A droga é um mal que assola a sociedade mundial. Os danos causados por ela dificilmente podem ser identificados como um todo ou classificados através de pesquisas, dada a proporção de seus efeitos, já que suas mazelas ocorrem nos mais diversos locais, classes sociais, faixa etárias e demais formas de classificação social.

Há muito se questiona o combate às drogas, mas, via de regra, os atos efetivos de política criminal focam-se na legislação e repressão penal.

O mundo traz exemplos diferenciados de pacificação social sobre o tema “drogas”, porém, excluindo atuações que considerem pensamentos em longo prazo, investindo em educação, saúde, e cidadania, como ocorre na Suíça, por exemplo, não tenho conhecimento de outras que surtiram efeito positivo adequado. Diferente do que muitos acreditam, a liberação do uso da droga, autorizada em determinada região, na cidade de Amsterdã, Holanda, não resolveu nada quanto ao tráfico e uso desequilibrado de entorpecentes. As drogas autorizadas na região supra citada, são as de origem natural (maconha, haxixe etc). Porém, é comum ser abordado na rua por indivíduos trajando capas, totalmente drogados, oferecendo substâncias psicotrópicas de origem química das mais diversas, penduradas na parte interna do paletó. Apesar de este ato ser crime apenado severamente pela legislação holandesa, eles abordam os transeuntes dizendo: “Do you wanna a chocolat?” (você quer um chocolate?). Outro fato que demonstra a ineficácia da política holandesa é quanto ao local determinado para a liberação do uso, que hoje, pelo costume e imposição do vício, se estende a quase toda a cidade de Amsterdã.

No Brasil, no ano de 2006, nova tentativa legislativa foi aprovada na intenção de controlar as mazelas da droga sobre a sociedade. Entretanto, desta vez, novo foco foi abordado, observando o indivíduo usuário como ente a ser protegido também. Os artigos 20 a 26 da Lei 11.343/06, descrevem toda uma necessidade de proteção ao usuário de drogas, extensivo até mesmo aos seus familiares, demonstrando sua vulnerabilidade frente ao vício. O artigo 22, em seu inciso I determina inclusive o respeito ao usuário e ao dependente de drogas. Em contra partida a esse entendimento, o artigo 28 da referida Lei, prescreve penas determinadas ao usuário. Controverso o caso. Se o indivíduo é um vulnerável, que precisa de ajuda e merece respeito, por que o submeter a penas?

A doutrina diverge sobre a nova norma ter descriminado o usuário ou não. Eu mesmo, submetido aos ensinamentos do professor Luiz Flávio Gomes, acreditei na tese de uma situação sui generis da norma, ou seja, uma nova regra que criou situação inusitada em si mesma. Entretanto, tecnicamente falando, nulla poena sine crimen (não há pena sem crime), portanto, se o usuário pode ser submetido a penas, cometeu crime. E assim entendeu recentemente o STF, determinando que a Lei de Drogas não descriminalizou o fato, mas promoveu uma despenalização, a pena não deixa de existir, mas foi radicalmente reduzida em relação a norma legal anterior.

Em meu entendimento após raciocínio jurídico e social acredito ser, como na primeira tese apresentada aqui, o usuário de drogas vítima do vício, da condição social, do meio em que vive e da falta de educação e cidadania.

A Lei 11.343/06 apresenta dicotomia ou contradição lógica quando determina penas para alguém que ela mesma julga debilitada e dependente. Políticas criminais voltadas exclusivamente para a punição como repressão a determinado fato são populistas, eleitoreiras e normalmente ineficazes. Não se pretende evitar o fato, mas punir quem o pratica. A resposta do Estado à sociedade não é preventiva, mas repressiva. Hoje são apenados os usuários de drogas, amanhã os alcoólatras, depois os fumantes, os jogadores, os pobres, o hipossuficiente etc.

 

Lúcio Corrêa Cassilla

Advogado e pedagogo especialista em Ciências Criminais.

www.cassillaadvocacia.com

[email protected]