Richard Rorty começa seu texto Philosophy as Cultural Politcs de uma forma bem racional e que nos põe diretamente a pensar em nosso país:

O termo “política cultural” cobre, entre outras coisas, argumentos sobre as palavras que usamos. Quando dizemos a franceses que deveriam parar de chamar alemães de “chucrutes” ou que as pessoas não deveriam se referir a pessoas negras como “crioulas” nós estamos praticando política cultura. (RORTY, 2007, p. 3). 

Será que é isso que vemos não só entre franceses e sua etiqueta e entre as pessoas do mundo em respeito aos negros? Será que este ponto que nós visualizamos e aplicamos quando o assunto é saber como tratar alguém, seja um companheiro de jornada, seja um afeto, ou seja, uma pessoa de um país “inimigo” nosso?  

Não é bem assim que o mundo gira e não é assim que nem na mídia, nem nas ruas e nem nos altos escalões do governo a coisa funciona. Durante toda a caçada a Osama Bin Laden viu-se uma troca de acusações religiosas sem fim entre talibãs (que não respondem pelo grosso do povo afegão, diga-se de passagem, e nem pelo preconceito ridículo que se fala quando se tem como cara a religião islâmica que não é responsável por homens bomba e fundamentalista que usam o livro sagrado para seu bel prazer e transformar e interpretar palavras como bem queiram) viu-se insultos e palavras de baixo calão voarem mais rápido do que bombas e é isso que vemos, por exemplo, pelo veto russo e chinês a sansões e a retaliações ao Irã como lemos em qualquer noticiário. Será que esta é a adequada política cultura que queremos? Será que esta é a tão sonhada de se viver bem entre as noções de instituições como a ONU apregoam e dão o nome de “paz”. Não!

E a quem ainda acha que a linguagem não faz coisas como explicar a apropriação do “übermansch” nietzschiano pelos nazistas em plena preparação para uma guerra? Como explicar que uma figura que representa apenas um homem ou um além-homem que não prive de sua vontade de vida diante de uma auspiciosa e ruim “moral de rebanho” assumida por Nietzsche como escravizadora e típica cristã que deveria ser transvalorada como alguém que aponte armas para inocentes e faça judeus de cobaias humanas e vivas para experimentos bizarros do que quis se chamar de medicina, mas bem poderia ser chamado de horror?

Sim caros leitores e leitoras há sim um absurdo que é o que se diz e como se diz uma simples coisa e pode se provocar uma guerra ou incendiar um relacionamento ou simplesmente matar um sentimento. Isso tudo é questão de como se fala, do que se fala e como o preconceito, principal alvo deste texto, se camufla dentro de expressões medonhas e depreciativas como vimos por aí.

O fato de chamar uma pessoa negra de “crioula” não é o cerne do preconceito, mas a política cultura, isto é, a cultura que se carrega de inferioridade e pejoratividade na palavra que nos faz evitar ao invés de repetir aos quatro ventos. Nós não sabemos o efeito que uma palavra como estas pode tomar em algum ouvido e jamais poderemos dizer que tudo que dissermos está justificado pelas nossas intenções, pois nossas intenções não acompanham nossas palavras, ao máximo um olhar; uma expressão; um gesto e nada mais.

Então cada vez que formos a um discurso, num bate papo, numa conversa informal prestemos atenção ao que se diz, pois “fogo” tanto pode significar atirar em alguém, avisar de um incêndio, como ser uma simples forma de falar. E existem inúmeros exemplos destes e quem assistiu Sherlock Holmes 2 o Jogo das Sombras pode ver o quão lisonjeira é uma mensagem escrita por antônimos. Temos que ser mais espertos e mais intensos no que falamos, porém tomando muitíssimo cuidado com toda e qualquer palavra dita, pois se estamos numa sociedade, e queremos essa tal de política cultural funcionando bem sem provocar problemas temos que ser claramente zelosos com cada uma de nossas frases, pois como diz a música dos Mutantes “não vá se perder por aí...”.

É muito triste saber que se pode perder uma vida ou uma história somente por palavras ditas, escritas e que guerras já foram declaradas e sentenciadas por elas. Mas é um fato como um mais um é, ainda, dois. Nós não temos opção e nós não temos condições de prever quando uma palavra pode ser entendida como uma ofensa ou como um grato elogio, porquanto o melhor é observar a lei de falar pouco e com esmero nos adjetivos e advérbios que são absolutamente (como este aqui) traiçoeiros. Que não pensemos mais em Nietzsche como benfeitor dos nazistas, pois não foi. Nem em Marx como justificando qualquer desmando de Stalin como também jamais ocorrera. O mundo não carece mais de desentendimentos lingüísticos, mas de atenção no que se vai dizer e ouvir não acham, ainda mais numa era em que “ter preconceito com o racismo”, e “se você fosse branco seria perfeito” são expressões repetidas em canais de alta freqüência de pessoas assistindo. Temos que ignorar os desmandos da linguagem e fazer com que tudo que dissermos ou fizermos seja absolutamente uma página de palavras transparentes e sem duplo sentido algum. Para nosso bem, o bem da gramática e o bem dos países deixemos que demônios existam só no imaginário religioso, e mal seja um assunto moral não é melhor assim. É melhor esquecer o azeite quando o caldo já está muito gorduroso ora, pois!

Referência Bibliográfica:

RORTY, RICHARD, Philosophy as cultural politics. USA. Cambridge University Press, 2007.

Eustáquio José 

Mestrando e Bacharel em Filosofia pela UFPE-PE