Universal, Nacional, Regional:

Influências e intenções em Alencar

Vivências e reflexões em Guimarães.

 

 Resumo

 

O nacionalismo apresentado por José de Alencar foi fruto de um estudo profundo sobre as coisas do Brasil. Ele expõe costumes contrários à perspectiva de uma sociedade homogênea até então, não retratados por outros escritores.O nacionalismo de Alencar revela  as peculiaridades locais, nos quais hábitos e estilos de vida, dos povos indígenas por exemplo,era tema que se diferenciava da civilização “niveladora”. Posteriormente a Alencar também com expectativa de tratar sobre  idéias nacionais, João Guimarães Rosa parte do primitivo espaço do sertão,  e desenvolve sua obra, cujo objetivo é fundir o mais universal ao mais regional,  cuidando de profundos temas sobre a humanidade através de recortes de uma realidade particular. Enquanto Alencar transita das lendas primitivas para fixar o que é regional, Guimarães expõe aspectos nacionais vinculados a ideais universais. Possuídos pela ideologia nacionalista de José de Alencar muitos escritores procuraram, nas suas obras literárias, lidar com aspectos regionais, o que proporcionou conseqüentemente, o desenvolvimento do regionalismo.

 

Palavras-chave: nacionalismo, José de Alencar, João Guimarães Rosa, regional, regionalismo.

 

REGIONALISMO : PROJETO NACIONALISTA

 

A literatura regionalista inicia-se no Brasil durante o Romantismo e desenvolve-se durante os anos 30 e 40. Este gênero  realçou a região focalizando temas específicos desta.Faz parte do projeto nacionalista na medida em que tematiza de forma idealizada a vida e os costumes do brasileiro. Dentro dessa perspectiva, os regionalistas reproduziram também os ideais do maior ficcionista romântico nacional, José de Alencar. Ele declarou ser nacionalista ao formar uma literatura autenticamente brasileira, que retratava o Brasil.

José de Alencar constituiu, portanto, o panorama brasileiro focalizando desde o mundo selvagem e a miscigenação branco-índio até a sociedade burguesa no campo e na cidade, tendo como base concepções universais para construir o nacional. Suas abordagens abrem o caminho do regionalismo para as representações literárias. Em O sertanejo e O Gaúcho, Alencar procura realçar o íntimo relacionamento entre o homem e o meio físico, para tanto, mostra regiões diferentes do sertão nordestino e dos pampas gaúchos. Também permeados pelo caráter regionalista estão Til e O tronco do Ipê, obras estas voltadas para o meio rural.

De acordo com as expectativas de Alencar, cujas, eram fundir o universal ao nacional, está João Guimarães Rosa que dentro deste nacional consegue vincular o regional com profunda descrição visual, lingüística e filosófica.

O estudo das manifestações regionalistas é de grande importância para o reconhecimento dos aspectos sócio-historico-culturais do  local focalizado. Contudo,. Convém observar que a ficção regionalista se propõe a ir muito mais além do que apenas retratar exclusivamente as peculiaridades de uma determinada região. Este gênero possui abordagens criticas e propõe, como nas obras de Guimarães, reflexões que reúnem o essencialmente universal ao especificamente local.

Este trabalho objetiva analisar abordagens literárias que revelem significações universais, nacionais e regionais. Para tanto, serão comparados dois escritores que procuraram explorar valores e reflexões universalistas efetivamente voltados para o âmbito nacional e regionalista brasileiro. José de Alencar e João Guimarães Rosa, esses escritores construíram o nacional procurando realçá-lo com traços universais.

 

ALMA DA PATRIA BRASILEIRA: IDENTIDADE NATIVA

 

José de Alencar pretendeu construir a identidade nacional escrevendo-a, pois ele entendia que “a literatura nacional (...) outra coisa não é senão a alma da pátria”. Dentro dessa concepção, Alencar procurou rechear de nacional as suas obras, provando que havia conteúdos nativos, representantes da essência brasileira para serem apresentados. Tal atitude, explica essa fase de Alencar: “É oco (...) o Brasil não tem poesia nativa, nem perfume seu”.

Na verdade, o “oco” que incomodava José de Alencar não significava que o país estivesse vazio, no sentido de ausência de conteúdos e de histórias para serem contadas. Estava sim, cheia de acontecimentos inaceitáveis diante da expectativa de uma sociedade europeirizada que pretendia prevalecer. Diante disso as manifestações nacionais  não eram cultivadas, já que a sociedade da época não poderia ser louvada como essencialmente nacional, tal fato fazia com que essas manifestações fossem evitadas. Posteriormente

Possuídos pela ideologia nacionalista de José de Alencar muito escritores procuraram apresentar a “alma da pátria” através de recortes dessa pátria. O homem passou a configurar-se nas obras literárias, como sendo síntese da sua região, fixando-se como tipo possuidor de costumes e linguagem específica. Além do mais, os autores da primeira fase regionalista objetivavam retratar as peculiaridades locais, expondo acontecimentos em ambientes onde os hábitos e os estilos de vida se diferenciavam da civilização “niveladora”. É dentro dessa perspectiva, que o Regionalismo exala o “perfume seu”, efetivamente nativo.

Esse tipo de trabalho visando o âmbito regional teve como influência às idéias do precursor do nacionalismo, José de Alencar. De um estilo que refletia a simplicidade das cenas, que tirava proveito dos dialetos populares e que se limitava ao pitoresco; o Regionalismo passa a ser mais literário no sentido de se tornar menos objetivo e mais interpretativo, procura acima de tudo expressar intenções denunciadoras, assim, configurou-se e desenvolveu-se como um gênero literário dinâmico ao longo dos anos.

 Assim como José de Alencar, João Guimarães Rosa também apresenta idéias nacionalistas, reconhecendo-se no regionalismo universal. Partindo do primitivo espaço do sertão, como Alencar que partiu do primitivo espaço indígena, Guimarães Rosa começa a delinear as veredas de um grande sertão que para ele é o mundo.

A obra de João Guimarães Rosa tem caráter universalista porque este escritor conseguiu fundir o mais regional ao mais universal, sobretudo porque a partir de histórias e personagens do sertão mineiro tratou grandes e profundos temas da humanidade. É dentro dessa perspectiva, que João Guimarães Rosa caminha junto com José de Alencar. Ambos procuram expressar em termos ficcionais experiências humanas. Uma vez que a ficção também registra essas vivências do homem, o regionalismo procura enfatizá-las fazendo prevalecer a necessidade de afirmar o nacional e o regional como valores universais.

Destaca-se neste trabalho uma análise que propõe paralelo entre o nacionalismo de Alencar e o regionalismo de Guimarães Rosa; Onde observa-se a convergência de ambos para o universalismo:

José de Alencar constrói mitos e lendas da terra selvagem para incluir Iracema, e em um livro que é um poema em prosa, repleto de lirismo o autor envolve componentes nacionais, históricos e regionais para a configuração do enredo. Também a leitura flui para falar de sentimento, uma característica universal.

“Diante dela e todo a contemplá-la, está um guerreiro estranho, se é guerreiro e não algum mau espírito da floresta.(...). Foi rápido, como o olhar, o gesto de Iracema. A flecha embebida no arco partiu Gotas de sangue borbulham na face do desconhecido.De primeiro ímpeto, a mão lesta caiu sobre a cruz da espada, mas logo sorriu. O moço guerreiro aprendeu na religião de sua mãe, onde a mulher é símbolo de ternura e amor. Sofreu mais d'alma que da ferida. Porém a virgem lançou de si o arco e a uiraçaba, e correu para o guerreiro, sentida da mágoa que causara.A mão que rápida ferira, estancou mais rápida e compassiva o sangue que gotejava.

(José de Alencar:Iracema cap. II)

 

O retorno às formas de vida rudimentares perpassados por aspectos culturais mais complexos caracteriza ideologias universalistas. Dessa forma, as obras de Alencar além de pretenderem demonstrar uma identidade nacional brasileira, também defendem concepções européias para a caracterização, principalmente, do caráter moral das personagens.

Assim, José de Alencar transita das lendas primitivas para construir e fixar o que é regional. Ele consegue com isso retratar aspectos nacionais envolvidos com ideais universais, dos quais não se desvincula.

Portanto, atributos como beleza, coragem e nobreza são essencialmente universais, sendo reivindicados por Alencar para compor o indivíduo que irá representar a identidade nativa.

Construindo o nacional com traços universais, Alencar preocupa-se em dar à nacionalidade brasileira, ainda emergente, a missão de regenerar a humanidade através de um papel exemplar. É neste sentido que José de Alencar procura elaborar através da literatura a “alma da pátria” perfumando-a com o cheiro nativo.

 

“Em Peri o sentimento era um culto, espécie de idolatria fanática, na qual não entrava um só pensamento de egoísmo; amava Cecília não para sentir um prazer ou ter uma satisfação, mas para dedicar-se inteiramente a ela, para cumprir o menor dos seus desejos, para evitar que a moça tivesse um pensamento que não fosse imediatamente uma realidade”.(...)

Ao contrário dos outros ele não estava ali, nem por um ciúme inquieto, nem por uma esperança risonha; arrostava a morte unicamente para ver se Cecília estava contente, feliz e alegre; se não desejava alguma coisa que ele adivinharia no seu rosto, e iria buscar nessa mesma noite, nesse mesmo instante. (...)

Assim o amor se transformava tão completamente nessas organizações, que apresentava três sentimentos bem distintos; um era uma loucura, o outro uma paixão, o último uma religião.(...)

Loredano desejava; Álvaro amava; Peri adorava. O aventureiro daria a vida para gozar; o cavalheiro arrostaria a morte para merecer um olhar; o selvagem se mataria, se preciso fosse, só para fazer Cecília sorrir.

( José de Alencar: O Guarani. Cap: VIII )

Ventando um mito heróico, Alencar atribui ao Guarani uma história que une nacional e universal na medida em que mitifica e torna heróico o passado colonial do Brasil. José de Alencar ao mesmo tempo em que acentua ao máximo a cor local, inclusive mostrando lendas, costumes, linguagens e fatos históricos. O autor faz ponte entre documento e fantasia, idealizando o primitivo brasileiro, principalmente através do cenário, do heroísmo e do amor Cortez dos romances de cavalaria medievais.

A FACE NACIONAL E SEUS TRAÇOS UNIVERSAIS

 

Nas manifestações literárias de José de Alencar e de João Guimarães Rosa, o gênero regionalista vai além da ficção. Enquanto esta parte do particular para o geral, observando o indivíduo na medida em que ele se integra na humanidade, o regionalismo entende esse indivíduo de forma contrária. É na proporção em que o sujeito se desintegra de uma generalização, que o regionalismo se manifesta. Ele mostra o indivíduo como produto de um meio, ligado ao seu ambiente, separado de tudo o que é estranho ao seu mundo.

Contudo o regionalismo tanto em Alencar quanto em Guimarães, não implica abandono do universal. Na verdade, este aspecto irá ser apenas uma sugestão significativa que converge para uma especificidade que prevalece.

Dentro dessa perspectiva, o sertanejo criado por Guimarães Rosa, configura-se como homem universal ao defrontar-se com problemas existenciais. Por isso é que as obras de Guimarães classificam-se como regionalismo universal, porque realizam uma importante análise da psicologia humana e reflete dramas humanos e sociais  em face de um contexto peculiar.

Para tanto, Guimarães Rosa transforma episódios cotidianos em momentos intensos, provocando reflexões sobre o grandioso mistério da existência.

Dessa forma o sertão apresentado por Guimarães, antes de ser uma realidade social, é uma realidade psicológica universal que se adapta a uma esfera especificamente concreta e representativa de particularidades.

Quanto ao processo narrativo, João Guimarães Rosa, geralmente faz abordagens e interpretações em torno do que considera realidade brasileira específica em face de outras realidades de configuração nacional. É em torno dos “causos” que o enredo se desenvolve, tais “causos” comuns e simples, pois é do cotidiano que ele exprime ocorrências grandiosas e excepcionais. Isto torna este cotidiano mais expressivo e extremamente significativo, possibilitando melhor descrição para se detectar os aspectos regionais apresentados.

 

                                       “Eu, pessoalmente, quase que já perdi nele a crença, mercês a Deus; é o que ao senhor lhe digo, a puridade. Sei que é bem estabelecido, que grassa nos Santos-Evangelhos. (...) E me inventei neste gosto, de especular idéia. O diabo existe e não existe? Dou o dito. Abrenúncio. Essas melancolias. O senhor vê: existe cachoeira; e, pois? Mas cachoeira é barranco de chão, e água se caindo por ele, retombando; o senhor consome essa água, ou desfaz o barranco, sobra cachoeira alguma? Viver é negócio muito perigoso... Explico ao senhor: o diabo vige dentro do homem, os crespos do homem ou é o homem arruinado, ou o homem dos avessos. Solto, por si, cidadão, é que não tem diabo nenhum. Nenhum! É o que digo. O senhor aprova? Me declare tudo, franco é alta mercê que me faz: e pedir posso, encarecido. Este caso por estúrdio que me vejam é de minha certa importância. Tomara não fosse... Mas, não diga que o senhor, assisado e instruído, que acredita na pessoa dele? Não? Lhe agradeço! Sua alta”. Opinião”. compõe minha valia. Já sabia, esperava por ela já o campo! Ah, a gente, na velhice, carece de ter sua aragem de descanso. Lhe agradeço. Tem diabo nenhum. Nem espírito. Nunca vi. Alguém devia de ver, então era eu mesmo, este vosso servidor. Fosse lhe contar... Bem, o diabo regula seu estado preto, nas criaturas, nas mulheres, nos homens. Até: nas crianças eu digo. Pois não é ditado: "menino trem do diabo"? E nos usos, nas plantas, nas águas, na terra, no vento... Estrumes... O diabo na rua, no meio do redemunho...”   ( Guimarães Rosa: Grande Sertão:veredas.)

 Percorrer o Grande Sertão Veredas é viajar na história, na cultura e na literatura. É mergulhar num lugar selvagem e encontrar os personagens vivos de Guimarães Rosa. É conhecer um vocabulário simples e peculiar. É compreender a sabedoria nata e a cordialidade dos seus moradores. É um outro mundo. O sertão nessa região não é tão cruel, mas sim belo e gigantesco. O que se vê de sobra é esperança e perseverança do povo com mãos calejadas e vida cheia de histórias e luta.

Guimarães em Grande Sertão: Veredas dar a um ex-jagunço a função de ser um narrador-personagem que apresenta reflexões metafísicas e uma oralidade fulente.Com tal forma de expressar motivos e questões humanas universais, Guimarães expões também aspectos regionais através  do discurso significativo e do espaço apresentado.

Nota-se no trecho destacado está perspectiva quando aborda através da inquietude do questionamento do personagem e narrador Riobaldo sobre a existência ou não do diabo.Guimarães em seu texto tanto dá a impressão de um discurso oral, como também o enriquece de diversos regionalismos e neologismos. Dessa forma, o autor une coloquial e erudito para expressar acontecimentos vividos e imaginados pelo personagem, acontecimentos esses que refletem principalmente concepções sertanejas. Além disso, o narrador apresenta uma característica naturalmente humana e geral; a de examinar a vida e tentar entendê-la.

Para concentrar o geral e o específico na identidade nacional, Guimarães vai além dos ideais e influências européias apresentadas por José de Alencar. Ele recria a linguagem regional de forma extremamente elaborada e criativa. Baseia-se, claro, na linguagem da região em que ocorrem as histórias narradas e, sobretudo cria palavras novas, recupera o significado de outras e estabelece relações sintáticas complexas que chegam a tornar a leitura difícil de ser compreendida de imediato.

Tudo isso, combina erudição e expressões simples, alia os dialetos regionais na interlocução do homem simples do povo sertanejo ao falar eloqüente e instruído do homem da cidade, explora com precisão os vocábulos agrupando termos científicos, expressões estrangeiras, marcas de oralidade e construções formais.

__Simão, me preza um laço dos  laços, um laço bom, que careço, a quando a boiada for sair...

__Laço, lação! Eu gosto de ver a argola estalar no pé do chifre e o trem pular pra riba!

__Aprecio, por demais, de ajudar numa saída de gado. Vadiarmais os companheiros...

__Manuelzão, (...)

__Que é que há?

__Está clareando agora, esta resumindo...

__Uai! É dúvida?

__Nem não. Cantar e brincar, hoje é festa – dançação. Chega o dia clarear!A festa não é pra se consumir, mas pra depois se lembrar...com boiada, jejuada forte, de hoje se contando três dias... a boiada vai sair. Somos que vamos.

(Guimarães Rosa:Manuelzão e Miguilim- Uma estória de amor)

 

 

Nesta estória  Guimarães Rosa  valoriza a tradição oral, misturando casos e questionamentos metafísicos com a busca de Manuelzão pela razão de sua existência. Além de abordagens universais , o autor remete a leitura ao folclore sertanejo.

 

 

"Eu vim preguntar a vosmecê uma opinião sua explicada..."

—       "Vosmecê agora me faça a boa obra de querer me ensinar o que é mesmo que é: fasmisgerado... faz-megerado... falmisgeraldo... familhas-gerado...?

—       "Lá, e por estes meios de caminho, tem nenhum ninguém ciente, nem têm o legítimo — o livro que aprende as palavras... É gente pra informação torta, por se fingirem de menos ignorâncias... Só se o padre, no São Ão, capaz, mas com padres não me dou: eles logo engambelam... A bem. Agora, se me faz mercê, vosmecê me fale, no pau da peroba, no aperfeiçoado: o que é que é, o que já lhe perguntei?"

 

(Famigerado – Primeiras Estórias)

 

 

Guimarães trabalha neste conto a questão da palavra, a qual além de refletir características regionais da linguagem oral, também elabora múltiplo significado e conotações.

Quanto ao processo narrativo, João Guimarães Rosa, geralmente faz abordagens e interpretações em torno do que considera realidade brasileira específica em face de outras realidades de configuração nacional. É em torno dos “causos” que o enredo se desenvolve, tais “causos” comuns e simples, pois é do cotidiano que ele exprime ocorrências grandiosas e excepcionais. Isto torna este cotidiano mais expressivo e extremamente significativo, possibilitando melhor descrição para se detectar os aspectos regionais apresentados.

Através do mito do “ Bom Selvagem”, o guarani volta-se para valores heróicos dos cavaleiros medievais, tal aspecto evidencia expectativas de concepções universalistas. Da mesma forma, a história do ex-jagunço.Riobaldo de “Grande Sertão: veredas” lembra o mito de Fausto, o homem que vendeu a alma ao diabo. A obra de Guimarães Rosa adquire universalidade admitindo conhecimentos gerais no cruzamento entre o real e o fantástico, nela, mistérios e dilemas profundos da mente humana são interrogados.

De acordo com essa perspectiva universal, Alencar e Guimarães propõem a seus personagens atribuições míticas e assim elaboram a representação da identidade nativa e regional, portanto, do clássico e geral.

Sagarana, primeiro livro de Guimarães Rosa segue essa técnica de significação universalista. Em seus contos, Guimarães já compõe a aproximação do mundo e do sertão, entre o indivíduo possuidor de ideais e interrogações e a experiência de vida do sertanejo.

Como exemplo, alguns temas universais podem ser encontrados em “Grande Sertão: veredas”, “Sagarana”, “Primeiras Estórias”, “O Guarani”, “Iracema” e outras obras destes autores. Temas como: a luta entre o bem e o mal, Deus e o diabo, o destino, a morte, o amor, a bravura, a lealdade, o heroísmo, a luta, a prece (fé), a honra, a pureza, a maternidade, dramas e angústias da existência humana, mundo terreno e mundo celeste, e também ações simbólicas.

Todos esses temas e ainda outros, transitam do universal e se adequam ao local. Adquirem as peculiaridades, pintam e movimentam os elementos que sintetizam em seu contexto o “perfume” nacional.

De acordo com tal concepção, a realidade brasileira apresentada pelos regionalistas guarda vestígios significativos do que é universal e dele não precisa se desvincular para propor uma configuração nacional. Na verdade, o nacionalismo proposto por Alencar no Brasil do século XIX, ocorreu no momento em que se processava uma independência mental. Momento em que ocorria um nítido e consciente esforço para se apresentar valores autenticamente brasileiro.

Já o regionalismo de João Guimarães Rosa aflora na terceira fase modernista, e do ponto de vista literário representa um retrocesso em relação às conquistas da primeira fase, visto que esta tem como traço marcante a despreocupação para com as convenções da língua.

A terceira geração modernista na qual se insere Guimarães Rosa, prega a idéia de que a atividade literária é, antes de tudo, um constante exercício e pesquisa da linguagem, como forma de retorno às convenções lingüísticas. É, justamente, esse traço que se pode perceber na obra de Guimarães, o qual representa o regional através da sondagem interior e da linguagem que o determina.

O que aproxima José de Alencar e João Guimarães Rosa, além das pretensões nacionais, são os temas míticos que sugerem em suas obras. Sobretudo também, porque guardam intacta a verossimilhança que sugerem na composição de um mito nativo.

A função das obras nacionalistas comentadas neste artigo reflete o objetivo de apresentar a realidade brasileira elaborada através de um processo reflexivo. Elas possuem o mérito de por um lado tocar o universal e dele trazer elementos para elaborar o nacional em cada regional que apresenta. Portanto o nacionalismo e o regionalismo focalizado e fotografado por José de Alencar e João Guimarães Rosa além de descrever e apresentar, também cria para refletir o nacional no espelho da alma brasileira.

 

Pretendeu-se que este trabalho promovesse um paralelo entre o que é comum nas manifestações literárias de Jose de Alencar e João Guimarães Rosa. O foco da análise projetou-se para esclarecer que estes autores revelam aspectos regionais carregados de conceitos nacionalistas, tendo em vista a representação da nação brasileira. Pensa-se que o resultado obtido proporciona compreensão sobre o que realmente é e trata o regionalismo. Faz-se notar, todavia, que traços regionalistas são geralmente encontrados nas ficções e isto ocorre independentemente da época ou da estética literária. Contudo, o que define e distingue o regional como um gênero literário, são as obras que alem de retratarem características de uma determinada região, também promovem reflexões sobre ela de forma critica e humanística.Assim, as abordagens deste texto deverão ser entendidas apenas como um breve estudo que poderá ser posteriormente aprofundado.

 

Agradecimento

As autoras agradecem à professora Itana Nogueira pela proposta de trabalho, tendo em vista que tal solicitação lhes proporcionou a realização de uma primeira produção acadêmica nesta categoria.

 

 

 

 

 

Referencias:

ALENCAR, José Martiniano. O Guarani. São Paulo: ed. Ática. Série Bom Livro. 14ª edição. 1988.

MIGUEL, Jorge, Curso de Literatura II, do Romantismo ao Simbolismo. São Paulo: Ed. Harper & Row do Brasil Ltda., 1986.

OGLEARI, Braz e PEREIRA, Tarcílio A. Nova Visão – literatura, linguagem e redação. São Paulo: Instituto Brasileiro de Edições Pedagógicas – IBEP. 1980.

SODRÉ, Nelson Verneck, História da Literatura Brasileira. Rio de Janeiro: Ed. Bertrand Brasil, 9ª edição. 1995.