Utilizando o jogo de quebra cabeças para o ensino de Ciências Biológicas
Renata Rafaela Alves Gomes
Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Centro de Biociências, Departamento de Fisiologia - PIBID ? Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência ?
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Resumo
O ensino e aprendizagem de Biologia deixam bastante a desejar na proposta pedagógica tradicional. Este modelo aplicado em sala de aula é visto como umas das causas da dispersão dos alunos em torno do ensino, que o vêem como algo tedioso e insignificante. Portanto, um dos grandes desafios da educação atual, seja na Biologia ou em outras áreas, é despertar o interesse, curiosidade e atenção do aluno. Reconhecendo esta dificuldade, há cada vez mais a necessidade da aplicação do lúdico no processo de ensino aprendizagem. Diante disto, o objetivo deste trabalho foi o de produzir um jogo que auxilie o professor e facilite a fixação do conteúdo pelo aluno. O jogo é um "quebra cabeça citológico" composto por trinta e duas peças o qual aborda as organelas e outros componentes pertinentes à célula. Os alunos irão aprender sobre citologia de uma forma diferente e divertida, tendo para isso que estimular o raciocínio, memória, lógica, paciência, e conhecimentos. Para o professor, o jogo é um modelo que pode ser modificado para utilizá-lo em cima de outros assuntos da Biologia. O jogo foi aplicado na Escola Estadual Peregrino Júnior, em Natal-RN, e avaliado por quinze alunos que o utilizaram. A maioria dos estudantes gostou do jogo porque o achou divertido e fez com que eles recordassem do conteúdo dado anteriormente. A perspectiva é difundir o jogo para mais alunos e professores para se obter resultados mais amplos. Todavia, esses resultados já demonstram o que é confirmado por vários estudiosos, de que a ludicidade pode se tornar uma aliada no processo de ensino aprendizagem, despertando o interesse dos alunos, e consequentemente a motivação dos professores.
Palavras chave: lúdico, jogos, ensino, aprendizagem, Biologia.

1. Introdução

O ensino de Biologia é uma prática de difícil ministração por parte dos docentes, que não conseguem envolver seus alunos de forma a proporcioná-los o que há de ponto principal na educação: a aprendizagem. Reconhecendo esta dificuldade, seja pela má formação dos professores ou indisponibilidade dos alunos em aprender, entre outras várias causas, há cada vez mais a necessidade da utilização do lúdico no processo de aprendizagem, aplicando-se não apenas à Biologia, mas também às outras áreas do ensino.
Segundo Kishimoto (1996), o professor deve rever a utilização de propostas pedagógicas passando a adotar em sua prática aquelas que atuem nos componentes internos da aprendizagem, já que estes não podem ser ignorados na prática do ensino para o aluno. Neste sentido, a utilização do lúdico vem sendo acatada pelos profissionais da educação, não como substituição ao método "tradicional", mas como ferramenta complementar no processo de ensino-aprendizagem.
O lúdico tem sua origem na palavra latina "ludus" que significa "jogos", "brincar". Porém, a ludicidade não é uma simples brincadeira. O desenvolvimento do aspecto lúdico facilita a aprendizagem, o desenvolvimento pessoal, social e cultural e colabora para boa saúde mental e física. Nos últimos anos, com a ampla divulgação das idéias e práticas construtivistas, esse recurso pedagógico vem ganhando espaço crescente nas escolas, mas a quantidade não garante a qualidade (Cunha, 2001, p.13). O lúdico deve ser uma estratégia voltada para uma aprendizagem mais eficiente, sem perder o objetivo central de ensinar, porém de uma maneira divertida e diferente.
Segundo Schiller, a humanidade se completa quando há possibilidade de entretenimento, que se traduz em ludicidade. E, como afirma Simon Goldhill (2007: 196), "o entretenimento é uma atividade fundamental na definição de si mesmo- para os indivíduos, para os grupos e para a própria cultura". Este, talvez seja o grande desafio do educador: como entreter o aluno. É justamente esta finalidade que as atividades lúdicas proporcionam. Despertar a curiosidade e o interesse de forma a envolver o aluno ao contexto disciplinar.
Os jogos são os métodos lúdicos mais utilizados na prática do ensino. Johan Huizinga (1990) afirma, em sua tese sobre Homo ludens, que o jogo antecede à cultura: "é no jogo e pelo jogo que a civilização surge e se desenvolve". Para Piaget (1998), o jogo é essencial na vida da criança. Ele constitui-se em expressão e condição para o desenvolvimento infantil, uma vez que as crianças quando jogam assimilam e podem transformar a realidade. Isto se aplica não apenas às crianças, mas pode se estender à todas as faixa etárias, partindo do princípio de que, independente da idade, todos gostam de aprender de forma mais divertida.
Apesar de favorecer a descontração na hora de aprender, os jogos devem ser elaborados de maneira a induzir o aluno ao raciocínio, à soluções de problemáticas, à reflexão, ao pensamento e, consequentemente, à (re) construção do seu conhecimento, a fim de que o jogo não se torne apenas um passatempo. Para que se alcance esses objetivos e conseqüente aproveitamento do aluno em relação aos jogos, os professores tem que estar atentos às finalidades que querem alcançar com a aplicação dos mesmos, formatando-os de acordo com a faixa etária, assunto abordado em sala de sala e principais dificuldades apresentadas pelos alunos.
Portanto, o jogo constitui-se em um importante recurso para auxiliar o professor, pois ajuda na habilidade de resolução de problemas, favorece a apropriação de conceitos e atende às necessidades da adolescência, estimulando os alunos a construírem ou refazerem conceitos (CAMPOS; FELÍCIO; BORTOLOTO, 2003).
Diante destes fatos, foi criado o "quebra cabeça citológico", visando o ensino de citologia de forma fácil e dinâmica, uma vez que este assunto está entre um dos mais difíceis de ser aprendido pelos alunos, e é, em contrapartida, de fundamental importância para a compreensão dos seres vivos, ou seja, da Biologia.

O quebra cabeça é composto por trinta e quatro peças e, como dito anteriormente, abordar o conteúdo de citologia. A base onde será montado o jogo tem trinta e quatro figuras de organelas celulares e outros componentes que compõem as células, com suas respectivas imagens para ilustrar e facilitar na assimilação. Alguns são: ribossomos, membranas, cromossomos, núcleo, cílios, citoplasma, e os demais (figura 1).

1- Base para montagem do quebra cabeça citológico.
Atrás de cada peça do quebra cabeça tem uma informação à respeito de uma organela ou componente da célula (figura 2), que guiará o aluno à associá-la à sua respectiva figura presente na base. A utilização da imagem junto ao nome, das estruturas celulares, ajudará o aluno a recordar sobre o conteúdo visto ou a melhor fixá-lo quando for lecionado, associando o nome à imagem.

2. Peças do quebra cabeça citológico
À medida que o aluno for associando corretamente cada peça à sua respectiva estrutura celular, vai se formado a imagem de uma célula (figuras 3-4).

2- Quebra cabeça incompleto.

3- Quebra cabeça montado.
É importante esclarecer que somente o jogo não fará com que o aluno aprenda todo o conteúdo. É necessário que isto se faça previamente pelo professor, e que o jogo tenha o papel de fixar o conteúdo de forma mais eficaz por parte do aluno.
Logo, o objetivo deste trabalho é fornecer ao professor uma ferramenta lúdica para auxiliar o ensino de citologia, e desta forma:
? Estimular os alunos a relembrar o assunto visto previamente;
? Ajudar na fixação do conteúdo;
? Trabalhar o raciocínio, associação, lógica e organização de idéias dos alunos.

2. Material e método
Para construir o quebra cabeça citológica foram utilizados:
 Uma cartolina (cor opcional);
 Figuras das estruturas celulares (tiradas da internet);
 Folhas de papel ofício (para impressão das imagens e fixação na cartolina);
 Papel foto (para impressão da célula que será montada);
 Cola, tesoura e lápis.
A aplicabilidade do jogo foi testada na Escola Estadual Peregrino Júnior, Natal-RN, na turma do segundo ano EJA noturno. Ao todo quinze alunos participaram e avaliaram o jogo.
Primeiramente foi perguntado aos alunos se estes já haviam tido aula sobre citologia, e não houve uma convergência na resposta, mas disseram que já ouviram ao menos falar sobre o assunto, porém não lembravam muito sobre o mesmo. Após esta sondagem, o quebra cabeça foi posto no centro da sala e os alunos se puseram ao redor dele. Cada estudante retirou uma peça e leu em voz alta a característica escrita atrás da mesma. Após a leitura todos os alunos iam ajudando a encontrar a organela correspondente à característica, juntamente com dicas que iam sendo dadas a eles ao longo do jogo.
Após a montagem do quebra cabeça os alunos avaliaram o jogo dentre cinco opções que lhes foram dadas:
 Divertido, no entanto, não pude utilizá-lo muito bem por não me recordar do assunto/ não vi ainda o conteúdo.
 Divertido, e me permitiu recordar os conteúdos já vistos na escola.
 Não gostei, pois não consegui compreender.
 Não gostei, pois considero o nível do jogo muito avançado.
 Não gostei, por outros motivos. Cite-os.
Além destas alternativas também foram feitas mais três perguntas:
? Numa escala de 1 a 10, que nota você atribui ao jogo?
? Que sugestões você daria para melhoria desse jogo paradidático?
? Você acredita que a aplicação de jogos educativos pode ajudar na fixação de conteúdos? Justifique.

3. Resultados e discussão
Diante da aplicação do jogo em sala de aula, constatou-se que o mesmo teve uma boa aceitação, pois doze dos quinze alunos avaliaram o jogo como sendo divertido, uma vez que permitiu recordar o conteúdo já visto na escola. As duas avaliações negativas foram justificadas pela não compreensão do mesmo e por ser considerado de nível avançado.
Com relação às notas atribuídas ao jogo (de 1 a 10), a distribuição ficou assim: seis alunos deram nota 10; três alunos deram nota 9,0; dois alunos deram nota 8,0; e os outros três alunos deram notas 6,5, 6,0 e 5,0.
No tocante às sugestões dadas para melhoria do jogo, algumas foram destacadas: "Queria mais tempo"; "Mais organização no grupo". "Que tivesse sido avisado, pois teria dado uma olhada na matéria"; "Fazer várias vezes"; "Mais capacidade de brincadeira"; "Um quebra cabeça maior"; "Um tempo para ser estudado para poder ter lógica no jogo"; "Fazer outras cópias para distribuir para os alunos.
Com relação à última questão, se os alunos acreditam que a aplicação de jogos educativos pode ajudar na fixação de conteúdos, 99% dos alunos responderam que sim, e as justificativas foram bastante diversas: "Sim, porque a gente aprende mais através das figuras"; "Sim, pois ajudaria a melhorar nossos conhecimentos"; "Concerteza além de ser divertido nos ajuda a relembrar o que já foi visto"; "Sim, pode ajudar mais na memória"; Sim, por que estaria colocando em prática o que está vendo em sala de aula"; "Sim, porque a gente aprende mais sobre Biologia"; "Sim, pode ajudar as pessoas a melhorar o raciocínio".
Estas justificativas corroboram o que muitos estudiosos da área da educação afirmam, em particular Campos ET AL. (3), que diz que os jogos didáticos por aliar aspectos lúdicos aos cognitivos, são uma importante estratégia para o ensino e aprendizagem de conceitos complexos e abstratos, favorecendo a motivação interna, o raciocínio, a argumentação e a interação entre professores e alunos.

4. Conclusão
Portanto, as práticas didáticas com jogos lúdicos mostram que esta forma de ensino não é simplesmente uma maneira de "fugir" do padrão tradicional de ensino, mas uma ferramenta importante que auxilia o processo ensino-aprendizagem por estimular diversos potenciais dos alunos, tais como raciocínio, lógica, memória, associação, estratégias, decisões, soluções, entre outros. Diante, destes fatos, o uso da ludicidade nas escolas pode não ser a solução para uma educação de qualidade, mas com certeza é um passo para que se consiga chegar lá.

5. Referências
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