Vagas nas Universidades Federais?

Tem sido veiculada na mídia, diariamente, uma propaganda governamental que afirma que o governo federal criou mais de duzentas mil novas vagas nas Universidades Federais, além de inúmeras novas Universidades e campi universitários.

Realmente é de se parabenizar tal atitude, pois será facilitado o acesso ao ensino superior gratuito a muitos jovens. Essa verdade é incontestável, e qualquer crítica sobre essa conquista será infundada. Os números apresentados são bons, pois o governo federal afirma que dobrou as vagas nas universidades. Mas a pergunta é: qual realmente será o público atingido? Essa é a verdadeira questão...

Causou-me muita preocupação o fato do governo estar investindo massivamente apenas na ponta da linha, ou seja, no ensino superior, e se esquecendo de investir nos caminhos que conduzem os alunos a essa conquista. Já passou da hora de termos ensino público primário e secundário de qualidade, a fim de que os alunos menos favorecidos tenham condições de igualdade de disputa com as classes mais abastadas pelas novas vagas criadas nas Universidades Federais.

Todos sabemos que as universidades públicas, via de regra, possuem ensino de alta qualidade, até mesmo superior ao fornecido por muitas faculdades privadas, como é o caso do ITA, do IME, da UFRGS, da UFPB, da UFPE, da UFSM, enfim, existem inúmeros exemplos que poderiam fazer parte desta lista. Não só as federais, mas também as estaduais. E tudo isso de maneira gratuita para o cidadão, dependendo o acesso apenas do bom ensino básico e do mérito do aluno. Mas onde o estudante poderá encontrar ensino pré-universitário de qualidade? Por que nossas escolas públicas não dispõem do mesmo conceito? Por que as nossas escolas primárias e secundárias, nos diversos níveis, são abandonadas a própria sorte, tendo falta de materiais, instalações precárias, carência de segurança interna e externa, planos de carreira nada atraentes aos professores, e baixos salários para os docentes? Embora alguns não percebam, são esses os caminhos que conduzem os alunos ao "Olimpo".

Infelizmente não mudando a estrutura do nosso ensino, nada mudará nas Universidades. Pesquisas comprovam que são os alunos oriundos das classes mais abastadas financeiramente que freqüentam as Universidades Federais, principalmente nos cursos mais concorridos. Isso não sou eu, humilde e ignorante cidadão do povo, quem está falando. São dados reais e incontestáveis, apresentados por organismos de credibilidade à nível nacional. Normalmente, a cursar nas faculdade públicas, o novo médico será o filho do médico, o novo advogado será o filho do advogado, pois esses possuem condições de pagar o melhor ensino para os seus filhos desde a infância. Mas de quê maneira o filho do pobre poderá competir em condições de igualdade com os alunos oriundos das escolas particulares, se freqüentou escolas carentes em todos os sentidos?

Ah, parece que nossos sábios governantes encontraram a solução: Sistema de Cotas. Cotas pela cor da pele e cotas pelo tipo de escola – pública ou privada. Quanta sabedoria... Uma solução paliativa e demagógica. É mais fácil criar novas vagas nas Universidades, e dividir tudo em cotas, que investir nas bases educacionais, para que todos os nossos jovens tenham educação de qualidade desde pequenos. É a milenar demagogia, tentando enganar o povo de boa fé. Será o retorno da velha política do "pão e circo"? A solução não são as cotas, mas sim educação primária e secundária de qualidade, tal qual a fornecida pelas instituições públicas de ensino superior. A verdadeira justiça somente virá dessa forma. Se foi possível realizar essa reforma na ponta superior da linha, também será possível reformar as bases da estrutura educacional. Basta vontade e verdade.

Outro grande problema enfrentado pelos alunos carentes nas Universidades Federais, é a falta de cursos noturnos. A ampla maioria dos cursos fornecidos e ampliados pelo governo, são os fornecidos no período diurno: manhã e/ ou tarde. Ou seja, se o aluno precisar trabalhar, e normalmente os pobres precisam, ou por precisarem custear livros e materiais, ou por serem oriundos de cidades do interior, ficarão obrigados a cursar qualquer curso oferecido à noite. Ou então trabalhar à noite para poder estudar durante o dia, invertendo perigosamente o relógio biológico. Ou, pior ainda, cursar o curso que deseja em faculdade particular, trabalhando durante o dia e, na maioria das vezes, nem conseguindo os recursos necessários para pagar o curso que realmente deseja. De qualquer maneira, sem a criação de novos cursos noturnos, as Universidades Federais ficam fadadas aos filhos dos ricos. O problema do acesso ao estudante de baixa renda permanece. Porém os de renda mais elevada podem comemorar as novas facilidades que terão para ingressar, em virtude do aumento do número de vagas.

Exatamente nesse problema eu me encaixei, e ainda me encaixo. Apesar de possuir condições de cursar uma faculdade mais disputada, caso ela existisse à noite, vejo-me obrigado a pagar o curso que desejo numa universidade particular, qual seja: Psicologia. Isso se deve ao fato da UFPE não possuir Psicologia no período noturno. E dezenas de amigos meus enfrentam o mesmo problema. No Brasil devem ser centenas de milhares, se não milhões...

Então já passou da hora da demagogia ir embora do nosso País e de ocorrer uma mudança de atitude dos governantes que gostam apenas de apresentar números. Na verdade os números apresentados são bonitos, mas nem de longe resolveram os problemas enfrentados pelos alunos de baixa renda e que precisam trabalhar. A solução é simples: criar mais cursos noturnos, e investir na educação básica, pilares que formarão o cidadão consciente e apto a lutar em condição de igualdade com o outro que possui condição financeira mais favorecida. Sem isso não haverão mudanças, e pouca gente se deixará enganar pelos números. Afinal, com perdão da redundância, números são apenas números. Agora resolver a questão exige muito mais boa vontade, além duma visão um pouco diferente e superior da que andamos vendo por aí. Deus nos deu inteligência e sabedoria. Não sejamos enganados por aqueles que oportunamente se julgam mais sábios que nós.