruturas familiares e reduzir a violência na sociedade. ? A favor da redução da menoridade: entre os pontos citados a favor da redução podemos citar que pessoas com 16, 18 anos já sabem o que fazem, têm plena consciência de seus atos e livre arbítrio para escolher como se comportar, além de que pessoas adultas utilizam menores para executar seus crimes mais graves, pois sabem que eles não cumprem pena, apenas medidas sócio-educativas. Há ainda o fato dos índices de violência cometida por menores estarem aumentando e talvez a redução da menoridade penal trouxesse soluções para este problema. O ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE E A VISITA A FUNASE CARUARUENSE. O estatuto da criança e do adolescente, criado em 13/06/1990, nos diz que as delinqüências cometidas por menores não podem ser chamadas de "crimes" e sim de "infrações" e a condenação não pode ser chamada de "penas", mas sim de "medidas sócio-educativas em regimes de internação ou de semi-liberdade". Vale ressaltar que entre as leis implantadas pelo ECA há também a determinação de que o tempo máximo de internação de um adolescente em medidas de privação de liberdade é de até três anos, dependendo de sua conduta dentro da instituição. Em visita a uma instituição de proteção integral da cidade de Caruaru-PE, vimos que o principal propósito destas instituições é a reeducação e reinserção no convívio social. Porém, saímos com uma indagação na mente: será que lá dentro eles estão aprendendo a ser realmente pessoas com condutas socialmente aceitas ou estão aprendendo uns com os outros as experiências do mundo do crime? Será que medidas de privação de liberdade os fazem refletir sobre seus atos ou fazem com que estes menores sintam ainda mais raiva do mundo por privar-lhe de algo que ele sempre dispôs ? a liberdade? Em entrevista feita na FUNASE, com a psicóloga Keila Meneses, foi perguntado qual o papel do psicólogo na unidade da FUNASE e nos foi respondido que: "Seu papel é fazer o acompanhamento do adolescente na medida de internação, desde a entrada até a saída, dando-lhes informações, trabalhando os sentimentos dele, sua adequação ao regime e desenvolvimento nas oficinas e na educação formal. O psicólogo no âmbito jurídico é convocado a fazer uma avaliação temporária (que é determinada pelo juiz, uns pedem reavaliação de seis em seis meses, outros bimestrais, trimestrais, não passando de seis meses) por escrito que pode ser um parecer ou um relatório de acompanhamento a respeito da conduta do menor dentro da unidade. O parecer é conclusivo para decisão do juiz em relação a quanto tempo o menor ficará interno. O relatório de acompanhamento se faz em geral na entrada do adolescente na unidade, quando ainda não há subsídios suficientes para determinar o perfil do mesmo, até porque este fica assustado pelo fato de não saber como se dará a nova experiência, por isso, toda rotina e acontecimentos dos adolescentes é registrada pelo plantonista. Esses registros são lidos pelos profissionais diariamente para tal acompanhamento. A boa conduta é quem determina o tempo de estadia na unidade, que pode variar de 6 meses a 3 anos." (TRANSCRIÇÃO DE FALA) Na FUNASE estimam-se ter, aproximadamente, 140 internos, enquanto que a sua capacidade é para 90 internos. Na unidade estão juntas a internação provisória e as internações. A psicóloga relata que os extrapolamentos em outras unidades são maiores, com super lotação e que não há nenhuma instituição com total de internos ideal. Os adolescentes participam de atividades, tais como tapeçaria, costura básica, oficinas de músicas, escultura em barro e fabricação de roupas. Na unidade os profissionais trabalham com mediação de conflitos, os agentes trabalham em duplas, conversam com os adolescentes em caso de violência e ao determinar quem provocou o conflito este irá cumprir uma medida disciplinar. Na unidade as separações são feitas por idade e estrutura física. Visitas íntimas não existem no estado de Pernambuco, pois para isso teria que haver uma regulação ampla na infra-estrutura, aumentando os espaços físicos da unidade e profissionais para fiscalização das visitas e as mesmas ainda poderiam ocasionar confusões entre a família da parceira adolescente, caso ela seja menor de idade, e os internos. Na unidade os adolescentes participam de festas e comemorações como semana santa, dias das crianças para os que têm filhos, missas, cultos, quadrilhas, etc. As festividades são comemoradas junto aos funcionários, família e adolescentes, a unidade também aumenta os reforços de plantonistas para garantir a segurança das pessoas que estão presentes. A psicóloga ainda cita que alguns infratores têm a idéia de que estão na unidade apenas por um "furtozinho" e acham que não deveriam estar presos porque há pessoas roubando milhões e estão soltos por aí. Estas idéias servem também como uma negação de sua realidade, afinal, culpar os outros por aquilo que fizemos ou apontar erros ditos "mais graves" fazem com que eles se ponham no lugar de vítima e vítima sempre recebe a atenção, enquanto o delinqüente é injuriado, este fato mais uma vez reflete a violência e as infrações como um pedido de atenção ou de onipotência de alguém para com eles. A exemplo disso podemos citar a história do adolescente Sandro, do filme "ônibus 174", o mesmo era um jovem brasileiro que presenciou a chacina da candelária e foi abandonado pelos pais devido ao tráfico, aprende a atirar e a roubar, cresce e faz um ônibus de refém, sua história acaba quando um policial tenta matá-lo e ele cai disparando acidentalmente a arma e matando a mulher que ele havia feito de refém. Nota-se na tragédia que em momento algum o adolescente sabia o que queria, não exigia dinheiro ou algo do tipo, ele queria mesmo um pouco da atenção que nunca teve. CONSIDERAÇÕES FINAIS Hoje as pessoas tratam mais de buscar a punição para os menores em conflito com a lei do que tentar implantar métodos preventivos ou reavaliar onde nós, enquanto cidadãos, erramos ao discriminar aqueles de poucas condições e fechar os olhos para os descasos sociais. Portanto, preferimos deixar que nossos jovens se tornem monstrinhos violentos, que roubam, matam e furtam na tentativa de conseguir atenção ou cometem essas faltas para se vingar da sociedade que os criou assim, para depois tentar concertar o descaso trancando seus menores infratores em sistemas de proteção integral, como por exemplo, a FUNASE, antiga FUNDAC. É importante ressaltar aqui que não defendemos o crime ou a violência contra o próximo, defendemos a justiça e a preservação dos direitos alheios. Então para que a sociedade cobre de tais adolescentes os seus deveres de respeito à sociedade e ao outro, se faz necessário que o mundo ofereça a tais indivíduos condições promissoras para uma vida digna. Pretende-se com este trabalho fazer com que as pessoas reflitam sobre seu papel social antes de apedrejar aqueles que estão marginalizados e também mostrar a importância do profissional da psicologia que acolhe ao mesmo tempo em que mostra a realidade das personalidades que chegam às instituições na qual ele atua. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS. HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade, trad. T.T da Silva e G. L. Louro. 5ª ed. Rio de Janeiro. ZP e A, 2001. COSTA, Jurandir Freire. Violência e psicanálise. 3ª ed., Rio de Janeiro: Edições Graal, 2003. MELLO, Marilia Montenegro Pessoa de. Inimputabilidade penal: adolescentes infratores: punir e (res)socializar. Recife: Nossa Livraria, 2004. LEAL, Barros Leal. A delinqüência juvenil: seus fatores exógenos e prevenção. Rio de janeiro: AIDE, 1983. OLIVEIRA, Ana Sofia Schimdt de. Entre luzes e sombras. Mente e Cérebro, São Paulo. Ed.n.4 pág. 70 a 77. BARROSO FILHO, José. Do ato infracional . Jus Navigandi, Teresina, ano 6, n. 52, nov. 2001. Disponível em: . Acesso em: 07 jun. 2009.