Nunca é demasiado conhecer sobre a abordagem estruturalista da linguagem, por isso, este trabalho propõe-se a apresentar a trajetória estruturalista seguido de um panorama dos estudos pós-saussurianos.

Para uma intelecção concatenada da abordagem estruturalista da linguagem, faz-se imprescindível ater-se à dimensão temporal em que se involucraram os primeiros estudos nessa área da ciência da linguagem. Assim, vale salientar que o final do século XIX despontou como o palco das concepções revolucionárias de Saussure que concebeu a língua como uma instituição social. Nesse período, a Lingüística galgava para o seu cientificismo.

O inolvidável mestre genebrino ao estudar o funcionamento da língua e não sua evolução, desconstruirá a primazia do historicismo e adotará o descritivismo (revolução para a época).

Sob essa nova perspectiva, houve o deslocamento da preocupação com a evolução histórica para a função que os elementos lingüísticos exerciam no sistema. Veja-se:

O estudo do comportamento humano perde suas melhores oportunidades quando tenta traçar as causas históricas dos acontecimentos individuais. Em vez disso, ele deve concentrar-se, em primeiro lugar, nas funções que os eventos têm numa estrutura social geral. Deve tratar os fatos sociais como parte de um sistema de convenção de valores. (Saussure, 1916, p. 93)

Rompendo com as idéias comparatistas e desligando-se do evolucionismo, passou à investigação sincrônica com o intuito de acesso ao sistema. Baseado nessa sincronia, veja o que escreve Saussure (1916):

Numa partida de xadrez, qualquer posição dada tem como característica singular estar libertada de seus antecedentes; é totalmente indiferente que se tenha chegado a ela por um caminho outro; o que acompanhou toda a partida não tem a menor vantagem sobre o curioso que vem espiar o estado do jogo no momento crítico; para descrever a posição, é perfeitamente inútil recordar o que ocorreu dez segundo antes. Tudo isso se aplica igualmente à língua e consagra a distinção radical do diacrônico e do sincrônico.

Da metáfora do xadrez, fica nítido que Saussure traz um novo paradigma para a Lingüística. Dessas novas concepções e métodos, a ciência da linguagem se desprenderá do aval historicista, galgando para sua autonomia.

Disso tudo, caberia uma pergunta: como entender melhor a contribuição de Saussure para a Lingüística? A resposta é simples – estudando seu objeto de estudo e antenando-se para o porquê dessa escolha. Seguindo este raciocínio, valeria outro questionamento: por que Saussure preferiu a langue à parole? A parole, sendo heterogênea, multifacetada e assistêmica, não interessaria à Lingüística; já a langue, exterior ao falante, não poderia ser criada e, tampouco, modificada.

Como conseqüência da valoração da langue em detrimento da parole, parece excluir-se o sujeito, ou seja, o usuário da língua. A partir desse ângulo, a langue teria um funcionamento independente do falante, anulando-se o sujeito / falante. Desta forma, tem-se que Saussure veria a langue como auto-suficiente, nela e por ela, independente de seus usuários.

Essencialmente, por ser um sistema auto-suficiente, não por ser social, a língua independeria do indivíduo. Veja o que diz Saussure (1916: 39):

Na língua só existem diferenças. [... ] Quer se considere o significado, quer o significante, a língua não comporta nem idéias nem sons pré-existentes ao sistema lingüístico, mas somente diferenças conceituais e diferenças fônicas resultantes deste sistema. O que haja de idéia ou de matéria fônica num signo importa menos o que existe ao redor dele nos outros signos. A prova disso é que o valor de um termo pode modificar-se sem que se lhe toque quer no sentido, quer nos sons, unicamente pelo fato de um termo vizinho ter sofrido modificação.

Com base no conhecimento a respeito da teoria saussuriana, pode-se dizer que o essencial seria mostrar a língua como um sistema de valores constituído não por conteúdos ou produtos de uma vivência, mas por diferenças puras. Assim, Saussure apresenta a noção de que cada elemento da língua só adquire valor na medida em que se relaciona com o todo de que faz parte. Para Saussure, o signo deve ser visto como parte um sistema, onde as distinções são importantes e as unidades lingüísticas teriam uma identidade puramente relacional.

Outro ponto a destacar é que, enquanto todas as inovações da fala permanecem individuais, não há motivo para levá-las em conta, pois como mencionado anteriormente, o objeto de estudo saussuriano foi a langue. Destarte, as inovações da parole só entrariam no campo de observação do lingüista num momento em que o corpo social as acolhe. Veja-se o que diz Saussure (1916: 115):

Tudo quanto seja diacrônico na língua, não o é senão pela fala. É na fala que se acha o germe de todas as modificações: cada uma delas é lançada, a princípio, por um certo número de indivíduos antes de entrar em uso.

Fica evidente no pensamento estruturalista saussuriano que ao separar a langue da parole, ou seja, a língua da fala; há a cisão entre o social e o individual, o essencial do acessório. Ao priorizar a langue, Saussure limitou-se ao estudo restritivo do código, fora de suas condições de aparecimento e significação. Esta opção pelo abstrato e social converteu-se numa das principais características do paradigma estruturalista e num de seus principais "deslizes" teóricos. Ao conceber a língua como uma estrutura, deixa de lado o fato de que uma palavra ou enunciado pode ter vários sentidos.

Ainda vale salientar que as categorias saussurianas serviram de instrumento epistemológico ao estruturalismo em geral e, algumas delas, atravessaram os anos e estão vivas no arcabouço dos estudos lingüísticos atuais.

Feito essa abordagem dos estudos estruturalistas, nada melhor que passar a um panorama dos estudos pós-saussurianos.

Para um panorama concatenado, nada melhor do que começar pelo estruturalismo. Sobre o mesmo, é deveras importante dizer que ao longo do tempo, teve de enfrentar e superar vários limites, especialmente dentro de seus próprios liames e fronteiras. As críticas no tangente aos seus modelos e paradigmas incluíam a desconsideração aos aspectos cruciais dos fenômenos lingüísticos, como o papel do sujeito e da fala, visão reducionista das relações entre diacronia e sincronia e apagamento de fenômenos semântico-textuais no estudo da língua.

Em meados do século XX, alguns lingüistas formalistas ficarão insatisfeitos com as descrições, pois para eles a lingüística deveria ultrapassar os liames da descrição chegando às explicações. Nesse ínterim se desenvolverá o gerativismo.

A escola gerativa não se proporá à descrição, ao contrário, se voltará para a forma e o significado das expressões de uma determinada língua. No gerativismo, por meio de uma Gramática Universal (GU), houve a tentativa de explicar o conhecimento lingüístico com base na existência de uma base genética para a faculdade da linguagem. O gerativismo pautou-se no enfoque de que uma língua não poderia ser aprendida.

O gerativismo apresentará a noção de que a linguagem não se constitui num hábito que alguém ou a sociedade ensina ao indivíduo. O organismo humano nasceria preparado para, a partir da exposição a uma língua qualquer, selecionar os elementos e caracteres nela presentes. O ser humano seria dotado dessa capacidade de linguagem.

Um ponto importante entre as teorias estruturalista e gerativa estaria no fato de que nesta, há a concepção de que a língua é um fenômeno individual, ao passo que naquela, seria um fenômeno social.

Da preocupação com as concepções, até então vigentes, surgirá um novo olhar nos estudos lingüísticos, a escola funcionalista. Daí a pergunta – mas o que é o funcionalismo dentro da ciência da linguagem? Uma teoria lingüística com propostas bem distintas das correntes anteriores, mas sem negá-las.

O funcionalismo se pautará no princípio de que toda a explicação lingüística deve ser buscada na relação entre linguagem e uso, ou na linguagem em uso no contexto social. Tem-se aí uma nova postura – a de que a interação é importante nos processos comunicativos. A teoria funcionalista explicará, por exemplo, o fenômeno lingüístico nas relações sócio-interacionais entre falantes/ ouvintes, levando-se em conta, a pragmática, e possíveis intelecções discursivas.

No tangente à origem da corrente funcionalista, Pezatti (ano?) diz que "o ponto de vista funcional pode ser encontrado também na Escola de Praga". No entanto, mesmo sabendo que o embrião funcionalista remonta à Escola de Praga, o funcionalismo enquanto teoria só se configurará anos mais tarde. Vale salientar que a teoria funcionalista se ramificou ou se dividiu em várias vertentes na atualidade. Hoje, há várias concepções dentro dessa teoria maior. Como exemplo pode-se citar: a pragmática, lingüística textual, análise do discurso, dentre outras.

Em suma, o que se pode dizer é que com base nesse panorama dos estudos lingüísticos, tem-se que Saussure jamais poderá ser olvidado e que, torna-se imprescindível ter em mente que as muitas teorias lingüísticas surgiram em detrimento de necessidades sentidas, sob as impressões de seus tempos. Portanto, mesmo hoje, muito do que se sabe pode ter uma origem numa dessas teorias. Um exemplo claro disso é o fato de que a língua como um fator social tão apregoado por Saussure ainda está em voga nos trâmites do funcionalismo, mesmo que sob a faceta da interação e mudança lingüística provocada no uso social; detalhe olvidado ou não levantado pelo genebrino ou Chomsky. Na atualidade, por exemplo, sabe-se que há um gene responsável pelo desenvolvimento da linguagem; portanto, tem-se que a diversidade lingüística existe e faz parte do fazer ciência. Uma teoria, de alguma forma, serviu para outra. Na verdade, elas se desenvolveram e se desenvolvem na tentativa de explicar fatores não explicados ou abarcados anteriormente.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CÂMARA Jr., J. M. Princípios de lingüística geral. Rio de Janeiro: Padrão Livraria Editora, 1980.

DUBOIS, j. et al. Dicionário de lingüística. São Paulo: Cultrix, 1978.

NEVES, M. H. M. A gramática funcional. São Paulo: Martins Fontes, 1997.

VOTRE, S. & NARO, A. Mecanismos funcionais do uso da língua. D.E.L.T.A. São Paulo, v. 5, n. 2, 1989.

RAPOSO, E. Teoria da gramática. A faculdade da linguagem. Lisboa: Editorial caminho, 1992.