TUTELA CONSTITUCIONAL E PENAL DO MEIO AMBIENTE


Helyrose Rosely Santos da Silva


RESUMO


O presente artigo tem como objetivo estudar de que forma se deu a constitucionalização e a criminalização das práticas degradadoras ao meio ambiente. Nesse sentido, estudar-se á no primeiro capítulo, o meio ambiente alçado a direito fundamental e tipificado no art. 225 e por consequência, incluído no rol de bens jurídicos altamente relevantes. Por conseguinte, estudar-se á a tutela penal do ambiente, evidenciando as características do Direito Penal Ambiental e apresentando as generalidades e inovações da lei de crimes ambientais, a lei nº 9.605/98. Para tanto, necessário ainda, estudar com maior precisão o bem jurídico ambiental, diferenciando dos demais bens e especificando-o de forma a justificar sua proteção constitucional e penal.

Palavras-chave: Constitucional. Penal. Crime. Ambiental.Proteção.

1 Introdução

Com o crescimento econômico e a globalização, tornaram-se cada vez mais freqüentes as lesões ao meio ambiente. Tal preocupação exigiu da sociedade, a necessidade em tratar o meio ambiente de forma especial, como meio de assegurar a eficaz proteção a seus recursos, objetivando a qualidade de vida por meio do ambiente ecologicamente equilibrado.
Nesse sentido, nasce o Direito Ambiental com vistas a regular e dispor, inclusive, acerca dos princípios norteadores de proteção do meio ambiente.
A esse respeito, considera-se que o Direito Ambiental entrou em vigor no ordenamento jurídico pátrio através da Lei nº 6.938 de 31 de agosto de 1981. Vê-se, portanto, tratar de um ramo recente do direito, por isso, seu conceito e objeto de estudo ainda carecem de maiores fundamentações, eis que, seu objeto possui natureza bastante ampla. Apesar disso, tendo a Constituição Federal ouvido os reclames da sociedade, indubitável é o meio ambiente alçado a direito fundamental e, portanto, incluso no rol de bens jurídicos altamente relevantes e a merecer proteção sob a ótica do Direito Penal.
Assim, tendo em vista a necessidade de assegurar os direitos fundamentais, o Direito Penal, dentre outras formas de proteção, criminaliza condutas que violem a proteção de bens jurídicos altamente relevantes.
Nesse contexto, nada mais coerente no âmbito do Direito Ambiental que práticas contrárias à proteção ambiental, sejam também criminalizadas.
Desta forma, tendo em vista que a Lei nº 9.605/98 definiu como crime algumas condutas que agridem o meio ambiente, tem como propósito o presente artigo, estudar a lei de crimes ambientais e suas vantagens e desvantagens no que tange a efetiva proteção penal do meio ambiente.
No primeiro capítulo, estudar-se á o meio ambiente e sua constitucionalização, eis que o art 225 da CF alçou o meio ambiente a bem jurídico altamente relevante e por conseqüência digno da tutela penal
Por conseguinte, no segundo capítulo, abriremos espaço para discutir aspectos importantes da tutela penal do meio ambiente. Ademais, analisar-se-á a Lei nº 9.605/1998, destacando suas importantes inovações na efetividade da defesa do bem ambiental.
2 Noções do direito fundamental ao meio ambiente e sua proteção constitucional

Define-se direitos fundamentais como o conjunto de direitos e garantias do ser humano, em que o respeito a sua dignidade, se traduz como sua finalidade principal. Para tanto, necessária é a proteção a determinados bens jurídicos, como meio de garantir as condições mínimas de vida e desenvolvimento do ser humano. Nesse sentido, tem-se o meio ambiente ecologicamente equilibrado como bem jurídico altamente relevante, e portanto, digno de proteção pelo ordenamento jurídico brasileiro.
Para o estudo do meio ambiente como direito fundamental, há a necessidade de compreender, antes de tudo, a importância do Direito Ambiental e seu objeto de estudo, qual seja, o meio ambiente. Para tanto, necessário expor seus principais conceitos e definições.
A esse respeito, Silva (2010), na obra Direito Ambiental Constitucional, em que reserva espaço para estudo do meio ambiente, inicia alertando o leitor para a redundância da expressão meio ambiente, eis que, entende o autor que a palavra meio já se encontra incluída no sentido da palavra ambiente. Portanto, ao indicar a palavra ambiente, o âmbito, a esfera e o círculo em que vivemos, é que se faz desnecessário e redundante, falar em "meio".
Nesse sentido, Silva (2010, p. 18) ilustra o posicionamento italiano quanto ao meio ambiente, vez que os mesmos não utilizam a palavra "meio", e sim, só, "ambiente".
Em Italiano, contudo, só se emprega a palavra "ambiente", que, segundo Massimo Severo Giannini, corresponde a três noções:
I ? a de ambiente enquanto paisagem, incluindo, tanto as belezas naturais como os centros históricos, parques e florestas;
II ? a de ambiente como objeto de movimento normativo ou de idéias sobre defesa do solo, do ar e da água.
III - a de ambiente como objeto da disciplina urbanística.
Por outro lado e em contraposição ao posicionamento anterior, justifica Silva (2010, p. 18), a prática da Língua Portuguesa, que opta por incluir a palavra "meio", como forma de fortalecer o sentido do ambiente.
Em Português também ocorre o mesmo fenômeno, mas essa necessidade de reforçar o sentido significante de determinados termos, em expressões compostas, é uma prática que deriva do fato de o termo reforçado ter sofrido enfraquecimento no sentido a destacar, ou, então porque sua expressividade é mais ampla ou mais difusa, de sorte a não satisfazer mais, psicologicamente, a idéia que a linguagem quer expressar. Esse fenômeno influencia o legislador, que sente a imperiosa necessidade de dar aos textos legislativos a maior precisão significativa possível; daí por que a legislação brasileira, incluindo normas constitucionais também vem empregando a expressão ?meio ambiente?, em vez de ?ambiente?, apenas.
Portanto, pode-se inferir pela citação acima, que clara era a preocupação do legislador brasileiro quando optou pela prática lingüística adotada. A intenção do mesmo estava no sentido de fortalecer o sentido da palavra, atribuindo desde já, uma amplitude de sentido que revelasse a importância do meio ambiente. Para corroborar tal entendimento, Silva (2010, p. 18) ensina:
O ambiente integra-se, realmente, de um conjunto de elementos naturais e culturais, cuja interação constitui e condiciona o meio em que se vive. Daí por que a expressão ?meio ambiente? se manifesta mais rica de sentido (como conexão de valores) do que a simples palavra ?ambiente?. Esta exprime o conjunto de elementos; aquela expressa o resultado da interação desses elementos. O conceito de meio ambiente há de ser, pois, globalizante, abrangente de toda a natureza original e artificial, bem como os bens culturais correlatos, compreendendo, portanto, o solo, a água, o ar, a flora, as belezas naturais, o patrimônio histórico, artístico, turístico, paisagístico e arqueológico.
Nota-se, portanto, que a visão que Silva (2010, p. 18) tem acerca do meio ambiente é uma visão macro, na qual o define como a interação do conjunto de elementos naturais, artificiais e culturais, elementos esses que propiciam o desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas formas, além de defender, uma concepção unitária do ambiente, que compreende recursos naturais e artificiais.
Nesse sentido, verifica-se que Silva (2010, p. 19) traz em seu conceito, a existência de três aspectos.
I ? meio ambiente artificial, constituído pelo espaço urbano construído, consubstanciado no conjunto de edificações (espaço urbano fechado) e dos equipamentos públicos (ruas, praças, áreas verdes, espaço livres em geral: espaço urbano aberto;
II - meio ambiente cultural, integrado pelo patrimônio histórico, artístico, arqueológico, paisagístico, turístico, que, embora artificial, em regra, como obra do Homem, difere do anterior ( que também é cultural) pelo sentido de valor especial que adquiriu ou de que se impregnou;
III - meio ambiente natural, ou físico, constituído pelo solo, a água, o ar atmosférico, a flora: enfim, pela interação do s seres vivos e seu meio, onde se dá a correlação recíproca entre as espécies e as relações destas com o ambiente físico que ocupam.
Milaré (2007, p. 109), por sua vez, também destaca em sua obra, uma atenção especial no que tange ao sentido da expressão meio ambiente. Afirma inicialmente que tal denominação foi utilizada pela primeira vez pelo naturalista francês Geoffroy de Saint ? Hilare. Ademais, diz pertencer o meio ambiente, a uma categoria cujo conteúdo é mais intuivel do que definível, eis que leva em conta sua riqueza e complexidade. Ainda no que tange a expressão meio ambiente, define como uma expressão camaleão, que representa nada mais do que as paixões, expectativas e incompreensões daqueles que dele cuidam. No entanto, ressalta a importância em examinar a expressão em suas diferentes acepções, eis que, para o jurista, necessário se faz compreender as noções que se relacionam com sua tarefa de formular e aplicar normas jurídicas.
Assim, dá a sua contribuição quanto a elucidar o sentido do referido instituto, quando expõe a diferença entre as nomenclaturas: meio e ambiente.
Tanto a palavra meio como o vocábulo ambiente passam por conotações diferentes, quer na linguagem científica, quer na vulgar. Nenhum destes termos é unívoco (detentor de um significado único), mas, ambos são equívocos (mesma palavra com significados diferentes). Meio pode significar: aritmeticamente, a metade de um inteiro; um dado contexto físico ou social; um recurso ou insumo para alcançar ou produzir algo. Já ambiente pode representar um espaço geográfico ou social, físico ou psicológico, natural ou artificial (MILARÉ, 2007, p. 110).
Com efeito, Milaré (2007) manifesta-se contrário a redundância existente na expressão meio ambiente, no entanto, em consonância com o que leciona Silva (2010), defende a consagração da expressão pela Língua Portuguesa, sendo esta usada de forma pacífica na doutrina, lei e jurisprudência, que amiúde falam em meio ambiente, em vez de ambiente apenas.
Nessa perspectiva, inova Milaré (2007, p. 110), quando conceitua o Meio Ambiente em termo técnico e jurídico, subdividindo essa última em duas visões: ampla e estrita.
Em linguaguem técnica, meio ambiente é a "combinação de todas as coisas e fatores externos ao indivíduo ou população de indivíduos em questão". Mais exatamente, é constituído por seres bióticos e abióticos suas relações e interações. Não é mero espaço circunscrito ? é realidade complexa e marcada por múltiplas variáveis.No conceito jurídico mais em uso de meio ambiente podemos distinguir duas perspectivas principais; uma ampla e outra estrita.Numa visão estrita, o meio ambiente nada mais é o que a expressão do patrimônio natural e as relações com e entre seres vivos.Tal noção, é evidente, despreza tudo aquilo que não diga respeito aos recursos naturais.Numa concepção ampla, que vai além dos limites estreitos fixados pela Ecologia tradicional, o meio ambiente abrange toda a natureza original (natural) e artificial, assim como os bens culturais correlatos. Temos aqui, então, um detalhamento do tema: de um lado, com o meio ambiente natural, ou físico, constituído pelo solo, pela água, pelo ar, pela energia, pela fauna e pela flora; e, do outro, com o meio ambiente artificial (ou humano), formado pelas edificações , equipamentos e alterações produzidos pelo homem, enfim os assentamentos de natureza urbanística e demais contruções (MILARÉ, 2007, p. 110).
Diante do apresentado, fica claro que compreender o meio ambiente supera a discussão voltada à sua nomenclatura. Na verdade, o que de fato importa é a essência, o conteúdo do meio ambiente. A dificuldade em conceituá-lo como dito anteriormente, decorre da própria complexidade do bem jurídico ambiental. No entanto, a maioria dos autores tais como os já citados anteriormente o definem com base em três aspectos: o ambiente natural, o cultural e o artificial.
Ainda no campo conceitual, Milaré (2007, p. 112), propõe o conceito legal, destacando sua importância e definindo de forma mais precisa a expressão alvo de divergências doutrinárias. Trata-se do conceito concebido pela lei nº 6.938/1981 (Política Nacional do Meio Ambiente), que define como sendo o meio ambiente, o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas. Destaca ainda, que tal definição afasta-se de rigores e eventuais controvérsias científicas para servir ao seu objetivo principal da lei, qual seja, a delimitação do conceito ao campo jurídico.
Outro conceito que merece total credibilidade é o proposto pela Constituição Federal de 1988. Aliás, é a partir dele que o meio ambiente foi alçado a direito fundamental.
Nesse passo, compreendido o campo conceitual do meio ambiente, necessário investigar agora, sua proteção constitucional.
Dessa forma, Silva (2010, p. 46) afirma ser a Constituição Federal de 1988, a primeira Constituição a tratar da questão ambiental, eis que, as demais constituições anteriores nada traziam especificamente no que concerne à proteção do meio ambiente natural, porém, ressalva que entre as Constituições mais recentes, a de 1946, parecia iniciar tal proteção, ao tratar de preceito protecionista da saúde e sobre a competência da União para legislar sobre águas, florestas, caça e pesca, o que possibilitava a elaboração de leis protetoras como o Código Florestal e os Códigos de Saúde Pública de Água e de Pesca.
Em consonância com tal entendimento, Cavalcante (2006, p. 36) defende que a Declaração da Conferência da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre o Ambiente Humano, realizado em Estocolmo em 1932, foi o evento de grande relevância em matéria de meio ambiente, pois os princípios nela consagrados influenciaram o direito em praticamente todo o mundo. Nesse contexto, entende que a tutela jurídica do meio ambiente tornou-se imperativa para praticamente todos os países. Afirma ainda que, desde a Constituição de 1934, todas as constituições brasileiras mantiveram a proteção do patrimônio histórico e paisagístico do país, e consideraram a função social da propriedade, no entanto, tal proteção não se preocupava em proteger o meio ambiente de forma globalizada. O que se tinha, era uma proteção diluída e casual. Assim conclui, quando enseja que a real proteção ambiental só veio ocorrer com a Constituição de 1988, que no entender da autora, sem sombra de dúvidas, é uma das mais avançadas do mundo nesse aspecto.
Assim, seguindo esse rumo, a Constituição Federal no texto legal do seu art. 225, prevê a primeira proteção constitucional ambientalista.
Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações (Art, 225, CF) (BRASIL, 1988, não paginado).
Prado (2007, p. 76) por sua vez, diz que a atual Constituição Brasileira, buscou inspiração nas Constituições da Grécia, de 1975; de Portugal de 1976, e da Espanha, de 1978 e revela a essência legislativa dessas Constituições.
O tratamento constitucional aqui adotado reflete, como se vê, tendência exclusiva das constituições contemporâneas, elaboradas num momento em que são fortes a consciência e a preocupação ecológicas dos povos civilizados. A intenção do legislador constituinte brasileiro foi dar uma resposta ampla à grave e complexa questão ambiental, como requisito indispensável para garantir a todos uma qualidade de vida digna. Em última instância, valor maior a ser protegido, e que caracteriza a natureza de certo modo instrumental e relativamente personalista da tutela jurídica do ambiente. Aliás, essa é uma conseqüência lógica da própria concepção de Estado democrático e social de Direito consagrada na Lei Magna.
Em outras palavras, Prado (2007) propõe que a constitucionalização do meio ambiente, reflete a preocupação quanto à questão ambiental, portanto, decorre da consciência e necessidade da preservação ambiental, eis que um ambiente ecologicamente equilibrado é requisito essencial para a proteção de outro direito fundamental: o direito à vida.
Dentro desse contexto, Prado (2007, p. 76) afirma ainda, estar presente nessa tendência uma nova espécie de constitucionalismo: o existencialista. Tal espécie é uma das características da nossa contemporaneidade e consiste em estar atenta às necessidades dos indivíduos e preocupada com condições materiais e espirituais. Por isso é que surge no ordenamento jurídico, direitos vitais que continuam a crescer à medida que novas necessidades vão aparecendo, sendo, portanto, jurisdicizadas.
E nessa perspectiva, pode-se entender que quando a Constituição de 1988 alçou a proteção do Meio Ambiente a direito fundamental, procurou atender aos anseios da sociedade quanto à preocupação da questão ambiental. Entendeu ainda, ser necessário proteger o meio ambiente em todos os seus aspectos a fim de garantir a qualidade de vida da espécie humana.
Registre-se ainda, o posicionamento de Sirvinskas (2006, p. 47) quanto à importância da qualidade de vida para a Constitucionalização do Meio Ambiente.
A qualidade de vida, como se vê, é a finalidade que o Poder Público procura alcançar com a união da felicidade do cidadão e do bem comum e supera estreita visão quantitativa expressa pelo conceito de nível de vida. Busca-se, nas palavras da própria Carta Política, a construção de uma sociedade livre, justa e solidária. Assim, meio ambiente e qualidade de vida fundem-se no direito à vida, transformando-se num direito fundamental. Por isso que a maioria das Constituições passou a protegê-la mais intensamente como garantia de coletividade.
Na mesma direção, Prado (2007, p. 76) ratifica o posicionamento acima e explica ser a qualidade de vida e o bem estar social, garantias do Estado Democrático de Direito, que impulsionaram a colocação do meio ambiente no rol de direitos fundamentais.
Foi dentro dessa perspectiva de melhoria de qualidade de vida e de bem-estar social a alcançar que o texto maior erigiu como direito fundamental o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, indispensável à vida e ao desenvolvimento do ser humano. Essa particularidade vem manifestada na valorização concreta da condição humana digna, da qualidade de vida do ser humano como dado vital inerente ao seu desenvolvimento enquanto pessoa.
Pois bem, tem-se portanto cristalizado em nosso ordenamento, mais precisamente em seu art. 225, a proteção ambiental de forma ampla. No entanto, tal dispositivo legal, não é o único a tratar na Constituição dessa proteção. Portanto, não se pode considerar o Direito Ambiental Constitucional a partir desse único preceito.
Existem ainda outras disposições que tratam da matéria em questão, disposições essas que Silva (2010, p. 46) define como referências constitucionais explícitas e implícitas e sugere seu estudo de forma especial, para a eficiente compreensão do Direito Ambiental como um todo.
A Constituição dedica, como foi dito, um importante capítulo ao meio ambiente, que é o Capítulo VI do Título VIII, sobre a "Ordem Social". O núcleo, portanto, da questão ambiental encontra-se nesse capítulo, cuja compreensão, contudo, será deficiente se não se levar em conta outros dispositivos que a ela se referem explícita ou implicitamente. De fato, como se disse acima, a questão ambiental permeia o texto constitucional mediante expressão explicita ao meio ambiente, que se mostra ao pesquisador com maior clareza. Há, porém, muitos outros dispositivos em que os valores ambientais se apresentam sob o véu de outros objetos da normatividade constitucional. Como nota Renato Magalhães Jr., são dispositivos com valores do meio ambiente em penumbra constitucional, passíveis de descoberta, que demanda pesquisa atenta na Constituição.
No entanto, levando em conta o objeto de estudo em questão, estudar-se-á apenas as referências explícitas, mais precisamente o conteúdo normativo do art. 225, de maneira a revelar os princípios do Direito Ambiental existentes e imprescindíveis para o estudo em questão, sem os quais não se pode prosseguir.
Sirvinskas (2006), ao citar o art. 225 da Constituição Federal centra-se na expressão "todos" existente logo no início do caput do art. 225 da Constituição Federal e que, segundo o mesmo, revela uma característica do meio ambiente: a visão antropocêntrica, eis que a palavra todos é compreendida como sendo o conjunto de pessoas integrado pelos brasileiros e estrangeiros residentes no País.
A respeito dessa característica aponta Sirvinkas (2006) para a necessidade de se construir uma nova base ética normativa da proteção do meio ambiente, partindo de uma visão mais moderna do meio ambiente e revelando outra característica, qual seja, a visão biocêntrica do Meio Ambiente.
Há a necessidade de se construir uma base ética normativa da proteção do meio ambiente. Todos os recursos são considerados coisas e apropriáveis sob o ponto de vista econômico, incluído aí a flora, a fauna e os minérios. Essa apropriação é possível pelo fato de o homem ser o centro das preocupações ambientais ? antropocentrismo. Há, no entanto, quem entenda que a flora, a fauna e a biodiversidade também são sujeitos de direito ? biocentrismo (Antônio Herman V. Benjamin, Edis Milaré, José Renato Nalini etc. Todos os seres vivos têm o direito de viver (SIRVINSKAS, 2006, p. 8)
Da mesma maneira, Prado (2007) assevera que o legislador ao afirmar ser o meio ambiente um bem de uso comum do povo, impondo não só ao Poder Público, mas também à coletividade, o dever de defendê-lo e preservá-lo, quis retratar também um perfil antropocêntrico.
Machado (2007), por sua vez, não discorda acerca da característica antropológica do art. 225 CF, e afirma, citando Mirra (1994 apud MACHADO, 2007) se tratar de um direito fundamental da pessoa humana, como forma de preservar a vida e a dignidade das pessoas ? núcleo essencial dos direitos fundamentais, pois ninguém se propõe a contestar que o quadro da destruição ambiental no mundo compromete a possibilidade de uma existência digna para a Humanidade e põe em risco a própria vida humana. Defende ainda, que tal característica também foi ratificada na Declaração da Conferência do Rio de Janeiro/92, quando esta em seu princípio nº 1, dispõe que os seres humanos constituem o centro das preocupações relacionadas com o desenvolvimento sustentável. Apesar disso, diz o autor, já haver uma preocupação em harmonizar e integrar os seres humanos e a biota. Tal equilíbrio pode ser visualizado nos §§ 4º e 5º, além dos incisos, I, II, III e VII do § 1º do art. 225 da Constituição Federal.
Portanto, mais que claro está a visão antropocêntrica atribuída ao preceito constitucional, no entanto, como bem assevera os autores supracitados, já existe um movimento que avista outra tendência a ser observada, qual seja, a observância da característica biocêntrica, que inclui no centro das discussões, a biota, destacando-a como sujeito do Direito Ambiental. No entanto, conclui-se que não se pode considerar uma ou outra característica. O mais adequado é integrar as duas, ou seja, admitir a interelação entre seres humanos e os seres biológicos.
Por conseguinte, pode-se extrair ainda do art. 225 CF, outros dois conceitos que merecem ser investigados: o primeiro deles é o ambiente ecologicamente equilibrado e o segundo, o princípio do direito à sadia qualidade de vida (BRASIL, 1988).
No que tange ao ambiente ecologicamente equilibrado pode-se dizer que tal conceito está diretamente relacionado com o desenvolvimento sustentável, o que nos propõe também considerar o binômio: desenvolvimento econômico e meio ambiente.
Nesse sentido, Machado (2007, p. 121) conceitua equilíbrio ecológico:
Equilíbrio ecológico "é o estado de equilíbrio entre os diversos fatores que formam um ecossistema ou habitat, suas cadeias tróficas, vegetação, clima, microorganismos, solo, ar, água, que pode ser desestabilizado pela ação humana, seja por poluição ambiental, por eliminação ou introdução de espécies animais e vegetais.
Milaré (2007), ao conceituar Ecologia, propõe que em linguagem corrente é equivalente a natureza, paisagismo, moda com temática de plantas e animais. Destaca ainda que tal palavra passou a denotar o movimento ativista voltado para a proteção ambiental, inclusive com conotações intelectuais e artísticas, sociais e políticos. Apesar disso, entende haver um aprofundamento desse conceito, o que leva a revisão de prática de hábitos sociais e até pessoais, voltada para uma vida saudável e sustentável.
Assim, pode-se entender que o equilíbrio ambiental nada mais é, do que a boa relação entre a ação do ser humano e os vários recursos do meio ambiente. É por isso, que a sustentabilidade é essencial para a compreensão do equilíbrio ecológico.
A esse respeito, Silva (2010, p. 25) afirma ter tal conceito, contornos constitucionais, eis que a própria Constituição Federal impõe ao Poder Público e à coletividade, o dever de defesa e preservação do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado para as presentes e futuras gerações.
Por sua vez, Fiorillo (2007, p. 29) define sustentabilidade e correlaciona com a atividade econômica humana, definido como a base para um ambiente ecologicamente equilibrado.
Constata-se que os recursos ambientais não são inesgotáveis, tornando-se inadmissível que as atividades econômicas desenvolvam alheias a esse fato. Busca-se com isso a coexistência harmônica entre economia e meio ambiente. Permite-se o desenvolvimento, mas, de forma sustentável, planejada, para que os recursos hoje existentes não se esgotem ou tornem-se inócuos. Dessa forma, o princípio do desenvolvimento sustentável tem por conteúdo manutenção das bases vitais da produção e reprodução do homem e de suas atividades, garantindo igualmente uma relação satisfatória entre os homens e destes com o seu ambiente, para que as futuras gerações também tenham oportunidade de desfrutar os mesmos recursos que temos hoje à disposição. [...] A busca e conquista de um ponto de um equilíbrio entre o desenvolvimento social, o crescimento econômico e a utilização dos recursos naturais exigem um adequado planejamento territorial que tenha em conta os limites da sustentabilidade.
Por fim, por meio dos conceitos acima apresentados, pode-se inferir que o princípio da sustentabilidade busca equilibrar o meio ambiente e o desenvolvimento econômico. Tal relação é requisito fundamental para garantir ao ser humano o direito ao ambiente ecologicamente equilibrado.
O segundo princípio também preconizado pelo art 225 da atual Constituição e que também merece destaque é o princípio do direito à sadia qualidade de vida.
No dizer de Machado (2007), esse princípio só pode ser mantido e efetivado se o meio ambiente estiver ecologicamente equilibrado. Nesse sentido, defende que o conceito de qualidade de vida é um conceito que precisa de normas e de políticas públicas para serem dimensionados, no entanto, afirma que tal conceito está para além do não diagnóstico de doenças e compreende a sanidade do estado dos elementos da natureza ? águas, solo, ar, flora, fauna, e paisagem. Por fim, parafraseando Ramón (1994 apud MACHADO, 2007), diz ser a qualidade de vida, um elemento finalista do Poder Público, onde se unem a felicidade do indivíduo e o bem comum, com o fim de superar a estreita visão quantitativa, antes expressa no conceito de nível de vida.
Nesse esteio, Prado (2007) também assevera que não é possível falar em qualidade de vida humana sem uma adequada conservação do ambiente, do mesmo modo, afirma que a própria existência da espécie humana depende dessa proteção.
Assim, delineados tais princípios, pode-se afirmar que a Constituição Federal alçou com maestria o Meio Ambiente a direito fundamental, incluindo a qualidade do meio ambiente como bem jurídico a ser protegido. Nesse sentido, faz-se necessário sua preservação e conservação e o desrespeito a tais normas e princípios, incide na aplicação de penalidades, sejam elas, de natureza, civil, administrativa ou penal, conforme dispõe § 3º do art. 225 da CF: "As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados" (BRASIL, 1988).
Nesse sentido, tendo em vista que a Lei 9.605/98 se propõe à proteção penal do meio ambiente, faz-se necessário, no subitem seguinte, delinear os contornos em que se dá essa proteção.

3 Aspectos gerais e inovações da Lei 9.605/98 (Lei de Crimes Ambientais)

Conforme já mencionado anteriormente, a Constituição Federal alçou o meio ambiente a direito fundamental. Por essa razão, tem-se, a qualidade do meio ambiente como bem jurídico altamente relevante, e por assim ser, a merecer proteção penal.
A respeito dessa proteção penal ambientalista, entende Milaré (2007, p. 921).
A proteção penal do meio ambiente foi recomendado pelo próprio legislador constituinte, fato que, por si só, elimina qualquer discussão quanto à discussão quanto à pertinência de sua seleção para a categoria de bem jurídico autônomo, considerado por Welzel como aquele "vital de la comunidad o del individuo que por su significância social es protegido juridicamente.
Por isso, em consonância com o que dispõe o § 3º da Carta Magna, é que o legislador editou a Lei nº 9.605/98, também conhecida com a lei dos Crimes Ambientais (BRASIL, 1988).
Nesse contexto, Silva (2010, p. 3), afirma ser a Lei nº 9.605/98 resultado de um projeto de sistematização das penalidades anteriormente previstas em legislações que antes tutelavam assuntos relativos ao ambiente, especificamente no âmbito penal. Dessa forma, justifica a atuação da referida lei, pela integralização de dispositivos penais ambientais já existentes. Por outro lado, assevera que a lei atual só complementa a Lei nº 7.804/89, não derrogando, portanto as leis anteriores. Acrescenta ainda, que tal lei vem regulamentar a disposição constitucional e embora apresente muitas críticas, já constitui um enorme avanço e uma constatação da preocupação do legislador com um bem de tão alta relevância para todo o mundo: o meio ambiente.
Nesse mesmo esteio, Duarte e Gentile (2009, p. 165), destacam a lei de crimes ambientais como um marco na proteção ambiental e ainda apresentam suas principais inovações.
A lei federal 9.605/98 trouxe importantes avanços em termos de proteção ambiental, sistematizando e tentando consolidar em um único instrumento legal boa parte da legislação referente ao meio ambiente no que se refere à matéria penal.Como marcantes inovações podemos citar: a não utilização do encarceramento como norma geral para as pessoas físicas criminosas e a valorização das penas alternativas, a valorização da intervenção da Administração Pública através de autorizações, licenças e permissões e, especialmente, a implementação da responsabilização penal da pessoa jurídica já introduzida pela Constituição Federal de 1988.
Portanto, têm-se como principais contribuições e inovações da Lei nº 9.605: a valorização das penas alternativas e da intervenção da Administração Pública por meio de licenças, autorizações e permissões, além da responsabilização penal da pessoa jurídica.
Acerca da responsabilidade penal da pessoa jurídica, pode-se afirmar que este é tema cada vez mais freqüente nos debates jurídicos, isso porque tem se mostrado bastante controverso, dividindo opiniões das mais variadas quando o assunto é a possibilidade ou não de sua atuação.
Milaré (2007, p. 926) sintetiza em que momento se deu a inclusão desse tipo de Responsabilidade.
Seguindo tendência do Direito Penal moderno de superar o caráter meramente individual da responsabilidade penal até então vigente, e cumprindo promessa do art 225, § 3º, da CF, o legislador brasileiro erigiu a pessoa jurídica à condição de sujeito ativo da relação processual penal, dispondo, no art. 3º da Lei nº 9.605/98, que as pessoas serão responsabilizadas administrativa civil e penalmente conforme o disposto nesta lei, nos casos em que a infração seja cometida, no interesse ou benefício da sua entidade.
Ainda no dizer de Milaré (2007, p. 926), a intenção do legislador ao editar tal dispositivo, foi punir o criminoso certo e não apenas o humilde, visto que, via de regra, o verdadeiro delinqüente ecológico não é a pessoa física, mas, a pessoa jurídica, as empresas que buscam o lucro como finalidade precípua, pouco se importando a longo ou médio prazo com os prejuízos causados à coletividade.
Nesse sentido, Duarte e Gentile (2009, p. 165), por sua vez, defendem que a lei de crimes ambientais ao responsabilizar a pessoa jurídica, tende a levar a uma conduta empresarial mais madura e consciente no exercício de atividades degradantes do ambiente. Afirmam ainda com relevância, o fato de que o sujeito ativo nos crimes ambientais, seja pessoa física ou jurídica, geralmente, pratica o crime como resultado de uma atividade produtiva, não oferecendo periculosidade ao meio social, como nos crimes comuns. Ademais, confirma o posicionamento defendido por Milaré (2007), quando afirma que no caso de crimes em que o sujeito é pessoa física, este, não age individualmente, mas sim, em nome de uma pessoa jurídica.
No entanto, apesar dos precedentes acima para a criminalização da pessoa jurídica há quem entenda também pela não responsabilização da pessoa jurídica, em razão da incapacidade de conduta e culpabilidade.
De um lado, grandes mestres pregam não ser possível tal responsabilização, pois tais entes coletivos não podem praticar crimes ou contravenções penais, já que não detêm capacidade de conduta e culpabilidade. Por não possuir existência corpórea, nem tampouco psiquismo, a empresa não pode por si mesma, praticar ações ou omissões (SILVA, 2010, p. 66).
Em contraposição e favorável à responsabilização da pessoa jurídica, Sznick, (2001) prega a responsabilização da pessoa jurídica pela teoria da autoria imediata. Assim, entende que da mesma forma que não se pune o menor, mas sim, quem o usou, não se pune o louco, mas, quem o levou à conduta lesiva, deve ser punida a pessoa jurídica, que faz uso de um subordinado ou terceiro, as vezes de boa fé, para a consecução de sua vontade.
Por fim, pode-se concluir que o legislador ao estabelecer a responsabilização penal da pessoa jurídica, buscou antes de tudo, conhecer a realidade em que se dá os crimes ambientais, principalmente no que tange ao sujeito ativo desse crime que, apesar parecer ser pessoa física, em sua maioria das vezes, é a pessoa jurídica, empresas que com o objetivo de lucratividade, agridem o meio ambiente. Nesse contexto, o legislador ao estabelecer a responsabilidade penal da pessoa jurídica, quis, antes de tudo, punir o real responsável por grande parte dos crimes ambientais: a pessoa jurídica.
Outra inovação advinda da Lei de Crimes Ambientais, diz respeito à valorização das penas alternativas, conforme dispõe o art 7º da referida lei.
Art. 7º As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade quando:
I - tratar-se de crime culposo ou for aplicada a pena privativa de liberdade inferior a quatro anos;
II - a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias do crime indicarem que a substituição seja suficiente para efeitos de reprovação e prevenção do crime (art, 7º, Lei 9.605/98) (BRASIL, 1998, não paginado).
No dizer de Duarte e Gentile (2009, p. 165) as penas alternativas podem ser compreendidas como a efetivação do caráter humanista das normas penais baseadas no Direito Penal Mínimo, em que se busca uma descriminalização através do incentivo a meios educativos socialmente mais benéficos de penalização do agente infrator.
Nessa mesma direção, Machado (2007, p. 696) diz sobre o sistema penal ambiental.
Passamos a ter um sistema penal ambiental predominantemente sancionador das pessoas físicas ? o da restrição de direitos. A promiscuidade carcerária fica afastada, esperando-se que o novo sistema de penas seja efetivamente aplicado, inclusive com a fiscalização dos meios de comunicação e da própria opinião pública.
Interessante destacar ainda, que quanto à aplicação das penas restritivas de direito, o legislador impôs uma mudança de tratamento, destinada ao agente que, em decorrência de determinada situação econômica comete crime ambiental em estado de necessidade. Tal tratamento pode ser evidenciado principalmente nos casos de crime contra a fauna, em que o agente, utiliza as espécimes para a sua sobrevivência ou de família.
Assim, pode-se afirmar que de fato a Lei nº 9.605, representa um grande marco no que tange à Responsabilização Penal do Meio Ambiente. O legislador ao editá-la, não só se preocupou com a realidade em que se dá os crimes ambientais, como também, com a própria especificidade do delito ambiental e por sua conseqüência, do bem jurídico ambiental. Aliás, é a partir do estudo do bem jurídico ambiental, que se busca analisar o principio da insignificância, objeto de estudo do presente trabalho. Por isso, a necessidade de delineá-lo com mais precisão.

4 A especificidade do bem jurídico penal ambiental

Como já estudado anteriormente, a própria Constituição é um dos meios de seleção dos bens jurídicos. Isso porque, é a fonte dos bens jurídicos suscetíveis de tutela penal, eis que em seu texto, se encontram os valores elementares da sociedade.
Nesse contexto, indubitável é a condição do meio ambiente como bem jurídico a ser protegido pelo Direito Penal, tendo em vista que, a própria Constituição em seu art. 225, o promoveu como direito fundamental.
No entanto, o que de fato interessa ao estudo do bem jurídico ambiental é o seu objeto de proteção.
A esse respeito, Prado (2007, p.121) afirma que anteriormente, a tutela penal do ambiente possuía o caráter puramente patrimonialista, ou seja, se limitava apenas ao direito de cada um de não ver perturbado o desfrute pacífico do ambiente ameaçado por condutas danosas. Tal tendência se dava inclusive, quando do interesse individual se passava ao coletivo, tratando-se sempre de uma visão circunscrita ou limitada, e não abrangente do ambiente.
No entanto, defende o autor que atualmente a idéia de bem jurídico tem se tornado um conceito de difícil determinação.
Segundo Prado (2007, p. 121), "A idéia de bem jurídico ambiente vem a ser uma questão assaz tortuosa e de difícil determinação. De caráter poliédrico e multidimensional, o termo ambiente assume na linguagem jurídica contornos peculiares e fluidos."
Aliás, é nessa dificuldade conceitual que se dá a primeira distinção do bem jurídico penal ambiental e os demais bens jurídicos a serem tutelados pelo Direito Penal. Como decorrência dessa amplitude conceitual, podemos considerar o meio ambiente como bem jurídico penal em duas categorias: meio ambiente categorial e bem jurídico específico.
Ainda aqui, destarte, emerge uma questão relevante para bem se compreender o contido na idéia de ambiente como bem jurídico ? penal. É mister, então, operar a necessária distinção entre o ambiente como bem jurídico categorial, ou seja, como objeto jurídico genérico de proteção, e como bem jurídico específico ( em sentido técnico) protegido em um determinado tipo legal de delito, isto é , como objeto jurídico próprio de cada figura delitiva (PRADO, 2007, p. 128).
Nesse contexto, defende o autor que em relação à amplitude conceitual, o ambiente não se confunde com os demais bens jurídicos individuais ou supra individuais protegidos pelo Direito Penal, pois, o bem jurídico penal ambiental é portador de substantividade ou textura própria, sendo vital em si mesmo como bem jurídico metaindividual sistematicamente autônomo. Nesse passo, não se quer dizer que o bem jurídico ambiental não se encontre em estreita conexão com a tutela instituída a outros bens, pelo contrário, apenas é dotado de entidade penal diferenciada e por isso, distinto dos demais bens jurídicos penais (PRADO, 2007).
Assim, vislumbra-se que o bem jurídico ambiental é dotado de tutela penal especial e por assim ser, distingue-se dos demais. Prova disso, é que a lei nº 9.605/98 se destina exclusivamente a tratar dos crimes ambientais e está esculpida dentro dos princípios fundamentais do meio ambiente com vistas a um único objetivo: a proteção do meio ambiente.
A propósito, acerca da Lei nº 9.605, Milaré (2007) afirma que nos crimes ambientais, o bem jurídico protegido é o meio ambiente, o qual, equivale a qualidade ambiental em sua dimensão global.
Por seu turno, Silva (2008, p.66), na mesma direção, afirma ser o bem jurídico ambiental penalmente tutelado composto por elementos que integram o conceito de meio ambiente. Para tanto, recomenda observar a lei nº 9.605/98, quando esta estabeleceu os crimes ambientais com base nos elementos naturais (crimes contra a fauna e flora), artificiais (crimes contra ordenamento urbano) e culturais (crimes contra o patrimônio cultural) do meio ambiente.
Por meio das contribuições acima, percebe-se claramente que a especificidade do bem ambiental decorre da própria dimensão conceitual do meio ambiente, da dificuldade em interagir os vários aspectos que o circundam. Portanto, não se pode considerar descriminalizar qualquer tipo penal ambiental sem antes considerar a complexidade do meio ambiente como um todo.


5 Considerações Finais

A Constituição Federal, ao considerar o meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito fundamental, elevou por conseqüência, o meio ambiente a bem jurídico altamente relevante.
Desta forma, tendo em vista que o Direito Penal se propõe a proteção de bens jurídicos relevantes, por meio da criminalização de condutas, nada mais coerente, criminalizar também, as práticas que de alguma forma agridem o meio ambiente.
Nesse contexto, a Lei nº 9.605/98, se mostrou apta a exercer essa proteção, quando tipificou as condutas que violam a disposição constitucional, quanto ao direito do ser humano, ao meio ambiente ecologicamente equilibrado
Sirvinkas afirma que a Lei n. 9.605/98 procurou sistematizar toda a legislação esparsa. Trata-se de uma legislação moderna, trouxe muitos avanços e alguns retrocessos, mas, no geral, melhorou alguns tipos penais e criou outros, acrescentando a culpa como modalidade inexistente anteriormente, bem como mais crimes de perigo.
O fundamento jurídico da tutela penal ambiental encontra-se na própria Constituição, quando esta preconiza em seu art. 225, § 3º: " As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoa físicas ou jurídicas, a sanções penais,
Da mesma forma, entende-se que existem três critérios que legitimam a tutela penal ambiental. a) meio ambiente como bem jurídico penalmente relevante; b) a natureza subsidiária do Direito Penal; e c) a função instrumental da sanção penal.
Conclui-se que antes do advento da Constituição Federal de 1988, o meio ambiente, não era tutelado, nas Cartas Constitucionais, como bem jurídico autônomo, s omente com o texto constitucional de 1988, o meio ambiente, foi alçado à condição de direito social e passou a ser autonomamente tutelado, o que por consequência teve como reflexo a necessidade de tutela penal do meio ambiente.

REFERÊNCIAS


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