Nas últimas décadas do século XX, os alarmantes índices de violência urbana registrados no Brasil ultrapassaram os limites de tolerância aceitos pela população e, em especial nos últimos anos, pelo próprio aparato estatal, responsável pela prevenção, controle e repressão da criminalidade.

A violência urbana, em suas diversas formas de manifestação, em menor ou maior grau, passou a ser concebida como componente da vida cotidiana e, geralmente, como conseqüência natural da vida nos centros urbanos, sejam estes de pequeno ou de grande porte populacional.

Paulatina e dissimuladamente, um novo atributo de condição comportamental da sociedade - o estado de vitimização - vem sendo incorporado aos procedimentos comportamentais coletivos dos atores urbanos que assumem novas atitudes e novas modalidades de representações sociais, diferentes daquelas que lhes eram peculiares. A prevenção se interpõe como fundamento básico da conduta do cidadão, como meio de sobrevivência.

Na tentativa de tomar medidas para evitar as situações de risco, a sociedade reage, buscando também se adaptar à nova modalidade de vivência social, uma vez que se sente desamparada pelos órgãos públicos responsáveis pelo controle e contenção da violência. O evento da reação coletiva pode ser constatado por um conjunto de ações concretas, como a criação de uma nova arquitetura urbana, com outras formas de lazer e de trabalho. O fenômeno pode também ser percebido através do processo de escolha dos locais de estudo, de realização das compras, de contatos afetivos, práticas estimuladas em função da proximidade geográfica com as áreas consideradas de baixa incidência de violência.

Essa mudança comportamental implica prejuízos sociais e, fundamentalmente, perda da qualidade de vida das pessoas, uma vez que a sociedade tenta criar instrumentos individuais de defesa, ou simplesmente um aparato que lhe assegure a sensação emocional de proteção.

A análise das mudanças sociais às quais os cidadãos brasileiros foram submetidos, tendo como motivação central a cultura da violência introjetada na sociedade, mostra a necessidade de ser aumentada a coesão social para a redução dos atuais níveis de violência; de serem aplicadas medidas de prevenção como políticas sociais voltadas para os grupos da população com maior risco de serem vítimas e vitimadores, e, ainda, de ser reformado o aparato responsável pela segurança social. Uma discussão aprofundada sobre os custos da violência é essencial para uma definição das prioridades de atuação e sobre qual encaminhamento dar a seus agentes: reeducação, punição, ressocialização?

A resolução do fenômeno social da violência urbana certamente passará por uma análise de variáveis sociais e econômicas que abrangem toda a sociedade,  do universo de ações a serem efetivadas, destacam-se as seguintes: a) atuação das agências encarregadas do acautelamento e ressocialização dos delinqüentes – sistema prisional; b) Atendimento  para as vítimas dos eventos violentos e disponibilização de verbas  para as instituições públicas encarregadas de seu tratamento e reabilitação; c) mobilização da sociedade civil, haja vista a perda de indivíduos inseridos nos meios de produção e no mercado consumidor, tendo como reflexos a deterioração e a desvalorização de áreas específicas.

De acordo com a Centralização dos Serviços dos Bancos S/A (SERASA)[1],  o Brasil do novo milênio contabiliza cerca de 30 homicídios para cada 100 mil habitantes diante da média mundial de cinco. O resultado anual de homicídios pode ser comparado ao número de vítimas de uma guerra civil. Em 2001, foram notificados um milhão de crimes contra o patrimônio na cidade de São Paulo, sem considerar aqueles que não tiveram registro de ocorrência nas unidades das Polícias Civil e Militar e que são a maioria, de acordo com pesquisa do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, em parceria com a Universidade de São Paulo (USP) e o Instituto Latino-Americano das Nações Unidas para a Prevenção do Delito e Tratamento do Delinqüente (ILANUD).

O bem estar  social, em especial a existência do estado de  segurança, deve ser considerado como direito de cidadania, pois significa liberdade (respeito ao indivíduo) e ordem (respeito às leis e ao patrimônio), fundamentais para o desenvolvimento econômico e social.

Estudos da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e do Banco Interamericano de Desenvolvimento estimam que os custos da violência atingem 10% do Produto Interno Bruto, algo em torno de R$130 bilhões. São recursos usados na expansão apenas dos serviços especializados de segurança, e que poderiam estar sendo gastos na geração de empregos na cadeia produtiva.

O estudo da FGV calcula que o número de vigilantes hoje no Brasil é 3,5 vezes o contingente das forças armadas nacionais, com o agravante de possuírem qualificação discutível.



[1] Guia Serasa de Orientação ao Cidadão. Violência Urbana: causas e soluções apontadas. Custos da Violência Urbana.

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