UMA ANÁLISE CRÍTICA ACERCA DO VETO À DIVULGAÇÃO DO VOTO DIVERGENTE DO COLEGIADO PREVISTO NA LEI Nº 12.694/2012[1]

 

Irleivânda Castro Pereira[2]

Isabela Tereza Barros Silva²

Cleopas Isaías Santos³                        

                                          

Sumário: Introdução; 1 Aspectos gerais da Lei 12.694/2012; 2 O veto à divulgação do voto divergente previsto na Lei 12.694/2012 e a violação de princípios penais envolvidos; 3 Críticas e Consequências do veto à divulgação do voto divergente; Considerações Finais; Referências

 

RESUMO

 

A Constituição Federal Brasileira assegura a segurança como um direito de todos e dever do Estado em garanti-la. Todo tema que envolve tal aspecto gera divergências e enseja grandes debates em âmbito jurídico-doutrinário. Partindo desse ponto, o presente trabalho busca uma análise da recente e polêmica Lei nº 12.694/2012 que traz a figura do “juiz sem rosto”. Tal lei busca garantir a segurança de juízes de primeiro grau que apuram crimes cometidos por organizações criminosas e tem como uma de suas propostas o veto à divulgação do voto divergente do colegiado em conflito com princípios e garantias constitucionais.

 

Palavras-chave: Juiz sem rosto; Lei nº 12.694/2012; Voto Divergente; Princípios penais.

 

 

INTRODUÇÃO

 

Em meio a tantos casos de ameaças, intimidações e atentados à juízes de primeiro grau que apuram crimes cometidos por organizações criminosas, a Presidenta Dilma Rousseff sancionou a Lei 12.694/2012 numa tentativa dar maior segurança à esse juízes que tem suas vidas envolvidas por risco e também por uma questão de segurança jurídica das decisões para que não sejam influenciadas.

A Lei 12.694/2012 traz em seu bojo a figura do “juiz sem rosto” como uma tentativa de proteção à integridade física dos juízes de primeiro grau que apuram crimes cometidos por organizações criminosas, tendo em vista as constantes ameaças, retaliações e até mesmo assassinatos como vingança daqueles que estes julgaram.

Essa Lei permite a criação de colegiados que serão compostos por três juízes para realizar o julgamento de organizações criminosas em primeiro grau e tem por fim a não exposição do juiz responsável pelo processo, será uma decisão em conjunto. Porém, a implementação dessa lei tem sido alvo de várias criticas em virtude da não consonância com os princípios constitucionais da publicidade, motivação das decisões, do juiz natural e da identidade física do juiz.

Sendo assim, o trabalho abordará a questão do veto à divulgação do voto divergente do colegiado, ponto que fica evidente esse embate em que por um lado se tem a tentativa de dar uma segurança maior aos juizes de primeiro grau que apuram crimes praticados por organizações criminosas e de outro lado se tem a violação de principios e garantias constitucionais.

O presente trabalho visa também fazer uma analise da proposta do “juiz sem rosto” como um meio de proteção à integridade física dos juízes e correlaciona-la a cada um dos princípios citados anteriormente, bem como averiguar a sua eficácia no âmbito jurídico.

Tendo em vista que o se trata de uma proposta recente, o trabalha terá como base de fundamento pesquisas bibliograficas e eletrônicas acerca do assunto.

1 ASPECTOS GERAIS DA LEI 12. 694/2012

A Lei 12.694/2012 trata da figura do juiz sem rosto, que enseja à não divulgação de sua identidade a fim de que sua integridade física seja protegida, tendo em vista o grande número de homicídios cometidos por organizações criminosas contra juízes. Neste sentido diz-se que “os juízes são seres humanos que sofrem interiormente as inseguranças de sua família, são ameaçados e por vezes desmoralizados pela eficiência das organizações criminosas em confronto com a inoperância estatal” (FUX, Luiz, 2012).

A figura do juiz sem rosto teve origem na Itália, na batalha contra a máfia, sendo adotada no Brasil contra as organizações criminosas que matam desafetos. Com a adoção dessa medida os juízes atuarão em colegiados quando da tomada de decisões severas contra investigados para dar maior segurança aos magistrados (MACEDO, 2012).

Diante de tantas ameaças, foram adotadas medidas que têm como finalidade primar pela segurança do juiz ao realizar suas tomadas de decisões na operação do direito. “A iniciativa permitirá que o Judiciário implante estruturas colegiadas semelhantes ao sistema do “juiz sem rosto", procedimento que visa impedir que o acusado saiba o nome do juiz responsável pela aplicação da pena”(COSTA,Fabiano,2012).

Visto isso, a lei que cria a figura do juiz sem, rosto em seu Artigo 1°, traz a permissão de instauração de colegiados para decidir a cerca do processo, juntamente com o juiz do processo.

Art. 1o  Em processos ou procedimentos que tenham por objeto crimes praticados por organizações criminosas, o juiz poderá decidir pela formação de colegiado para a prática de qualquer ato processual, especialmente: 

Nesse mesmo sentido:

O juiz poderá instaurar o colegiado, indicando os motivos e as circunstâncias que acarretam risco à sua integridade física em decisão fundamentada, da qual será dado conhecimento à Corregedoria do tribunal ao qual está vinculado. O colegiado será formado pelo juiz do processo e por dois outros juízes escolhidos por sorteio eletrônico, dentre aqueles de competência criminal em exercício no primeiro grau de jurisdição (FUX, Luiz, 2012).

A referida lei menciona que na formação do colegiado a competência deste limita-se ao ato para o qual foi convocado, sendo que as reuniões poderão ser sigilosas caso haja risco de que a publicidade resulte em prejuízo à eficácia da decisão judicial. As decisões do colegiado deverão ser fundamentadas e firmadas, sem exceção, por todos os seus membros e serão publicadas sem nenhuma referência a voto divergente (O ESTADO DE SÂO PAULO, 2012).

1o  O juiz poderá instaurar o colegiado, indicando os motivos e as circunstâncias que acarretam risco à sua integridade física em decisão fundamentada, da qual será dado conhecimento ao órgão correicional.  § 2o  O colegiado será formado pelo juiz do processo e por 2 (dois) outros juízes escolhidos por sorteio eletrônico dentre aqueles de competência criminal em exercício no primeiro grau de jurisdição.  § 3o  A competência do colegiado limita-se ao ato para o qual foi convocado.  § 4o  As reuniões poderão ser sigilosas sempre que houver risco de que a publicidade resulte em prejuízo à eficácia da decisão judicial.  § 5o  A reunião do colegiado composto por juízes domiciliados em cidades diversas poderá ser feita pela via eletrônica.  § 6o  As decisões do colegiado, devidamente fundamentadas e firmadas, sem exceção, por todos os seus integrantes, serão publicadas sem qualquer referência a voto divergente de qualquer membro.  § 7o  Os tribunais, no âmbito de suas competências, expedirão normas regulamentando a composição do colegiado e os procedimentos a serem adotados para o seu funcionamento.  

As medidas tomadas pela lei 12.694/2012 visam à diminuição do índice de criminalidade, assim como a proteção dos juízes nas tomadas de decisões, afim de que estas não fiquem suprimidas frente ao medo e às ameaças que envolvem os magistrados.

Deve-se levar em consideração que o fato de não haver uma divulgação no que concerne à identidade do juiz, a eficácia da aplicação da norma jurídica não será minimizada frente àquelas em que há a divulgação da identidade do mesmo. Diante disto o ministro Luiz Fux diz:

A efetivação dessas medidas em todo o território nacional é capaz de retirar o nosso país da posição em que se encontra, no mundo, no âmbito da criminalidade e da ineficiência da apuração, fatores que geram sensação de impunidade e aumento da criminalidade. Afinal, o Brasil, que já permitiu tantas marchas e movimentos, deve iniciar uma “campanha pela vida digna da sociedade” e, sobretudo, por aqueles que almejam erradicar a marginalização para o bem de todos, ainda que para alcançarem esse desígnio sejam “homens sem rosto” (FUX, Luiz, 2012).

Apesar da proposta de não divulgação da identidade do magistrado ter caráter de atribuição de segurança para estes, há muitas críticas a cerca da constitucionalidade da nova lei, pois alguns juristas acreditam que tal lei vai de encontro com alguns princípios constitucionais como, devido processo legal, juiz natural e publicidade (SILVA, 2012).

O STF reconheceu que os estados podem criar leis para criar varas especializadas para julgar crimes ou delitos cometidos por organizações criminosas. Porém a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) queriam que fosse declarada inconstitucional a lei que criou a 17.ª Vara Criminal, dedicada à análise de processos penais abertos contra membros do crime organizado em Alagoas, mas os ministros não aceitaram o pedido da OAB.  Então essa vara tem cinco magistrados na sua composição afim de que a proteção dos juízes seja garantida; diminuindo assim o risco de ameaças por parte do crime organizado. Essa foi uma iniciativa do estado de Alagoas, abrindo espaço para que os outros estados sigam o seu exemplo (GAZETA DO POVO, 2012).

 

 2 O VETO À DIVULGAÇÃO DO VOTO DIVERGENTE PREVISTO NA LEI 12. 694/2012 E A VIOLAÇÃO DE PRINCÍPIOS PENAIS ENVOLVIDOS

No que tange à figura do juiz sem rosto, elencada na lei 12. 694/2012 prevê em seu Art. 1º § 6o   que as decisões do colegiado, devidamente fundamentadas e firmadas, sem exceção, por todos os seus integrantes, serão publicadas sem qualquer referência a voto divergente de qualquer membro.

Dessa feita, observa-se que havendo votos divergentes nas decisões colegiadas, estes não serão divulgados, ferindo assim princípios constitucionais tais como o devido processo legal, sendo que se o juiz deixar de assinar ao final da decisão, não terá como se saber se ele foi imparcial ou não na sua discricionariedade, sendo assim, não terá como se identificar quem está julgando a organização criminosa e consequentemente não haverá como identificar a imparcialidade do juiz; indo de encontro com a norma prevista no Art. 95, I do CPP que trata da suspeição do mesmo (SILVA, 2012).

O art. 95, I do CPP prevê que poderão ser opostas as exceções de suspeição, porém, não será possível a identificação de hipóteses de suspeição, visto que, se a identidade do juiz não for publicada não terá como ser identificado o juiz responsável pelo processo, suprimindo também a possibilidade de identificação de suspeição (SILVA, 2012).  

A finalidade precípua da identificação do magistrado que processará e julgará o feito é oportunizar que as partes questionem, nos autos, sua imparcialidade, apontando possível suspeição ou impedimento do julgador. A razão é clara: toda pessoa tem o direito de ser julgada por um tribunal independente e imparcial (art. X da Declaração Universal dos Direitos Humanos) e tal prerrogativa é inerente ao devido processo legal (ARIANNE, Tamara, 2012).

O sistema do juiz sem rosto também fere o princípio da publicidade, visto que há uma omissão referente à pessoa daquele que está julgando o processo, causando assim uma insegurança jurídica em relação ao processo.

Ademais, esse sistema fere, ao contrário do que seus defensores alegam, o princípio da publicidade na medida em que todo e qualquer acusado, em um Estado de Direito, tem de saber quem o acusa e quem o julgará, condenando-o ou absolvendo-o, pois a publicidade dos atos processuais pode ser restringida, mas não excluída (artigo 5º, LX e artigo 93, IX, todos da CRFB) (SILVA, Ronaldo Lastres, 2012).

A Constituição Federal de 1988 assegura o princípio da publicidade em seus artigos 5°, LX e 93, IX. Essas garantias fundamentais não poderão ser suprimidas pela a lei 12.694/2012.

Art. 5°, LX - a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem;

 Art. 93, IX- todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação;

Observa-se que a Constituição Federal diz que a publicidade poderá ser restringida em casos de defesa da intimidade, mas no caso da referida lei, não está em jogo a intimidade do magistrado, pois são atribuições deste, decidir, atendendo tais princípios ( SILVA, 2012).

A CF/1988 também prevê em seu Art. 5°, XXXVII que não haverá juízo ou tribunal de exceção, visto isso, uma lei que foge a essa regras, não pode ser declarada constitucional, sendo a própria Constituição Federal que é a lei maior do ordenamento jurídico brasileiro veda a aplicação de juízos que se excluem da regra (SILVA, 2012).

Em relação ao papel do juiz observa-se que o sistema elencado pela lei 12.694/2012 é um sistema no qual não contém a assinatura do juiz, portanto, pode-se dizer que a sentença seria inexistente, desse modo ela não poderia produzir efeitos. Se o promotor, delegado, defensor ou qualquer outro operador do direito se omitir a publicar sua identidade, ocultando seu próprio rosto, estes devem repensar seu papel, pois não está vocacionado para a atividade exercida (SILVA, 2012).

3 CRITICAS E CONSEQUENCIAS DO VETO AO VOTO DIVERGENTE DO COLEGIADO

 

A lei 12.694 de 24 de julho de 2012 sancionada pela presidenta Dilma Roussef já está em vigor desde outubro de 2012. Esta é resultado de uma antiga reivindicação da magistratura que atua na área criminal, em especial os que julgam os crimes praticados por organizações criminosas em virtude de constantes ameaças e retaliações por parte dos réus.

É inegável que ao motivo a que se propôs a Lei 12.694/2004 de garantir proteção policial e medidas de segurança para juízes criminais e promotores que julgam crimes de organizações criminosas é uma iniciativa nobre. Tendo em vista o risco a que esses juízes e promotores passam no dia a dia no julgamento dessas causa. Contudo, ela contém algumas falhas.

No programa Via Justiça, o desembargador do tribunal de justiça de Minas Gerais, Nelson de Moraes em relação a esta lei, admite ser uma iniciativa importante, mas na sua concepção tem as suas falhas e estas precisam necessariamente serem corrigidas sobre tudo ouvindo-se a magistratura e o Ministério Publico que atua na área criminal. Segundo ele, esta Lei 12.694 possui ainda alguns vícios que são incorrigíveis, uma vez que foi elaborada não por quem usufruiria dela, mas de órgãos superiores a quem convive na pratica os riscos a que estão submetidos. Ressalta inclusive vícios de constitucionalidade.

O desembargador Herbert Carneiro, nesse mesmo programa, considera que:

Os propósitos da lei são nobres, realmente o juiz brasileiro esta carente demais de segurança, isso é uma constatação do dia a dia da atividade judicante. Mas há que se considerar, por exemplo com relação aos estados uma dificuldade muito grande da implantação da lei. Não só do colegiado para julgamento como ela traz prevista como a disseminação da segurança dos fóruns, nos temos dificuldades orçamentárias, financeiras, que vão tornar a lei sobre certos aspectos ineficaz.

Ainda de acordo com a Lei 12.694 art 1 , §2º, o colegiado será formado pelo juiz do processo e por 2 outros juízes escolhidos por sorteio eletrônico desde que com competência criminal e em exercício no primeiro grau de jurisdição e a competência do colegiado ficará limitada ao ato para que foi convocado. Esse artigo ainda admite a possibilidade de que a reunião seja sigilosa e feita por via eletrônica. O desembargador Herbert Carneiro considera que

É preciso ter em foco que essa lei num primeiro momento foi muito de iniciativa da Justiça Federal que tem uma realidade completamente diferente da realidade da justiça Estadual. Nos teremos dificuldades inclusive do ponto de vista da implantação propriamente dita. [...] A justiça federal tem a facilidade da videoconferência hoje de comunicação de juiz com juiz. Na justiça estadual nos ainda não temos esses meios operacionais de maneira eficaz. [...] Os deslocamentos vão importar em pagamentos de diárias de direitos que o juiz tem naturalmente no exercício de serviços extraordinários que podem trazer dificuldade a implementação e a eficácia da Lei.

Conforme artigo 1º da Lei 12. 694, processos que tenham por objeto crimes praticados por organizações criminosas poderá, o juiz decidir pela formação de colegiado para a prática de qualquer ato processual, contudo, o juiz deverá indicar os motivos e as circunstâncias que acarretam risco à integridade física em decisão fundamentada. Em relação a isso, o desembargador Nelson de Moraes comenta que há necessidade de se atentar para alguns pontos:

A formação de um juiz de exceção também fere o princípio do juiz natural porque instaura o colegiado após o cometimento do crime e isso afeta ate o devido processo legal e há que se atentar também para um ponto muito importante que eu ainda não vi ate agora ninguém abordando que é  da essência do juiz de primeiro grau, o caráter monocrático de suas decisões, e isto esta na constituição e é uma lei ordinária.

Ademais, as decisões do colegiado serão divulgadas sem referência a voto divergente de qualquer membro conforme art. 1º, § 6o da Lei 12.694: “as decisões do colegiado, devidamente fundamentadas e firmadas, sem exceção, por todos os seus integrantes, serão publicadas sem qualquer referência a voto divergente de qualquer membro”. Esse parágrafo é polemico em relação a sua legitimidade.  O Desembargador Nelson Morais, considera que isso é “absolutamente ilegítimo. A lei processual assim como o foco da administração é a publicidade, e a publicidade pressupõe a colocação de todos os termos inclusive das pessoas que participam do julgamento. E ai alguns vícios de constitucionalidade que certamente eles encontraram óbices na suprema corte do país”.

Nesse mesmo sentido, há críticos que consideram que a lei abre caminho para instituição do sistema do juiz sem rosto e da sentença sem assinatura. E se assim fosse, não seria bom para democracia uma vez que abriria brecha para abusos.

O desembargador Herbert Carneiro completa suas criticas a Lei 12. 694 da seguinte forma:

Eu concordo com um grande penalista brasileiro Flavio Gomes que diz que nos fizemos uma copia mal feita do juiz sem rosto que existe na Colômbia e existe no Peru. Por quê? Eu digo, no nosso caso aqui de maneira muito clara a sentença terá que ser firmada e de forma fundamentada alias como a constituição prevê. Ora a partir do momento que o juiz terá que lançar a sua assinatura, naturalmente será do conhecimento das organizações criminosas quem foi que impôs aquela pena naquela determinada sentença. Na Colômbia como no peru a sentença não é assinada, ela não é firmada pelo juiz. Guarda-se sim um documento assinado e firmado pelo juiz de forma secreta, sigilosa e, as partes tem acesso ao que foi decidido. É um aspecto que eu acho que no nosso caso foi uma cópia mal feita. Outro aspecto a ser visto é a questão realmente de uma situação de exceção. De depois do crime já configurado você estabelecer esse colegiado como em um regime de exceção não dando as partes e ai fere a constituição Federal a possibilidade de saber até dos pontos divergentes da decisão para eventual recurso.

Joana Neitsh em seu artigo na Gazeta do povo ressalta que o juiz federal Sérgio Moró, que integrou a comissão que escreveu o texto da Lei 12694/2012, considera que não se trata de “juiz sem rosto” tendo em vista que os magistrados do colegiado serão todos identificados. Ademais, o juiz considera que haverá mais probabilidade de ter um julgamento com maior qualidade e maior profundidade, uma vez que várias cabeças pensam melhor do que uma.

Apesar de o juiz se sentir mais protegido, uma vez que a Lei traz segurança pra os magistrados e para a sociedade evitando possíveis retaliações por parte do crime organizado, a possível proteção de juízes em detrimento de direito constitucional não se justifica.

Nesse mesmo sentido o juiz Odilon de Oliveira que constantemente recebe ameaças em entrevista a Carlos Eduardo Orácio também faz criticas a lei 12.694 na medida em que a Lei viola o direito do réu e contraria o princípio da transparência. E complementa:

Vamos supor que você seja réu, o voto do juiz que optou pela absolvição não aparecerá. Nesse caso, o condenado teria interesse em saber qual foi o voto favorável para saber qual o teor do voto e fundamentar algum recurso. A questão fere o princípio da ampla defesa e o do livre convencimento do juiz que é obrigado a ir contra seu entendimento em relação ao voto divergente.

O juiz também faz as ressalvas quanto à demora que pode gerar esse processo e que isto estaria beneficiando o réu:

A divisão judiciária não permite essa disponibilidade. Em razão da extensão do país, é inviável a formação de um colegiado. O Brasil possui cerca de três mil comarcas, 70% delas possuem apenas um juiz, e muitas são de difícil acesso e distantes umas das outras [...]Em caso de processos com mais de 100 volumes, por exemplo, a análise de toda a peça seria demorada, além do comparecimento das testemunhas e protelação nas datas das audiências, o que resultará na prescrição do caso. Em situações como essa é justamente o crime organizado que vai ser beneficiado. [...] A reforma do judiciário é crucial entre os pontos para o combate ao crime organizado. O Estado não pode se acovardar. Esse colegiado é um ato de covardia. Esse colegiado demonstra que o Estado está se ajoelhando diante do crime organizado. Ele deveria demonstrar força perante a sociedade e está se acovardando

E ressalta a possibilidade de não se conseguir comprovar a ameaça e cometer o crime de denunciação caluniosa. O juiz Odilon também chama a atenção para os casos dos juízes aposentados que após este fato são deixados de lado pelo Estado, sendo que continua passando pelos mesmos riscos de quando estava no cargo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em decorrência do crescente número de ameaças contra magistrados que proferiram sentença contra organizações criminosas, foi sancionada a lei 12. 694/2012, que viabiliza ao juiz do processo que trata dessas organizações, a não divulgação de seu nome, sendo que ao proferir a sentença, este não a assinará para que o julgado não possa identificar o julgador de seu processo.

O veto à divulgação do voto divergente previsto na Lei 12.694 fez surgir diferentes posicionamentos quanto à sua aplicação. Há quem entenda que é perfeitamente constitucional. Contudo, a maior parte dos juristas entende que se trata de medida inconstitucional ferindo garantias e princípios constitucionais como o principio da publicidade, identidade física do juiz e da segurança jurídica.

Há juristas que entendem que a Lei 12.694 tem iniciativa muito importante e aborda um avanço mundo jurídico, uma vez que é inegável as frequentes ameaças sofridas pelos juízes de primeiro grau que julgam crimes cometidos por organização criminosa. Contudo, esta Lei apresenta falhas que precisam ser sanadas e para isso, é indispensável que sejam ouvidos os juízes e Ministério Público que atuam na área criminal, uma vez que estes é que lidam diretamente com as ameaças e sabem o que precisa ser feito para melhorar a segurança destes.

REFERÊNCIAS 

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CARNEIRO. Programa Via Justiça. Disponível em:<http://www.youtube.com/watch?v=JMoxWXYsXEY> Acessado em: 1 nov. 2012.

 

COSTA, Fabiano. STF autoriza varas de 1º grau para combate ao crime organizado: Decisão permite Estados criarem estruturas semelhantes ao 'juiz sem rosto'. Ideia é aumentar a segurança de juízes que lidam com redes criminosas. Disponivel em: <http://g1.globo.com/politica/noticia/2012/05/stf-autoriza-varas-de-primeiro-grau-para-combate-ao-crime-organizado.html>.Acesso em: 07 de novembro de 2012.

 

FUX, Luiz. Juízes sem rosto. O Globo.Disponível em: <http://www.eagora.org.br/arquivo/juizes-sem-rosto>. Acesso em: 05 de novembro de 2012.

 

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O ESTADO DE SÃO PAULO. OABRJ digital.  Lei cria colegiado para casos que envolvem risco a magistrados. Disponível em: <http://www.oabrj.org.br/detalheNoticia/73732/Lei%20cria%20colegiado%20para%20casos%20que%20envolvem%20risco%20a%20magistrados.html>. Acesso em: 05 de novembro de 2012.

 

MACEDO, Fausto. Disponível em: http://maranauta.blogspot.com.br/2012/07/lei-n-12694-de-24-de-julho-de-2012.html>.Acesso em 07 de novembro de 2012.

MORAES. Programa Via Justiça. Disponível em:<http://www.youtube.com/watch?v=JMoxWXYsXEY>. Acessado em 1 nov. 2012.

NEITSH, JOANA. Lei que proteje juiz sofre críticas. Disponível em: http://www.gazetadopovo.com.br/vidapublica/justica-direito/conteudo.phtml?id=1289478 acessado em: 01 nov.2012.

ORÁCIO, Carlos Eduardo. Juiz Odilon diz ser contra lei juiz sem face e aponta beneficio ao crime organizado. Disponível em: <http://www.buritinews.com.br/ver_not.php?id=25689&ed=ENTREVISTAS&cat=Not%EDcias> . Acesso em: 02 nov. 2012.

SILVA, Ronaldo Lastres. Proposta inconstitucional: sistema de “juiz sem rosto” é sentença sem assinatura. Disponível em: < http://www.conjur.com.br/2012-jul-05/ronaldo-lastres-silva-juiz-rosto-sentenca-assinatura>. Acesso em 05 de novembro de 2012.


[1] Paper elaborado para a disciplina de Direito Processual Penal I da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco.[2]Alunas do 6º período de Direito Noturno da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB³ Professor mestre, orientador.