* Amaury da Silva dos Santos,
*Humberto Rolemberg Fontes,
*Fernando Fleury  Curado e
*Joézio
Luiz dos Anjos


A Embrapa Tabuleiros Costeiros possui um Campo Experimental que se localiza no município de Itaporanga D’Ajuda (Sergipe), denominado Reserva do Caju. Trata-se de uma antiga fazenda produtora de coco, que foi adquirida para desenvolver pesquisas com aquela  cultura, onde se encontra atualmente o banco ativo de germoplasma do coqueiro. Ocupa aproximadamente 1.000 ha com áreas naturais e antropizadas de fitofisionomias associadas a Floresta Atlântica como o mangue, restinga e mata de restinga, com rara beleza cênica . Identificou-se na área uma nova vocação, que seria a de se tornar um centro de referência em educação ambiental. Atualmente, parte do Campo Experimental está em processo avançado junto ao IBAMA para tornar-se uma Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN).

No entorno da Reserva do Caju, as áreas são ocupadas por comunidades de pescadores artesanais, agricultores familiares tradicionais e de assentamentos rurais, fazendas com predomínio do cultivo do coqueiro e criação de camarões. Com o objetivo de estimular o diálogo de saberes e intercâmbio técnico-científico das comunidades do entorno da reserva, com técnicos e estudantes e outros agentes de desenvolvimento foram instaladas vitrines agroecológicas, como forma de viabilizar o desenvolvimento da região.

Vitrine Policultivo
Realizou-se inicialmente o diagnóstico dos sistemas de produção no assentamento Darcy Ribeiro, localizado no entorno da Reserva onde foram identificados sistemas diversificados, predominando o policultivo, ou seja, o cultivo de várias culturas em um mesmo ambiente de forma sincronizada segundo uma racionalidade que considera a combinação entre as plantas, as condições do solo e o aproveitamento do espaço de produção.

Após o conhecimento dos sistemas de produção dos agricultores assentados e que, em grande medida, se reproduzem nas demais comunidades locais, optou-se pela replicação da lógica produtiva destes agricultores na Reserva do Caju. Neste sentido, buscou-se a associação dos saberes dos agricultores aos conhecimentos gerados pela pesquisa, inicialmente na forma de uma vitrine tecnológica para observações e fonte para intercâmbio com agricultores, técnicos e estudantes. A conformação dessa vitrine também possibilitará a identificação de eixos de pesquisa em Agroecologia fundamentados nas experiências dos agricultores familiares desta região.

A vitrine de policultivo foi instalada em uma área bem representativa à encontrada nos assentamentos rurais da região, ou seja, solo com textura arenosa classificado como Neossolo Quartzarênico, caracterizado pelos baixos níveis de fertilidade e de matéria orgânica, além de pouca disponibilidade de água, principalmente no verão, que nesta região corresponde ao período seco do ano.

Iniciou-se com o plantio de coqueiros (Cocos nucifera L.) em espaçamento 10x10m em quadrado, objetivando maior espaço entre linhas e plantas, onde seriam inseridas outras culturas. Os coqueiros (híbrido de coqueiro gigante e anão) foram plantados em berços com 60 x 60 x 60 cm onde se adicionou casca de coco, esterco, hiperfosfato de gafsa, sendo a planta mantida com cobertura morta. Foi instalado também um sistema de irrigação por micro aspersão dos coqueiros, utilizado durante o período seco para manutenção das plantas, como irrigação de salvação. Buscou-se adotar tratos culturais agroecológicos, como o uso de adubo orgânico na forma de composto e o uso de cobertura morta, visando a proteção das plantas ao calor durante o verão. Cerca de um ano após o plantio, os coqueiros apresentam muito bom desenvolvimento, de acordo com as avaliações realizadas para circunferência do coleto, número de folhas vivas e número de folíolos da folha três.

Nas linhas de plantio dos coqueiros, optou-se pelo plantio de mudas de gliricídia (Gliricidia sepium (Jacq.) Steud) que serviriam para adubação verde e fonte biomassa para cobertura do solo. Essas plantas foram adubadas com esterco e hiperfosfato de gafsa. Entre as linhas de coqueiro semeou-se no primeiro ano feijão-de-porco (Canavalia ensiformis DC.) e mandioca (Manihot esculenta Crantz.). O feijão-de-porco foi cortado no início da floração e depositado na superfície do solo, servindo de cobertura morta para a mandioca. No início das chuvas de 2009, iniciou-se o plantio das culturas anuais: milho (Zea mays L.), feijão de corda (Vigna unguiculata (L.) Walp.) e mandioca.

 Após a colheita do feijão, foi semeada abóbora na zona de coroamento dos coqueiros (duas covas / coqueiro) correspondente a área de abrangência dos microaspersores.

 
Compostagem e Vermicompostagem

No processo de produção do composto, são utilizadas camadas sucessivas contendo biomassa vegetal (capim, cana-de-açúcar, glirícidia, etc.), esterco bovino ou ovino, hiperfosfato de gafsa e calcário. Após a montagem, cada camada é umedecida com água e biofertilizante líquido (Biogel). O uso do biogeo serve como inóculo para favorecer o processo de decomposição. O Biogeo é um produto de outra vitrine que será descrito posteriormente.

Em 15-20 dias o composto é revirado, ou seja, as camadas mais inferiores vêm para a parte de cima e vice-versa. Este processo é feito visando a aeração e uniformidade da decomposição dos resíduos orgânicos. Este processo é repetido a cada 15 dias até o momento que apresente textura parecida com borra de café e com cheiro de terra, a partir de 90 dias de sua implantação.

A vermicompostagem, técnica de produção de adubo orgânico com a contribuição das minhocas, principalmente Eisenia. fétida e Eudrilus eugeniae, introduzidas no sistema após a fase termófila do processo de compostagem, tendo como o intuito agilizar a transformação de resíduos orgânicos em húmus mais rico em substâncias de crescimento e com potencial de maior disponibilização de nutrientes. Na área, existem três minhocários que são formados por canteiros de alvenaria com dimensões de 10,0 X 1,0m onde são mantidas minhocas e resíduos orgânicos - esterco de curral e restos vegetais, como manga, gliricídia, caju, entre outros. O espaço é utilizado para discussão e troca de experiências com o público – agricultores, professores, alunos etc – sobre a importância ambiental da reciclagem dos resíduos orgânicos das propriedades, escolas, municípios e domésticos. O público é estimulado a construir em suas propriedades, ou mesmo residências, estruturas adaptadas às suas condições.

Em ambas as vitrines destaca-se na discussão, a importância do aproveitamento dos resíduos produzidos na propriedade, estimulando que façam seus compostos com o que está disponível, uma vez que o que está implantado na vitrine é apenas um modelo, mas cada um pode produzir o seu próprio desenho.

 

Biofertilizantes líquidos

Existem diferentes tipos de biofertilizantes, podendo ser aeróbicos ou anaeróbicos. Na Reserva do Caju há dois modelos, conforme descrito a seguir.

O Biogeo utilizado na vitrine é um biofertilizante aeróbico rico em nutrientes para as plantas, e também pode ser útil no controle de pragas e doenças. É produzido numa caixa d’água ou qualquer outro recipiente disponível, onde são adicionados à água esterco bovino (ou outros), farinha de rochas, tortas, leveduras, xisto, cinzas, etc, ou seja, restos de matéria orgânica disponíveis. Este conjunto de materiais com água é arejado constantemente para que predominem no sistema microrganismos aeróbicos.

O biofertilizante líquido anaeróbico é constituído por um recipiente (bombona) onde são distribuídos 40% de esterco e outros 40% de água. A bombona é totalmente vedada, e há uma conexão com um tubo que se ligará a um outro recipiente com água, que tem o objetivo de liberação de ar da bombona. Assim como o Biogeo, este biofertilizante pode ser usado tanto como biofertilizante como no combate a pragas e doenças.

 Adubos Verdes

Nessa vitrine são mantidas coleções com linhas de plantios de diferentes espécies utilizadas como adubo verde, onde são estimulados os debates e troca de experiências sobre essa prática, principalmente a fixação biológica de nitrogênio, a conservação do solo com plantas de cobertura e reciclagem de nutrientes. Atualmente a vitrine conta com as seguintes plantas: gliricídia, feijão de porco, guandu, mucuna preta, feijão caupi e crotalária.

 Sistemas Agroflorestais - SAF’s

Também utilizamos como vitrines três áreas de SAFs anteriormente montadas, para discussão do uso dessa ferramenta nas pequenas propriedades, adaptando a cada realidade, tendo como foco o quintal produtivo.

 
Visitas a Remanescentes de Mata Atlântica

Na Reserva do Caju ocorre o projeto Embrapa Escola que tem por foco a recepção de estudantes de ensino médio e fundamental para a discussão de sistemas ecológicos da mata, importância de espécies e de sua preservação.

Desde que as vitrines foram montadas, a Reserva do Caju tem sido alvo de visitas freqüentes, incentivando o estabelecimento de novas vitrines, assim como a potencialização daquelas já existentes.

Durante pouco mais de um ano ocorreram  visitas de agricultores, professores, estudantes e membros das comunidades do entorno de vários municípios do Estado de Sergipe, sempre recebidos por membros do grupo temático de agricultura familiar da Embrapa com apresentações e discussões por meio de metodologias participativas, um diferencial  didático aos “dias de campo” tradicionais. Os agricultores do Assentamento Darcy Ribeiro foram os primeiros a visitar as vitrines, ainda no seu início. Ainda assim eles conseguiram se enxergar dentro do processo e ao mesmo tempo se colocando para novos projetos. Existe um diálogo freqüentes entre todos, buscando a interação constante entre as vitrines apresentadas com a realidade dos agricultores. Os agricultores são “provocados” a mostrarem suas experiências, identificando nesses momentos vários agricultores-experimentadores e suas idéias, as quais poderão ser utilizadas na montagem de novas vitrines e ações de pesquisa orientadas pelas demandas identificadas junto aos grupos, uma vez que se entende que é um processo dinâmico.

* Amaury da Silva dos Santos, Humberto Rolemberg Fontes,  Fernando Fleury  Curado e  Joézio Luiz dos Anjos são pesquisadores da Embrapa Tabuleiros Costeiros