VIOLÊNCIAS DE GÊNERO

Para além da espetacularização midiática cotidiana das violências de homens contra mulheres, vale ressaltar que as violências de gênero têm características socioantropológicas seculares.
Historicamente, o processo civilizatório imposto à nossa sociedade se desenvolveu através de uma socialização centrada na figura do homem em detrimento às mulheres. Dessa forma, durante muitos séculos, o imaginário social brasileiro reificou nas relações sociais a idéia de superioridade dos homens sobre as mulheres, confinando-as nas tarefas de dona-de-casa, cuidar da cozinha e dos filhos, servir ao marido com zelo e obediência.
Obrigadas a se submeterem ao “pacto do silêncio” e amordaçadas através de torturas físicas e psíquicas, as mulheres desde crianças são estimuladas a brincarem com bonequinha, de casinha e comidinha, para quando chegarem à idade adulta, mesmo que percebam alternativas de vida nas interações e contatos sociais, não escapem ao controle machista, autoritário e o veja como uma situação normal. Isso ainda acontece nos dias de hoje, cujas evidências se mostram tanto pelos números de violências contra as mulheres – as violências de gênero – quanto pela masculinização dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário – as violências simbólicas.
Na verdade, o controle social machista para garantir a passividade das mulheres é exercido de diversas formas e instrumentos. É um enquadramento perverso que se processa por meios internos (socialização) e externos (pressão social e força). O controle social pela força vai desde humilhações até a morte – geralmente de forma brutal – para inibir quaisquer desvios do comportamento estabelecido pelos homens para as mulheres.
Nesse sentido, os homens impuseram sobre as mulheres uma ordem de existência e de relação que não é unicamente natural (física e/ou biológica), mas uma ordem simbólica que atribui significações, valores e juízos a partir da unilateralidade de seus pensamentos. Diante desse contexto, o que pode – e não o que deve - ser feito para prevenir as violências de gênero? Particularmente, penso que muito, senão todas as discussões sobre a temática perderiam sua razão de ser. Dentre algumas possibilidades sugiro quatro movimentos.
Primeiro, é fundamental desconstruir a ordem simbólica de cunho machista instaurada no imaginário social, ressignificando os valores dimensionais que subjaz a relação entre homens e mulheres, a partir, por exemplo, da negação das brincadeiras machificantes de submissão das meninas.
Segundo, constituir planos locais de prevenção às violências de gênero com caráter intersetorial, visando uma aproximação das especificidades de cada realidade, para organizar e capacitar mulheres – e homens! – em práticas de sociabilidade de prevenção às violências de gênero na perspectiva de criação de fóruns de discussões locais permanentes.
Terceiro, exercer uma pressão social continuada sobre a ordem jurídica e política, através do acompanhamento de processos e mobilizações públicas, popularização da “Lei Maria da Penha” e empoderamento das mulheres.
Quarto, elaborar painéis, debates e cartilhas sobre a prevenção das violências de gênero, ou seja, colocar a questão na ordem do dia através das escolas, das Igrejas, dos discursos jornalístico e policial. Afinal, a idéia é desconstruir um processo de dominação de gênero instaurado há séculos.